Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Crítica interna

’09/08/2004


Dia dos pais, DOMINGO sem sustos para o governo federal. A pior notícia, mais uma contra Henrique Meirelles, levantada pela ‘Veja, já estava na Internet na quinta-feira. A notícia mais importante da Folha saiu no sábado: ‘CPI do Congresso quebra sigilo fiscal de banqueiros’. O fim-de-semana foi de Drauzio Varella.


No domingo, cada jornal com sua manchete, nenhuma bombástica: Folha: ‘Receita facilita importação de caça-níquel’. A reportagem deixa claro que não há evidência de corrupção. ‘Estado’: ‘Setor de açúcar e álcool vive euforia com US$ 6 bilhões de investimento’. A foto, de um bóia-fria cortando cana, lembra mais o país empobrecido e sem tecnologia. ‘Globo’: ‘Rio: metade dos condenados tem entre 18 e 24 anos’. O jornal do Rio traz reportagem estranha sobre o tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Estranha, porque parece denúncia mas não contém qualquer comprovação de irregularidade ou ilegalidade.


As revistas:


‘IstoÉ’: ‘Podres poderes – Briga entre PT e PSDB pelas informações da CPI do Banestado revela maracutaias do governo atual e do anterior’. ‘Época’: ‘Doutor Drauzio – Conheça melhor o médio mais popular do Brasil e saiba como é seu novo livro sobre doentes terminais’. ‘Veja’: ‘Tem salvação? Por que o governo do PT não abandona o presidente do BC aos tubarões’.


O que há de melhor


Jornais e revistas têm vasto material sobre a Olimpíada que se aproxima. A Folha traz boas reportagens, artes e textos no Esporte, em caderno especial e no Mais!


Como disse, a denúncia mais importante foi a de sábado, sobre a quebra de sigilo fiscal de vários banqueiros.


Vi na Folha de domingo várias reportagens bem feitas, mas nenhuma se sobressai. Embora importante, a questão de segurança nas universidades, espalhada em três páginas, ficou superdimensionada.


Também não vi nada de excepcional no ‘Estado’ e no ‘Globo’.


DOMINGO


Eleições


Vi problemas no texto ‘Ex-prefeito tem seu maior índice entre autônomos’, na pág. A12, que trata da disputa dos votos de motoboys e taxistas de São Paulo. A retranca de apoio faz referência à pesquisa do Datafolha de 24 e 25 de junho mas não lembra a margem de erro da pesquisa. Como o objetivo é comparar os índices do vários candidatos, a margem de erro é importante. O mesmo texto faz referência a ‘estudos’ que mostrariam que há uma tendência de os taxistas apoiarem líderes personalistas e, por isso, apóiam (ou apoiavam), o Maluf. Que estudos? Estudos de quem, de onde? Como está é vago, impreciso e sem credibilidade.


CFJ


A Folha já manifestou em editorial, no domingo, sua posição contrária ao Conselho Federal de Jornalismo (‘A mão sinistra’, pág. A2). É de se esperar que o noticiário contenha o mínimo de equilíbrio. A repercussão do caso nos EUA (‘Entidades dos EUA condenam conselho de jornalismo no país’, pág A8), como o título indica, já condenava a iniciativa do CFJ. A segunda retranca sobre o assunto deveria, portanto, ter tido como título a defesa do CFJ feita por um ministro do STF, Carlos Velloso, e não a opinião de um promotor sem o mesmo peso do juiz. O jornal fez uma abertura que juntava as duas opiniões, mas deu o título para o promotor, contrário ao conselho: ‘Profissão não pode ter nenhuma forma de pressão, diz promotor’. Acho que, neste caso, o título teria de ser algo do tipo: Ministro do STF defende Conselho de Jornalistas.


Há jornalistas contra e a favor do conselho. Há entidades jornalísticas contra e a favor do conselho. E haverá na sociedade pessoas e entidades contra e a favor do conselho. Acho que o jornal deve se preocupar em ter uma cobertura equilibrada.


