Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Ernesto Rodrigues

‘A’Uwe, 14 de janeiro

A propósito da edição do ‘A’Uwe’ exibida no dia 14 de janeiro, fiz o seguinte comentário na análise interna de ontem:

Não há dúvidas de que a série ‘Vídeo nas Aldeias’, que vem sendo exibida pelo ‘A’Uwe’, deve ser assistida na perspectiva de conhecermos o que já foi descrito como ‘o processo de apropriação dos meios audiovisuais pelos índios até a recente produção de autoria indígena’.

Mas a exibição do episódio ‘Kiarãsâ yõ sâti, o amendoim da cutia’, no programa de 14 janeiro, mostrando o cotidiano da aldeia Panara durante a colheita do amendoim, tinha uma sequência que, considerando o veículo e o horário de exibição – início da noite, com telespectadores remanescentes do horário infantil – merecia não uma censura ou qualquer tipo de corte, mas uma cuidadosa contextualização, ou através do apresentador Marcos Palmeira ou com um a narração em off.

É que, para mostrar um dos costumes da aldeia – o de fazer cortes nas pernas das mulheres com dentes de paca ‘para que eles fiquem com as coxas grossas’ – os realizadores do documentário filmaram o momento em que uma jovem índia, nua e aos gritos, reagia à tentativa de um grupo de índios que a imobilizavam pelos braços e pernas de riscar seu peito em carne viva. Um ritual que assemelhava-se, assutadoramente, a uma sessão de tortura.

O documentário mostra que a índia reagiu muito e que os homens acabaram não conseguindo ‘riscá-la’. Mas o desconforto que a cena causou – para não citar eventuais efeitos traumáticos no público infantil – sugere um cuidado maior dos responsáveis do programa na exibição de manifestações culturais tão drasticamente diferentes como esse ritual. Principalmente em uma emissora na qual até personagens mais agressivos, pouco edificantes ou assustadores de desenho animado costumam merecer severa condenação de parte dos telespectadores.

Transcrevo abaixo a resposta imediata que recebi de Laine Milan, da direção do programa:

Caro Ernesto,

Provavelmente você tenha razão – e tenha me faltado distanciamento em relação a eventuais cortes no documentário ‘O Amendoim da Cotia’. Havia cenas, neste mesmo documentário, que conseguimos cortar, num acordo com os realizadores. Cenas que expunham certa ironia sobre a sexualidade, principalmente a feminina.

É preciso, de qualquer forma, ter muito cuidado na interpretação do universo indígena, permeado por crenças e mitos. Temos nos guiado pela certeza de que é fundamental olhar esses documentários sem ‘pré-conceitos’ – e sem julgamento.

De qualquer forma, sua observação é importante, pois faz um link com nosso público. Grata, mais uma vez.

Laine Milan

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Conheça os pontos positivos e negativos da programação exibida na última semana.

Viva a diferença!

Vitrine, 26 de agosto

A bem-produzida reconstituição, estilo documentário, do reencontro de João Gilberto com o grupo de amigos paulistanos que ele convocou, via Monica Bergamo, na véspera do show em São Paulo, merece um destaque especial pelo notório esforço de produção, pelo material de arquivo e pela qualidade da edição. Como bônus, a matéria contribuiu para fazer contraponto à cobertura deslumbrada e cheia de colunismo provinciano que tomou conta da mídia em geral em relação a esse show.

Três em um

Pé na rua, 26 de agosto

A equipe do Pé na Rua conseguiu uma proeza ‘três em um’, no bom sentido: primeiro, uma pauta de ‘serviço’ com as dicas importantes para que uma festa surpresa dê certo. Depois, aproveitar o aniversário da apresentadora Gabi para um interessante making of dos bastidores do programa e da TV Cultura, que sempre interessam ao telespectador. E, finalmente, captar toda a autenticidade da reação de Gabi quando ela foi realmente surpreendida pela festa preparada pela família, pelos amigos e pelos colegas de trabalho.

