Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Agência Carta Maior

POLÍTICA
Beto Almeida

A reunião (do Copom) terá que ser televisionada!

‘Quando será que esta maravilhosa tecnologia que é a televisão terá o uso didático e educativo para – televisionando a Reunião do Copom – revelar quais são os que defendem os juros altos, com o seu linguajar enrolado, sua insenbilidade de grande organizador das derrotas do mundo do trabalho, levando a pequena produção à falência, as cooperativas à paralisia, os assentamentos da reforma agrária ao desesperante beco sem saída e toda uma geração sem rumo para o crime? O artigo é de Beto Almeida.

‘…a dor da gente não sai no jornal’

Luiz Reis e Haroldo Barbosa

Apesar do presidente Lula pregar a redução dos juros praticamente todos os dias, apesar do vice-presidente José Alencar reclamar diuturnamente que ‘o nosso discurso de campanha de 2002 ainda não chegou ao poder’, forças aparentemente misteriosas e supostamente sobrenaturais fazem com que o Brasil ainda tenha a mais elevada taxa de juros do mundo. O que acontece de fato? Inspirado no título do excelente documentário ‘A revolução não será televisionada’, reivindicamos aqui que o palco onde estão sendo tomadas todas as decisões para manter os juros nas alturas – a Reunião do Comitê de Política Monetária – precisa ser iluminado, precisa ser escancarado à opinião pública, precisa ser didaticamente televisionado.

É passada a hora de revelar com clareza e sem subterfúgios de um economês propositalmente indecifrável quais são estas forças que estão sabotando o presidente e o vice-presidente. É preciso um novo jornalismo capaz de revelar que forças são estas que estão sabotando os que trabalham, sabotando o pequeno empresário, sabotando o agricultor familiar, sabotando a aplicação criativa e produtiva de recursos empoçados, estagnados e esterilizados em títulos da dívida pública. É preciso que a televisão cumpra o seu papel social de esclarecer o papel anti-social e anti-nacional dos que sabotam e impedem a aplicação deste crédito empoçado na geração de empregos, seja construindo casas, estradas, hospitais, ferrovias, ou fabricando roupas sapatos, móveis e utensílios domésticos que as enxurradas levam a cada nova chuvarada. Enfim, quando será que esta maravilhosa tecnologia que é a televisão terá o uso didático e educativo para – televisionando a Reunião do Copom – revelar quais são os que defendem os juros altos, com o seu linguajar enrolado, sua insenbilidade de grande organizador das derrotas do mundo do trabalho, levando a pequena produção à falência, as cooperativas à paralisia, os assentamentos da reforma agrária ao desesperante beco sem saída e toda uma geração sem rumo para o crime? Quem é o maior criminoso? Uma juventude proibida de trabalhar e tangida para a prisão ou os que produzem as políticas que levam toda uma geração para o crime e a prisão?

Que estupendo efeito político teria sobre a sociedade brasileira a simples colocação na tela, e com explicações didáticas e compreensíveis sobre economia, de todos os que impedem que este país saia da crise pela via da produção de bens do consumo necessário, ao invés de criminosamente fazer rodar apenas a especulação estéril que tão somente cria uma república dos rentistas – a dos que enriquecem sem trabalhar – e a outra, a dos que trabalham e produzem escravizados pelos rentistas, ou gostariam de trabalhar e de produzir, se esta oportunidade não estivesse sendo criminosamente sabotada na cara de todos nós! Afinal, para que serve tanta televisão??? Afinal, para que serve uma tv pública?

Técnico e político

Observa-se toda uma tentativa dos meios de comunicação capturados pela tirania vídeo-financeira privada de desmoralizar algumas das tímidas mas acertadas medidas de Lula para facilitar o acesso ao crédito, para baixar os juros, para estimular a produção. Durante seis anos de governo, apesar da chiadeira diuturna e militante do vice-presidente José Alencar denunciando os juros altos como sabotagem à produção e à geração de emprego, apenas muito suavemente se observa uma redução parcial nos juros. Mas, as resistências são gigantescas.

