Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

O jornalismo big brother

O jornalismo é big brother! E tem cara e nome: Jean Wyllys. Jornalista e professor universitário, mestrando da Faculdade de Comunicação da UFBA, natural de Alagoinhas, interior baiano, que rompe definitivamente com o simulacro universitário e com a toga dos intelectuais de plantão, não mais imunes ao mundo do consumo de massa.

Não adianta, ele, Jean Wyllys, vai se tornar tema contínuo das salas de discussão sobre os caminhos da comunicação e, principalmente, do jornalismo. A participação do jornalista baiano no BBB finca a idéia de que o espetáculo não pode parar, que não existem categorias fora da lógica mercantilista, fomentada pela velocidade e pela produção em escala.

Sono da necessidade

Os intelectuais que se cuidem. O jornalismo iluminista, esclarecedor, objeto da emancipação individual do homem através da razão não se firmou, mas transformou a racionalidade, utilizando-a para legitimar a racionalidade da dominação. É. Agora não resta nada nem ninguém. Como diria Adorno, Jean é resultado do caráter compulsivo da sociedade alienada de si mesma. Não que o jovem intelectual seja um alienado. Pelo contrário.

O baiano pode lançar temas debatidos nos gabinetes da academia ao maior espaço de negociações da história humana: a tevê. No entanto, pode terminar o processo de deglutição iniciado a partir do momento em que desejou ser contemplado pelo ‘Grande Olho’.

A adesão de todos à tal imagem movediça significa apenas o reconhecimento comum, na pobreza, de um prolongamento imaginário da atividade social real. Agora a vida do rapaz vai ser esmiuçada. O particular vai ganhar ênfase e se tornar interesse público; mas, ao contrário do interesse do público BBB, depositado sobre os participantes do reality show, não é a realidade individual que desperta interesse, mas a macrorrealidade; a realidade que emerge Jean Wyllys do nicho acadêmico, que lhe permite ganhar um milhão de reais em troca da sua imagem e em favor da sua própria projeção, viável graças ao pai de todos: a mídia. Nela, as pessoas dormem e se exilam no sono da necessidade de se tornarem visíveis.

Piores momentos

Jean é o maior exemplo. O sonho dele passa a ser refém da realidade, prisioneiro das verdades sonhadas por ela. A ilusão, enquanto tal, regozija sobre a imaginação. A vida de Jean aparece de acordo com a constituição lucrativa que possui o fato em que está incluso, e o fato, posteriormente, por ser efêmero, vira museu. Seu fim, portanto, deixa de existir e o espetáculo não chega a nada que não seja ele mesmo.

O professor jornalista insere o jornalismo no circo. Jean não dorme sozinho. No BBB tem-se a impressão do ser não existir enquanto não lhe é oferecido o sonho formulado pela mídia: encenar o real, como se nele não existissem recortes, sem retoques, como se tudo não passasse de um show onde os palhaços não estão no picadeiro, mas na platéia. O jornalista apresenta-se como um Judas para alguns, mas, para outros, como um filósofo socrático ao retirar do jornalismo as máscaras que lhe cobrem as canalhices.

A aparência predomina; o interior só encontra refúgio quando se torna fato consumado. O jornalismo bebe do próprio veneno. Tal como é, vem se tornando sua função buscar os piores momentos de cada um. O profissional que não gosta de maldade não presta, no sentido jornalístico da palavra vigente. O bom jornalista não presta porque na hora de reportar desconsidera todos os pactos, acordos, todas as cumplicidades que estabeleceu com a fonte durante a apuração. A virtude de não valer nada está na missão de esquartejar a imagem de alguém da cabeça aos pés. A crítica que atinge a verdade do espetáculo o descobre como negação visível da vida; como negação da vida que se tornou visível. Pois bem: com Jean na tevê podemos caricaturar o jornalismo da forma mais clara: através dos seus piores momentos.

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Estudante de Jornalismo e Ciências Sociais, Salvador