Atenção, desde o dia 7 a Fenaj tem novo presidente, Sérgio Murilo. O jornal continua identificando Beth Costa como a presidente.


Internacional


Muito boa a reportagem que explica o sistema eleitoral dos Estados Unidos (‘Bush e Kerry ignoram 60% do eleitorado’, pág. A18). Mas o mapa que ilustra (‘Números de votos de cada Estado no colégio eleitoral’) não mostra os Estados-pêndulos. Eu não consegui identificá-los.


Nome do deputado


O jornal grafa de duas maneiras o nome do deputado do PPS de SP: na pág. A13, de Brasil, é João Herrmann, com dois erres; em Mundo (pág. A24) está João Hermann, com um erre.


SÁBADO


Ilustrada


A submissão dos jornais às agendas de lançamentos é uma discussão antiga e, parece, sem fim. Este sábado foi a vez do livro ‘Por um fio’, de Drauzio Varella. Foi a capa dos cadernos de cultura da Folha e do ‘Estado’ , estava no caderno de livros do ‘Globo’ e do ‘JB’, no suplemento da ‘Gazeta Mercantil’, nas revistas e no Fantástico. Uma unanimidade.


Se for para dar a agenda, pelo menos que se faça bem feito. Estréia em São Paulo, e a notícia está em praticamente todos os jornais também, mas sem tanto destaque, a mostra do gravador Gilvan Samico. É uma mostra rara de um artista singular porque, além de criativo, lança apenas uma obra por ano, com reproduções. O jornal envia um repórter para Olinda, mas não aproveita bem o material, não dá o destaque merecido. E não reproduz uma única gravura, não digo nem a última, que seria um belo presente para os leitores, mas uma apenas. Era reportagem que merecia página com cores.


SEGUNDA


Manchete


A manchete parece já não conter qualquer novidade, tantos levantamentos já foram feitos mostrando que o governo do PT privilegia as cidades que governa, as capitais que governa, os Estados que governa, as cidades, capitais e Estados que seus aliados governam… Acho que o jornal deve continuar mostrando para onde vão as verbas públicas, é uma obrigação. Mas não é possível que não tenha outros assuntos para manchete.


O título interno para a reportagem – ‘União libera mais verba para o


Piauí do que para São Paulo’, pág. A4 – não dá idéia do favorecimento que o jornal queria demonstrar. Revela apenas que atual governo está tentando diminuir as desigualdades: o Piauí precisa mesmo de mais verbas do que São Paulo.


Kroll


O caso sumiu. Desde quarta-feira não sai mais nada.


Aviso


Por conta de compromissos em São Paulo, esta Crítica não circulará terça e quarta.


06/08/2004


Folha e ‘Estado’ repercutem a mais recente denúncia, da ‘Veja’, contra Henrique Meirelles, o presidente do Banco Central: ‘Lula mantém Meirelles, apesar de nova denúncia’ (Folha) e ‘Nova denúncia. E Meirelles reage: ‘Será uma por dia’.


O ‘Globo’ deu manchete para os bingos (‘STF reabre caminho para a proibição dos bingos’) e preferiu noticiar a crise do BC por seu impacto: ‘Petróleo e BC afetam mercado’.


Folha e ‘Globo’ mantém em destaque, no alto de suas capas, o noticiário sobre a Olimpíada de Atenas.


Banco Central


O noticiário da Folha me pareceu confuso. A nova acusação da ‘Veja’ está espalhada por três retrancas diferentes, quando deveria estar descrita na reportagem principal.


A reportagem principal avança, ao registrar a disposição do governo de manter o presidente do BC, mas o jornal não reflete a repercussão negativa que o caso teve (não me refiro aos reflexos no mercado, contemplados no caderno Dinheiro) no meio político e econômico e que pode ainda resultar na queda de Meirelles. O ‘Estado’ captou este clima. O ‘Valor’ também: ‘Novas denúncias podem precipitar explicações de Meirelles no Senado’.


