Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Crítica interna

’18/10/2004

A grande novidade do fim-de-semana foi a implantação do novo projeto gráfico do ‘Estado’. Como o próprio jornal informa, ‘a meta é tornar leitura mais prazerosa, com mais informações sobre tendências em tecnologia, entretenimento e a vida de pessoas e empresas’. A manchete trata do peso da carga tributária sobre os negócios: ‘Dívida fiscal sufoca empresas’. Não há nenhum furo relevante, mas um nítido investimento em viagens.

Outras manchetes de domingo:

Folha: ‘67% acreditam que Serra vencerá’ (pesquisa Datafolha);

‘Globo’: ‘Doze vereadores eleitos respondem a processos’;

‘Correio Braziliense’: ‘Exclusivo – Herzog, humilhação antes do assassinato’;

‘Veja’: ‘Os intocáveis – A guerra do grupo de agentes de elite contra o crime organizado e a corrupção na própria Polícia Federal’;

‘Época’: ‘Células vivas – Como os embriões podem gerar tratamentos para males cardíacos, paralisia, diabetes, câncer e Alzheimer’;

‘istoÉ’: ‘A força da célula-tronco’.

Manchetes de hoje dos dois jornais de São Paulo:

Folha: ‘Analistas apostam em alta de juros até 2005’;

‘Estado’: ‘Burocracia bloqueia investimento de US$ 16 bi’.

Reforma do ‘Estado’

O ‘Estado’ apresentou domingo seu novo projeto, com mudanças gráficas, morfológicas e temáticas.

O jornal ficou mais leve, o que não era difícil de se obter em relação ao projeto anterior.

O uso abundante de fios e cores nas vinhetas e chamadas lembra outros projetos da mesma ‘Cases i Associats’.

Com as mudanças, ‘Estado’ e Folha ficaram bastante diferentes nestas edições de domingo e de hoje, o que é bom para os dois, que vinham editando capas muito parecidas.

A reforma, independentemente de seus defeitos e obviedades, é positiva para o ‘Estado’. Demonstra para o mercado de São Paulo, maior centro consumidor de informações e publicidade, que o jornal está vivo.

A mensagem que tenta passar é a de que resolveu seus problemas internos de gestão e caixa, e está novamente no mercado com o objetivo claro de aproveitar a força de marketing da reforma para estimular a circulação.

O novo projeto juntou as seções destinadas aos leitores, o ‘Fórum de Debates’ e o ‘Fórum dos Leitores’. Não sei se por conta do corpo das letras ou pelo tamanho menor das mensagens, o certo é que o novo espaço acolheu, nos dois primeiros dias, mais correspondências dos leitores do que o habitual.

O jornal adotou cores nas páginas de opinião e estreou um chargista com traços fortes, Cau Gómez (se consegui entender a assinatura).

Quanto ao conteúdo, algumas observações:

– Não há furos relevantes, mas um esforço evidente –que ocorre sempre que os jornais anunciam mudanças– de enviar jornalistas para produzir grandes reportagens, não necessariamente com novidades. Seus repórteres foram para o Ceará, Acre, rio São Francisco, Toledo (Ohio/EUA), Cabul (Afeganistão), Montevidéu, Catu (Bahia) e Brumadinho (Minas)

– Há uma ênfase na valorização do que as ongs gostam de chamar de ‘agenda positiva’, ou seja, casos de sucesso.

– O artigo de Celso Lafer (‘Pró-Serra’) e a entrevista com o governador Geraldo Alckmin (‘O governo Lula é ineficiente, centralizador e pouco ágil’), ambos sem contraponto, reforçam a opção tucana firmada em editorial de 3 de outubro (‘O que está em jogo em São Paulo’).

A Folha reagiu ontem com uma edição bem mais generosa em espaço do que o normal. Os dois jornais não economizaram papel. A Folha pulou das 172 páginas do domingo passado para 264 páginas; e o ‘Estado’, de 164 para 272.

‘Eleições 2004’

A Folha editou neste sábado sua melhor contribuição para a compreensão da disputa eleitoral em São Paulo. A manchete ‘Serra e Marta distorcem dados em debate na TV’ e o quadro ‘A verdade de cada um’, na página A6, questionam, pela primeira vez, os números e as críticas que os dois candidatos repetem como se fossem verdadeiros. Nem todos são, e os leitores não têm como saber, exceto se o jornal checar os dados, como fez no sábado. A iniciativa de sábado deveria se tornar uma rotina neste segundo turno.

‘O Globo’ também deu duas boas contribuições para que os (e)leitores reflitam sobre os resultados do primeiro turno. No domingo, a manchete foi um levantamento das fichas dos vereadores eleitos para a Câmara do Rio: ‘Doze vereadores eleitos respondem a processos’. E hoje, outro levantamento, sobre prefeitos investigados pela Controladoria Geral da União: ‘Prefeitos reprovados em inspeção são reeleitos –Eleitores ignoraram desvios de verba e licitações fraudulentas’.

