Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Depoimento espontâneo cria polêmica em novela


Manoel Carlos lamenta depoimento de sábado no fim de Páginas da Vida


Giovani Lettiere – copyright GloboOnline, 17/07/2006 – 20h17


Continua a polêmica em Páginas da Vida. Depois das cenas de nudez de Edson Celulari e Ana Paula Arósio que elevaram a audiência do capítulo de quinta-feira [13/7], chegou a vez dos depoimentos que encerram a trama. Sábado [15/7], uma senhora não identificada de 68 anos revelou que não sabia o que era orgasmo até os 45, quando se masturbou pela primeira vez, ao som de ‘Côncavo e convexo’ (leia a letra e ouça a música aqui). Em sua confissão, ela acrescenta ‘que não precisa de homem, pois sabe de virar sozinha’. O que você acha?


Em entrevista por email ao Globo Online, o autor da novela, Manoel Carlos, lamentou o fato de o depoimento ter ido ao ar sem nenhum tipo de corte e pediu desculpas aos telespectadores.


– O depoimento de sábado teve uma repercussão negativa, o que eu entendo perfeitamente. Algumas pessoas se sentiram constrangidas por estarem assistindo à novela com crianças por perto. Lamento muitíssimo. Não era nossa intenção criar esse tipo de polêmica, pois não traz benefício a ninguém. Reconheço que deveria ter feito alguns cortes, procedido à uma edição, ou simplesmente substituído o depoimento por outro. Cometi um erro de avaliação, mas involuntariamente. Posso garantir que isso não voltará a acontecer – assegurou o novelista.


Por telefone, Manoel Carlos garantiu que, apesar do episódio de sábado, os depoimentos vão continuar encerrando a novela e que eles vão ao ar sempre após às 22h, horário permitido pela classificação do Ministério da Justiça. Ele acrescentou também que o diretor da trama, Jayme Monjardim, recebeu um pedido da direção da emissora para que ‘se tome mais cuidado com os depoimentos que irão ao ar’.


Nesta segunda-feira [17/7], circularam rumores de que os depoimentos poderiam ser retirados em caráter definitivo.


– Você pode ligar normalmente a TV hoje na novela e conferir um novo depoimento – garantiu Manoel Carlos.


Sobre a possibilidade de reclassificação do horário da novela por conta das cenas fortes, o novelista garantiu não saber nada sobre o assunto, que só a Globo poderia responder.


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Para TV Globo houve ‘excesso’ em depoimento polêmico de Páginas da Vida


Giovani Lettiere – copyright GloboOnline, 17/07/2006 – 20h14


Em nota assinada pela Central Globo de Comunicação, a TV Globo reconheceu nesta segunda-feira [17/7] que ‘houve um excesso’ no depoimento deste sábado veiculado no fim de Páginas da Vida, no qual uma senhora de 68 anos confessa que só atingiu o orgasmo aos 45 anos, quando descobriu a masturbação.


‘A TV Globo reconhece que houve um excesso e a direção da empresa solicitou que, a partir de agora, todos os depoimentos sejam acompanhados de perto pela área de Controle de Qualidade’, diz a nota.


A assessoria de imprensa da emissora também negou a possibilidade de a novela ter sua classificação horária alterada para as 22h e reafirmou que os depoimentos continuarão a ir ao ar normalmente.


Neste sábado, a trama de Manoel Carlos atingiu 41 pontos de audiência no Ibope, com 65% de participação entre todas as TVs ligadas. Na véspera, os índices atingiram 44 pontos, com 64% de participação.


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Depoimento polêmico em Páginas da Vida está longe de ser chocante


Rodrigo Pinto – copyright GloboOnline, 18/07/2006 – 12h05


Faz sentido, se a intenção for entreter mais e provocar menos reflexão, o pedido da direção da TV Globo para que o diretor Jayme Monjardim tome cuidado com os depoimentos que escolhe em Páginas da Vida . Feita como no sábado [15/7], a eleição do entrevistado pode causar uma tremenda dor de cabeça dentro da emissora e pelo país afora.