Os comentaristas da tirania vídeo-financeira – os mesmos que recomendaram as políticas neoliberais de estado mínimo e desregulamentação que levaram à crise do capitalismo atual – agora tentam esconder sua responsabilidade incontornável pela crise fugindo para a frente. Um verdadeiro tom de campanha é que o que vemos no tratamento nada jornalístico sobre a recente demissão do presidente do Banco do Brasil, apresentada como se fosse uma temerária intervenção política de Lula numa instituição financeira que ‘está dando certo’. Ora, dando certo para quem se o banco público, desafiando Lula e José Alencar, chegou a praticar os mais elevados juros do mercado? Dando certo para quem, cara pálida?

Tenta-se passar a idéia de que baixar juros é voluntarismo político, ao mesmo tempo indicam que juros altos é responsabilidade técnica. Seria esta a única alternativa que não merece qualquer crítica. Ora, por que elevar os juros às alturas não é também uma clara opção política pela especulação, pelo rentismo que enriquece ricos, uma clara escolha contra os que querem créditos para a produção??? Isto é opção política sim, e opção preferencial pelos ricos!!!

O economês indecifrável

Se a televisão simplesmente colocasse este tema em debate – hoje há nas telas apenas a defesa da tese subliminar de que juros altos é prova de responsabilidade técnica e que juros baixos é populismo e intervencionismo político – já seria uma enorme contribuição para elevar a compreensão na sociedade brasileira sobre quem são os que querem produzir e quais os que querem manter o dinheiro empoçado, esterilizado e rodando apenas a especulação financeira para enriquecer os já ricos.

Por exemplo, se a tv cumprisse sua função pública definida na Constituição e veiculasse todas as opiniões em torno da decisão governamental de reduzir o superávit primário, sobretudo aquelas que estão vedadas atualmente nas telinhas, como o argumento de que com uma maior aplicação de recursos na produção, em obras públicas, deverá trazer efeitos concretos e benéficos seja lá nos grotões mais isolados da sociedade brasileira e até ao mais simples pipoqueiro ou vendedor de bandeirolas nos estádios de futebol, já seria uma relevante contribuição prática para a democracia da informação. Superemos as discussões conceituais intermináveis, pratiquemos democracia informativa. Este argumento hoje não é veiculado, não circula, é sonegado pela tv privada.

Também é preciso divulgar que a redução do superávit primário permitirá, por exemplo, aumentar em 15 bilhões o volume de investimentos da Petrobrás no Pré-Sal, na construção de novas refinarias. Debatamos: que efeitos isto trará na indústria naval, no fortalecimento do poder aquisitivo dos trabalhadores, nos índices de emprego formal, na arrecadação da previdência, no comércio de bens da indústria leve? Esta é a missão pública da televisão. Antes desta decisão – sim, de verdade uma decisão política de Lula – estes recursos ficavam esterilizados no superávit primário. Entrevistado pela TV Globo sobre o tema, um ‘especialista’, destes sempre convidados para defender redundantemente a mesma tese, definiu candidamente porque a redução do superávit primário não era medida recomendável: ‘isso pode gerar intranqüilidade nos credores externos’.

Quais credores externos ficariam intranquilos? Os que estão indo á bancarrota nos EUA? Os que estão pregando novo calote no sistema financeiro internacional através da impressão (não emissão) de mais dólar furado, moeda sem lastro, papel pintado, mas com capacidade de comprar uma riqueza real, não fictícia, como a Vale do Rio Doce ou ações da Petrobrás????

É de se lamentar que não tenhamos uma televisão com a decisão suficiente para fazer cumprir o direito dos brasileiros à informação plural, diversificada, com caráter educativo como estabelece a Constituição. Ontem mesmo, reconstruída a bancada das Meninas do Jô, uma delas chegou a sentenciar ‘Este país acabou!!!’. Não se ouviu uma crítica sequer ao epicentro da crise que está no coração do capitalismo, os EUA, país que estes ‘comentaristas’ têm como modelo.

Aliás, ouvimos ontem na CBN uma pérola analítica sobre a redução do superávit primário no Brasil: aqui esta medida é temerária, dizem eles, porque aqui se dá calote (mas o Brasil não pagou a dívida com o FMI?) , mas nos EUA é diferente porque, segundo os dois comentaristas, ‘lá trata-se de um endividamento sério e responsável’. Será que não viram o presidente chinês advertindo os EUA para que honrem sua monumental dívida financeira com a China? Endividamento sério e responsável com a impressão de papel moeda sem lastro que a economia mundial tem que aceitar? Por que o Brasil não poderia emitir moeda a partir de riqueza real, o petróleo pré-sal, o urânio, a maior jazida conhecida de nióbio do mundo????Aí seria populismo, inteervencionismo político na economia?!!!

