Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1280

Ernesto Rodrigues

‘Errei feio na expectativa de desencadear um debate com a coluna heterodoxa de ontem, 7 de julho, sobre o primeiro episódio da minissérie ‘O amor segundo B. Schianberg’. Mesmo assim, acho que é meu dever, em nome de pelo menos uma parte dos telespectadores, voltar ao assunto, desta vez para explicar, uma a uma, para quem não entendeu, algumas frases que fizeram parte do texto. Vamos lá:

‘O título Navalha na carne, São Paulo, 3 de fevereiro de 2009, confunde.’

O início do primeiro episódio foi um prenúncio da confusão que permearia todo o programa. Parecia erro de operação ou fita trocada, mostrando, em vez da minissérie um teleteatro com a antológica peça de Plínio Marcos.

‘Uma peça – o estilo gritado de sempre’

A referência, aqui, diz respeito à transposição, do palco para a tela da TV, de um vício antigo do teatro brasileiro: confundir intensidade dramática com decibéis e linguagem agressiva com autenticidade.

‘A Cultura também tem seu Big Brother, com desvantagens: a qualidade do áudio enlatado, difícil de entender’.

O formato de reality show da minissérie, queiram ou não queiram os realizadores, remete à gincana global, sim. Mas o naturalismo das imagens, ainda que fake, por envolver duas interpretações de atores – e não pessoas comuns em situação de confinamento – antes mesmo de parecer pouco convincente, era muitas vezes inaudível, devido às notórias limitações técnicas para a captação dos acontecimentos da ‘casa’.

‘Granulação’

É péssima a qualidade das imagens. Um tipo de imagem, aliás, que só prende, fascina e desperta interesse quando se trata de um flagrante da vida real, jornalístico ou não – o que não era, absolutamente, o caso, em ‘O amor segundo B. Schianberg’.

‘Frias como câmeras de um caixa eletrônico sem assalto’

Um comentário para corroborar a flagrante falta de importância da maioria das seqüências editadas (?) para este primeiro episódio.

‘Escuridão’

(Ler, com mais impaciência, o texto acima sobre a palavra ‘Granulação’)

‘Foi dito na reportagem da Folha que o objetivo não era audiência.’

Se o objetivo não era audiência, como disse à Folha de S. Paulo o diretor da TV Cultura responsável pela exibição da minissérie, qual a justificativa para exibir um conteúdo como este num horário durante o qual milhares de pessoas buscam alternativas interessantes, ricas e saborosas para a programação dominical das redes comerciais? Qual o sentido de exibir um clássico laboratório de teledramaturgia como se fosse obra acabada, além da soberba que se camufla no biombo esgarçado da liberdade de expressão?

‘Flávia Scherner’

A participação da apresentadora foi importante, mas insuficiente diante das explicações, contextualizações e esclarecimentos que precisariam ser feitos para que o primeiro episódio tivesse um mínimo de sentido, do ponto de vista artístico.

‘Comendo pipoca’

Referência a um chavão supremo, muleta clássica de interpretação

‘Faltou um Pedro Bial para tentar legitimar, embora esse não tenha sido, com certeza, o objetivo.’

Trata-se de uma alusão à forma com que o apresentador tenta legitimar, ética, cultural e artisticamente, seu torneio banal de beldades e aventureiros. Ou uma lembrança de que uma ancoragem com a dele poderia tornar o episódio pelo menos compreensível, ainda que não necessariamente interessante ou emocionante.

Algumas das outras frases da coluna dispensam explicação, incluindo a pergunta que fiz sobre quantos telespectadores, independentemente de sua disposição para testemunhar experimentalismos, conseguiriam resumir o conteúdo desse primeiro episódio. No mais, como foi dito na coluna, foram diálogos incompletos, situações ‘bigbrotherianas’ sem qualidade técnica, suspiros, sonolência e uma frase em especial, dita pelo ator que interpreta um ator de teatro: ‘Liberdade dá trabalho’.

A explicação para o texto da coluna eu presumo que esteja dada.

Quem explica a minissérie ao telespectador que estava sintonizado na TV Cultura na noite de domingo?

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O amor segundo B. Schianberg, 7 de julho

O título ‘Navalha na carne’, São Paulo, 3 de fevereiro de 2009, confunde.

Uma peça – o estilo gritado de sempre

A Cultura também tem seu Big Brother, com desvantagens: a qualidade do áudio enlatado, difícil de entender

Granulação

Frias como câmeras de um caixa eletrônico sem assalto

Escuridão

Foi dito na reportagem da Folha que o objetivo não era audiência.

Flávia Scherner

Análise do relacionamento entre uma videomaker e um ator.

Gustavo Machado e Marina (?)

Comendo pipoca

Faltou um Pedro Bial para tentar legitimar, embora esse não tenha sido, com certeza, o objetivo.

