Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Dez anos junto aos movimentos sociais

Uma das marcas da década de 80 é a popularização da produção em vídeo, que abriu um amplo campo de atuação para os profissionais que trabalhavam com a imagem. Foi nesse contexto que três amigos se reuniram e decidiram montar a primeira televisão comunitária a céu aberto – isto é: exibida em praça pública – das Américas. A surpresa veio dois anos depois, num encontro de produtores no Chile: a idéia tinha surgido ao mesmo tempo em muitas cabeças pelo mundo. Segundo um dos idealizadores da TV Viva, o jornalista Eduardo Homem, já naquela época, em meados dos anos 80, muitas experiências semelhantes estavam sendo desenvolvidas em vários países da América Latina. Hoje, mais de 20 anos depois da sua fundação, a explicação para a vitalidade do projeto só pode ser uma: era de fato uma boa idéia.

A acessibilidade técnica e econômica do vídeo permitiu que muita gente entrasse no ramo da produção audiovisual. Entretanto o objetivo, conta Eduardo, não era simplesmente produzir conteúdo. ‘Desde que fui para Recife (PE), sempre trabalhei vinculado aos movimentos sociais. O vídeo potencializou a comunicação nesse setor. Por isso a TV Viva nasceu da mistura de um desejo profissional junto a uma oportunidade tecnológica e à possibilidade de diálogo com os movimentos sociais’, explica. O projeto surgiu no Programa de Comunicação do Centro de Cultura Luiz Freire.

Durante dez anos, a TV Viva veiculou produção ligada à realidade da população do Nordeste, como reivindicações locais e ações culturais de sindicatos, associações, grupos de jovens, mulheres, indígenas e quilombolas, entre outros. A idéia era descentralizar a produção e a distribuição da informação, que na época estavam muito limitadas à Região Sudeste. Eduardo explica que, devido à falta de canais para veicular esse tipo de produção, a TV Viva exibia a sua programação em praça pública, em telões, direto para a população-alvo.

‘Tínhamos uma programação mensal que era formatada com uma sucessão de programas. Era uma grade de uma hora, com vários blocos: infantil, jornal, reportagem temática, documentário ou ficção e, no fim, um bloco cultural’, recorda. As exibições aconteciam periodicamente em 24 bairros da região metropolitana do Recife e esporadicamente em cidades do interior de Pernambuco. ‘O nosso ânimo no começo do trabalho era dar voz nos meios de comunicação em massa para pessoas que não tinham. Os personagens da TV sempre eram semelhantes às pessoas que iam assistir na praça. O grau de identificação com a trama era muito grande. E com isso criamos uma maneira nossa de fazer comunicação’, orgulha-se Eduardo.

Rede de comunicação

Depois de uma década convidando as pessoas a irem à praça para verem sua realidade projetada num telão, a TV Viva encerrou as exibições ao ar livre. Segundo Eduardo, o principal motivo foi a falta de dinheiro.

‘Nos nossos primeiros dez anos de vida, estávamos mais voltados para ser uma TV comunitária de rua. E nos dez anos seguintes nos concentramos mais no trabalho de produtora. Mas uma produtora voltada para a área social’, diz o jornalista. Devido ao forte vínculo da TV Viva com a cultura, os trabalhos sempre foram muito ligados à cena musical pernambucana, como o programa Sopa Diário, veiculado na TV Universitária de Recife.

Além de manter o ritmo intenso de quem luta pela regionalização da produção, a TV Viva está levantando uma nova bandeira. ‘Estamos, junto com o Centro Luiz Freire, muito envolvidos na briga pela generosidade intelectual. Procuramos dar o exemplo, pois tudo o que produzimos até hoje é do mundo, não é nosso. Isso fortalece a nossa posição nessa causa’, defende Eduardo. O acervo da TV está disponível para quem quiser usar. Para facilitar o acesso do público e preservar o material, o conteúdo está sendo digitalizado e em breve será montada uma estrutura para que as pessoas possam consultá-lo.

Um dos projetos aos quais a TV Viva vem se dedicando ultimamente é a construção de uma rede de comunicação do Semi-Árido. O passo inicial foi a produção do primeiro número da rede Patativa, uma revista em vídeo sobre temáticas importantes para as comunidades locais, como agricultura familiar. ‘Resolvemos começar pequeno e, a partir da existência da revista, queremos tentar sensibilizar outros adeptos da criação de uma rede de comunicação na região’, explica. Segundo ele, a idéia é tecer a rede em torno das 52 unidades gestoras da Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA).

Outra iniciativa que vem sendo tocada pela TV Viva é a produção do filme Pernamcubanos. A montagem está em fase de pré-produção. ‘Já foi aprovado pela Ancine [Agência Nacional de Cinema e Vídeo] e estamos na fase de levantar recursos. Já produzimos duas vídeo-cartas de Pernambuco para Cuba e outra de Cuba para Pernambuco. A idéia é mostrar as identidades dos dois lugares e as afinidades em relação à musica e à religião’, explica Eduardo. O lançamento está previsto para o segundo semestre de 2007.

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Jornalista da Rede de Informações para o Terceiro Setor