Nunca estes outros ângulos ganham espaço para a discussão democrática na televisão capturada pela ditadura do mercado, que impõe o seu ‘dirigismo editorial de pensamento único’.

Enquanto na Globo se recompõe a bancada das Meninas do Jô, permitindo prever o que vem por aí – uma espécie de reedição da campanha do mensalão que tentou em vão impedir a reeleição de Lula – a TV Brasil, no mesmo horário, parecia estar em outro país, estava exibindo o Sem Censura reprisado, com uma dupla caipira e um apresentador do Fantástico falando de suas viagens pelo mundo. Convenhamos, é um desperdício de oportunidades. Por que não realizar com a freqüência gritantemente necessária mesas de debate ao vivo, com a participação do público, convidando todas as vozes normalmente proscritas nas emissoras da tirania vídeo-financeira??? Quem proíbe? Quem não se anima? Os mesmo que sabotam o discurso de Lula e de José Alencar a pregar no deserto, por mais de 6 anos, a queda dos juros???

A função da tv e dos bancos públicos

É hora de audácia. A mesma audácia presente na determinação do presidente Lula em retirar o Banco do Brasil do esquema de sabotagem aos que querem produzir e trabalhar, mudando seu presidente e sua orientação, deveria estar presente também na TV Brasil, que pode muito bem inaugurar um novo jornalismo. Um jornalismo que faça o contraponto democrático a este que predomina nas emissoras prisioneiras da tirania vídeo-financeira, repetindo no plano comunicacional a mesma concepção que rege a fraude monetária especulativa que levou o mundo à crise econômica atual.

Moeda sem lastro, moeda falsa, moeda fictícia, acompanhada de informação que não revela o potencial do mundo do trabalho, do mundo da produção e constrói uma realidade falsa, nornalizando a especulação, na qual qualquer outra visão que proponha uma revolução produtiva é liminarmente excluída de divulgação, é sonegada, e, sem direito de defesa, taxada de intervencionismo político no mundo financeiro, de populismo. A partir daí, resta apenas a sacrossanta opção, igualmente política, de que responsabilidade fiscal e financeira só e somente só é possível com os juros altos. Paralela à fraude monetária, ocorre uma fraude midiática. Elas se realimentam.

Que tal colocarmos tudo isto em debate, afinal já estamos há 45 anos do golpe militar de 1964? Que tal revelarmos as forças nada sobrenaturais ou misteriosas que na Reunião do Copom, protegidas pelo linguajar economês impenetrável, continuam a defender, apesar do colapso do capitalismo, os indecentes privilégios dos banqueiros que recusam a aplicação dos recursos na produção e geração de emprego e renda? Que tal inaugurarmos o debate sobre a função dos bancos públicos que poderiam seguir de fato a orientação do presidente da república e do seu incansável vice-presidente e terem, finalmente, audácia de colocar em prática o discurso da campanha de 2002?

Que tal ampliarmos mais ainda o debate sobre o papel da televisão, sobretudo sobre a obrigação das emissoras de cumprirem a função pública inscrita na Constituição? Por que a reunião do Copom não pode ser televisionada se ali são tomadas decisões que levam milhões e milhões de pequenos empresários, pequenos agricultores à falência e à ruína e se ali são inviabilizados , com uma simples canetada baseada em pesquisas encomendadas pelos próprios bancos( Pesquisa Focus) inúmeros projetos de emancipação nacional? Não será um direito constitucional do povo brasileiro saber de cor e salteado quem são os que sabotam a desesperante e inadiável necessidade de reduzir os juros? Não será uma obrigação da tv pública mostrar, revelar, explicar o que acontece nestas reuniões onde se decide ou a tragédia dos que são impedidos de produzir ou a cadeia da indecente felicidade dos que enriquecem sem trabalhar e produzir?

