Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Do tupiniquim para o mundo

O ato da comunicação ‘pode ser comparado ao da respiração: o ser humano não pára de se comunicar, mas poucas vezes dá-se conta disso’. A comunicação, em si, é um processo que põe em relação dois ou mais pólos (emissores e receptores) que trocam informações. A informação é a ação de informar o conteúdo de uma mensagem. No contexto publicitário, a mensagem é um objeto do processo de comunicação, onde é constituído por um conjunto de contexto de cultura e de mercado, o anunciante. Se o processo de comunicação em sua essência é formado por emissores e receptores, no caso do texto publicitário o emissor é o anunciante e o receptor é o público-alvo. A ponte de ligação entre eles é chamada de mídia, onde impõe ao texto suas limitações e possibilidades.

O principal objetivo do texto publicitário é romper paradigmas, inovar, para chamar atenção dos receptores (público-alvo). Está inserido em uma forma de expressão e de conteúdo, mas freqüentemente fazendo com que novos públicos sejam atraídos ao campo da expressão. Procurando criar e fixar novas necessidades para os receptores, a mensagem publicitária é na maioria das vezes inserida em um contexto de cultura híbrida (populares e massivas, críticas e de consumo).

Sendo fundamentado nos argumentos anteriores, o presente texto tem como objetivo principal analisar a campanha publicitária ‘As legítimas’, pertencente às sandálias Havaianas, marca produzida pela Alpargatas, do grupo Camargo Correa.

Serão feitas as análises interna, comparativa e discursiva e, para isso, se usarão formas teóricas para descrever e analisar a mensagem veiculada na campanha, sendo o principal objetivo do estudo. A identificação do discurso utilizado e do campo de expressão inserida a marca das Havaianas, irá mostrar como acontece o processo de inclusão de uma marca na mente do público-alvo, e como se dá a remodelagem de um produto para ser redirecionado para outro tipo de público. No caso das Havaianas, tornando-se ícone fashion mundo afora.

Contexto – Aldeia Global

Segundo o professor de literatura canadense Herbert Marshall McLuhan, o surgimento dos meios eletrônicos tornou a comunicação um ato capaz de reproduzir a simultaneidade plural do pensamento.

O ‘homem eletrônico’, resultante das transformações tecnológicas, voltou a encontrar-se em uma aldeia tribal, mas de escala planetária: a aldeia global. Nela, a mesma experiência comunicativa é compartilhada por diferentes culturas: a maneira como o receptor se relaciona com a TV, por exemplo, é a mesma em qualquer país, independente da língua falada ou dos costumes sociais.

O processo de globalização se pauta, portanto, pela disseminação de informações e de produtos culturais, assim como de idéias e atitudes (‘use as legítimas, não aceite imitações’), difundidas pelas mídias que formam vastas redes de comunicação, muitas vezes pertencentes a corporações multinacionais (no caso, as Havaianas se encontram, atualmente, em mais de 80 países), em escala planetária e compartilhadas por pessoas de diferentes sociedades e culturas.

Com isso, o marketing ganha um papel poderoso em relação ao consumidor versus mercado, criando novas necessidades para serem colocadas em um ambiente global. Afinal, quanto maior o número de pessoas atingidas em lugares diferentes, maior a fixação da marca no mercado globalizado.

O ambiente de marketing

O que é marketing?

Segundo o comitê de definições da American Marketing Association, marketing é ‘a execução das atividades de negócios que encaminham o fluxo de mercadorias e serviços dos produtos aos consumidores finais, industriais e comerciais’.

Considerado o ‘papa’ do marketing, Philip Kotler, em seu livro Administração em Marketing, define marketing sendo a função de identificar as necessidades e desejos não-satisfeitos, estabelecer e medir sua magnitude, determinar a que mercado-alvo a organização pode atender melhor, lançar produtos, serviços e programas apropriados para atender melhor a esses mercados e orientas as pessoas da empresa para que ‘pensem e sirvam o cliente’.

O marketing é formado por 4p’s, ou pés, como algumas pessoas chamam: produto, preço, praça e promoção. A publicidade/propaganda está incluída em si na questão da promoção. Então, conclui-se que a publicidade/propaganda está inserida no marketing.

Quando se trata de publicidade e propaganda, existe uma grande confusão dos seus verdadeiros significados.

Publicidade ou propaganda?

De um lado, os ‘homens de marketing’ dizem que a propaganda é uma forma de comunicação paga, veiculada pela mídia de massa, por anunciantes identificados, enquanto a publicidade engloba só as atividades de divulgação de informações sobre empresas, produtos ou serviços com características de noticiário geralmente gratuitas [Cobra, Marcos. Marketing básico]. De outro, os estudiosos de comunicação dizem ser propaganda ‘o conjunto de técnicas e atividades de informação e persuasão destinadas a influenciar, num determinado sentido, as opiniões, os sentimentos e as atividades do público receptor [Fernandes, Francisco de Assis M. Propaganda] e, publicidade, o ‘conjunto de técnicas de ação coletiva utilizadas no sentido de promover o lucro de uma atividade comercial, conquistando, aumentando e mantendo clientes’ [Malanga, Eugênio. Publicidade; uma introdução].

Mesmo com toda essa confusão de significados, no contexto aqui presente será referida a campanha das Havaianas sendo uma publicidade, de acordo com a visão dos estudiosos de comunicação.

A publicidade sendo peça fundamental no ambiente de marketing, por persuadir e manipular o público-alvo, influência este mesmo público a escolher uma marca específica, tendo o marketing um conhecimento do que o público deseja.

O poder da marca

Hoje em dia, ouve-se muito falar que existe um novo P no ambiente de marketing, além dos 4p´s (produto, preço, praça e promoção). O novo P é a percepção.

A matéria-prima em marketing é a mente. Lições instigantes seguem-se daí, e a mais curiosa é o conceito de marca: a boa marca não é aquela que você escolhe: é ela, a marca, que escolhe você.

