Saturday, 27 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Crítica interna

"26/07/2004


A Folha deu seqüência, acertadamente, ao assunto que levantou com exclusividade no meio da semana. Manchete de domingo: ‘Judiciário também foi espionado’. A sub também é sobre a Kroll, com a notícia quente do sábado: ‘PF prende espião que trabalhou para a Kroll’. Manchete de segunda: ‘Espião inglês é o novo alvo da PF’.


O ‘Estado’ destaca boas notícias da economia. No domingo, ‘Venda pela Internet vence o medo e cresce 40% ao ano’. Na segunda: ‘Empresas vivem melhor momento em 10 anos’. O ‘Globo’ de domingo tem apenas um destaque na capa: o lançamento da ‘Revista O Globo’, apenas para assinantes. A principal reportagem do novo produto é uma pesquisa sobre o que fazem os moradores do Rio nos domingos (‘O domingo é carioca’). Hoje, o jornal do Rio divide a sua capa entre a conquista da Copa América (destaque de todos os jornais, obviamente) e ‘Ministério tira da escravidão mais 2.300 trabalhadores’.


A ‘IstoÉ’ tem uma capa que parece informe publicitário: ‘Rio trabalhador (apesar da fama em contrário)’. O selo ‘Rio – Especial Desenvolvimento’ não deixa claro se o material é comercial ou jornalístico. São 21 páginas, com dois anúncios da Firjan, a Federação da Indústria do Rio. Seu presidente é um dos entrevistados. Mas a revista tem pelo menos uma informação que mereceu a atenção dos jornais no final de semana: o presidente e um diretor do Banco Central estariam sendo investigados por suspeita de sonegação fiscal e evasão de divisas. ‘Veja’ e ‘Época’ mantém o cardápio de assuntos de interesse familiar e pessoal. ‘Veja’: ‘Trincheira contra os impostos’. ‘Época’: ‘Separação sem stress’. As duas têm chamadas para a espionagem: ‘A briga das teles respinga no governo’ (‘Época’) e ‘Chegou até ao governo’ (‘Veja’).


Espionagem


O jornal tem nas mãos um grande assunto, que está longe de ter sido completamente explorado. Aflorou agora, pela primeira vez, este mundo da espionagem entre empresas privadas e sua incursão na administração pública. O jornal continua na dianteira do caso.


O governo tem agora duas preocupações: a de negar que esteja sendo espionado (só o Gushiken e o Cassio Casseb estariam sendo vigiados) e a de limitar a espionagem ao período pré-Lula. O Janio de Freitas de domingo, no entanto, chama a atenção para um aspecto que merece ser cultivado pelo jornal, paralelamente ao acompanhamento das investigações da PF: em 2003, já como autoridades do governo Lula, Gushiken e Casseb teriam, segundo a Kroll, formulado a orientação aos fundos de pensão para desfaze o acordo que permite ao Opportunity o controle da Brasil Telecom. O editorial de hoje, ‘Espionagem’ (pág. A2), vai na mesma linha.


Há um problema sério na edição de Domingo, na pág. A4. Pelo que entendi da reportagem principal (‘Investigação da Kroll acusa desembargadores de fraude’), a espionagem se deu no Tribunal de Justiça do Rio e faz referência a um caso recente de investigação da distribuição de processos com cartas marcadas. Foi um caso amplamente noticiado, mas não tem nada a ver com o caso relatado na ‘Memória’ desta mesma página (‘STJ afastou três desembargadores no mês passado’), que se refere a uma outra investigação, esta no Tribunal Regional Federal da 2ª Região Federal. São dois casos completamente diferentes, e a investigação da Kroll refere-se ao primeiro, no TJ do Rio. Acho que é o caso de Erramos, se estou certo.


Eleições


Não é verdade, como informa o texto da arte ‘Fôlego governista’ (ilustração do levantamento ‘Sem máquina, oposição perde candidatos’, pág. A10 de domingo), que o PC do B seja o partido que vai para a disputa eleitoral ‘com o maior número de candidatos’. Como arte mostra, o PC do B é o partido com a maior variação percentual de candidatos lançados. Acho que é o caso de Erramos.