Do Bope a Shakespeare

Provocações, 15 de agosto

Não poderia ser diferente: o encontro de Antonio Abujamra com Wagner Moura, respectivamente cardeal e estrela dos nossos palcos e telas, resultou em um Provocações divertido, bem-humorado e revelador tanto do entrevistado quanto do entrevistador. Como no momento em que ambos discordaram sobre o filme ‘Tropa de Elite’.

Fibra

Balanço Social, 24 de novembro

Mereceria uma reprise – dentro do Jornal da Cultura, por exemplo, para ampliar o contingente impactado – a matéria de Ricardo Ferraz sobre o uso de fibras vegetais pela indústria automobilística. Com boas imagens da linha de montagem e entrevistas pertinentes de técnicos da Volkswagen e da Unicamp, a matéria ainda foi complementada por uma entrevista de Heródoto Barbeiro com o professor André Carvalho, da FGV.

Show de Krugman

Roda Viva, 4 de agosto

Paul Krugman, como não poderia deixar de ser, rendeu uma ótima entrevista, bem ao gosto do telespectador habitual do Roda Viva. Previu (antes da crise) vacas magras para o Brasil nos próximos cinco anos. Aprovou a política do BC brasileiro. Disse que os Estados Unidos já não contaminam a economia mundial como antigamente. Mostrou toda a sua insegurança em relação ao inexperiente Barck Obama. Disse que não é a globalização que está em crise, mas o sistema financeiro que precisa de mais regulamentação. Colocou Alan Greenspan no topo da lista dos vilões responsáveis pela crise americana. E disse que, apesar de o mundo ter melhorado nos últimso 30 anos, não sabe como tornar rico um país pobre. Previu ainda que todos, incluindo europeus e americanos, teremos de nos acostumarmos com menos automóvel e menos carne, entre outros produtos, por razões ambientais. Foram poucas as perguntas não respondidas satisfatoriamente. Mas uma, infelizmente, não foi feita: como os brasileiros devem se preparar para as vacas magras que, segundo Krugman, nos esperam no horizonte?

Canja preciosa

Metrópolis, 4 de agosto

O emocionante sobe-som com Frederika von Stade, cantando ‘La vie en rose’ na Sala São Paulo, foi uma prova do poder que a televisão tem de transformar fragmentos de um espetáculo em um outro tipo de conteúdo que, mesmo sendo obviamente muito mais curto, de vida breve e limitado, tem um valor em si. Afinal, se não podemos ir à Sala São Paulo, temos uma noite de segunda-feira aquecida por alguns segundos de arte e beleza. Isso é televisão. Boa televisão. E, é sempre bom lembrar, gratuita.

Respeito

Intervalos comerciais

A definição de regras, tempos e condutas para a inserção de chamadas, patrocínios e publicidade, comunicada internamente em detalhes pela presidência da FPA na semana passada, além de disciplinar os intervalos da programação, tem tudo para dar agilidade à grade e facilitar a fidelização. Atitudes como essa, em se tornando realidade, se enquadram perfeitamente no quesito estatutário de respeito ao cidadão telespectador da TV pública.

A história de Ana Cristina

Entrelinhas, 26 de outubro

A homenagem à poeta Ana Cristina Cesar, na semana dos 25 anos de sua morte, foi uma reprise mais que merecida. Apesar do tempo menor, estavam lá o ritmo, o acabamento sofisticado e o domínio de linguagem de televisão que são marca registrada de quase tudo que o programa faz. Quem queria conhecer mais Ana Cristina Cesar soube um pouco mais da geração que viveu radicalmente o fim da utopia dos anos 60/70 e foi impactado principalmente pelos depoimentos de Heloisa e Armando. Heloisa descreveu Ana como uma jovem de formação rígida que ‘queria errar e não conseguia’.

Cartola, no bom sentido

Mosaicos, 12 de outubro

O ‘Mosaicos’, exibido em 12 de outubro para celebrar o centésimo aniversário de Cartola, foi um emocionante dueto dele – em imagens e sons preciosos do arquivo da TV Cultura – com a nata do samba e da música popular brasileira. Com narração perfeita de Rolando Boldrin, o programa teve momentos emocionantes como o de Elton Medeiros e Zé Renato interpretando ‘O sol nascerá’, um dos grandes hinos do samba de todos os tempos.