A entrevista com Pizzolato, o diretor do BB que também está ameaçado de perder o cargo, é boa, transmite bem a personalidade dele, mas me pareceu um exagero a edição ocupar meia página com tanta falta de espaço para a crise do BC, que é a principal neste momento.


A entrevista com Meirelles se limitou às questões ‘técnicas’ das acusações e deixou de lado os desabafos pessoais, como os que estão no ‘Estado’ (‘Vai ser uma denúncia por dia até as eleições’), no ‘Globo’ (‘Acho que isso não vai parar’) e no ‘Valor’ (‘Por enquanto estou exercitando a minha paciência, mas uma hora eu vou ter que impor limites’). Estes desabafos mostram que o próprio Meirelles, embora disposto a enfrentar as acusações, sente que pode ser atropelado pela persistência do tema na imprensa.


Acho que o jornal, que começou mal neste caso, lá atrás, quando ignorou as primeiras denúncias da ‘IstoÉ’, ainda não encontrou um rumo na cobertura e na edição.


Jornalistas


Até onde acompanhei, a história do Conselho Federal de Jornalismo nasceu na Federação Nacional dos Jornalistas, e não no governo, que apenas o encampou. É possível que o governo tenha encampado pelas razões apresentadas pela Folha (no contexto da dificuldade de relacionamento com a imprensa, que é real). Mas, na origem, é um projeto da Fenaj e de sindicatos de jornalistas e, imagino, a grande polêmica se dará entre jornalistas. A Edição SP já mostra que não há unanimidade entre os profissionais (‘Presidente da ABI se diz contra criação de órgão’, pág. 11).


Acho que teria sido mais informativo se o jornal tivesse feito uma arte com os principais pontos do projeto, e não a memória dos atritos com o governo. Sugiro também que, no caso de uma continuação com a repercussão sobre o CFJ, que o jornal forneça o endereço eletrônico onde possa se ler a íntegra do projeto.


O projeto tem vários pontos polêmicos que merecem ser discutidos, porque não interessam apenas aos jornalistas, mas à sociedade. Ele realmente sugere algum tipo de controle sobre a liberdade de imprensa e de expressão? Será um órgão autônomo ou tutorado pelo governo? Enfim, são várias questões que estão colocadas e que é bom que sejam discutidas.


E acho que o jornal, depois de conhecer melhor o projeto, deveria se posicionar com editorial.


O ‘Estado’ tem um relato mais objetivo do projeto. E o ‘Globo’ publica apenas uma pequena nota que praticamente só fala de um aspecto do projeto: ‘a partir da aprovação da lei o jornalista terá de pagar à entidade para poder trabalhar’.


Cinema


Outra assunto importante e que também esbarra na questão da liberdade de expressão é o projeto para a criação da Ancinav (Agência Nacional de Cinema e Audiovisual). É outro projeto polêmico e que merece mais atenção do jornal.


Eleições


Não vi o debate da Bandeirantes. Mas achei boa a cobertura que a Folha fez, principalmente o texto que narra o debate. A edição (págs. A12 e A13 da Edição SP) indica planejamento. Bom sinal.


Ilegais


‘Corpos de ilegais chegam ao Brasil’ é o título de reportagem na capa de Mundo. Eles tentaram entrar nos EUA e não conseguiram. Morreram. Iam para lá para trabalhar, não para cometer crimes. Não sei se é correto chamá-los de ilegais depois de mortos.


05/08/2004


A morte de Cartier-Bresson, a vitória do Brasil na Organização Mundial do Comércio e a nova ameaça de apagão são os assuntos contemplados com destaque pelas primeiras páginas dos principais jornais.


