Thursday, 25 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Exemplos de ‘párias indecorosos’

A série da Rede Globo, A vida alheia, escrita por Miguel Falabella, mostra os bastidores de uma revista semanal homônima que se ocupa dos escândalos das celebridades, flagrados pelas câmeras de seus paparazzi.

Abstraindo-se o bom ou mau gosto, o que nos interessa são as questões éticas jornalísticas tratadas nos episódios, protagonizados pela editora Alberta Peçanha (Claudia Jimenez) e a dona de revista, Catarina Paissol (Marília Pera).

Embora reconhecesse a importância da profissão e não concordasse com essa percepção, Max Weber disse, em 1919, que ‘o jornalista pertence a uma espécie de párias que a sociedade julga a partir de seus representantes mais indecorosos’ – e a série da Globo evidencia exatamente eles, os párias indecorosos. Invariavelmente, as discussões sobre a imprensa marrom levam ao tema da invasão de privacidade, de onde se nutre A vida alheia.

Vida íntima, privada e pública

O respeito à dignidade humana e a proteção à honra estão igualmente contemplados no direito civil e nos princípios e deveres dos jornalistas (deontologia), prevalecendo as obrigações legais. Já o direito ou a invasão de privacidade está na essência dos códigos de ética dos jornalistas e trata da vida íntima, privada e pública.

Na intimidade, o que acontece é velado e somente comunicável por iniciativa dos envolvidos ou no caso de ato ilegal. Na esfera privada compartilha-se os fatos e eventos com um número restrito de pessoas; logo, não são secretos, embora não se tenha a intenção de tornar público. Ao contrário da esfera pública, que além de ser do conhecimento de todos, pode-se divulgar sem autorização.

Mesmo que esses três círculos sejam claros na teoria, torna-se complexo a sua delimitação na prática, variando conforme as pessoas e as circunstâncias. Em geral, os entendimentos de vida íntima e pública são consensuais. Mas quanto à privacidade há opiniões, mas não consenso.

Para alguns, quem tem uma vida pública perde a privacidade, principalmente ao se expor em lugar público. Para outros, mesmo as aparições públicas são privadas, quando não ficar caracterizado um fato notório de interesse ou interferência pública. Por exemplo, um artista passeando no shopping denota privacidade, mas se ele agredir alguém, torna-se público.

Para certas fontes ‘a imprensa é feroz. Não perdoa nada e apenas dá destaque aos erros. Todo fato é distorcido, cada gesto é criticado’, como disse a princesa Diana Spencer, ao jornal Le Monde, em 1997, quatorze dias antes de sua morte, ao ser perseguida pelos paparazzi em Paris.

O jornalismo é um espaço de contradições e controvérsias, polifônico e não unilateral, como a publicidade. A vida alheia pode não ser de interesse público, mas interessa ao público de determinada mídia – por exemplo, uma revista onde a vida alheia é ‘mais interessante que a sua’.

******

Mestrando em Jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina