Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

A morte do professor

Morreu na noite de segunda-feira (15/2) o professor Gildo Marçal Bezerra Brandão, pesquisador do Centro de Estudos de Cultura Contemporânea da Universidade de São Paulo (Cedec/USP), em decorrência de problemas cardíacos.

Brandão estava em São Sebastião, no litoral paulista, onde passava o feriado com a família. No dia 17, completaria 61 anos.

‘Gildo era um arguto analista político e cientista de grande competência. Deu grande contribuição à Fapesp e à ciência no Brasil. Foi um incansável defensor de referenciais acadêmicos elevados para a universidade pública brasileira’, disse Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp.

Brandão era assessor ad hoc da Fapesp e coordenava o Projeto Temático ‘Linhagens de pensamento político e social brasileiro’, apoiado pela Fundação.

O tema do projeto foi inspirado em sua tese de livre-docência de 2004 e deu origem a um livro de mesmo título lançado pela editora Hucitec em 2007 e considerado uma de suas principais obras.

‘Ele tinha uma capacidade de liderança muito grande, além de ser extremamente generoso. Gildo jamais se negou a compartilhar suas ideias e ajudar quem quer que fosse. Vários de seus ex-orientandos se tornaram professores de importantes universidades’, disse Elide Rugai Bastos, professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas, que participa do Temático coordenado por Brandão, à Agência Fapesp.

Envolvimento permanente

Natural de Alagoas, Brandão graduou-se em filosofia pela Universidade Federal de Pernambuco, em 1971. Atuou como jornalista e militou no Partido Comunista Brasileiro (PCB) sendo o primeiro editor do jornal Voz da Unidade, publicação do partido que ajudou a fundar. Também chegou a trabalhar como editorialista do jornal Folha de S.Paulo, no início dos anos 1980.

Em São Paulo desde o fim dos anos 1970, deixou a militância política para se dedicar à carreira acadêmica. Lecionou na Universidade Estadual Paulista, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e na USP, na qual concluiu doutorado em 1992.

Sua tese de doutoramento deu origem ao livro A Esquerda Positiva (As Duas Almas do Partido Comunista, 1920-1964) (Hucitec, 1997). Sua produção bibliográfica contém outras obras importantes como Linhagens do Pensamento Político Brasileiro (Hucitec, 2007) e Caio Prado Júnior e a nacionalização do marxismo no Brasil (Editora 34, 2000), esta última lançada com apoio da Fapesp por meio da modalidade Auxílio à Pesquisa – Publicações.

Completou pós-doutorado em teoria política contemporânea em 1996, na Universidade de Pittsburgh, nos Estados Unidos. Foi editor da Revista Brasileira de Ciências Sociais.

A Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), da qual Brandão foi secretário adjunto entre 2004 e 2008, divulgou nota ressaltando as contribuições que o pesquisador deu à área e destacando ‘seu fortíssimo engajamento na construção das ciências sociais’ no Brasil.

Segundo o chefe do Departamento de Ciência Política da USP, professor Álvaro Vita, Brandão era ‘um dos intelectuais mais respeitados e reconhecidos em sua área de atuação’.

Brandão não se preocupava somente com a sua área, de acordo com Brasílio João Sallim Júnior, professor do Departamento de Ciência Política da USP. ‘Ele se preocupava em manter e elevar a qualidade da universidade como um todo e não só da área dele’, disse.

Casado com Simone Coelho, filha do jornalista e ex-deputado Marco Antonio Tavares Coelho, Brandão deixou dois filhos. Seu corpo foi cremado na quarta-feira (17/2) no Crematório da Vila Alpina em São Paulo.

‘Sua vida é um exemplo de um envolvimento permanente com toda a sorte de dificuldades financeiras, políticas, policiais, e de extremo amor a diversas instituições de pesquisa, particularmente a Universidade de São Paulo’, disse Tavares Coelho.

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Morre cientista político Gildo Marçal Brandão

Cristiane Agostine # reproduzido do Valor Econômico, 17/2/2010

 

Morreu na noite de segunda-feira [15/2] o cientista político e ex-dirigente do Partido Comunista Brasileiro Gildo Marçal Brandão. Às vésperas de completar 61 anos, que seriam comemorados hoje, Brandão foi vítima de um ataque cardíaco, segundo informaram seus amigos.

Ele estava em São Sebastião, litoral norte de São Paulo, com a família, preparando-se para a apresentação na Universidade de São Paulo (USP) que o efetivaria como professor da instituição.

O corpo foi velado ontem, na capital paulista.

De acordo com informações fornecidas por amigos, Brandão tinha uma cardiopatia grave há anos, mas estava bem de saúde.

Brandão trabalhava como professor do Departamento de Ciência Política da USP, de onde era livre-docente desde 2004, e é reconhecido como um dos maiores pesquisadores das linhagens do pensamento político-social brasileiro – tema de livro de sua autoria e de coletâneas de textos clássicos.

Nos anos 80, ainda na resistência à ditadura, Brandão integrou a primeira diretoria do jornal Voz da Unidade, do PCB. Também trabalhou como jornalista na Gazeta Mercantil e na Folha de S.Paulo. O Partido Comunista foi seu objeto de estudo na tese de doutorado e a pesquisa aprofundada resultou no livro A Esquerda Positiva (As Duas Almas do Partido Comunista, (1920-1964).

Amigo de Brandão, Brasílio Sallum, também professor da USP, lembrou que o ex-dirigente do partidão costumava falar que a ditadura não devia ser ‘derrubada’, mas sim ‘derrotada’. ‘Ele não militava mais, mas sempre foi um homem da esquerda’, disse Sallum.

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Cientista político Gildo Marçal Brandão morre aos 61 em SP

Reproduzido da Folha de S.Paulo, 17/2/2010

Morreu anteontem [15/2] aos 61 anos o cientista político Gildo Marçal Brandão. Professor de ciência política da USP, ex-jornalista e ex-militante comunista, Brandão descansava com a família na praia da Baleia, em São Sebastião, quando sentiu-se mal e, por volta de 21h, morreu. Ele tinha uma cardiopatia grave e já fora submetido a cirurgia de revascularização.

Natural de Alagoas, Brandão graduou-se em filosofia pela Universidade Federal de Pernambuco. No final dos anos 70, veio para São Paulo, onde lecionou na Unesp e, em seguida, na Escola de Sociologia e Política, na PUC e finalmente na USP. Também era dirigente da Anpocs (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais).

A militância no Partido Comunista Brasileiro (PCB), que vinha desde Pernambuco, acabou empurrando-o da filosofia para a ciência política. Em 1992, sob a orientação de Francisco Weffort, defendeu seu doutorado, um estudo sobre a gênese e o papel político do PCB e da esquerda brasileira.

Paralelamente, desenvolveu a carreira de jornalista. Foi o primeiro editor da Voz da Unidade, o jornal do PCB, cargo que exerceu por quase meia década. Também foi editorialista da Folha no início dos anos 80.

Foi paulatinamente se afastando do PCB para dedicar-se à carreira acadêmica. Jamais rompeu formalmente com o partido, mas, em suas obras, tampouco o poupou de críticas muitas vezes duras.

No plano intelectual, foi bastante influenciado pelas ideias do italiano Antonio Gramsci (1891-1937), as quais, ao lado de intelectuais como Carlos Nelson Coutinho, Leandro Konder e Luiz Werneck Vianna, reelaborou para desenvolver um conceito de esquerda democrática que se adequasse ao Brasil.

Entre 1995 e 1996, passou uma temporada nos EUA, na Universidade de Pittsburgh, onde concluiu um pós-doutorado em teoria política. De lá trouxe as ideias que acabariam marcando a última fase de sua carreira e que resultaram em sua principal obra, Linhagens do Pensamento Político Brasileiro (Hucitec, 2007).

Trata-se de um grande programa de estudos que pretende traçar a genealogia das ideias políticas no Brasil desde o século 19 até hoje. O pressuposto é o de jamais desvincular a matriz de pensamento do contexto histórico particular em que ela vem: ‘Nenhuma grande constelação de ideias pode ser compreendida sem levar em conta os problemas históricos aos quais tenta dar respostas e sem atentar para as formas específicas em que é formulada e discutida; ao mesmo tempo que nenhuma grande constelação de ideias pode ser inteiramente resolvida em seu contexto’.

Brandão, que era casado com Simone Coelho, filha do jornalista e ex-deputado comunista Marco Antonio Tavares Coelho, deixa dois filhos.