Afinal, o que é marca? Partindo da visão do dicionário da língua portuguesa, marca é o ato ou efeito de marcar; carimbo; cunho; distintivo; sinal (…). Então, considera-se que a marca seja como um carimbo colocado na mente do consumidor, sendo muitas vezes reforçada pela mídia para não ser ‘sumida’ da mente do consumidor.

Segundo o INPI, marca é ‘todo sinal distintivo, visualmente perceptível, que identifica e distingue produtos e serviços de outros análogos, de procedência diversa, bem como certifica a conformidade dos mesmos com determinadas normas ou especificações técnicas’.

Na teoria da comunicação, marca pode ser um signo, um símbolo ou um ícone. Uma simples palavra pode referir uma marca. O termo é freqüentemente usado hoje em dia como referência a uma determinada empresa: um nome, marca verbal, imagens ou conceitos que distinguem o produto, serviço ou a própria empresa. Quando se fala em marca, é comum estar-se a referir, na maioria das vezes, a uma representação gráfica no âmbito e competência do designer gráfico, onde a marca pode ser representada graficamente por uma composição de um símbolo e/ ou logotipo, tanto individualmente quanto combinados.

No entanto, o conceito de marca é bem mais abrangente que a sua representação gráfica. Uma empresa através de seu nome fantasia e da sua representação gráfica – comunica a ‘promessa’ de um produto, seu diferencial frente aos concorrentes que o faz especial e único. O mercadólogo busca associar às marcas uma personalidade ou uma imagem mental. Assim, pretende ‘marcar’ a imagem na mente do consumidor, isto é, associar a imagem à qualidade do produto. Em função disto, uma marca pode formar um importante elemento temático para a publicidade. Possui vários níveis de significado, entre eles cultura, atributos ou benefício. É fundamental entender que a marca é mais intangível do que tangível, pois o consumidor de determinada classificação demográfica tem sensações, experiências e percepções diferentes sobre a mesma marca em relação a outro consumidor classificado demograficamente da mesma forma.

Sendo iniciada uma nova era mercadológica depois da II Guerra Mundial, houve um ‘temporal’ de novos produtos para serem consumidos. Surge a necessidade de diferenciação entre produtos. A marca torna-se elemento poderoso na escolha do produto.

O fabricante, então, tem a necessidade de atribuir valores ímpares para o seu produto através do seu manuseio, visual, individualidade e a proteção, para a diferenciação ao do concorrente.

O branding, em português traduzido como ‘construção da marca’, é uma estratégia de gestão da empresa que faz com que a marca tenha valor próprio, torne-se um ativo financeiro, um bem. O conceito, tal qual se conhece hoje, surgiu da necessidade do mercado de desenvolver vantagens competitivas de longo prazo. A tecnologia de hoje faz com que os produtos ou serviços concorrentes sejam muito parecidos entre si. Até mesmo quando uma empresa lança um produto exclusivo, em três meses – essa é a média vigente – a concorrência consegue copiá-lo. Se uma marca é forte o bastante, um consumidor pode escolhê-la em detrimento das outras. Resulta disso a vantagem competitiva de uma marca sólida. Daí também sua cotação. Além do mais, a pressa com que se vive e a fartura de opções de consumo cria a necessidade de algum critério em que o consumidor possa se ancorar. A marca, neste sentido, dá segurança para a compra. ‘Uma marca sólida tem atributos associados que carimbam seus produtos.’

Com uma marca sólida, o consumidor torna-se fiel. A partir disso, a empresa pode agregar certos valores àquela marca, como um valor bem mais alto que a concorrência e mesmo assim o consumidor pagando para obter o mesmo produto.

Teoria da informação

Durante a Segunda Guerra Mundial, na década de 1940, com os procedimentos de codificação e decodificação das mensagens trocadas entre os aliados ou seus inimigos, a informação ganhou status de símbolo calculável. Engenheiros e matemáticos passaram, a partir de então, a quantificar e otimizar o custo de uma mensagem transmitida entre dois pontos.

Também conhecida como teoria matemática da comunicação, a teoria da informação tem como base a quantidade de informação existente em um processo de comunicação.

Como não há processo comunicacional isento de ruído, a teoria da informação busca aumentar o rendimento informativo das mensagens, seja pelo recurso da redundância, seja pela escolha de um código (sistema de símbolos que, por convenção prévia, representa e transite a mensagem da fonte ao destinatário) mais eficiente.

As campanhas publicitárias usam muito da teoria da informação para propagar as informações desejadas, através da redundância, para a absorção das informações.

A mídia pós-modernista

Não se pode imaginar a chamada sociedade pós-moderna (ou pós-industrial) sem a presença maciça de informações ou a intervenção constante dos meios de comunicação de massa na vida.

A realidade é elevada à condição de efeito especial, com os meios de comunicação de massa transmitindo flashes da história em tempo real para interromper o fluxo banal da vida cotidiana. É por causa do poder adquirido pelos meios de comunicação massivos e seu entrelaçamento com outros fenômenos sociais que alguns teóricos da pós-modernidade também estudam, em seus textos, a comunicação neste contexto.

A pós-modernidade caracteriza-se por alguns elementos:

1) Alta Tecnologia: satélite, antena parabólica, telefone, celular, microcomputador, etc; possibilitam divulgar, armazenar, copiar, captar e produzir elevado número de informações, facultando a criação de novos códigos e a possibilidade de interferência na emissão e no conteúdo das mensagens.

2) Velocidade: não é apenas a quantidade de informação que aumenta com a tecnologia, mas também a rapidez com que é veiculada. Assim, as idéias e comportamentos são modificados rapidamente. Vive-se em um contínuo presente, diferente daquele que o antecedeu e do que irá suceder.

