Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Maioral, ele inventou o humor moderno brasileiro

Quando era criança, ia ao barbeiro com meu pai e lia os cartuns da revista Pif Paf, do Millôr. Ficava encantado com aquilo. Era um humor corrosivo que foi me formando como cartunista. O Millôr é o maior de todos. Ele inaugurou o humor moderno brasileiro. Dividiu prêmios com Saul Steinberg (1914-1999), o criador do humor moderno no mundo.

Lembro que fui ao Rio, aos 14 ou 15 anos, para levar meus desenhos à Redação do Pasquim. Queria entrar para a turma do Pasquim. Quem me recebeu foi o Henfil. Quem mandava mesmo era o Millôr, que entrou na Redação e pegou um dos meus desenhos. Eu tremi. Era o maioral ali vendo um desenho meu. Millôr olhou para o desenho por um instante e depois o jogou na mesa, como se fosse merda. Ainda assim, senti aquilo como algo positivo. Acho que a minha carreira de cartunista começou ali.

Depois, nos anos 80, quando eu lancei a revista Chiclete com Banana, ele mandou um cartão elogiando o tipo de humor que eu estava fazendo. Começou uma admiração mútua – muito mais de mim por ele do que dele por mim. Essa relação rendeu uma parceria: ele me escolheu para ilustrar dois livros dele, Contos Fabulosos e Novas Fábulas Fabulosas, em 2007.

Até hoje eu recorro ao Millôr para buscar soluções gráficas. O desenho dele era intuitivo, quase naïf.

E Millôr era um escritor brilhante. Um dia, eu abro a revista piauí e encontro um texto de duas páginas escrito pelo Millôr para elogiar uma série de tiras que eu faço, “República dos Bananas”. E não havia elogio babão, era um texto muito engraçado.

Naquele momento, eu me senti coroado. Voltei ao salão do barbeiro com meu pai. Enfim, ali, eu me senti um cartunista de verdade.

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[Angeli é cartunista]