Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Espaço de inovação e de convergência

A interatividade pode significar a renovação da própria televisão, abrindo novos caminhos para esta mídia, já que o atual modelo de programação tem se mostrado saturado, como atesta a tendência de queda de público e o baixo índice de inovação dos conteúdos, proliferando repetições de temáticas e modos de apresentação. Com a interatividade mais plena, os telespectadores passam a atuar como construtores, emprestando sua capacidade e inventividade ao sistema, tendência já esboçada na economia-cultura atual.

A possibilidade de agregar interatividade à TV, com a digitalização, é mais um passo na convergência das tecnologias. Muitas das características de interatividade que poderão ser aplicadas à televisão já vêm sendo desenvolvidas e testadas para a internet e para os videojogos. A capacidade interativa dos computadores, na década de 90 do século 20, foi crucial para o boom da informática. O computador tornou-se um item pessoal e de grande valia a partir de seu potencial de comunicação com o homem, através de interfaces desenhadas para atrair a atenção e simplificar o uso de máquinas.

Uma nova perspectiva

Depois disso, a entrada da internet e a abertura de um universo onde todos podiam contribuir de alguma forma – que não estava pronto e chamava usuários para fazerem parte do seu grupo construtor – trouxe ainda mais possibilidades interativas ao computador. Esse novo tempo acarretou outras mudanças: a interatividade deixou de ser uma relação homem-máquina para ser então uma relação homem-homem, já que, por intermédio dos computadores e da internet, as pessoas ganham um novo lugar de comunicação entre si.

Já a história dos videogames é ainda mais longa: desde sua criação, iniciada no decênio de 1950, precisaram ser interativos e ter uma boa usabilidade para garantir que pudessem ser jogados com facilidade. Hoje são encontrados no mercado videogames cada vez mais sofisticados em sua plataforma tecnológica, mas, simultaneamente, mais intuitivos no processo de interação com o usuário, tendo em vista viver-se em uma cultura onde a tecnologia está introjetada. Além disso, os jogos criados têm um potencial interativo acrescido, na medida em que cada jogador vai modelando algumas características ao sistema que está sendo utilizado – ou seja, o jogo torna-se uma experiência pessoal e modela-se ao jogador de forma única. É um sistema que evolui a partir da interação com cada usuário.

Se a interatividade agregada aos computadores e inerente aos videogames fez toda a diferença, esse momento também não está longe de ser vivido no horizonte televisivo. É certo que, hoje em dia, a prática de assistir televisão é algo simples, mas inovar com a interatividade é trazer uma nova perspectiva para essa mídia de massa. Cada vez mais o telespectador tem canais para mudar, à procura de algo interessante, mas crescentemente ele também encontra uma grade muito semelhante, nas TVs aberta e paga.

Experiências reveladoras

A multiplicidade da oferta trouxe mais concorrência para as empresas de audiovisual, sem constituir, no entanto, efetiva diversidade ao telespectador. Já a interatividade tende a permitir uma maior diversidade de conteúdos porque estes não terão apenas que ser transmitidos e assistidos para ter algum sucesso, trazendo a necessidade de que o telespectador utilize seu potencial de retorno e interaja com o meio. Além disso, há abertura para que os programas sejam criados não somente pelas empresas de televisão, mas também pelo telespectador, como conhecido hoje na internet, com a disponibilização de vídeos pessoais em espaço determinado, ou em outros modelos, a serem ainda criados e propostos.

O que da internet ou dos jogos pode ser trazido para a TV ainda é uma questão em aberto. Entende-se que a tecnologia que estará disponível para a televisão digital inicialmente precisará de grandes avanços para permitir um nível de interação próximo da internet ou dos videogames. Mas em algumas partes do planeta, onde o canal de retorno da TV digital está em funcionamento, já há propostas relevantes de conteúdos interativos. É o caso da Inglaterra, onde a BBC apresenta a atração Test the Nation, um teste de Q. I. em que o telespectador participa de casa, através do controle remoto, e recebe retorno via televisor, com seu resultado pessoal. Além disso, para que o programa seja ainda mais atrativo, um grupo de convidados responde às questões ao vivo. No final de cada edição, todas as respostas são contabilizadas no chamado ‘Q. I da nação’, um número que representa a média dos participantes da noite.

Experiências como essa, singelas a seu modo – por não permitirem grandes escolhas ao telespectador, apenas proporcionando uma navegação por opções já programadas –, revelam que há margem para trazer potencialidades tanto dos videogames quando da internet para dentro da televisão digital. Resta saber como aplicá-las e buscar a construção de um padrão tecno-estético que tenha vocação não somente para o uso comercial, mas que também se proponha a incluir uma massa que está ainda hoje fora do mundo digital.

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Respectivamente, professor no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos); e jornalista pós-graduada em Assessoria Lingüística