Turismo

A Folha publica neste domingo duas reportagens sobre o Brasil como destino turístico. Uma, em ‘Cotidiano’ (‘Brasil é visto como destino turístico perigoso’ e ‘Violência ainda não afetou venda de pacotes’, na pág. C10), e outra, em ‘Dinheiro’ (‘Propaganda boca a boca atrai mais turistas’, ‘Violência no Rio não muda plano de viagem’, ‘Aumenta o investimento em hotelaria no Nordeste’ e ‘Bahia deseja atrair negros dos Estados Unidos’, B16). As reportagens se complementam, e é estranho que estejam separadas.

Pareceu-me excesso de espaço para o assunto e falta de coordenação.

A crítica interna é de responsabilidade do ombudsman Marcelo Beraba. Circula diariamente na Redação da Folha e na Empresa Folha da Manhã S/A

15/10/2004

Várias mudanças tornaram a capa da Edição São Paulo da Folha mais quente (em termos de fotos e notícias) e mais bem arrumada em relação à Edição Nacional. A manchete permaneceu a mesma: ‘Gasolina sobe; Palocci indica nova alta’.

A manchete do ‘Estado’ é sobre o Iraque (‘Ataque mata 10 no QG dos EUA em Bagdá’) e a do ‘Globo’ sobre a operação da Polícia Federal (‘PF prende 21 acusados de tráfico internacional’).

Como os jornais trataram o debate na TV Bandeirantes, ontem à noite, entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo:

Folha: ‘Serra e Marta fazem debate agressivo’;

‘Estado’: ‘Marta e Serra fazem guerra de nervos em debate’;

‘Globo’: ‘Debate esquenta campanha em SP’;

‘Diário de S. Paulo’: ‘Serra e Marta fazem debate de verdade’ (parece uma crítica aos debates de outra emissora);

‘Valor’ (manchete interna, sem chamada na capa): ‘Serra cobra corte social em 2005 e Marta, o bilhete único no metrô’.

‘Eleições 2004’

Assisti a uma boa parte do debate de ontem entre os candidatos de SP e achei bons os relatos, na Folha, das tensões que marcaram os enfrentamentos entre Serra e Suplicy, na telinha e nos bastidores. O texto principal se fixou, corretamente, no enfrentamento direto entre os candidatos, nas suas reações.

Mas faltou, na edição, um destaque jornalístico para os principais pontos colocados em discussão: túneis da Faria Lima, recursos federais para SP, taxas e impostos, gestão do Serra na Saúde, cortes nos programas sociais, bilhete único e metrô e outros. Ao não fazê-lo, o jornal mais uma vez privilegia a cobertura do comportamento e do desempenho dos candidatos, e não ajuda o (e)leitor a encontrar suas próprias conclusões sobre os pontos em discussão. Pego carona na análise do Marcelo Coelho: ‘Questões concretas foram discutidas, com mais profundidade do que de hábito, ainda que aparecessem poucas soluções. Talvez não existam mesmo…’

Para cada questão levantada, os dois candidatos tinham informações que pareciam contraditórias, que aparentemente se anulavam. Quem está certo? Os dois? Nenhum? Há soluções para os problemas levantados? Quais?

É evidente que, pelo horário, seria impossível aprofundar a discussão e, imagino, em algum momento o jornal o fará. Mas a edição de hoje já poderia ter trazido, em forma de texto ou de arte, um apanhado dos principais problemas levantados, e as posições dos dois candidatos.

Quando o jornal vai dedicar espaço às ‘questões concretas’ de São Paulo?

Barril de pólvora

É um exagero, principalmente em um jornal que economiza papel, como a Folha, destinar quatro páginas, sendo uma inteira, para o aumento da gasolina.

É o dobro do espaço destinado pelo ‘Estado’, que tem um caderno com duas páginas a mais do que o ‘Dinheiro’ da Folha.

Bancários

Ok, a greve dos bancários acabou, como informa o jornal na pág . B7. Mas não deveria ter sido feita uma reportagem de serviço para orientar os leitores prejudicados com a greve, privados de serviços bancários (pagamentos atrasados, pensões)? O que devem fazer agora? Ou a greve já não tinha mais qualquer conseqüência prática na vida das pessoas?

‘Esteira livre’

Está pobre a cobertura da Folha sobre o desmonte da rede de tráfico que agia no aeroporto internacional do Rio. Faltou memória (o caso remete à quadrilha que usava aviões da FAB para o envio de drogas), faltaram detalhes das funções e personagens envolvidos, faltou a repercussão junto ao governo (o ministro da Justiça falou), faltou explicar melhor a história do tráfico de armas.

Na Edição Nacional, o jornal informa na primeira página que a Polícia Federal prendeu 21 acusados de tráfico no Rio e no Paraná. A reportagem ‘PF desmonta rede de tráfico em aeroporto’, na capa de ‘Cotidiano’, informa, no entanto, que foram presos 23 pessoas. Na Edição SP não há esta discrepância.

