Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Suzana Singer

“A fotografia que reuniu Dilma e seus antecessores no embarque para a África do Sul, estampada na capa de quase todos os jornais brasileiros na terça-feira, provocou polêmica.

Fernando Rodrigues saudou a iniciativa da presidente: ‘A foto de todos juntos torna o país um pouco mais civilizado e urbano’. Rogério Gentile criticou o gesto, porque, ao incluir Fernando Collor, Dilma estaria ‘homenageando uma vergonha nacional’. José Simão ironizou: ‘Dilma, Sarney, Collor, FHC e Lula. Se eles tivessem peso na consciência, o avião não decolava’.

A reunião de todos os (vivos) que já ocuparam o posto mais alto no Palácio do Planalto era uma cena única. Pena que tenha sido registrada só pelo fotógrafo oficial da Presidência. A imprensa não teve acesso ao local, porque, segundo a ministra da Comunicação Social, Helena Chagas, não estava prevista foto naquele momento. A imagem teria sido feita para atender a um pedido de oficiais que estavam na Base Aérea do Galeão. A imprensa poderia fotografar o grupo na chegada a Johannesburgo.

Só que os grandes jornais não enviaram fotógrafos para a África do Sul. ‘Não vimos necessidade. Sabíamos que haveria uma ampla cobertura fotográfica à nossa disposição’, diz a Secretaria de Redação.

De fato, as melhores agências estavam na cerimônia pela memória de Nelson Mandela, mas um olhar brasileiro poderia resultar em imagens originais, do mesmo modo que um enviado especial de texto faz diferença em coberturas importantes. A presença de Dilma, que discursou, e dos outros políticos brasileiros justificaria ainda mais a ida à África.

Embora muitos leitores não prestem atenção ao crédito, que aparece em letras miúdas no alto de cada imagem, faz diferença se uma imagem foi aprovada pelo fotografado ou se foi feita sem censura. Em foto oficial, estão todos penteados e bem-dispostos, como os cinco empertigados no aeroporto.

Não há flagrante, como o registrado por Roberto Schmidt, da France Presse, na homenagem a Mandela. A foto, que mostra Obama, David Cameron e a premiê dinamarquesa fazendo pose para si mesmos (‘selfie’), gerou críticas (o trio estaria fazendo farra numa cerimônia fúnebre) e um monte de especulações sobre o ciúme da primeira-dama americana.

Foi tanta repercussão que o fotógrafo divulgou uma explicação sobre a cena. Não teria havido desrespeito na ‘selfie’ porque o clima no estádio era de festa, com cantoria e dança. Michelle não estaria incomodada, já que, minutos antes, brincava com os outros, inclusive com a amiga loira. ‘Os líderes mundiais estavam simplesmente agindo como seres humanos, como você ou eu’, disse o fotógrafo.

Políticos adoram parecer ‘gente comum’, mas em situações controladas. Obama vem restringindo o acesso de repórteres fotográficos, o que provocou um protesto formal de vários jornais, inclusive do ‘New York Times’. Grupos de mídia como Gannett (‘USA Today’), McClatchy (‘Miami Herald’) e a agência Associated Press decidiram não publicar mais fotos oficiais, salvo em situações muito especiais.

No Brasil, o veto presidencial em algumas situações e os cortes nos orçamentos das Redações têm deixado à disposição dos leitores cada vez mais fotos oficiais, que, como bem definiu a ombudsman do ‘NYT’, Margaret Sullivan, nada mais são do que ‘releases visuais’.

Só o negativo

A manchete de segunda-feira decretava: ‘Ineficiência marca gestão do SUS, diz Banco Mundial’. A reportagem trazia apenas as críticas contidas no estudo, que fez um balanço de 20 anos do sistema único no país.

Toda a parte elogiosa, em que se ressalta, entre outros pontos, um acesso mais equânime à assistência médica, foi ignorada pelo jornal. Ficou a impressão de que o Banco Mundial condenava o SUS. Foi mais um ataque de pessimismo crônico da Folha.”