Se televisionam um sujeito animalizado surrando um outro até sangrar, se há canais televisionando leilões de gado, tapetes ou jóias, ou oferecendo o sexo-mercadoria, se são televisionados os mais indigentes diálogos de grupos de descerebrados a debater a edificante questão do sexo anal por satélite nos Big-Brother, se somos obrigados a ver mais de mil horas de tv a estimulando o consumo de cerveja quando se deveria educar no amor aos livros, no amor às bibliotecas, ou educar para a solidariedade por meio da difusão de informações sobre nossa trágica liderança mundial em hanseníase, a pergunta é clara e direta: por que a reunião do Copom não pode ser televisionada?

Beto Almeida é presidente da TV Comunitária de Brasília’

 

Argemiro Ferreira

Vitória do humor vira piada nos EUA

‘Ultrajantemente engraçado, Al Franken foi popularizado no passado pelo ‘Saturday Night Live’ da NBC. Ao contrário de outros comediantes, investiu cada vez mais na política e numa sátira devastadora de políticos e pregadores hipócritas e corruptos, especialmente personalidades da direita religiosa – como os tele-evangelistas Pat Robertson e Jerry Falwell, então donos de programas de TV. Franken venceu eleição para o Senado, em Minnesota. Republicanos declaram guerra para tentar evitar que ele assuma a cadeira.

Primeiro foi a Flórida. Agora é a vez de Minnesota fazer a eleição nos EUA virar piada. E não porque o democrata Al Franken, que acaba de ser declarado de novo – agora por um painel de três juízes – o vencedor da cadeira para o Senado, um comediante da TV. Mas por causa da obsessão do republicano Norm Coleman, com amplo apoio de seu partido, de rejeitar o resultado no tapetão dos tribunais.

Coleman, ex-prefeito de St. Paul, cargo para o qual fora eleito da primeira vez como democrata e progressista (bandeou-se depois para a direita mais extremista dos republicanos), cumpriu um mandato no Senado (de 2003 a 2009) como beneficiário da morte em acidente aéreo durante a campanha, do senador democrata Paul Wellstone, alvo da difamação adversária. Agora a lambança foi ainda maior.

Na medida em que as pesquisas, durante a campanha, expunham sua sistemática queda na preferência do eleitorado e a ascensão de Franken, Coleman veiculava mais comerciais sórdidos, do baixo nível, preparados pelo estrategista de Bush, Karl Rove. Nos ataques Franken era acusado de planejar o ‘assassinato de empregos’ no estado – e ainda de atrasar o pagamento da pensão da ex-mulher.

Fox News e talk shows em cena

A direção republicana, consciente da ameaça de perda de cadeiras no Senado, injetou milhões em Minnesota para salvar ao menos a reeleição de Coleman. E quando veio um resultado duvidoso a 5 de novembro, segundo o republicano tinha vantagem de 215 votos (num eleitorado de 3 milhões), o candidato republicano ‘festejou’ às pressas, mesmo sabendo que em casos assim tinha de esperar a recontagem automática.

Ao mesmo tempo, entrou em cena o exército da extrema direita republicana na mídia nacional. Nos papéis centrais, o rei do talk show de rádio Rush Limbaugh, alvo da sátira devastadora de Franken num livro; e o campeão de audiência no horário nobre da Fox News, Bill O’Reilly, atingido pelo humor corrosivo de Franken em outro livro. Segundo eles, o comediante estava roubando votos.

Mas know how de roubo de votos quem tem são os republicanos – em especial votos fraudados de eleitores ausentes, uma das técnicas usadas pelo partido para inverter o resultado da eleição de 2000 na Flórida, que deu Casa Branca a Bush. Eles insistem na repetição obsessiva do expediente, mas todas as recontagens mostraram o contrário: a vitória fora de Al Franken, com vantagem ligeiramente maior: 312 votos.

Aparentemente Coleman já percebia que era impossível mudar o resultado final, pois até arranjou outro emprego – o de conselheiro, regiamente remunerado, da Republican Jewish Coalition (Coalizão Judaica Republicana), parte do milionário lobby israelense nos EUA. Mas a ordem do partido foi retardar ao máximo a declaração do resultado, privando os democratas de uma cadeira.

A vingança da direita republicana

A comissão apuradora deu a vitória a Franken a 5 de janeiro, ratificada depois no tribunal. E agora veio a confirmação de um painel de três juízes. Mas Coleman contesta de novo. Como em 2000, houve milhares de votos irregulares de supostos eleitores ausentes (sem os requisitos legais, como carimbo de Correio e testemunhas). Democratas monitoraram tudo, já que fora assim o roubo da Flórida para Bush.