MST


Está muito mais completa a reportagem do ‘Estado’ sobre a política de comunicação do MST. O jornal levanta o uso de jornais, revistas, rádios e Internet (‘MST monta rede de comunicação alternativa’). A Folha mostra apenas o caso de uma rádio, a Camponesa (‘Voz do acampamento chega às cidades’, pág. A11 de domingo).


Descalabro


Josias de Souza conta, na coluna ‘Planalto’ (A11), o caso realmente impressionante, de tão absurdo que é (‘Um descalabro que sobrevive a cinco presidentes’), da desapropriação do porto da ilha de Caratateus, próximo a Belém, no Pará. Não seria o caso de se fazer uma reportagem no local?


Ilegais


A Folha segue bem no acompanhamento das agruras dos brasileiros ilegais nos Estados Unidos. Bem pensado o side deste domingo, ‘Brasileiros ilegais em Boston fogem da convenção’ (pág. A15).


Desperdício


Não precisa da Kroll, para ser espionado, um governo que permite vazar a gravação de uma reunião do Conselho de Administração do BNDES que mostra um ministro e o presidente do banco batendo boca (‘Gravação revela atrito entre Furlan e Lessa’).


Abastecimento


Está aparentemente bem feito o principal investimento de Cotidiano deste domingo, ‘Esgoto duplica custo de tratamento da água’ (capa e páginas seguintes do caderno). Mas tenho uma observação: a reportagem deveria ter se preocupado em comparar o crescimento dos custos dos tratamentos nos três sistemas estudados com os de outros sistemas parecidos em outros Estados. Não sei se seria possível, se haveria alguma base para a comparação porque cada sistema deve ter características diferentes. Mas imagino que possa ser encontrado um padrão de tratamento que permita uma comparação. Sem isso, fica aceito que os aumentos foram devidos exclusivamente à poluição, e descarta-se outros fatores, como superfaturamento e desperdícios.


Anões


Achei corajosa e bem feita a reportagem de capa da Revista da Folha, ‘No mundo dos pequenos’. É um tema difícil, marcado pelo preconceito, e acho que a reportagem soube tratá-lo.


‘Revista’ do Globo


Imagino que o jornal tenha feito pesquisas que indicam que a revista lançada neste domingo é a que os seus leitores querem. Mas fiquei decepcionado. Ela apenas recepciona o ‘Jornal da Família’ e outros produtos do domingo, sem novidade ou criação.


Turismo


O caderno de hoje podia ter evitado os clichês e obviedades. Ninguém agüenta mais reportagens sobre gays que têm de lançar mão de expressões como ‘sair do armário’ ou termos como ‘arco-íris’. É pobre.


23/07/2004


A Folha, que fez ontem uma grande edição com o material exclusivo sobre espionagem, mantém o assunto como manchete: ‘Planalto decide processar espiões’. Apenas o ‘JB’ deu destaque para a repercussão: ‘Governo investiga espionagem patrocinada por telefônica’. O ‘Globo’ deu uma chamada no alto de sua capa (‘Abin vai investigar denúncia de espionagem’) e o ‘Estado’ ignorou.


‘Globo’ e ‘Estado’, assim como vários jornais regionais, preferiram destacar nas suas manchetes, a pesquisa de emprego e renda do IBGE: ‘Globo’: ‘Emprego exibe sinais de recuperação pelo 2º mês’; ‘Estado’: ‘Desemprego cai pelo 2º mês e renda sobe’.


O noticiário econômico da Folha é bem otimista: estão bem dados o artigo que os ministros José Dirceu e Antonio Palocci assinam juntos (‘Muito há por fazer, mas está dada a rota do crescimento’) e a pesquisa do IBGE (‘Desemprego cai, renda sobe e empresários estão mais confiantes’). O contraponto está na página de Opinião (A2), no editorial ‘A prisão dos juros’ e na charge do Angeli.


Painel do Leitor


O ‘PL’ tem hoje apenas cinco cartas. Quatro são respostas de personalidades que questionam reportagens do jornal. Com isso, o leitor ficou sem espaço.


Erramos


Quatro das cinco correções de hoje da Edição SP (três das quatro, da Edição Nacional) são referentes a erros cometidos ontem no jornal. Considero esta rapidez uma prova de respeito ao leitor.