Aprender sorrindo

Almanaque Educação, 14 de outubro

O programa tem uma característica marcante: o uso inteligente do humor em formatos apropriados à televisão, como no quadro ‘Pílulas do saber’ – uma crônica sobre a invenção da secretária eletrônica – e no ‘Telejornal’, com suas ‘reportagens’ sobre a mulher multada a 750 quilômetros por hora e o indiano considerado o pior aluno do mundo.

Programaço

Roda Viva, 9 de setembro

Os especialistas convidados – Luiz Carlos Merten, Rodrigo Salem e André Nigri – não deixaram que a condição de críticos de cinema os fizesse cair na tentação das perguntas-teses que costumam comprometer o ritmo e o conteúdo do Roda Viva com Fernando Meirelles. E o cineasta, com sua simpatia contagiante e a notória paixão pelo que faz, falou de forma envolvente, franca e bem-humorada sobre criação, mercado, tecnologia, bastidores, polêmicas e mitos do cinema.

Surpresas da periferia

Manos & Minas, 23 de julho

A reportagem de Juju Denden sobre a reunião do ‘Família Car Club’ e os fiéis importadores paulistanos da cultura norte-americana ‘low rider’ – velhos carrões gastadores de gasolina primorosamente restaurados e equipados com um sistema hidráulico que os torna saltitantes – foi mais uma revelação interessante sobre o que vai pela periferia e também sobre o desafio complexo que é entendê-la ou julgá-la.

Homossexualismo na TV

Sexualidade, 24 de julho

O tema ‘as diferentes formas de amar’ foi apresentado com uma ótima dramatização: o monólogo de um jovem que está em dúvidas sobre o tipo de sentimento que tem por um amigo. O que se seguiu foi um raro, corajoso e abrangente debate dos jovens participantes do programa sobre o homossexualismo.

Muito além do palavrão

Especial Dercy Gonçalves, 22 de julho

Uma divertida, oportuna e emocionante despedida de Dercy Gonçalves, muito além dos palavrões. Foi assim, com a reprise de ‘Dercy por Dercy e por alguns amigos’, da série ‘Brasileiros e Brasileiras – Biografias para tv ‘, que a Cultura homenageou a artista.

Mito indestutível

Metrópolis 1º de setembro

O especial ‘Michael Jackson 50 anos’, que abriu e fechou o programa do dia em que o cantor completou 50 anos (29 de agosto), foi uma primorosa retrospectiva de sua trajetória e uma aula de edição, perfeita para TV aberta e muito adequada, em tempo, ritmo e formato, a uma revista eletrônica cultural como o Metrópolis.

Cultura é currículo

Projeto Cultura é Currículo

‘O cinema vai à escola’ foi uma ágil e bem-humorada reconstituição dos bastidores de uma produção cinematográfica, a começar pela convincente sequência de suspense e comédia envolvendo dois ladrões que invadem uma casa.

A peixeira do Chatô

Vitrine, 29 de julho

Impressionante o depoimento de Fernando Morais a Sabrina Parlatore sobre os métodos de seu famoso biografado Assis Chateaubriand.

Trintão

Manos & Minas, 26 de novembro

A vibração dos grupos na platéia do Teatro Franco Zampari, ao serem apresentados por Rappin Hood, na edição número 30 do Manos & Minas, mostra que o programa não precisa de claques artificiais. O conteúdo dessa trigésima edição, aliás, confirmou, mais uma vez, a proposta do programa de ser um olhar rico, plural, representativo e sem preconceitos sobre o que efetivamente acontece na periferia de São Paulo em termos culturais, artísticos e comunitários. E para os telespectadores que estranham, alguns até flertando com o preconceito social, as influências e linguagens não exatamente brasileiras presentes no script do programa, essa edição deixou claro que o Manos & Minas continua sendo acima de tudo brasileiro.

Mostra tudo!