3) Consumo e Hedonismo: O consumo passa a ser o espaço da diferenciação. A compulsão consumista gera fenômeno do hedonismo, do individualismo exacerbado, que se manifesta como forma de defesa em um ambiente hostil que preconiza um futuro incerto.

4) Niilismo: com o aumento da quantidade de informações e a rapidez com que surgem e desaparecem nas mídias, não há mais temas relevantes e as ideologias aparentemente ficaram obsoletas e perderam o sentido: os discursos repetem o que já foi dito e ouvido. Não se espera mais nenhuma criação original, pois já se esgotaram todas as possibilidades teóricas.

5) Pastiche: se não há originalidade, a cultura pós-moderna busca retrabalhar velhos temas, dar nova roupagem a antigos produtos (é o caso dos remakes de filmes), A nostalgia (olhar saudosista, que revela um passado ideal, já que o presente é ruim) é outra forma bastante usada na TV, no cinema, na música e na publicidade.

6) Simulacro: uma vez que a realidade não corresponde aos desejos do indivíduo, os meios de comunicação oferecem um substituto melhor: a fantasia, a recriação da realidade produzida de maneira cada vez mais sofisticada. A publicidade, a tevê, o cinema, o vídeo game criaram uma hiper realidade, em que o receptor se sente mais confortável, seguro ou feliz do que no mundo real. A essa abstração, simulação da realidade, corresponde ao simulacro, um mundo falso que se torna mais atraente do que verdadeiro.

O texto publicitário

A mídia tem divulgado prioritariamente textos complexos e híbridos, buscando transmitir com eficiência suas mensagens, seduzir e convencer a opinião pública. Por isso, a especialmente a publicidade, a forma como o texto é veiculado requer clareza e inovação. Persuadir é a ordem.

Consideram-se textos complexos aqueles que recorrem a várias substâncias de expressão e a de diferentes linguagens para exprimirem seu conteúdo. O atual processo de produção midiática, muito bem aparelhado pelas novas tecnologias, é um campo perfeito para o surgimento desses textos híbridos, uma vez que os procedimentos e mecanismos expressivos de caráter intersemiótico e intermidiático acabam, muito rapidamente, sendo transpostos de um tipo de linguagem e mídia para os outros, advindo daí a ‘contaminação’ em todos os textos.

Hjelmslev propõe um método de comparação que busca uma base homogênea que faz de qualquer linguagem uma linguagem capaz de ser sobreposta a realidades não lingüísticas. Para isso, ele recomenda que o texto seja dividido em classes, por sua vez, divididas em componentes analisáveis, até o esgotamento completo das possibilidades. Ele alerta para a importância de compreender as dependências vigentes entre as partes que. Juntas, forma a totalidade do texto.

A linguagem do texto publicitário

No texto publicitário, as diferentes linguagens utilizadas podem apresentar as seguintes relações: reiteração, complementaridade, contrariedade ou autonomia.

A relação da reiteração acarreta a reprodução, o esforço da informação dada pelo outro sistema lingüístico. Normalmente, junto com a reiteração há a complementaridade que tem função de acrescentar informações novas ao outro sistema adotado. A contrariedade, ou seja. A negação da informação aparece pouco.

Para garantir a produção e recepção de sentido com o foco na persuasão, objetivando a venda ou o uso do produto ou serviço, a publicidade tem se valido sistematicamente do ‘casamento de linguagens’.

A polissemia da imagem imprime aos seus significantes, uma ‘cadeia flutuante de significados’. Com isso, de acordo com a disposição do receptor no momento da leitura, ele poderá escolher alguns sentidos e simplesmente ignorar outros.

O objetivo maior dos produtores de textos publicitários é fixar a ‘cadeia flutuante de significados’. Procedendo assim, tentam eliminar sentidos e signos dúbios e /ou incertos, estreitando sua relação com a linguagem verbal, denotando-a, reiterando-a e direcionando a leitura para o sentido que o texto publicitário quer explicitar. Segues-se que a análise deve buscar conhecer a relação estabelecida entre o texto verbal e a imagem como uma prerrogativa para a produção de certos sentidos e não de outros, fora de seu contexto.

Pesquisas que investigam a produção e a recepção/percepção de imagens fotográficas representam uma significativa contribuição à análise de textos publicitários. Elas esclarecem a respeito das possibilidades descritivas dos textos complexos e das alternativas de estruturação de uma pragmática do visual. Sempre buscando com isso mostrar as interfaces e contaminações que se fazem presentes entre as várias mídias, impondo a elas limites cada vez menores e interferências cada vez maiores no seu lazer.

Para Couchot, ‘as técnicas figurativas não são apenas meios de criar imagens de um tipo específico, são também meios de perceber e interpretar o mundo’. Assim, as imagens, as fotografias que ‘representam a realidade’ e que usamos para ‘ler o mundo’, tornam-se instrumentos privilegiados que constroem, destroem e reconstroem a realidade. Essa estratégia de simulação, sempre presente nos textos midiáticos pós-modernos, leva ao que Baudrillard chama de ‘representação desenfreada de real e de referencial’.

Por isso, é necessário compreender que as linguagens, inclusive a fotográfica, são mais do que simples sistemas de signos, mas, principalmente, sistemas de relações. Sendo assim, todo e qualquer texto pode ser analisado internamente, nos planos da expressão e do conteúdo, e também externa e intertextualmente, sendo comparado com os outros textos de outros sistemas que integram seu contexto.

A brasilidade nos textos publicitários

Na falta de autenticidade, o brasileiro leva a sério, isto é, assume as máscaras sociais e culturais que são impostas pelo exterior e que ditam quem ele é e como ele é. O povo brasileiro perdeu a ligação e a referência crítica com a realidade. Eles imaginam ser aquilo que lhes é mostrado a partir do que vem de fora: sambistas, jogadores de futebol e belas mulheres; todos felizes, bonitos, sadios, extremamente sociáveis e sem maiores problemas ou preocupações. É o triunfo do simulacro midiático.