A Folha manteve a queda de braço entre governo e oposição na manchete: ‘Senado contraria governo e convida Meirelles a depor’. É uma derrota do governo e vale lembrar a manchete de ontem do jornal, que não acreditou que o caso estivesse encerrado: ‘Lula quer adiar ida de Meirelles ao Senado’.


O ‘Estado’ opta pela vitória na OMC: ‘Brasil vence guerra do açúcar com Europa’. O ‘Globo’ tem um bom caso eleitoral, que envolve o governo do Estado do Rio: ‘Justiça apreende 7.000 cestas básicas e investiga uso eleitoral’. Os jornais econômicos também destacam a decisão da OMC: ‘Vitória na OMC pode elevar vendas de açúcar em 10%’ (‘Gazeta Mercantil’) e ‘Vitória na OMC estimula investimentos em açúcar’ (‘Valor’).


A Folha conseguiu uma boa alternativa de foto e escapou do retrato de Bresson feito por Charles Platiau, uma foto ótima, mas exaustivamente utilizada pelos sites que ontem anunciaram a morte do fotógrafo e a preferida pelas primeiras páginas de hoje. Um detalhe: no texto, o jornal não precisava usar dois ‘considerado’ seguidos para traçar o curto perfil de Bresson; uma leitura mais atenta teria evitado a repetição desnecessária.


Banco Central


O ‘Estado’ tem mais bastidores do que a Folha a respeito da aprovação, na Comissão de Fiscalização e Controle do Senado, dos convites aos presidentes do BC e do BB para prestarem esclarecimentos. A reportagem do ‘Estado’ mostra que foi uma manobra do PMDB, aliado do governo, mas insatisfeito. O ‘Estado’ tem mais informações que a Folha sobre as iniciativas do PT para impedir a demissão de Henrique Pizzolato. O jornal conseguiu ouvir Pizzolato e ainda tem uma entrevista com o tesoureiro do PT, Delúbio Soares de Castro, em que este admite: ‘Podemos ter errado’. Enfim, o material do ‘Estado’ está melhor.


O ‘Globo’ informa que Pizzolato perdeu poder no BB e ainda corre o risco de ter de deixar o cargo.


Henrique Meirelles deu entrevista para Dora Kramer, no ‘Estado’ e no ‘JB’.


Faltou comunicação entre a Redação da Folha e o Painel (A4) antes do fechamento da Edição Nacional. O jornal circulou com a manchete que informa que o Senado convidou Meirelles a depor, mas manteve as duas primeiras notas do Painel (‘Para já’ e ‘Mapa da guerra’) que ainda tratam do assunto como se já não houvesse definição. Na Edição SP, o Painel mexeu na primeira nota e retirou a segunda.


Acho que a nota ‘Longa data’, também no Painel, ficaria mais clara se identificasse o Ivan Guimarães como diretor do Banco Popular. Ele também está na berlinda, mas o noticiário em geral, e o próprio Painel de ontem, trata com mais destaque o caso de Henrique Pizzolato.


‘Diretor do BB deve cair, mas não já’ (pág. A6 da Edição Nacional e A9 da Edição SP). Êta título perigoso! O jornal gosta de correr risco.


Eleições


Está errada a informação, na arte da pág. A5 (‘Quem vai’), de que o debate na TV Bandeirantes entre os candidatos de SP será amanhã. O debate é hoje, como informa corretamente o texto.


Escândalo atrás de escândalo. A Folha mostra mais uma distribuição de verbas federais por critérios políticos (‘Cidades dos aliados de Lula recebem mais verba federal’, pág. A4). O ‘Globo’ traz um caso novo: ‘Fome de votos – Programa de Rosinha para distribuir cestas básicas vira moeda eleitoral de candidatos no interior’. A Justiça Eleitoral já apreendeu 7.000 cestas. É um caso para ser acompanhado.


Cartier-Bresson


Está bem editada a notícia e a repercussão da morte de Cartier-Bresson. Merecia. Excelente o comentário do Eder Chiodetto, ‘Fotógrafo descobria delicadeza de gesto’ (A21).