Jornal da Cultura, 27 de novembro

O texto que acompanhou as imagens dos que se aproveitaram da tragédia de Santa Catarina para saquear até uísque importado de um supermercado teve a dureza e a franqueza que a situação exigia, por maior que tenha sido a vergonha que nos causou. E as imagens, mostrando claramente quem estava se aproveitando daquele arrastão malandro, foram um exemplo perfeito de quando, em vez de proteger, o jornalismo tem o dever de identificar claramente quem comete um crime – no caso, acrescido de um insulto – contra uma cidade traumatizada.

Ziriguidum

Zoom, 25 de julho

O sensacional e hilariante curta de animação ‘Ziriguidum’, de Gabriel Prezoto, exibido no programa Zoom, nos deu um momento antológico em que a arte fez parceria perfeita com o humor ao retratar a guerra social carioca.

Fronteira difícil

Tal & Qual, 26 de agosto

O novo horário de exibição do Tal & Qual, no final da noite, é bem mais adequado à sua proposta de conteúdo. Os textos de introdução, apresentados pelo carismático Amaury Wilson, continuam revelando um saudável e criativo esforço para que os assuntos latino-americanos conquistem o telespectador médio brasileiro. Mas a contradição mais aguda do programa continua sendo sua incapacidade de transpor as sólidas fronteiras culturais, históricas, comportamentais e temáticas, que, queiramos ou não, existem entre nós, brasileiros, e nossos hermanos co-participantes do projeto.

Falta de sincronia

Sinal da TV Cultura na NET

Há uma desconfortável falta de sincronia entre áudio e vídeo para quem assiste a TV Cultura pela NET. Quando o conteúdo é uma fala mais longa ou uma reportagem sobre música – mostrando performances vocais e instrumentais, por exemplo – o problema passa a ser irritante, comprometendo completamente a comunicação. Será que nada pode ser feito?

Exagero

Jornal da Cultura, 9 de setembro

‘O universo pode acabar amanhã, quando o acelerador de partículas europeu começar a funcionar’. Esta manchete de abertura, ainda que imediatamente seguida da pergunta sobre se a afirmação era ficção ou realidade, não foi uma demonstração de equilíbrio jornalístico em relação ao início da experiência com o acelerador de partículas europeu. Afinal, um entrevistado do mesmo Jornal da Cultura, o físico José Goldenberg, minutos mais tarde, consideraria a especulação da manchete uma ‘bobagem’.

Derrapada

Metrópolis, 9 de setembro

No discurso surpreendentemente sério com que abriu a crônica sobre o que foi chamado de ‘cobertura exagerada da imprensa’, o grupo Massaroca abandonou o humor que o consagra e construiu uma tese no mínimo discutível, que inclui todo o trabalho dos jornalistas nos atentados de 11 de setembro de 2001 na categoria ‘circo’, classificando a movimentação da imprensa como uma ‘maratona de terror’ que teria feito ‘um bom aperitivo para os intervalos comerciais’. Em seguida, ao condenar o notório sensacionalismo que marcou o Caso Nardoni, o Massaroca erra na dose, classsificando o brutal assassinato da menina Isabela como um ‘evento privado’. Convicto de que humor é coisa séria, este ombudsman, imaginando estar acompanhando pelo menos de parte dos telespectadores, prefere o humor e a graça inteligente da crítica aos paparazzi do que as perigosas opiniões do Massaroca sobre o papel da imprensa nas tragédias da vida.

Medalha de bronze

Roda Viva 1 de setembro

A bancada superior vazia no cenário do Roda Viva com a atleta Maurren Maggi, passou uma sensação de abandono e desprestígio. Na mesma linha, a reportagem de apresentação da entrevistada não tinha nenhum som além da voz da narradora. Faltaram os sons do esporte e pelo menos uma das proféticas declarações que ela deu muito antes de conquistar ouro em Pequim. E, como quase sempre, faltou uma pergunta dos jornalistas presentes sobre o comportamento da mídia brasileira no tempo em que Maurren foi condenada e esquecida.