Adotar uma significação que venha do exterior para lhe conferir personalidade elimina os riscos e o constrangimento de mostrar, sem a ilusão das máscaras, quem verdadeiramente é e como pensa, vive, percebe, interage e transforma a sua realidade. Então, tem-se aqui, mais que uma simples preposição filosófica, um desafio a ser transformado por aqueles que querem conhecer o Brasil e os brasileiros a partir de seus anúncios publicitários.

‘Não aceite imitações’ – As Havaianas e a sua história

Havaianas é uma marca de calçado brasileira de chinelos de borracha produzidas pela Alpargatas. As Havaianas já atingiram sucesso mundial e são vendidas desde o Brasil à Austrália passando pela Europa. Só no Brasil já foram comercializados cerca de 2 bilhões de pares desde a sua introdução em 1962. As Havaianas são produzidas na cidade de Campina Grande, no estado da Paraíba, pela indústria Alpargatas. Na fábrica que se localiza nessa cidade, são produzidos cinco pares de sandálias por segundo, o que gera uma produção anual em torno de 105 milhões de pares.

A idéia para a marca surgiu das zori, sandálias japonesas feitas de palha de arroz ou madeira lascada e que são usadas com os quimonos. Desde o seu aparecimento, as Havaianas evoluíram dos modelos simples de chinelo de enfiar no dedo, que continuam a ser um sucesso de vendas, para designes mais elaborados com aplicações variadas ou inspirados na bandeira do Brasil. Recentemente foi lançado um modelo que inclui um salto alto.

Apesar de serem chinelos, as havaianas já adquiriram um status que as torna um calçado aceitável mesmo em ocasiões mais elegantes.

O slogan mais conhecido do produto é ‘As legítimas’, uma vez que, devido ao sucesso, muitas outras empresas lançaram produtos semelhantes para concorrer com as Havaianas. Esse slogan começa a ser veiculado em campanha publicitária com Chico Anysio como garoto -propaganda.

O sucesso das Havaianas por todo o mundo se dá a partir de 1994, com uma estratégia de marketing bem sucedida, que remodela o produto e redireciona o posicionamento para públicos com maior poder aquisitivo, tornando-se ícone fashion, primeiro no Brasil, e a seguir, mundo afora.

Análise interna

‘Na década de 60, a Alpargatas lançava as sandálias Havaianas, um produto feito de borracha e 100% nacional. Naquela época, segundo definição da própria fabricante, era ‘a mais simples resposta à necessidade de proteger os pés’.

A partir da análise do case sandálias Havaianas, houve a necessidade do próprio cliente de alterar o produto, sendo assim uma mudança de tom no discurso foi notada. Por isso, através de três anúncios veiculados em revistas de circulação nacional no período de 1972 a 2002, ajudará a compreender as alterações feitas ao longo dos anos.

A mídia impressa foi escolhida por vir ocupando nos últimos anos um lugar de destaque, com algo em torno de 30%, perdendo apenas para o meio televisivo (entre 50 e 60%). Além disso, as Havaianas concentram seu esforço impresso em revistas por algumas razões que vão além da segmentação e do perfil de consumidor; como o produto é rico em cores e detalhes, a qualidade de impressão das revistas é infinitamente superior a de jornais e tablóides, favorecendo procedimentos impressos mais sutis e eficazes, como nuances de cor, tipos de letra e detalhes de foto.

1) Outdoor de janeiro de 1974.

‘Em festa de havaianas, fajuta não entra. A turma de baixo exige havaianas – as legítimas’.

a) Estrutura do anúncio

O título ‘Em festa de havaianas, fajuta não entra’, mostra que desde aquela época, as Havaianas já se preocupavam com a falsificação da concorrência, que as outras não eram bem-vindas na festa das legítimas.

O texto ‘A turma de baixo exige havaianas – as legítimas’, garante que as Havaianas dão conforto que os pés exigem. Fica claro que não é uma questão de gosto ou status, pois quem exige não é o consumidor e sim os pés dele.

O logotipo no outdoor aparece destacado no canto superior, na época era uma prática comum, porém, hoje em dia procura-se preservar o logotipo como um ícone isolado, sem interferências visuais.

O slogan ‘As Legítimas’ reforçam a preocupação com as falsificações.

b) Elementos não-verbais

A direção de arte em preto e branco buscou uma linguagem simples, como deve ser a linguagem de um outdoor, e porque o público-alvo também é simples e não têm condições de comprar calçados mais caros. Os elementos de festa de forma infantil mostram que usar as havaianas faz bem a quem de direito, os pés.

O uso de cromos na década de 70 ainda era algo inovador e, como tal, com custos elevados. Para o produto Havaianas e seu público consumidor, o uso do desenho, do traço se fazia mais pertinente, tanto do ponto de vista do entendimento, quanto do ponto de vista de investimento.

O jogo de cores feito com preto e branco hoje em dia é sinônimo de classe, de diferencial de moda, de inovação e de estilo. Neste caso, porém, foi uma forma de diminuir custos de produção.

c) Elementos verbais

Um das funções de linguagem que é usada, é a função referencial, focalizando o referente (está nos pés – as Havaianas).

Os recursos expressivos de linguagem que são utilizados são:

A metonímia, que consiste na substituição de um termo por outro com o qual existe uma relação de significado. No caso, o todo (pessoa) é substituído pela parte dos pés (com os dedos em destaque).

A antonomásia, que é o emprego de uma expressão que identifica coisa ou pessoa, salientando suas qualidades ou um fato notável pelo qual são conhecidas. ‘A turma de baixo’ (perífrase) por dedos (nome comum personificado).

A personificação, que consiste na atribuição de características humanas a seres inanimados ou irracionais. Exige compartimento humano dos pés vistos como pessoa.

2) Outdoor de fevereiro de 1976.