No texto que informa sobre a morte do fotógrafo, não fica claro onde ele morreu. No primeiro parágrafo diz que foi em ‘Céreste (Alpes-de-Haute-Provence)’. No segundo, em ‘l’Isle-sur-la-Sorgue (Vaucluse)’. Se todos estes topônimos estão certos, o jornal deveria ter explicado o que é vila, o que é região etc Como está, é incompreensível. Onde ele morreu?


Calhau


Não faz sentido a foto do prefeito de Belo Horizonte para ilustrar a nota ‘Lula anuncia ‘pacote de bondades’ amanhã’ (B13). Ainda poderia se justificar se a legenda dissesse claramente que ele vai se beneficiar eleitoralmente da visita de Lula. Assim como não tem qualquer informação a foto da pág. B11 que ilustra o texto ‘Alta do álcool eleva preço da gasolina em 1,5% amanhã’.


Foto


Não é possível que Cotidiano não tivesse alternativa de foto para a capa de sua Edição Nacional (pág. C6 da Edição SP). Embora bonita, ela já havia saído no jornal recentemente. É uma foto muito marcante para ser repetida.


04/08/2004


Os jornais têm três assuntos predominantes: a permanência da crise no BC e no BB, a possibilidade de aumento da gasolina e a descoberta de mais uma fraude de Bush. As manchetes: Folha: ‘Lula quer adiar ida de Meirelles ao Senado’; ‘Estado’: ‘Meirelles e Casseb ficam, decide Lula’; ‘Globo’: ‘Petrobrás já prevê novo aumento da gasolina’.


Folha (desde ontem) e o ‘Globo’ já abrem espaços nas suas capas para a Olimpíada de Atenas.


Banco Central


‘Estado’ e ‘Globo’ são mais incisivos que a Folha no noticiário sobre os presidentes do Banco Central e o Banco do Brasil, acusados de sonegação. O foco da cobertura da Folha é a estratégia que o governo montou para impedir a ida dos dois presidentes ao Congresso. Os outros dois jornais já garantem que os dois ficam, por decisão do presidente Lula. É uma interpretação que fazem das declarações de José Dirceu após a reunião de ontem no Planalto. Entendo que a Folha foi mais cautelosa por analisar que as pressões não acabaram e o caso pode se agravar nos próximos dias. Mas, mesmo assim, acho que deveria ter registrado com mais ênfase a decisão do governo de manter os dois presidentes de bancos. Até porque, se amanhã ou depois um deles tiver de sair por conta desta crise, a decisão de ontem do governo aumentará o peso da derrota.


O ‘Globo’ tem uma informação que não vi na Folha nem no ‘Estado’: na reunião de ontem, para traçar a estratégia do governo, saiu a decisão de demitir o diretor de Marketing do BB, Henrique Pizzolato, que será responsabilizado pela compra dos ingressos para o show de ajuda ao PT. Com isso, o governo espera ‘retirar os holofotes’ dos presidentes dos dois bancos. O Painel (A4) informa que este é o desejo de Casseb, mas que Pizzolato continua com as ‘costas quentes’, protegido pelo PT.


A Folha publica na sua Edição SP reportagem sobre o ofício enviado pelo presidente do BB à Comissão de Ética e às lideranças do Senado com um título que acho inadequado: ‘Em defesa, Casseb admite ida a show do PT’. Como está formulado, parece que Casseb negava anteriormente a ida ao show e agora teve de admitir. Ele simplesmente informa que esteve lá. Não sei o que o jornal quis passar ao usar o verbo admitir. A ida ao show muda alguma coisa? Piora a situação do presidente? Em que sentido? O jornal não explica. O problema, na minha opinião, não está no fato dele e de vários outros membros do governo terem ido ao show, mas na compra dos ingressos com grana do BB. Achei que o enfoque da matéria e o título estão errados. O ponto principal é que o relatório é inconsistente, principalmente quando diz que, ao tomar conhecimento do uso político do show, ‘a difícil operacionalização não permitiu uma imediata reversão do mesmo’. É evidente que nada impediria o banco de desfazer a ‘operação’ ao perceber o erro.