Aula de beijo técnico (começo, meio e fim) – uma das poucas seqüências que fugiram do

Fase sapato que durou quatro meses – cozinha iluminada por velas

Narração do ‘mapeamento ‘ da relação… ‘o perigo que é debruçar-se sobre os abismos do outro’ – duas ou três frases por bloco

Quantos telespectadores, independentemente de sua disposição para testemunhar experimentalismos, conseguiriam resumir o conteúdo?

Diálogos incompletos, situações ‘bigbrotherianas’ (sem qualidade)

As cenas da cozinha muito semelhantes…

Uma canção acompanhada ao violão… uma história engraçada de redação envolvendo Nelson Rodrigues e Otto Lara Resende que a atriz/personagem não entendeu.

‘Todo jogo significa alguma coisa’ (lendo um texto) – (Um texto filosófico) – ‘Que brega isso’ (a personagem/ videomaker) – ‘Tá na hora de pensar outra coisa’

‘Uma formiga carregando uma filha’

‘Liberdade dá trabalho’.

(ajuda de legendas)

Nu masculino – videomaker – ‘Tudo pela videoarte’ (perambula como macaco na janela)

‘Não quero esse conforto que você está’.

Granulação – suspiros, sonolências

Não é bem assim

De Simão Molinari, editor de conteúdo do portal da TV Cultura:

Caro Ernesto,

Discordo inteiramente da afirmação do telespectador Roberto Carlos dos Santos, que disse que ‘os links dos programas estão praticamente todos desatualizados’. A programação é atualizada semanalmente e em alguns casos até a programação mensal está disponível, como é o caso, inclusive, do Rumos da Música, citado por ele mesmo. Eventuais atrasos na divulgação às vezes ocorrem quando temos de aguardar a definição de alguma atração que será exibida em determinado dia e horário, mas assim que ela é confirmada colocamos imediatamente no site.

Atenciosamente, Simão Molinari’

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Tudo que é sólido não deveria derreter, 6 de julho

Não é apenas este ombudsman que lamenta a vida curta da série ‘Tudo o que é sólido pode derreter’. Muito pelo contrário. Transcrevo abaixo alguns emails que são indícios do impacto positivo que ela causou. A começar pela mensagem de Simão Molinari, editor de conteúdo do portal da TV Cultura, sobre o volume de acessos ao site do programa:

‘Caro Ernesto,

Encaminho dados de acesso do site da série ‘Tudo o que é sólido pode derreter’. Nos últimos 30 dias, temos 29.669 visitas e 108.952 pageviews. Desde 10 de abril até hoje, são 54.229 visitas e 206.663 pageviews. A série já é o segundo site de programa mais acessado da TV Cultura. Abaixo, os pageviews dos últimos 30 dias dos cinco programas mais acessados: ‘Cocoricó’ (524.605), ‘Tudo o que é sólido pode derreter’ (108.952), Provocações (83.778) e Roda Viva (59.771).

Um abraço, Simão Molinari’

Agora, três emails endereçados ao programa ‘Pé na Rua’, que não tem nada a ver – e também tem tudo a ver – com o ‘Tudo o que é sólido pode derreter’:

‘Oi, tudo bom? Sou de Sumaré, interior de São Paulo. Eu gostaria que vocês falassem sobre programas da cultura tipo ‘Confissões de Adolescente’ e ‘Mundo da Lua’. E não gostaria de que o ‘Tudo o que é sólido pode derreter’ acabasse. Beijos e abraços, Guilherme da Silva Brito (14 anos)’

‘Quero dizer que amo vocês demais e acho que o programa devia ser de uma hora por dia! Porque é muito rápidoooo! Por favor genteeee! Ah! Eu não sei para onde mandar um e-mail pra falar do ‘Tudo o que é sólido pode derreter’. Então, por favor, me ajudem: eu quero segunda, terceira, quarta, quinta, sexta temporada!!!

Jéssica Cristina Dos Santos

‘Estou aqui para admirar a TV Cultura por sempre estar conquistando o publico jovem – e ainda mais as crianças – e pra também reclamar do final triste que teve a série ‘Tudo o que é sólido pode derreter’. (…) Eu queria que o diretor ou a diretora tomassem a iniciativa correta para mudar o rumo que essa serie tomou. (…) Lá no site da série tem o espaço pra contato mas as mensagens não são respondidas. (…) Muitas as atitudes que eles estão tendo estão gerando nas pessoas tristeza e conflitos (…) Do jeito que está, as pessoas não vão querer mas assistir ao canal por causa dessas iniciativas… (…) Daqui a alguns dias só as crianças assistirão os desenhos e não é isso que vocês querem e sim o canal conquistando e abrindo espaços para todas as idades, principalmente os jovens que agora estão atrás de coisas novas. Pensem, reflitam nisso tudo e no que pode acontecer se essas atitudes continuarem na TV que faz bem……