‘Fique de olho na marca.

Legítimas só havaianas’.

a) Estrutura do anúncio

O título ‘Fique de olho na marca’, pede para que seus consumidores prestem atenção, não se deixem enganar e muito menos aceitar substituições.

O título e o texto neste caso se confundem no outdoor.

O nome Havaianas continua a aparecer em destaque com uma particularidade: o uso do logotipo como palavra de um texto.

O slogan ‘As Legítimas’ continua reforçar a preocupação com as falsificações.

b) Elementos não-verbais

A direção de arte usa um garoto propaganda que acaba sempre por agregar ao produto, as características de quem o anuncia. Nas décadas de 70 e 80, Chico Anysio foi o principal nome do humor na televisão brasileira, criando tipos inesquecíveis e com uma característica marcante: tipos brasileiros. Ora como personagem, ora como seu autor, Chico Anysio falava ao consumidor como igual – até porque sua infância humilde, sua origem nordestina, tudo absolutamente o fazia par da grande parcela de consumidores das havaianas. Por isso, mesmo, durante anos a fio, bastou para as Havaianas uma foto de Chico com o produto e seu depoimento.

O Close do garoto-propaganda junto ao produto é um dos recursos mais utilizados em toda a história da propaganda brasileira e mundial. Chico Anysio apresentando as Havaianas.

O jogo de cores feito com preto e branco devia-se ao fato que as Havaianas eram de um único tipo, de uma cor só. Portanto, não precisava investir na produção de um cromo colorido.

c) Elementos verbais

A função de linguagem utilizado neste caso, é a função conotativa, externando forte apelo ao receptor (Fique de olho).

3) Anúncio de novembro 1994, na revista Vogue.

‘A vida vem aos pares’.

Havaianas Top é o novo modelo exclusivo das Havaianas. Monocromática e de sola mais alta, ela vem nas cores preta, azul, rosa e lilás. Agora você pode escolher: As Legítimas ou as Novas Legítimas. Mas sempre Havaianas.

a) Estrutura do anúncio

O título ‘A vida vem aos pares’ faz referência à célebre proposição de que nenhum homem é uma ilha e de que ninguém vive sozinho. Assim, será em pares que a vida se processa e a palavra ‘par’, neste contexto, remete imediatamente ao calçado – que sempre é vendido aos pares.

O uso do plural (vem aos pares) é uma forma implícita de estimular a compra de várias Havaianas, uma vez que agora (e isto está no corpo do texto), é vendida em diversas cores (ela vem nas cores preta, azul, rosa e lilás).

O texto mostra que você pode escolher entre as legítimas e as novas legítimas. Mas sempre legítimas. Agora tem Havaianas Top, o novo modelo exclusivo das Havaianas. Monocromática e de sola mais alta, ela vem nas cores preta, azul, rosa e lilás. E a preocupação com as cópias continua sendo ressaltada quando você pode escolher entre as tradicionais e a nova extensão de linha, mas que no final são sempre Havaianas.

O logotipo enfatiza o novo segmento da linha das Havaianas, mantendo o nome em primeiro plano acrescentando o splash Top, como indicador de tipo, de extensão de linha. As legítimas, como sempre foram conhecidas, continuam a fazer parte da logotipia.

O slogan ‘As legítimas’ continua como assinatura da marca, sendo uma maneira de suavizar um pouco as tantas mudanças (nome, formato e apresentação) e alertando para as falsificações.

b) Elementos não-verbais

A direção de arte privilegiou o produto, pois se trata de um lançamento, colocando o par rosa avermelhado em destaque, sobre fundos antagônicos, um claro e outro escuro, dia e noite, o tempo todo. Além disso, a paridade do título se faz presente no fundo – arroz vem com feijão.

Foi escolhido um par número 37/38 que serve tanto para mulheres quanto para homens, por ser uma numeração intermediária. Isso deixa claro que as Havaianas existem e servem para os dois targets – masculino e feminino. Uma numeração 34/35 ou 42/43 poderia indicar o produto para um target específico (no exemplo, feminino e masculino respectivamente).

O jogo de cores feito com a cor rosa avermelhada é uma questão de exposição de produto, porque é uma cor quente que chama a atenção e contrasta com o fundo básico, contrastado, mas de cores e tons frios.

c) Elementos verbais

As funções de linguagem utilizadas foram: a função referencial, com o foco no objeto Havaianas Top (o novo modelo das Havaianas). E a função conotativa, pois externa forte apelo ao receptor (você pode escolher).

Os recursos expressivos de linguagem que se pode notar são: a polissemia, uma só palavra com vários significados, no caso a palavra par em seu plural ‘aos pares’, par de sandálias, par de casal (homem e mulher que geram a vida, que vem aos pares). E a antítese, que consiste no emprego de palavras ou expressões de sentido opostos, para realçar o contraste de idéias. Na divulgação das Havaianas Top, a composição feita com o jogo de cores de fundo, claro e escuro.

Quarenta anos depois, as Havaianas tornaram-se um produto totalmente cult que, como dizia Jorge Amado, calça ‘do mais pobre ao mais rico’. As sandálias calçam desde os pés menos abastados até os de celebridades como a atriz Nicole Kidman.

Análise comparativa – Império dos calçados

No começo, eram apenas embalagens plásticas, depois vieram os calçados. Foi assim que os irmãos Alexandre e Pedro construíram o império Grendene, marca batizada com o sobrenome da família, no ano de 1071.

A empresa nasceu no município de Farroupilha (RS). A modesta fábrica de embalagens plásticas aos poucos foi se transformando na sede do maior fabricante de calçados do país.

A empresa investiu tanto no desenvolvimento tecnológico e unidades fabris como em uma comunicação sofisticada. Hoje são 13 fábricas produzindo mais de uma dezena de modelos, que são exportados para quase todo o mundo.