14/10/2004

As manchetes dos principais jornais:

Folha: ‘Datafolha mostra razões de rejeição a Serra e Marta’. Tem ainda chamadas fortes para o último debate presidencial nos EUA e para levantamento sobre desemprego fora das metrópoles.

‘Estado’: ‘Só 9% dos jovens até 24 anos estão na universidade’.

‘Globo’: ‘Polícia mata chefe do tráfico mas guerra pode aumentar’. Outro destaque: ‘Miséria cresceu no 1º ano de Lula’, estudo da FGV.

Fotos na Edição SP da Folha e do ‘Estado’, com o mesmo título óbvio (‘Em branco’), são de Ronaldo, no empate com a Colômbia.

‘Eleições 2004’

Segundo a pesquisa do Datafolha, ‘Marta é rejeitada pelas taxas; Serra, por sua atuação na saúde’ (pág. A4). Dos que rejeitam Serra, 23% o fazem por que não aprovam sua atuação na área de Saúde. Entre os que rejeitam Marta, a razão principal (25%) é a criação de taxas.

É correto, sob o ponto de vista jornalístico, que o jornal relembre com destaque as taxas criadas e aumentadas por Marta, como faz na arte ‘Razões da rejeição e do voto em São Paulo’, na mesma página A4. Não entendo, no entanto, por que não informa igualmente as razões pelas quais uma boa parte dos paulistanos entrevistados não aprovam a atuação de Serra na área de saúde, que dirigiu como ministro durante quase quatro anos. O correto, neste caso, teria sido destacar os pontos fracos dos dois candidatos, e não apenas de um.

Este tipo de procedimento, sem qualquer lógica jornalística, tira a força da cobertura crítica da Folha.

O jornal perde, mais uma vez, a oportunidade de discutir os problemas concretos que afligem a cidade. As razões espontâneas de rejeição eram um bom ‘gancho’ (oportunidade) para a discussão da questão das taxas e da questão da saúde. Artigos como ‘O bilhete único não dá prejuízo; mas, se der, é ruim?’, publicado ontem, que junta informações com questionamentos fundamentados, são um caminho que o jornal reluta em seguir. Hoje, com o detalhamento da pesquisa sobre rejeição, tinha uma boa oportunidade de fazê-lo.

O jornal continua a priorizar a cobertura de apoios para o segundo turno e de ataques mútuos entre as candidaturas.

‘Mundo’

Está bem editada a cobertura do último debate entre os candidatos à Presidência dos EUA.

O ‘Estado’ comete um erro grave ao atribuir a Bush a frase em que Kerry cita a filha lésbica de Dick Cheney (arte ‘Fala Bush’ da pág. A20).

Justiça

A Folha ignora a visita, iniciada ontem, do relator especial da ONU que fará uma avaliação do Judiciário brasileiro. A última visita de um observador da ONU foi tensa. Esta vem sofrendo resistência desde que foi anunciada. O ‘Estado’ tem editorial contra a inspeção da ONU, ‘Uma visita dispensável’.

‘Dinheiro’

São ruins a foto e a legenda da pág. B6 que ilustra reportagem sobre a Vasp. O texto diz que ‘funcionários da Vasp chegam ao Planalto para encontro com ministro da Defesa’, mas a foto mostra em primeiríssimo plano um aeroviário com a cabeça cortada.

Guerra sem trincheira

A Folha deveria ter sido mais crítica na cobertura da morte do traficante Irapuan Lopes, o Gangan. Segundo o jornal, ‘Para polícia, morte desarticula tráfico’ (título da segunda retranca da cobertura).

Quantas vezes os governos Garotinho, Benedita e Rosinha anunciaram, ao prender ou matar um traficante que consideravam importante, que o tráfico seria desarticulado? Era só ir ao Banco de Dados. Nenhuma prisão ou morte desarticulou até agora o tráfico, tanto que continua dominando as favelas e colocando a PM para correr, como aconteceu anteontem no Méier.

A Folha informa, na reportagem principal (‘Líder da ADA é morto pela polícia no Rio’), que o chefe da Polícia Civil, Álvaro Lins, comandou pessoalmente a operação de cerco e morte do traficante. ‘Globo’ e ‘Estado’ dizem que a operação foi comandada por dois delegados.

‘Esporte’

Quanto foi o jogo Itália x Belarus pelas eliminatórias? Segundo a Folha (‘Scolari afasta crise com 7 gols contra a Rússia’, pág. D4 da Ed. SP), ‘a Itália (…) sofreu para bater Belarus em jogo de sete gols em casa. (…) Totti e Gilardino marcaram para a Itália’. E o resultado? O leitor tem de ir à página D2, no ‘Placar’, para saber.

Assim como tem de voltar à capa do caderno se quiser saber como ficará a classificação das eliminatórias na América do Sul. Como a arte ‘A classificação’ (pág. D4) não informa o número de jogos de cada equipe, o leitor tem de voltar à capa para lembrar que Venezuela e Equador têm um jogo a menos e se enfrentam hoje.’