Questão de identidade

Nossa Língua, 21 de julho

O programa, principalmente na entrevista conduzida pelo professor Pasquale, é confuso no formato e no conteúdo. O convidado do dia, Heródoto Barbeiro, só falou, e muito pouco, sobre os segredos e armadilhas do texto no telejornalismo e no radiojornalismo – uma pauta automática num programa teoricamente voltado para a aventura da língua portuguesa – no terceiro e último bloco da entrevista. O problema é a identidade indefinida do Nossa Língua, ora um talk-show, ora uma aula de português de telecurso, ora uma revista musical para jovens. Alguém poderá dizer que a idéia é exatamente essa. Mas será que o telespectador, em casa, está entendendo dessa maneira?

Olha o som!

Especial Cultura Flip 2008, 21 de julho

Depois do ótimo clipe de abertura, todo o esforço de reexibir, num só programa, a produção das equipes da TV Cultura na Flip 2008 foi seriamente comprometido por um problema que se repetiu de forma desastrosa em praticamente todas as narrações de tradução de língua estrangeira: uma mixagem tão ruim que inviabilizou a compreensão da narração em português, que era sempre atropelada pelo áudio original em língua estrangeira. É difícil até compreender, num programa que não era ao vivo, como um problema técnico tão grave e gritante – pelo menos para quem assistiu via NET – não foi percebido a tempo pelos responsáveis. Aconteceu nas traduções das falas de Chimamanda Ngozi Adichie, Fernando Vellejo, Richard Price, Nathan Englander, Cees Nooteboom e Pierre Bayard. A entrevista de Cunha Jr com Neil Gaiman foi a única feita com estrangeiros em que a mixagem estava correta nos momentos de tradução.

Um programa intransponível

Roda Viva, 27 de outubro

A entrevista com o professor Luiz Gonzaga Belluzzo bateu todos os recordes de despreocupação com o caráter fundamentalmente eclético que um conteúdo de televisão aberta deveria ter. Expressões como ‘risco de desalavancagem dos hedge funds’, ‘contratos assimétricos em operações de balcão’ e ‘marcação ao mercado’, usadas em profusão pelo entrevistado e desconhecidas não apenas do chamado telespectador médio, mas até de 80% das redações da imprensa brasileira, dominaram a conversa, tornando-a, em grande parte, elitista, excludente e, não raro, incompreensível, mesmo para o público tradicionalmente mais preparado do Roda Viva.

Tudo sobre animais

Tudo sobre animais, 30 de julho

A decisão da TV Cultura de exibir a série da BBC no horário nobre deveria ser acompanhada de uma adaptação do texto e da narração do original inglês para o público mais heterogêneo do horário nobre. Ainda que seguindo o tom do original da BBC, o tratamento às vezes infantilóide do texto certamente espantou um expressivo contingente que, de acordo com as pesquisas, costuma não perder esse tipo de conteúdo quando ele está disponível na TV aberta.

Entrevista mono

Móbile, 26 de novembro

Lima Duarte deu mais um show na entrevista a Fernando Faro. O que é difícil de compreender é que a entrevista não tenha sido a abertura do Móbile e que, em não sendo, não ter merecido uma chamada antes do difícil ‘Os móbiles e estábiles de Nelson de Magalhães’, monólogo ilustrado de 4m23s que abriu o programa. Por conta dessa inversão – e da falta da chamada para a entrevista de Lima Duarte – a média de audiência do programa certamente foi menor. E continua sendo difícil entender, também, a razão pela qual o telespectador, mais uma vez, não teve o privilégio de ouvir a voz (e o conteúdo) de Fernando Faro durante a entrevista, até mesmo nos momentos em que Lima Duarte inverteu o jogo e começou a fazer perguntas para ele.

Masterização muda

Radiola, 28 de julho

Uma ausência sentida e, no caso, fundamental, na ‘auto-entrevista’ do especialista em masterização Carlos Freitas foi, por mais insólito que pareça, a música. A edição não teve um frame sequer de inserções emblemáticas dos tipos de música e sons (ingleses e brasileiros) citados por ele.