O investimento no parque industrial foi a forma que a Grendene encontrou para ser tantas empresas numa só. Com tecnologia de ponta, fábricas de Primeiro Mundo e seguindo normas internacionais de produção, a Grendene tem força para atuar nos mercados adulto, adolescente, infantil e baby.

A comunicação da empresa foi trabalhada por anos pela DPZ, aos cuidados de Washington Olivetto. Quando o publicitário montou sua agência, em 1986 – a princípio w/GGK, depois W/Brasil, a conta foi para a agência, onde continua até hoje. Uma das estratégias da W/Brasil é a de colocar ícones brasileiros como garotos propaganda das campanhas nacionais e internacionais da marca, nomes como Gustavo Kuerten, Gisele Bündchen e o piloto Ayrton Senna.

Nos passos das Havaianas

A Grendene quer ter uma marca mundial e seguir a trilha da concorrente. Mas não é tão fácil como parece.

No dia 20 de março de 2007, a top model Gisele Bündchen foi a principal atração da festa de lançamento na Europa da sandália Ipanema, fabricada pela Grendene. O evento foi no tradicional hotel Ritz de Madri, em frente ao Museu do Prado, e foi visto como início simbólico de um passo decisivo da empresa. Os executivos de marketing da Grendene acreditam ter encontrado o produto certo, o que permitirá à campanha gaúcha ter finalmente sua marca global. A ambição da Grendene é repetir a trajetória de um dos mais lembrados produtos brasileiros no exterior: as sandálias Havaianas, da Alpargatas. Além de usar a imagem de Gisele Bündchen, a Grendene vai usar também outras referências brasileiras para tentar atrair visibilidade lá fora: a valorização da cultura indígena e o apelo da preservação ambiental. A mistura indígeno-ecológica reflete-se no design da sandália, enfeitada com grafismos feitos por representantes da tribo kisedjê, do Xingu. Pela participação, os índios receberão parte dos royalties pagos a Gisele. Além disso, a Grendene doará parte da renda da venda das sandálias ao projeto Y Ikatu Xingu, de preservação das nascentes do rio Xingu, ameaçadas pelo desmatamento.

O que animou os executivos da Grendene a partir para uma ofensiva tão ambiciosa foi a performance do produto no Brasil. Apesar de seu nome quilométrico – Ipanema Gisele Bündchen Y Ikatu Xingu –, a sandália vem tendo boa aceitação. ‘Desde que o produto foi lançado, em outubro, as vendas no período já foram 40% superiores às da antiga Ipanema Gisele Bündchen no mesmo período do ano anterior’, diz Március Dal Bó, responsável pelo marketing da Grendene. ‘A questão ambiental e os grafismos geraram conteúdo extra para o produto, que combinaram bem com a imagem de Gisele.’ Com a sandália, a Grendene espera reverter aquilo que seus executivos consideram o ponto fraco em seu processo de internacionalização. Dos 130 milhões de pares produzidos no ano passado, cerca de 30 milhões foram destinados ao exterior, o que a torna um dos maiores exportadores de calçados do Brasil. No entanto, apenas uma pequena parcela desses produtos – cerca de 1 milhão de pares – era de marcas consideradas fortes pela empresa, como Melissa e Ipanema. A Grendene exporta mais de 300 modelos de diversas marcas num ano, quase todos os produtos com baixo valor agregado. Num ambiente de feroz competição com os chineses, essa estratégia é no mínimo arriscada. ‘Vamos concentrar nossos esforços nas marcas que nos dão maiores margens’, diz Dóris Wilhelm, diretora de relações com investidores da Grendene.

Transformar um produto em sucesso internacional é um acontecimento ainda raro entre empresas brasileiras. A Alpargatas, uma das poucas bem-sucedidas, levou quase uma década para fazer com que as Havaianas fossem reconhecidas como sinônimo de chinelo de dedo (ou flip flop, como dizem os norte-americanos) em todo o planeta. A Alpargatas – empresa do grupo Camargo Corrêa – teve de investir em inovações, recorreu a escritórios internacionais de design e contratou profissionais de relações públicas com bom trânsito no mundo da moda. Estrelas internacionais, como Julia Roberts, Jennifer Aniston e Nicole Kidman, foram flagradas usando o produto e suas imagens estampadas em revistas de celebridades. O burburinho em torno da marca a catapultou para a elite dos produtos reconhecidos internacionalmente.

Uma estratégia ousada foi estabelecida para os principais mercados internacionais. O projeto começou em 2001 pelos dois países formadores de opinião (Itália e França). Neste ano as sandálias Havaianas participaram de uma mostra sobre a América Latina na Galerie Lafayette, em Paris. O sucesso desse evento facilitou a exportação de Havaianas para outros países, entre eles Inglaterra, Bélgica, Suíça, Grécia e Mônaco. Nos EUA, por exemplo, foram realizadas várias ações como a participação na New York Fashion Week, a distribuição do produto em megaeventos, como a entrega do Grammy e do Oscar em 2003 e o MTV Awards. Este trabalho foi realizado em conjunto com o distribuidor dos EUA, visando divulgar a marca graças à associação com eventos de grande prestígio e ao uso do produto por formadores de opinião. O posicionamento estratégico de vender a marca, e não o produto, caracteriza a atuação da Alpargatas no mercado internacional.

Aprendida a lição, a Alpargatas não descuida de seu carro-chefe. Mesmo com volume de vendas de 22 milhões de pares em 80 países em 2005, a empresa continua agressiva no marketing. Há duas semanas, enviou pares de Havaianas adornados com dez estrelas de ouro branco a atores, atrizes e diretores indicados ao Oscar – Meryl Streep, Martin Scorsese, Penélope Cruz e Leonardo DiCaprio entre eles. O valor do brinde: 1 500 dólares. ‘O sucesso das Havaianas é uma decorrência de seu posicionamento inovador e de sua capacidade de sintetizar qualidades brasileiras, como descontração e alegria’, diz o consultor Marcos Machado, da Top Brands. ‘Isso não significa que quem seguir a mesma fórmula se dará bem.’