A alegação republicana de que 4400 deixaram de ser contados foi rejeitada pelo painel de três juízes. Eles declararam unanimente que a apuração foi ‘honesta, precisa e imparcial’. Os juízes rejeitaram duas tentativas de Coleman de subtrair votos de Franken a pretexto de terem sido contados a mais. ‘Não acho que ataques a tribunais e ao processo eleitoral seja argumento válido’, disse Franken.

Uma decisão do mais alto tribunal do estado só ocorreria no final de maio – ou depois. E se houver recurso à Suprema Corte federal, não se sabe quando a decisão virá. Enquanto isso, Minnesota já está há quatro meses sem uma das duas cadeiras que tem no Senado. Coleman parece menos confiante nos próprios advogados, dada a impossibilidade jurídica, do que no barulho dos destemprados talk shows.

O rei do talk show de rádio, hoje encarado por alguns como o real líder republicano, não perdoa o best seller que Franken dedicou a ele em 1996: Rush Limbaugh is Big Fat Idiot (Limbaugh é um Gordão Idiota). Cinco anos depois, Franken enfeitou a capa de outro livro com O’Reilly, Ann Coulter, Bush, Cheney e a rede Fox Título: Lies – And the Lying Liars Who Tell Them (Mentiras – e os mentirosos que as dizem).

A ‘conduta imprópria’ do partido

Ultrajantemente engraçado, Franken foi popularizado no passado pelo ‘Saturday Night Live’ da NBC. Ao contrário de outros comediantes, investiu cada vez mais na política e numa sátira devastadora de políticos e pregadores hipócritas e corruptos, especialmente personalidades da direita religiosa – como os tele-evangelistas Pat Robertson e Jerry Falwell, então donos de programas de TV.

A rede Fox News, ofendida pela maneira corrosiva como era tratada por Franken no livro Lies, cuja capa ridicularizava o slogan repetido por ela como marca do jornalismo duvidoso que pratica (fair and balanced: honesto e equilibrado), lançou oneroso processo judicial contra o comediante, acusando-o de uso indevido da marca. Mas o desfecho foi a derrota embaraçosa do império Murdoch.

Agora o Partido Republicano insiste em gastar dinheiro na esperança de que os democratas fiquem o maior tempo possível sem aquela cadeira no Senado. Até um importante senador republicano – Orrin Hatch, vice-presidente do Comitê Senatorial Nacional do partido – discordou dessa linha. Declarou que ‘esse tipo de conduta imprópria não devia ser adotada pelo partido’.

No seu tempo de senador, Coleman estava sempre na tela Fox News. Adotava as causas da mídia de Murdoch, como a campanha em tom macarthista que culpava Kofi Annan, secretário geral da ONU, pelas irregularidades do programa Petróleo por Comida. Mas uma investigação presidida por Paul Volcker, ex-presidentre do banco central dos EUA, isentou Annan de qualquer responsabilidade nas irregularidades.

Blog do Argemiro Ferreira’

 

DEBATE ABERTO
Venício Lima

‘Teorias da Conspiração’: desqualificando os críticos da mídia

‘O debate, ainda relativamente restrito, sobre a mídia e seu papel no Brasil contemporâneo reserva perigosas armadilhas. Parte de uma disputa maior no campo da ‘batalha das idéias’, ele compreende um leque matizado de opiniões. No fundamental, todavia, não seria incorreto afirmar que duas posições antagônicas são relativamente claras: de um lado, aqueles que sustentam que o principal problema do país está no poder público e que a imprensa, ‘sensível às necessidades, carências e aspirações da sociedade’ é a melhor forma que temos de fiscalização e controle social; de outro, aqueles que defendem o fortalecimento do sistema público de comunicação e criticam a grande mídia por ser oligopolizada, parcial, elitista e vinculada às oligarquias políticas tradicionais; sem pluralidade e diversidade, muito distante de garantir aos cidadãos seu direito à comunicação.

Trata-se de um debate desigual. Os defensores da grande mídia, seus colunistas, possuem uma enorme capacidade de fazer chegar suas posições a amplas parcelas da população, através de jornais, revistas, do rádio e da televisão. Já seus críticos, sem qualquer acesso a ela, se abrigam em publicações eletrônicas de reduzido acesso e alcance comparativo.