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Caixa de mensagens

(Roda Viva, 15/1/09)

Em relação à ausência de legendas durante parte do Roda Viva de 12 de janeiro passado com a executiva da BBC Jana Bennett, o diretor de produção da TV Cultura, Marcelo Amiky, enviou mensagem em que considera a ocorrência ‘gravíssima’ e informa sobre as providências que tomou. Transcrevo os trechos que considero necessários para que o telespectador surpreendido com o problema tenha uma idéia aproximada do que aconteceu do ponto de vista operacional quando uma versão sem legendas da entrevista foi ao ar, no primeiro terço do programa:

‘A fita originalmente exibida foi enviada equivocadamente pelo trafego de fitas com um número diferente do oficialmente registrado no roteiro do departamento de programação. Este fato se deu por um voluntarismo do responsável pelo envio das fitas para exibição. (…) Em duas outras etapas do processo, poderíamos ter corrigido a falha, uma ainda no tráfego e outra na checagem de exibição, que ocorre na véspera, o que também não aconteceu. Os dois responsáveis (do trafego de fitas e do controle mestre) assumiram não terem detectado o problema e foram devidamente advertidos’.

‘Como estamos mudando nossa estrutura de exibição ainda neste mês de janeiro, vamos também contemplar um sistema mais eficaz de monitoramento de nossas transmissões, não só no que diz respeito à qualidade técnica (Closed caption, legendagem, áudio etc), mas também no que se refere ao sinal da TV Cultura em outros sistemas de transmissão, como o cabo (NET, TV Alphavile etc) e satélite (SKY, Direct TV), que vêm apresentando inúmeros problemas’.

‘Fizemos também uma reavaliação do processo de exibição de nossos conteúdos, atualmente em transformação devido à entrada das novas tecnologias de armazenamento de mídias em storage (tapeless), e estamos aumentando o nível de segurança, para que falhas como essa não possam mais acontecer’. (Ass. Marcelo Amiky)

Nassif

Em atenção às mensagens de telespectadores com protestos ou pedidos de explicações sobre a não renovação do contrato da TV Cultura com o jornalista Luis Nassif e considerando que algumas dessas mensagens continham referências a supostas pressões políticas e governamentais, pedi que a presidência da Fundação Padre Anchieta se manifestasse. Transcrevo abaixo a íntegra da resposta da FPA, a mesma que a direção da emissora enviou ao site ‘Comunique-se’ através da Gerência de Comunicação Corporativa:

‘A propósito do noticiário sobre a não-renovação do contrato do jornalista Luis Nassif, a Fundação Padre Anchieta esclarece que:

O contrato de Luis Nassif, iniciado em 1º de março de 2008 e com vigência até 28 de fevereiro de 2009, estabelece que o jornalista fará comentários sobre economia para o ‘Jornal da Cultura’, e que são de responsabilidade da FPA, contratante, ‘a concepção, organização e definição do conteúdo final dos trabalhos’.

Foi estabelecido de comum acordo que a participação de Luis Nassif no ‘Jornal da Cultura’ ocorre em dias não-especificados, por solicitação da direção do jornal, quando o noticiário exige.

Têm sido freqüentes, ao longo do período de vigência do contrato, as situações em que a direção do ‘Jornal da Cultura’ solicita a presença do jornalista e ele não está disponível, em razão de viagens ou outros compromissos profissionais. Isso obriga o jornal a adequar-se às conveniências de seu colaborador e não o contrário, como seria de esperar.

Independente dessa circunstância, o ‘Jornal da Cultura’ vem sendo reformulado paulatinamente desde meados de 2008, com a ampliação do volume de notícias e a redução do tempo para comentários. Em decorrência, vem eliminando os comentaristas fixos, de qualquer área de especialização, recorrendo a eles apenas eventualmente, quando indispensáveis.

São fatores editoriais e administrativos, portanto, que lastreiam a decisão de não renovar o contrato de Luis Nassif, o que nada tem a ver com as posições expressas pelo jornalista em seus comentários.

Jamais, ao longo da atual gestão presidida por Paulo Markun, a FPA exerceu qualquer tipo de censura sobre Luis Nassif ou outros colaboradores, não sendo também da prática da instituição contratar ou dispensar pessoas por critérios ideológicos.