Como todo assunto polêmico, discuti-lo, torná-lo parte do cotidiano da população causa, sim, constrangimentos. Até por que, pensando bem, não era do constrangimento que os pais – especialmente os de famílias mais cultas e abastadas – fugiam até os anos 70?


Até a chamada liberação sexual, o assunto sexo era um tremendo incômodo. E casar virgem era a regra que tirava dos pais – e colocava nas inexperientes filhas, mais do que nos filhos – a responsabilidade de tocar sua vida sexual. Apesar das muitas dúvidas a respeito do que é ser sexualmente saudável e de como, claro, ter prazer.


O depoimento de uma senhora negra, de português ruim (como diria em ‘Detalhes’ o próprio Roberto Carlos, autor, aliás, da canção que embalou o sonho de orgasmo da entrevistada), começava com uma ressalva: ‘falando no popular’, disse ela, explicitando sua origem e abrindo uma larga via de comunicação com o povo que vê a novela. Em seguida, ela contou que engravidar e, portanto, fazer sexo, não tem nada a ver com prazer. Novidade? Claro que não.


Porém, a descoberta foi para ela importante. E, ao contá-la com um riso envergonhado no canto da boca, a delicada senhora não identificada mostrou que este ainda é um assunto a ser debatido nos lares, entre os casais de todas as idades, classes sociais, orientação sexual. Ah, mas tem criança na sala! Verdade. Quando criança, quem não passou por constrangimentos diante de cenas que, para a época em que apareceram, enrubesciam os rostos de pais e filhos postos em frente à TV. Nada que não pudesse ser explicado e resolvido com uma boa conversa.


Simples? Claro que não. Mas o princípio básico é conversa e, claro, acesso à educação. Com os dois, o país e suas crianças vão longe, numa boa. Até porque, há muito as novelas das 20h vêm mostrando, num movimento que parece não ter volta, imagens tidas como ‘pesadas’ para as crianças, como uso de drogas e violentos assassinatos. A vida é dura (hoje em dia, até nos videogames é assim), que fique claro, dentro e fora das novelas.


E, afinal, naquele depoimento estava um pouco do que já se vê nas ruas. A novela nunca é mais explícita do que a vida. Basta andar por aí para ver mais beijos homossexuais, mais comentários explícitos sobre sexo ou mais fugas impunes de bandidos ricos do que na telinha. E muito antes das 22h.


Sexo verbal, sexo virtual, sexo seguro, sexo animal… Sexo, sexo, sexo. A palavra – e o conjunto de coisas que ela significa para cada um – sempre esteve na ordem do dia do ser humano. Enquanto o papa prega a abstinência contra a Aids, o governo pede na TV: ‘Bota a camisinha, meu amor’. Sexo! Na vida como na novela. Afinal, não era essa a idéia central de Páginas da Vida? A senhora de 68 anos de idade e o autor da novela foram tão corajosos quanto incompreendidos. Atitude invejável em meio a um Brasil no qual as pessoas têm enorme dificuldade de assumir suas posições e dificuldades, suas histórias, enfim. [Rodrigo Pinto é jornalista e editor de Cultura do Globo Online]


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Depoimento polêmico em Páginas da Vida já está na web


Copyright GloboOnline, 17/07/2006 – 19h12m


O depoimento polêmico no capítulo do último sábado da novela Páginas da Vida já circula na internet, no site de vídeos YouTube. O vídeo exibe a integra da declaração de uma senhora de 68 anos sobre a descoberta do orgasmo. A fala da mulher criou enorme debate. Clique aqui, vá ao YouTube e veja como foi. Se preferir, leia abaixo o depoimento, na íntegra:


– Esse negócio das pessoas dizerem que têm que gozar junto, que é isso que faz neném, é tudo mentira, porque fiquei sem gozar dos meus 14 aos 45 anos… Pra mim era tudo normal… O homem terminava e eu também… Daí, eu colecionava discos do Roberto Carlos e, aos 45 anos, ganhei um LP dele. Botei na vitrola a música ‘Côncavo e Convexo’ e fui dormir. E quando acordei, estava com a perna suspensa, a calcinha na mão e toda babada. Comentei com as amigas… Elas disseram: ‘Você gozou!’. Aí que vim saber o que era gozo. Moral da história: sou uma mulher de 68 aos, que homem pra mim não faz falta, eu mesma dou meu jeito.