Obrigado, Gustavo Rodrigues (16 anos)

Site

Do telespectador Roberto Carlos dos Santos:

‘Prezado Ernesto, gostaria de enviar meus protestos no que tange à programação disponibilizada via internet. Os links dos programas estão praticamente todos desatualizados. Isto é muito ruim para a imagem da TV Cultura, além de prejudicar quem tem o hábito de verificar a programação semanal ou mensal para adaptar sua agenda. Ensaio, Rumos da Música (não tem nada), Divercine, Cine Brasil e outros estão com a divulgação atrasada. Por gentileza, envide todos os seus esforços no sentido de regularizar algo que já é ‘cultural’ e reiterado. Atenciosamente, Roberto Carlos dos Santos’

Cultura ou Shoptur?

Do telespectador Regis Alves:

‘Como ocorre a concessão da TV Cultura para os estados? Tem alguma regra? Pois aqui no estado que moro, Rondônia, a Cultura divide o espaço com canal de vendas. São dois canais num só. Então, quando a gente está vendo um filme, ai vem o Shoptur invadir o programa. Vendo um show? A mesma coisa. Documentário? Igual. Façam alguma coisa. É Tv cultura ou Tv Shoptur?

Regis Alves’

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Respostas e soluções, 3 de julho

Um desencontro de emails deu a impressão a este ombudsman de que ficara sem direção da emissora a reivindicação de uma telespectadora para que os filmes em língua estrangeira exibidos pela TV Cultura sejam dublados, em vez de serem legendados. Houve resposta, sim. Do presidente da Fundação Padre Anchieta, Paulo Markun, e do diretor de Prestação de Serviços, Ricardo Paoletti. Transcrevo, primeiro, a de Paulo Markun:

‘Caro ombudsman,

A dublagem de um filme com qualidade custa caro. Cinco, seis vezes mais do que os direitos de exibição. Por isso, obras que poderiam ser dubladas caso houvesse recursos, são apresentadas com legendas. Como a Cultura não trabalha com os chamados blockbusters obrigatoriamente (não que isso seja um parâmetro), os estúdios não se dispõem a realizar a dublagem para uma língua tão ‘secreta’ quanto o português. Sinceramente, ainda não encontramos uma saída para esse impasse.

Atenciosamente,

Paulo Markun – presidente da FPA’

Do email de Ricardo Paoletti, transcrevo as seguintes informações complementares:

‘A TV Cultura procura manter uma programação variada e de alta qualidade nas faixas de exibição de filmes nacionais do Cinema Brasil e internacionais no DiverCine, além dos muitos filmes que integram a única programação regular de documentários na TV Brasileira (…) Entendemos que a legendagem tem seus adeptos – telespectadores que preferem ouvir a interpretação de voz dos atores originais – e que a dublagem tem o potencial de ampliar o acesso de um público maior. Mas, no nosso caso, a decisão pela dublagem de todos os filmes poderia implicar na exibição de menos títulos, o que certamente seria um prejuízo para nosso público.

Um abraço,

Ricardo Paoletti’

Explicado e compreendido está. Resta agora, em nome dos compromissos maiores da emissora, um esforço de todos na busca de uma alternativa para atender não apenas ao pedido da remetente do email, mas também ao dos potenciais milhões de telespectadores que ela representa. Cidadãos que, se pudessem estar à mesa na hora da definição de orçamentos da TV Cultura, certamente diriam que a dublagem de filmes é uma prioridade. E o diriam não necessariamente por razões estéticas ou culturais, por mais insubstituíveis que sejam as vozes de certos atores e atrizes estrangeiros. Diriam porque boa parte dos telespectadores de TV aberta brasileira simplesmente não consegue ler a tempo as legendas. Perde o fio da meada.

A título de contribuição nesse esforço, vai aqui uma pergunta em forma de sugestão: no caso específico dos citados documentários que a TV Cultura veicula com legendas – como a espetacular série da BBC sobre grandes obras-primas da pintura universal, exibida atualmente pelo programa Cultura Mundo – seria tão caro simplesmente traduzir para o português e narrar, com uma das ótimas vozes do elenco de jornalistas e artistas da emissora, a própria versão original em inglês do documentário?

Outra pergunta que merece ser posta na mesa, no caso, a mesa dos que decidem as políticas públicas na área de Cultura, é a seguinte: quantos espetáculos do Cirque du Soleil ou shows de Caetano Veloso custaria um eventual redirecionamento de frações de incentivo da Lei Rouanet para a dublagem de filmes estrangeiros que não se enquadrem na categoria de blockbusters?’