Dessa forma, não há qualquer fundamento na suposição de que o contrato de Luis Nassif não será renovado por razões políticas ou pressões externas sobre a FPA. A autonomia gerencial e editorial da instituição é assegurada em lei e sua direção empenha-se em preservá-la.’

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Discuta depois de ler

(Roda Viva, 12/1/09)

A entrevista com Jana Bennett, a principal executiva da BBC – um Roda Viva inspirador tanto para os telespectadores interessados no tema da televisão pública quanto para os profissionais responsáveis pelo conteúdo da TV Cultura – começou, infelizmente, com uma falha lamentável e incompreensível para um programa gravado em outubro de 2008.

Depois de seis minutos de introdução que incluíram a apresentação da entrevistada, uma reportagem informativa sobre a história e a importância da BBC, a apresentação dos entrevistadores convidados – Nelson Hoineff, do Instituto de Estudos de Televisão, Patrícia Kogut, colunista do Globo, Lúcia Araújo, do Canal Futura, e Eugênio Bucci – e uma pergunta inicial de Lillian Witte Fibe, o telespectador se viu diante de uma entrevistada que respondia em inglês e não tinha sua fala traduzida por legendas.

Durante os intermináveis oito minutos e meio durante os quais não houve legendas nas respostas de Jana Bennett, quem não domina o inglês ficou sem saber que ela atribui o sucesso da BBC não apenas ao histórico de credibilidade e ao olhar cosmopolita do jornalismo da emissora, mas também às parcerias que o conglomerado fez ao longo dos anos com produtores respeitados do mundo todo.

Também por causa da falta de legendas, ficou sem tradução a informação de Jana de que a BBC está redefinindo sua relação com o telespectador por causa da Internet, o que inclui colocar os programas da emissora na rede por uma semana. E que, ao contrário do que se supõe, Jana considera o papel da TV pública ainda maior e mais importante nos dias de hoje, pela necessidade de entendermos o mundo complexo que nos rodeia e pelo compromisso fundamental que esse tipo de televisão tem num ambiente de comunicação cada vez mais competitivo.

Nelson Hoineff sugeriu que Jana falasse sobre a polêmica em torno da criação da TV Brasil e a distância deste projeto em relação ao bem-sucedido modelo da BBC. A executiva, ainda sem tradução para as legendas, reconheceu que a independência comercial talvez seja um privilégio da BBC, já que, ao contrário do que acontece em outros países, são os interesses comerciais que rodeiam a emissora – tentando anunciar produtos para seu imenso público – e não o contrário. Referindo-se à adoção, em outros países, da taxa anual de TV em vigor há décadas na Inglaterra, Jana, no entanto, acrescentou: ‘Tudo depende da decisão social de cada país’.

Falta temporária de legendas à parte, o programa foi tão rico em conceitos relacionados à televisão pública que este ombudsman pede licença ao telespectador para se alongar um pouco mais neste comentário, dividindo-o em tópicos:

Origens diferentes

Jana Bennett disse que a ‘television license’ paga pelos telespectadores britânicos representa de 92 a 93 por cento do orçamento anual equivalente a 3,65 bilhões de reais da BBC, acrescentando que o sistema ‘dá tão certo que a concorrência prefere não ver a BBC captando anúncios’. Ela fez questão de ressaltar, no entanto, que o contexto histórico e as origens da BBC, fundada e consolidada sem ter concorrentes comerciais, não permitem comparação com os desafios da TV pública brasileira e o ‘ambiente comercial’ em que ela atua.

Reality shows

Ao contrário do que muitos poderiam pensar, a BBC também tem os seus reality shows. Nas palavras de Jana, ‘a idéia de as pessoas fazerem parte da televisão é boa e estimulante’. Como, segundo ela, foi o programa que levou um grupo de vorazes consumidores ingleses de roupas à Índia, local das confecções, para que eles conhecessem as péssimas condições de trabalho em que as roupas eram produzidas. Desse modo, os participantes do reality show da BBC conviveram com os trabalhadores e suas famílias por algumas semanas, vivenciando, na pele, a real globalização, o preço da moda e também a cultura de um povo diferente do inglês.