Eleições


Não consegui entender, até porque a reportagem não explicita, onde está o problema de um candidato a vereador receber R$ 7.500 para a sua campanha de vereador e doar R$ 20.000 para o candidato majoritário. A reportagem (‘Candidato doa a Marta mais do que recebe’, pág. A8) tem uma apuração bem detalhada, imagino que demorada, detecta problemas na declaração de bens do candidato a vereador, mas não informa se houve crime, fraude ou irregularidade na doação. Ou merecia mais investigação ou, me pareceu, é um caso menor.


Bom o relato sobre o acordo do PT com o PFL no Rio (‘PT promove acordo com PFL do Rio’, pág. A8). Mas, por justiça e interesse jornalístico, deveria ter feito menção à coluna de Elio Gaspari de domingo, que informava que o PT nacional estava entregando a cabeça de Jorge Bittar, candidato à Prefeitura do Rio, ao PFL de Cesar Maia. O relato da Folha de hoje comprova isso.


Kroll


A respeito da reportagem ‘Kroll tinha ligações com a política, diz PF’ (pág. A10 na Edição SP e A11 na Ed. Nacional), a ‘Carta Capital’ desta semana conta casos concretos de trabalho conjunto da Kroll com uma parte da PF paulista.


Venezuela


Não senti firmeza na reportagem ‘PF suspeita de envio de munição à Venezue la’ (pág. A12 de Mundo). O texto traz dois tipos de informações da PF: evidências que podem indicar que o destino era a Venezuela (rota do avião, visto do piloto) e um raciocínio aparentemente sem base para mostrar que o destino NÃO era a Colômbia. Acho que o jornal deveria ter sido mais crítico e buscar mais informações. Um dos motivos elencados pela PF, e reproduzidos pelo jornal, para mostrar que a hipótese Colômbia ‘perdeu força’ é a ‘logística’ (que está como ponto 3, mas que na verdade deveria ser o 4): ‘o transporte deste material de Manaus até a Colômbia é muito difícil e arriscado’. Se todos os dias transportam drogas e armas entre Colômbia e Brasil e Brasil e Colômbia, porque este seria mais arriscado que os outros contrabandos diários? Acho que os argumentos da PF (logística, farda, tipo de material da guerrilha) estão muito simplificados. É até possível que o destino fosse realmente a Venezuela, mas os dados entregues pela PF para a reportagem são ainda frágeis e inconsistentes. Acho que merecia mais apuração.


Embraer


Como a notícia saiu tarde anteontem e só foi veiculada na Edição SP, a Folha deveria ter informado hoje, na Edição Nacional, que o consórcio do qual a Embraer faz parte venceu concorrência nos EUA e fornecerá aviões de inteligência para as Forças Armadas daquele país. Como fez o ‘Estado’.


Presídio


Os oito presos foram mortos a estocadas e pauladas, e não apenas a pauladas, como ficou no título da Folha: ‘8 presos são mortos a pauladas por colegas’. A Folha fala em 45 mortos nas prisões em dois meses. O ‘Estado’ fala em 40 e o ‘Globo’ em 44.


Do leitor


Recebi agora de manhã o seguinte e-mail, referente ao ‘Placar’ de Esporte (pág. C2):


‘Pelo 2° dia consecutivo, os resultados do torneio de Cincinnati de Tênis saem como sendo o de Toronto’.


03/08/2004


Ontem foi um dia realmente atípico. Conferi as capas de hoje de 26 diários brasileiros: nenhuma manchete se repete, são 26 assuntos completamente diferentes. As fotos também não se repetem – exceto na Folha e no ‘Estado’ (e em dois outros jornais), que escolheram a mesma imagem do policial paraguaio tentando salvar uma criança.


