Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Suzana Singer

Na semana da Parada Gay, surgiu a dúvida: será que a Folha é homofóbica? Não por ter calculado, com o Datafolha, o número de participantes no evento, iniciativa aplaudida pelos leitores. Nem por ter acolhido o artigo de um vereador evangélico que questiona os direitos dos homossexuais, já que havia um contraponto na mesma página.Mas por ter publicado, no Painel do Leitor on-line, uma mensagem que previa que “daqui para a frente ser hétero não será politicamente correto”. “Os participantes da parada fazem a apologia da homossexualidade”, defendeu o escritor Gilberto de Mello Kujawski, 82.

A reação foi forte nas redes sociais. A mensagem foi considerada, no mínimo, “fascista”, e o jornal foi tachado de homofóbico. “Texto que fomenta o preconceito não deve ser publicado. Se escolheram essa mensagem, é porque ela reflete a opinião da Folha”, disse Tiago Mariano, 21, estudante de jornalismo.

A revolta é compreensível, mas não é verdade que publicar manifestação “antigay” signifique encampar essa visão. Para saber a opinião da Folha, tem que olhar os editoriais. Nos últimos anos, eles defenderam iniciativas que visam garantir direitos de casais aos gays e a aprovação de uma lei específica contra a homofobia (sem tolher a liberdade de expressão).

A Folha estaria errada se o e-mail publicado pregasse o ódio ou a violência contra homossexuais, mas não se tratava disso. Era mais uma ironia, de gosto duvidoso.

A dúvida do título acima é pertinente, porém, quando se analisa a notícia “Torcedores do Corinthians são maioria na Parada Gay, diz Datafolha”, publicada discretamente no impresso, mas com grande visibilidade na Folha.com. Foi o texto mais comentado, mais enviado e o segundo mais lido de terça-feira.

O dado, que saiu da pesquisa feita na parada, apenas reflete o tamanho da torcida corintiana em São Paulo. Não era notícia nem deu para entender por que essa pergunta foi incluída no questionário, já que orientação sexual e time do coração não têm nada a ver.

Serviu apenas para reforçar preconceitos, como se viu nos mais de 840 comentários postados na internet. “Eu me ofendo quando um torcedor xinga o outro de veado, bambi, como se a nossa condição fosse motivo de vergonha. Essa matéria acirrou ainda mais isso”, reclamou o editor de livros Átila Morand, 28.

Apesar do erro, a Folha não é homofóbica. Só os muito desatentos -e os militantes mais exaltados- não percebem a quantidade de reportagens e colunas favoráveis aos gays no jornal. O preconceito desse caso foi fruto de outra fraqueza: a vontade de aumentar a audiência com gracinhas, sem precisar suar para fazer jornalismo.

Para além dos aplausos

A cobertura da CPI do caso Cachoeira vai mal na Folha. Na quarta-feira, o depoimento do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), foi ignorado pela Primeira Página. Ficou apenas em “Poder”, que escolheu um título extremamente favorável -Perillo dizendo-se vítima de perseguição do PT, uma repetição do que havia sido publicado dois dias antes, na “entrevista de segunda”.

Já o depoimento do governador petista Agnelo Queiroz, do Distrito Federal, foi para a capa, mas sem a notícia principal, que era a manobra para obrigar Perillo a abrir seu sigilo telefônico. Destacou-se apenas o comportamento dos parlamentares, com uma grande foto do líder do PT na Câmara aplaudindo seu colega de partido.

Vários leitores reclamaram do desequilíbrio. A Secretaria de Redação afirma que o texto na Primeira Página “tratou do fato de que a CPI aplaudiu os dois depoentes, Perillo e Agnelo”. Havia mesmo quatro linhas dizendo que “tucanos já haviam feito o mesmo” no dia anterior, mas a crítica maior ficou, sem dúvida, para o PT.

Até agora, o jornal não poupou PSDB, PT ou PMDB nas investigações, mas precisa redobrar a atenção dada à CPI, detectar onde está a notícia para não cair na armadilha de acreditar que se trata apenas de um espetáculo político.