Eleições


Não ficou claro se há crime na cobrança da taxa de inscrição que o PSB impõe a seus candidatos a vereador (‘PSB impõe taxa de R$ 1,6 mil para lançar candidatos em SP’, pág. A4). É ilegal? A reportagem é cautelosa e diz apenas que o pagamento ‘não é previsto no Código Eleitoral’. Mas o box ‘Saiba mais’ diz que é ‘venda de vagas’. Isso é crime? O partido pode receber alguma sanção por isso? Acho que faltou esclarecer com advogados especializados em justiça eleitoral e com o próprio TRE.


Autoria


O ‘Globo’ recupera hoje a notícia da espionagem e dá crédito à Folha. A Folha recupera hoje a notícia de que o Banco do Brasil comprou 70 mesas no show para levantar grana para o PT e não dá crédito ao ‘Globo’, que ontem deu a informação, relevante, com exclusividade.


Memória


A reportagem ‘Ruralistas fazem convênio para ter segurança privada’ (A10) deveria ter lembrado sentença do juiz da 5ª Vara Cível de Taubaté, Carlos Eduardo Reis de Oliveira, publicada pela Folha dia 25/6. O juiz exigia que o Unibanco contratasse seguranças particulares como condição para que fosse cumprida nova reintegração de posse de uma área do banco invadida por sem-terra em Taubaté (130 km de São Paulo). Acho que foi a primeira referência à segurança privada com respaldo judicial e a Folha deu bem na época.


No ‘Estado’


O ‘Estado’ informa que o governo baixou de R$ 4,5 bilhões para cerca de R$ 2 bilhões a redução de impostos sobre produção de bens e serviços que planejava anunciar. É resultado da desistência em aumentar a contribuição previdenciária das empresas.


Prefeitura de SP


A Prefeitura admitiu, enfim, que pode haver problemas sérios no cálculo que fez da consolidação da dívida da cidade _o que a Folha já vinha mostrando há dias (Cotidiano, pág. C4 da Edição SP). Deveria ter tido uma chamada na primeira.


O jornal deveria ter dado melhor o resultado da Ouvidoria sobre a fraude do lixo (Cotidiano, pág. C4 da Edição SP). Foi outro caso que a Folha deu muito bem.


BNDES


O ‘Globo’ informa que o BNDES foi excluído da Câmara de Desenvolvimento Econômico por articulação dos ministros Furlan e Palocci.


Barcelona


Está bem documentada e bem feita a reportagem sobre o Barcelona da Capela do Socorro, da família Tatto. Acho, no entanto, que a Prefeitura, além da subprefeitura, deveria ter sido ouvida como ‘outro lado’.


21/07/2004


O governo cedeu às pressões e desistiu de aumentar a contribuição previdenciária das empresas para pagar a correção dos benefícios dos aposentados. Esta é a manchete de quase todos os jornais. O tom varia:


Folha: ‘Governo recua e não eleva tributo’; ‘Globo’: ‘Pressões forçam o governo a desistir de aumentar imposto’; ‘Estado’: ‘Governo desiste de aumentar o INSS’. ‘Valor’: ‘Previdência não aumenta, mas desoneração é adiada’; ‘JB’: ‘Governo cede de um lado, tira de outro’.


Folha e ‘Estado’ fizeram o alto de suas capas semelhantes: o recuo do governo no caso da previdência, o recorde de arrecadação no semestre e o alívio, nas Filipinas, pela libertação do refém no Iraque (texto e foto). O ‘Globo’ se diferencia com uma capa mais local: sargento da PM é preso, fardado, quando assaltava, e a avenida Niemayer continua interditada.


Muro de Israel


O ‘Estado’ já traz, na sua edição que circulou no Rio (fechada às 21h30), o resultado da Assembléia da ONU que condenou o muro de Israel e exigiu a sua derrubada. A Folha fechou sem o resultado e só deu chamada na primeira página na Edição SP.


O problema do muro, se é que eu entendi bem a resolução da Corte de Haia, não é pelo fato de estar sendo construído entre Israel e a Cisjordânia, como diz a Folha (na primeira página e na A9), mas por estar sendo construído, em algumas partes, dentro do território palestino ocupado.