Há dois anos, a Grendene fez sua primeira tentativa de copiar os passos das Havaianas. A companhia escolheu a Melissa e apostou em parcerias com designers, estilistas, artistas plásticos e até arquitetos para o desenvolvimento das coleções. Há Melissas concebidas por nomes como o egípcio Karim Rashid, o inglês Judy Blame, Romero Britto, os irmãos Campana e Alexandre Herchcovitch. As sandálias, com preço na faixa dos 75 dólares, estão em cerca de 500 pontos-de- venda no exterior, em lojas como Samaritaine, em Paris, ou Optitude, em Tóquio. Apesar de crescentes, as vendas da Melissa ainda são pequenas quando comparadas ao total de exportações da empresa. Em 2005, foram vendidos no exterior 50 000 pares da sandália. No ano passado, foram 200 000. A meta é dobrar esse número em 2007. Para a nova Ipanema, a Grendene tem planos diferentes. As sandálias serão vendidas por cerca de 30 dólares em lojas de departamentos européias, como Galeries Lafayette, na França, El Corte Inglés, na Espanha, e Kaufhof, na Alemanha. A empresa acredita que há cerca de 20 000 pontos-de-venda potenciais para o produto, tomando como base os pontos-de-venda que comercializam a marca Rider, a sandália masculina da Grendene. No ano passado foram vendidos 700 000 pares de sandálias Ipanema. Neste ano, a empresa espera vender 1,5 milhão de pares, em 30 países – isso se o pacote que junta índio, Gisele Bündchen e preservação ambiental derem certo.

Já as Havaianas no final do ano passado, chegavam a 56 países, após abrirem mercados também na Alemanha, Holanda, Finlândia, República Tcheca e Suécia. O Caribe também é o principal destino das sandálias Samoa, que em 2003 passaram a ser exportadas para Cuba, país que também começou a importar o tênis Conga.

Além disso, uma equipe viaja permanentemente pelo mundo com o objetivo de identificar oportunidades de negócio e selecionar pontos estratégicos para a promoção das marcas.

O maior mercado para as exportações da Alpargatas é a América Latina, que representa 61% da receita, seguido da Europa com 12%, EUA com 10% (mercado que apresenta maior oportunidade de crescimento das exportações), Oceania com 10% e Ásia com 7%.

As principais diferenças entre as duas no desafio de criar uma marca global é que as Alpargatas manteve o foco em um único produto, simples e identificado com a cultura brasileira. Difundiu o produto entre celebridades e personalidades do mundo da moda, o que garantiu o acesso das Havaianas às revistas mais sofisticadas do mundo; além de produzir versões que variam de 12 a 300 dólares o par, sempre com distribuição em butiques e lojas de departamentos de prestígio. Enquanto que a Grendene pretende associar o produto à imagem da modelo Gisele Bündchen e a temática indígena para reforçar o apelo de beleza e brasilidade. Centralizar o esforço de marketing nas sandálias Ipanema ao preço médio de 30 dólares, de baixo custo e desenho simples, onde será vendida em departamentos da França, da Espanha e da Alemanha.

Análise discursiva

Nos anos 80 e 90, tudo mudou muito rápido e ao mesmo tempo. Alterações econômicas e mesmo geográficas no mundo, democracia e voto popular no Brasil, impeachment presidencial, abertura total às importações, sucessivos planos econômicos, mudança de moeda, combate à inflação, mudança de comportamento do consumidor brasileiro. As empresas precisavam acompanhar essa evolução e a São Paulo Alpargatas, fabricante de Havaianas, não ‘dormiu no ponto’. Sabendo que similares chineses e dos chamados países ‘tigres asiáticos’ estariam desembarcando em breve, a preços muito mais acessíveis (em função especialmente da mão-de-obra mais barata, quase escrava em alguns deles), a empresa radicalizou e para manter a sobrevida de um produto cujo ciclo de vida já sinalizava queda, investiu em seu parque industrial e relançou o produto com o nome Havaianas Top, buscando ampliar seu público consumidor, entre as classes A e B (até então não desejadas e não trabalhadas pela comunicação).

E as Havaianas destacou-se na construção de sua marca, por conseguir mudar seu próprio perfil e o do público-alvo. E esta renovação foi acompanhada por uma mudança no seu próprio discurso publicitário, em especial no seu tom de voz, no seu ethos. Este passou a assumir diferentes sons, passando de uma abordagem técnica e direta para uma abordagem sensorial e emotiva. De forma mais simples, o ethos passou de voz denotativa para conotativa.

Antigamente, o seu discurso era um testemunhal sobre o produto, onde as características técnicas eram valorizadas ao extremo (não tem cheiro, não soltam as tiras e não deformam), para uma sensação de status que permite dizer ‘todo mundo usa’, sem exceções, pois de cada três brasileiros, dois usaram e quem não a usa, deve estar comprando um neste exato momento.

No começo de sua comercialização, as Havaianas procurava atender as necessidades das classes C, D e E, que eram seus maiores consumidores. As sandálias eram feitas com baixo custo e eram acessíveis mais as camadas sem poder aquisitivo e ignorada pelas classes mais altas. E ao usar como garoto-propaganda o humorista Chico Anysio na época, se encaixava perfeitamente nesse meio por se tratar de uma figura muito popular. Da mesma forma que era o patrocínio exclusivo do programa da família Trapo, tornava facilitava a tomada de conhecimento sobre o produto.

O glamour encontrado agora no atual discurso, surgiu a partir da estratégia de revitalização da marca em 1994. A propaganda passou a ser direcionada para um público de classe média, e começou a utilizar atores famosos em sua campanha, mostrando que eles também utilizavam o produto em situações de lazer ou em suas residências.