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Manoel Carlos: ‘Ninguém gosta de felicidade na TV’


Giovani Lettiere – copyright GloboOnline, 18/07/2006 – 18h45


Com Páginas da Vida polemizando e dividindo opiniões dos telespectadores por conta de cenas de nudez e depoimentos ousados, o autor da novela, Manoel Carlos roubou a cena no programa Sem Censura, comandado por Leda Nagle, nesta terça-feira [18/7], na TVE. Durante o bate-papo, o novelista afirmou que Páginas começou mesmo com polêmica, mas se disse surpreso com a repercussão da nudez de Ana Paula Arósio.


– Surpreendi-me. Foi uma nudez para o marido. Ela havia se casado. Há cursos de strip-tease no Rio. Foi feito com muito bom gosto. A cena foi feita na sombra, com cuidado, dentro do contexto da novela. Respeito a opinião dos outros. Mas tem uma coisa: quem gosta não se manifesta. Recebo muitos protestos, mas também tantas manifestações de carinho – contou Manoel Carlos, que defende uma nudez sem vulgaridade, com critério.


– Há até pedidos para que a cena seja reprisada – completou.


‘Ninguém gosta de felicidade. Daí arrumei um câncer’


Questionado sobre a morte da personagem Nanda (Fernanda Vasconcelos), ele foi categório: ‘Tô pensando em matar a Nanda, sim’. E acrescentou:


– Ator gosta de drama. Em Mulheres Apaixonadas, a personagem da Maria Padilha era feliz demais, bem-sucedida, tinha tudo, sem problemas. E ninguém gosta de felicidade. Daí arrumei um câncer de mama para ela. Gosto de campanhas sociais nas minhas novelas. Agora será a Síndrome de Down. Ainda hoje, no Rio ou São Paulo, ainda tem muita mãe que pede ao filho que saia da sala quando chega visita em casa.


Manoel Carlos defendeu no Sem Censura que uma novela não pode ser só entretenimento.


– São mais de 200 capítulos. Quase um ano no ar. Não posso imaginar que seja só para entretenimento. A novela tem que abrir caminhos – pensa.


‘Foi um erro de avaliação. Mas achei tão sincero…’


– Eu mesmo selecionei os seis primeiros depoimentos. O vi um mês atrás. Foi um erro de avaliação. Mas achei tão sincero, de uma força. Uma dona-de-casa, mãe de família, humilde. Achei aceitável. Mas no sábado, quando terminou de passar o depoimento vi que ia ter problemas. Foi um erro meu. Poderia ter cortado duas ou três palavras. Nem foi o Jayme (Monjardim, diretor da novela). Eu pisei na bola, como dizem – disse o autor, que garantiu que, apesar da polêmica, os depoimentos continuam e já foram gravados no Rio, Belo Horizonte, São Paulo e Porto Alegre.


– Os depoimentos são colhidos na rua. E fazem fila. Todo mundo quer participar – explica Maneco.


– Cheguei a cortar um depoimento que gostei muito, de uma mãe contanto que a filha de 10 anos tentou o suicídio e ela quis ir junto com a menina, mas achei excessivo. Mantemos uma vigilância, não colocamos qualquer coisa no ar não – defendeu-se.


Durante o bate-papo, o novelista reiterou que, apesar de se passar no Leblon, Páginas da Vida não é uma trama realista, é uma novela de ficção mesmo.