Câmaras


Os números do Painel (nota ‘Hexa’, pág. A4) não batem com os do Elio Gaspari. O Painel diz que José Dirceu preside agora seis câmaras; Gaspari relaciona cinco.


Independentemente da diferença de números, o Painel e a coluna do Gaspari remetem para o mesmo questionamento: para que servem estas câmaras? Não sei se o jornal já fez um balanço dos seus resultados. Se não, é o caso.


Invasão


Embora tenha ocorrido na madrugada de ontem, a invasão de terras em Goiás, considerada a maior já ocorrida no Estado, só saiu na Edição SP.


Mídia


Mesmo com a desistência formal das associações empresariais, o Pró-Mídia continua a ser discutido no Senado. É o que informa o ‘Estado’: ‘Senador pede R$ 4 bilhões para a mídia – Hélio Costa diz que o BNDES tem condições de dobrar o programa de empréstimos’. Acho que a Folha deveria continuar acompanhando este caso.


20/07/2004


A reação provocada pelo aumento da alíquota de contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento para pagar a correção dos benefícios dos aposentados é a manchete dos principais jornais. Folha: ‘Elevação de tributo não basta para pagar aposentado’; ‘Globo’: ‘PT e PFL condenam aumento de impostos’; ‘Estado’: ‘Governo corre para anunciar amanhã medidas para reduzir carga tributária’.


Sumiu das capas dos grandes jornais o assunto que aflige as famílias e baixa a auto-estima dos brasileiros: os aumentos abusivos nos planos de saúde antigos. ‘Correio Braziliense’ e ‘Estado de Minas’, do mesmo grupo, informam que ‘ANS vai mudar regras dos planos de saúde’.


Eleições


Ficou incompreensível o último parágrafo do relato sobre o debate dos candidatos a prefeito do Rio na TV Bandeirantes (‘Maia critica salário mínimo, mas diz ter boa relação com governo Lula’, pág. A6 da Edição Nacional; a matéria caiu na Ed. SP). O parágrafo diz que um jornalista protestou contra o veto de dois candidatos a dois jornalistas. Em que eles foram vetados? Foram convidados a participar do debate e foram vetados? Iam cobrir o debate e foram impedidos? Diz ainda que um deles ‘teria publicado reportagem pouco correta’ a respeito de um dos candidatos. Como está, sem atribuir a autoria, parece que é o jornal que está afirmando que o repórter teria publicado reportagem ‘pouco correta’ com o candidato.


Não é à toa que a Igreja Universal passou a atacar o casal Garotinho, de quem já foi aliada (‘Em jornal da Universal, Edir Macedo ataca casal Garotinho’, pág. A6). A Igreja Universal tem planos para o Rio. Há, por trás da decisão de começar os ataques, um bastidor que precisa ser contado e analisado pelo jornal. Os questionamentos que o bispo Crivella vem sofrendo por conta de seu patrimônio devem estar de alguma maneira arranhando sua candidatura, provavelmente não entre os fiéis evangélicos, mas entre os chamados ‘formadores de opinião’ da cidade e a zona sul. Ele é o único em condições hoje de se aproximar do Cesar Maia na disputa e os ataques que vem recebendo devem alterar sua estratégia de campanha. E isso também é assunto que o jornal vem ignorando.


Lula


O ‘Estado’ foi ouvir a mãe de Cazuza, Lucinha Araújo, a propósito dos comentários do presidente a depois que viu o filme ‘Cazuza’, e colheu uma frase ótima: ‘Ele se expressou tão mal que não sei se está falando bem ou mal’.


Palestina


Nem o ‘Globo’ nem o ‘Estado’ chamam o Hamas e as Brigadas dos Mártires de Al Aqsa de ‘grupos terroristas’ quando os identificam nas reportagens de hoje sobre a crise na Palestina. Só a Folha o faz.


Iraque


A reportagem do jornalista Robert Fisk (‘Ataque com carro-bomba mata 9 e fere 60 em Bagdá’, pág. A8) não era sobre o atentado, mas um relato de sua viagem ao sul do país, onde constatou que o governo iraquiano tem uma capital mas não tem um país. O título da reportagem tinha de sair daí. Ao misturar a notícia do dia (o ataque) com o relato de Fisk, a Folha não deu bem o ataque e nem valorizou a reportagem do ‘Independent’."