Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Ainda sobre estereótipos raciais

A ombudsman do Washington Post, Deborah Howell, tratou novamente do tema de estereótipos raciais em sua coluna de domingo (16/7). Segundo informa Deborah, temas como crimes e racismo dominaram o noticiário local na semana passada, depois que uma enxurrada de assassinatos levou o chefe de polícia Charles H. Ramsey a declarar ‘estado de emergência criminal’. Dois assassinatos em especial chamaram a atenção dos leitores e levantaram questões sobre os motivos que levaram o Post a não dar aos dois casos o mesmo espaço e a não publicar sempre as informações sobre as raças dos suspeitos.

O leitor Morey Rothberg notou que a notícia sobre o assassinato de um homem branco, Alan Senitt, foi publicada na capa do jornal, e a sobre a morte de Chris Crowder, que era negro, foi colocada apenas na seção metropolitana. ‘Você pode pensar em uma razão pela qual o homem branco ganharia mais destaque do que o negro? Por que um branco merece uma foto com a matéria e o negro não? A geografia e a cor da pele têm algum impacto sobre a decisão de onde publicar estas matérias no jornal?’, questionou Rothberg.

Assassinatos brutais

Deborah alega que os dois assassinatos foram brutais – Senitt teve a garganta cortada; Crowder, que era cadeirante, levou sete tiros. Crowder era bem conhecido entre os políticos de sua área e muito ativo em algumas organizações negras da vizinhança. Ele chegou a preencher os papéis para se candidatar ao cargo de prefeito. Senitt era britânico e ativo na campanha presidencial de Mark Warner para governador da Virgínia. Os dois assassinatos ocorreram nas primeiras horas da manhã. Senitt foi morto em Georgetown e Crowder perto de um novo centro de convenções.

Para a ombudsman, os dois artigos poderiam ter sido publicados na primeira página. Curiosamente, a matéria sobre a morte de Senitt estava programada para ser divulgada apenas na seção metropolitana e posteriormente foi transferida para a capa, na medida em que os detalhes do assassinato foram se esclarecendo. O assassinato de Crowder estava originalmente escalado para sair na capa e foi publicado apenas na seção metropolitana porque os motivos do crime ainda não estavam esclarecidos.

Edições diferentes

Além disto, a ombudsman observa que, dependendo da área onde o leitor compra ou recebe o jornal, as matérias são publicadas em locais diferentes no diário. Na edição do Distrito, por exemplo, o assassinato de Crowder foi publicado na primeira página da seção metropolitana com duas fotos. Nas edições de Virgínia e Maryland, não foram publicadas as fotos – e foi à edição de Maryland que Rothberg teve acesso.

Inspetor transferido

Deborah ainda esclarece que no caso de Senitt sua garganta foi cortada – um fato muito brutal para um assalto na rua. Também houve uma tentativa de estuprar sua companheira. Dois homens, uma mulher e um jovem foram rapidamente acusados e presos por envolvimento no assassinato. Os três adultos tiveram suas fotos publicadas no jornal. Para pesar mais na decisão de publicar a matéria na primeira página, o inspetor da polícia Andy Solberg foi acusado de fazer um comentário racista em uma reunião em que debatia o assassinato de Senitt. Ele teria afirmado que ‘não é racista dizer que as pessoas negras são incomuns em Georgetown [onde ocorreu o assassinato]’. O oficial, que foi transferido de posto, é branco, e as pessoas detidas neste caso são negras.

A morte de Crowder também foi brutal. ‘Por que atirar sete vezes em alguém em uma cadeira de rodas?’, questiona Deborah. Não há indícios de roubo e a polícia está oferecendo uma recompensa de US$ 50 mil para informações que levem à resolução do caso. Segundo o editor Philip Bennett, ‘depois de muita discussão, concluiu-se que não havia informações suficientes sobre o assassinato de Crowder para colocar o artigo na capa. Uma semana depois, ainda não se tem informações sobre os suspeitos’.

‘A curiosidade dos leitores sobre raça é compreensível, mas o que adianta saber se um suspeito é negro ou branco se não há detalhes suficientes sobre o caso? Ou se isto não é pertinente ao crime? Saber a cor da pele de alguém te faz sentir mais seguro?’, conclui a ombudsman.