A simbiose entre o produto e o artista desde sempre foi grande que houve um tempo em que se acreditava que Chico Anysio era o dono da empresa. Saiu Chico e entrou Thereza Collor. ‘Todo mundo usa Havaianas’ era o tema da campanha, que foi ao ar logo depois com o ator Luís Fernando Guimarães. Ele flagrava personalidades como Vera Fisher, Malu Mader, Bebeto e Maurício Mattar usando as sandálias. Na TV, a popularidade de Carolina Ferraz caiu ao tirar suas havaianas. Cristiana Oliveira ia tirando as peças de sua indumentária para descobrir o responsável pelos miligramas a mais que a balança, quebrada, não acusava. Em outro filme uma fã quase descobre Fábio Assunção disfarçado na praia através de suas sandálias. Pouco depois, um garoto beijava as sandálias de Rodrigo Santoro pensando serem de Luana Piovani, outro pedia as havaianas da Déborah Secco para fazer traves de gol. Marcos Palmeira, Raí, Popó, Luma de Oliveira e Reinaldo Gianechini também apareceram nas telinhas em divertidas situações relacionadas ao produto.

Nota-se que aqui a campanha visa ocupar um espaço na mente do receptor, ligando momentos prazerosos, pessoas bonitas, diversão e sucesso são possíveis com as Havaianas. Além de atribuir uma idéia de intimidade com seu público, mostrando que o produto se encaixa bem na vida das pessoas.

Agora, os brasileiros passaram a incorporar as Havaianas no dia-a-dia, e com isso tornou-se um símbolo democrático por ser vista nos pés desde uma marcha do MST, passando por milhares de homens, mulheres e crianças. Até socialites, artistas, o presidente da República: todos usam Havaianas, que é a cara de pelo menos três gerações de brasileiros. A reação do público dá uma boa dimensão do carisma que a marca Havaianas desenvolveu entre o povo brasileiro

A revista Marketing de setembro de 2006 apresenta alguns cases de sucesso; um deles é a das Havaianas, cujo título é ‘A Cara do Brasil’. Desde o começo, sendo com Chico Anysio como garoto-propaganda ou a Carolina Ferraz, as Havaianas mostra a preocupação de usar sempre pessoas conhecidas pelos brasileiros. Além disso, acompanha alguns eventos importantes no país, como quando lançou Havaianas com uma pequena bandeira do Brasil em uma das tiras, simbolizando o símbolo patriótico. Ou então, lançando três modelos que retratam animais da fauna brasileira ameaçados de extinção.

Outro discurso que as Havaianas utilizam é a de artigo de moda, usada principalmente fora do país, para conquistar cada vez mais o mercado internacional. Ela também associa o produto a personalidades conhecidas nos mercados internacionais, brasileiras ou não. Outra forma, é fazendo com que seus pontos de venda incluam lojas que são sinônimos de moda, como Galleries Laffayette, em Paris, e Selfridge’s, em Londres. Um grande triunfo são as parcerias, alguns exemplos são:

** Havaianas H.Stern, com tiras decoradas em ouro e diamantes, resultado da união do prestígio das sandálias com a sofisticação da marca de jóias. Havaianas adornadas com cristais Swarovski foram distribuídas em Hollywood aos candidatos do Oscar;

** Havaianas Audi, show room montado na balsa da Audi, em Angra dos Reis (RJ), onde artistas e personalidades foram presenteados com sandálias dessa série limitada;

** Outros projetos especiais foram desenvolvidos para a marca Mont Blanc e para o Consulado da Espanha.

O bom desempenho das Havaianas foi resultado de três estratégias, conforme descrito no relatório de 2004 da empresa:

** Ampliação da linha com produtos de maior valor agregado;

** Exploração de novas ocasiões de consumo: mais do que uma sandália para uso em férias, na praia e em casa, a Havaianas conquistou novos espaços, como um produto de moda e ícone de comportamento;

** Qualidade da comunicação, ações promocionais e eventos. O posicionamento como produto de moda foi reforçado com a presença nos principais eventos de moda do Brasil: a São Paulo Fashion Week e a Rio Fashion Week.

Os editoriais de moda, jornais e revistas são unânimes: as Havaianas provocam uma revolução na moda e no mercado. Transformaram-se em ícone, em objeto de desejo, em peça obrigatória.

Conclusão

Nos anos 60, chegaram ao mercado as sandálias Havaianas, marca produzida pela Alpargatas, do grupo Camargo Correa. No início, apresentava um único tipo de sandália, de uma cor só. A partir do final dessa década passou a utilizar personalidades como Chico Anysio por ter uma grande influência popular, devido aos seus consumidores serem das classes mais baixas e consumirem as sandálias que até então eram simples e feitas com baixo custo.

Já nos anos 90, a Alpargatas definiu uma estratégia de marketing que mudou completamente o status das sandálias, lançando várias versões das Havaianas. A partir daí começou a ser aceita pelas classes mais altas e passou a brilhar no mercado internacional, nas passarelas da moda e agora podendo ser encontradas nos pés desde trabalhadores rurais sem terra até nos pés de personalidades como o presidente da República, a rainha Sílvia da Suíça e a princesa Stéphanie de Mônaco.

O discurso publicitário das Havaianas modificou-se ao longo do tempo, no entanto, sem perder as características que as fizeram inesquecíveis enquanto produto: conforto, higiene e durabilidade. A evolução foi acompanhada também pelo produto, que ganhou novas formas e cores e junto com o discurso, se adequa aos consumidores independente de suas transformações.

Uma coisa é certa: objeto de desejo, as havaianas têm glamour, personalidade e estilo. Básicas, irresistíveis, imprescindíveis, elas serão eternas enquanto durarem. Simplesmente: As Legítimas.

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Ambas estudantes de Comunicação Social com Habilitação em Rádio e TV, Manaus, AM