O debate se caracteriza também pela utilização, por parte dos defensores da grande mídia, de uma estratégia permanente de desqualificação de seus críticos: um pretenso monopólio moral – nada democrático – como se fossem os únicos defensores dos princípios e valores universais da condenação da censura, da defesa da liberdade de expressão e de uma imprensa livre, independente e plural. Os críticos são, portanto, deslocados, à sua total revelia, para uma posição contrária a esses valores e princípios.

Há ainda outra forma de desqualificação que, apesar de antiga e surrada, continua sendo utilizada: a acusação genérica de que os críticos da grande mídia são adeptos de ‘teorias conspiratórias’. É essa desqualificação, em particular, que quero discutir aqui.

Teorias da conspiração

Conspiração é um substantivo de origem latina – conspiratione – que significa maquinação, trama; conluio secreto. Muitas teorias chamadas de conspiratórias, a respeito dos mais variados episódios, conquistam credibilidade e circulam amplamente no espaço público. São conhecidas, por exemplo, as que se referem ao assassinato do presidente John F. Kennedy (1963); ao acidente que matou a princesa Diana (1997); aos ataques ao World Trade Center em New York (2001), dentre outras. Existem também teorias que inicialmente foram consideradas conspiratórias e que, com o tempo, se provaram verdadeiras. Um exemplo é o envolvimento do governo dos EUA, especificamente da CIA, no golpe que derrubou o governo democrático de Salvador Allende, no Chile (1973).

Aqueles que acusam os críticos da mídia de adeptos da teoria conspiratória, todavia, não a definem. Associam-na a idéias como intenção oculta, armação, jogada maquiavélica. Ela implicaria que a mídia opera veladamente e de forma articulada, no interesse econômico e político dos grandes grupos que a controlam. Isso significaria, basicamente, que ela não serve ao interesse público e, portanto, não atua com a isenção e a imparcialidade que anuncia.

Registre-se ser inegável que existe uma carga de significação negativa, pejorativa e de desqualificação quando se atribui a alguém ser adepto de uma teoria conspiratória. Talvez, por isso mesmo, essa tem sido uma armadilha poderosa para desqualificar as críticas à mídia, sobretudo, quando são feitas do ponto de vista institucional ou da economia política do setor.

A antecipação da crítica

No clássico de E. S. Herman e N. Chomsky, Manipulação do Público: política e poder econômico no uso da mídia (original: Manufacturing Consent: the political economy of the mass media, 1988), publicado no Brasil em 2003, os autores, mais de 20 anos atrás, antecipando o tipo de crítica que certamente receberiam, escreveram no Prefácio:

Críticas institucionais como as que apresentamos neste livro são comumente descartadas pelos comentaristas do ‘establishment’ como ‘teorias conspiratórias’, mas isso é apenas uma evasiva. Nós não usamos qualquer tipo de hipótese ‘conspiratória’ para explicar a atuação da mídia. Na verdade, nossa abordagem é muito mais próxima a uma análise mercadológica com resultados provenientes, em grande parte, do funcionamento das forças do mercado. A maior parte das escolhas preconceituosas na mídia decorre da pré-seleção feita por pessoas de pensamento direitista, pré-julgamentos internalizados e da adaptação de jornalistas às restrições dos proprietários, da organização, do mercado e do poder político. Censura é majoritariamente autocensura, de repórteres e comentaristas que se adaptam à realidade das exigências organizacionais da mídia e das fontes; e de pessoas nos altos escalões dentro das organizações de mídia que são escolhidas para implementar – e, geralmente, internalizam – as limitações impostas pelos proprietários e outros centros de poder no mercado e no governo (p. xii; tradução livre do Autor).