O ‘Estado’ mudou quase completamente sua capa na edição de 0h15. Começou rodando com ‘Governadores do PSDB acusam Lula de enfraquecer os Estados’ e trocou para uma notícia mais quente, ‘Consórcio da Embraer vence licitação de US$ 7 bi do Pentágono’. Além disso, acrescentou uma foto da criança paraguaia salva pelo policial (a Folha também trouxe) e mudou várias chamadas.


Folha e ‘Globo’ mantiveram suas manchetes: ‘Um policial é morto no país a cada 17 horas’ (Folha); ‘MEC propõe trocar vestibular pelo exame do ensino médio’ (‘Globo’).


Embraer


O ‘Estado’ começou a circular (edição de 21h30) já com a informação de que o consórcio do qual a Embraer faz parte ganhou a concorrência para o fornecimento de aviões de inteligência para o Exército e a Marinha dos EUA. É uma nota pequena, a última da última página do caderno Economia, vinda de São José dos Campos. ‘Valor’ informou que o comunicado da Embraer celebrando o resultado é das 22h. A ‘Gazeta Mercantil’ diz que o resultado foi anunciado no final da tarde. O ‘Estado’ fez um grande investimento no assunto para a edição que fechou depois da meia-noite. Transferiu o noticiário para a capa do caderno, com foto e três reportagens: a notícia do resultado da licitação, uma entrevista com o embaixador do Brasil nos EUA e um apanhado sobre a balança comercial entre os dois países, Brasil e EUA. Valorizou o assunto num dia fraco, mobilizou repórteres que conhecem o assunto e o correspondente em Washington e mostrou rapidez.


A Folha não deu a informação na sua Edição Nacional (20h30) e publicou a notícia na Edição SP. Bem feita, mas sem destaque. O ‘Globo’ não deu nada.


Eleições


Na Folha, duas páginas e meia de cobertura da eleição em SP. Praticamente nada sobre o resto do país. Nem na Edição Nacional. Para ser preciso, há uma mísera nota na Edição Nacional que informa que o presidente do PT, José Genoíno, esteve ontem em Recife. E mais nada. No Rio, por exemplo, a campanha do senador Marcelo Crivella, único com alguma chance, até agora, de se aproximar dos índices de Cesar Maia, está sendo bombardeada, e o jornal não publica nada. Imagino que em várias cidades deva haver notícias.


Sem-terra


Mal escrito o primeiro parágrafo do texto ‘Uso de força contra invasão é garantido pelo Código Civil’ (pág. A7 da Edição SP e A9 da Edição Nacional, com o título ‘Uso de força é previsto pela legislação civil’). A redundância poderia ter sido evitada na Edição SP, que mudou o título e a diagramação.


Policiais mortos


Achei bem feito o levantamento de policiais mortos no Brasil ao longo do ano. O trabalho tem o mérito de ter sido uma iniciativa da própria Folha. Houve o cuidado de comparar os números com outros países. Como documento do que está acontecendo, acho perfeito, mesmo que os números possam variar um pouco em função das fontes ouvidas. Mas acho que faltou explorar melhor a razão de tantas mortes. Há várias hipóteses levantadas pelos especialistas. Com os dados que o jornal tinha em mãos, ele mesmo poderia aventar algumas explicações. Poderia, e isto ainda pode ser feito, se debruçar, por exemplo, sobre os 81 casos do Rio, Estado onde mais policiais foram mortos. Acho, sem qualquer informação que me ajude a provar, que esta quantidade absurda de mortes tem a ver com a política de segurança do Estado. Talvez a socióloga Julita Lemgruber tenha apontado a causa provável: no Rio se combate a violência com violência, a política de segurança é improvisada, os projetos não têm continuidade, os policiais também estão envolvidos com a criminalidade. Acho que a partir deste levantamento numérico é possível um aprofundamento das causas e conseqüências.’