Apesar dessa advertência, dez anos depois, em capítulo que revisitava o modelo de análise apresentado no livro (cf. ‘The Propaganda Model Revisited’ in Capitalism and the Information Age – The Political Economy of the Global Communication Revolution; organizado por R. McChesney, E. M. Wood e J. B. Foster, 1998), Herman reconhecia que:

Críticos do ‘establishment’ ainda não puderam abandonar a acusação (de teoria conspiratória) – em parte porque eles são muito preguiçosos para ler um trabalho complexo, em parte porque eles sabem que acusar falsamente uma crítica radical de teoria conspiratória não vai lhes causar nada, e em parte por causa do pressuposto superficial de que, como a mídia envolve milhares de jornalistas e empresas ‘independentes’, qualquer descoberta de que eles seguem uma ‘linha partidária’ a serviço do estado precisa se apoiar na conspiração presumida. (Na verdade, isto pode decorrer de uma ampla aceitação acrítica dos informes oficiais, de crenças comuns internalizadas, do medo de represálias a análises críticas, etc.). Os apologistas não são capazes de abrigar a noção de que fatores institucionais podem fazer a mídia ‘livre’ agir como roedores disseminando em conjunto propaganda falsa e até mesmo idiota: uma acusação como esta tem que supor conspiração (p. 195, tradução livre do Autor).

Na verdade, o que Herman e Chomsky afirmaram, com outras palavras, já era conhecido como resultado de anos e anos de pesquisa no campo das Comunicações.

Hoje, qualquer estudante de jornalismo sabe (ou deveria saber) que os estudos sobre o ‘jornalismo sitiado’, a sociologia do jornalismo, a construção da notícia (newsmaking), o enquadramento (framing) e o agendamento (agenda setting), apesar de diferenças significativas, revelam que a prática do jornalismo profissional ocorre no contexto de uma subcultura própria; de rotinas produtivas que se transformam em normas; e de interferências editoriais – explícitas ou não –, vale dizer, das opções e interesses daqueles que são proprietários ou concessionários da grande mídia.

Lógica de funcionamento

Um observador isento haverá de reconhecer que na história da grande mídia brasileira está devidamente comprovado que ela – apesar de suas diferenças e contradições – atua de forma uniforme a favor ou contra certas causas, a começar pela feroz oposição histórica que sempre fez e faz contra qualquer regulação democrática de sua atividade.

Recentemente a maciça oposição à criação do Conselho Nacional de Jornalismo ou à transformação da ANCINE em ANCINAV, a ‘presunção de culpa’ seletiva da cobertura na crise política de 2005/06 e a cobertura favorável ao candidato de oposição nas eleições presidenciais de 2006, podem ser lembradas. Nos nossos dias, como negar a homogeneidade da grande mídia na oposição às cotas para minorias nas universidades públicas, na sua hostilidade em relação ao programa Bolsa Família e na cobertura da crise econômica originária das ações dos bancos de investimento nos EUA?

Não há nada de teoria conspiratória nisso. Os donos da mídia não precisam sentar-se em torno de uma mesa para planejar nada. A própria lógica de funcionamento da indústria da comunicação e do entretenimento é o bastante.

Pode sim haver ‘conspiração’

Isso não quer dizer, todavia, que – repito, apesar de todas as diferenças e contradições – não possa haver ocasiões em que empresários de mídia (todos, alguns, a maioria?) possam articular diretamente ou fazer parte de uma ação iniciada fora da mídia, em favor ou contra determinada causa de seu interesse econômico e/ou político. Como quaisquer outros empresários de qualquer outra atividade econômica. E essa articulação não necessariamente aparece explicitada nos editoriais de seus veículos.

Talvez o exemplo mais bem documentado de uma conspiração da qual a mídia participou na história brasileira recente tenha sido seu apoio quase unânime ao golpe de 1964 (cf. René A. Dreifuss, 1964: A Conquista do Estado, Editora Vozes, 7ª. edição, 2008).

Batalha das idéias

A desqualificação de um crítico da mídia ou de seu argumento como sendo adepto de teorias conspiratórias deve ser, portanto, tomada exatamente pelo que é: uma armadilha da ‘batalha das idéias’, muitas vezes utilizada para evitar o debate do mérito das críticas.

O que a grande mídia e seus defensores não percebem é que, sim, o país está mudando. E sua influência e a de seus ‘formadores de opinião’ diminuem na medida mesma em que cresce a renda, a escolaridade, a organização e, sobretudo, a inclusão digital (através da internet e de celulares), que consegue oferecer alguma pluralidade e diversidade de informações, o que ela – a grande mídia – nunca ofereceu e nem oferece à imensa maioria da população brasileira.

é Pesquisador Sênior do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da Universidade de Brasília – NEMP – UNB’

 

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