De acordo com Jana, ‘o programa foi ao mesmo tempo educativo, interessante e divertido, atraindo grande audiência e provocando muita discussão, além de mudar a vida de algumas pessoas.’ Jana, no entanto, ressalvou: ‘Isso não é a mesma coisa que ver pessoas gritando umas com as outras, procurando um namorado ou uma namorada’.

Independência

O sistema que protege o corpo gerencial da BBC de influências ou interferências governamentais no conteúdo da emissora funciona através do chamado BBC Trust, uma instância independente da sociedade – ainda que selecionada por um comitê bipartidário – que regula e supervisiona o conglomerado em nome do interesse público. É ao BBC Trust que a BBC se reporta para explicar, depois – e não antes da exibição dos programas – suas decisões polêmicas sobre conteúdo como a cobertura guerras e conflitos.

TV aberta, os jovens e as outras mídias

A entrevistada, sem querer se arriscar a prever como o público vai se comportar diante da TV daqui a 5 ou 10 anos, disse que a estratégia da BBC é incorporar novas formas de produzir e assistir televisão, levando-a para onde o público pode estar e não apenas esperando que ele fique sentado na frente da TV’. Sobre a audiência dos jovens, Jana foi otimista:

‘Eles amam televisão, mas nós precisamos fazer mais o tipo de televisão que eles adoram, com comédias, um entretenimento importante, e tornar a dramaturgia atraente para eles, sem sermos sensacionalistas ou fazendo as coisas mais fáceis ou previsíveis, mas continuando a surpreendê-los e encontrando maneiras de estar na Internet e nos celulares’.

A estratégia da BBC, segundo Jana, inclui os games:

‘Não investiremos tanto quanto a indústria de jogos, mas devemos ter algumas áreas na Internet em que os jovens possam jogar, ainda que com conteúdo sério. Alguns elementos dos games são importantes para pensarmos como a TV pode mudar no futuro’.

O telespectador

A entrevistada disse que a BBC não se esquece de que ‘há programas a que as pessoas querem apenas assistir, sem interagir com nada’. Na área de teledramaturgia e ficção, por exemplo, ela acredita que o público ‘quer apenas uma boa história’. Já quando se trata de entretenimento, as pessoas, disse ela, ‘querem votar, interagir e ajudar nas escolhas’. A Internet, segundo Jana, ‘é um bom lugar para comédias, risadas e piadas, e tem um humor fantásticoi, gerado por comunidades.’

O valor público da BBC

Na resposta a Lúcia Araújo sobre como a BBC mede o seu próprio valor público, Jana Bennett disse que ‘o critério não é se algo é ou não lucrativo, mas saber se as pessoas estão recebendo algo de qualidade e se a BBC está chegando até o público’. A explicação:

‘Acreditamos que o alcance é mais importante do que o índice de audiência. Queremos chegar a todos, pois todos estão nos pagando. Precisamos atingir vários tipos de público, o que explica nossa programação de sábado à noite, por exemplo. Nós a fazemos para que uma família possa se reunir e assistir algo que interesse a todos. Isso é muito importante’.

Jana citou ainda, como outros critérios para medir o valor público da BBC, a qualidade dos programas, a utilidade da programação da emissora na vida do telespectador e a intensidade do uso dos conteúdos da BBC para Internet, rádio e televisão em todas as residências que pagam a licença de televisão.

Conteúdo ou audiência?

Nelson Hoineff pediu uma explicação de Jana Bennett para o prestígio mundial da BBC, em contraposição ao conceito de que a televisão ‘é um meio efêmero e um veículo de segunda classe’. Além do histórico de grandes investimentos que a Inglaterra sempre fez em televisão, Jana apontou, como pista para entender o sucesso da emissora, uma filosofia de conteúdo nada eletista:

‘Não vemos muita diferença entre ter qualidade em entretenimento ou em dramaturgia e ter seriedade. As coisas, entretenimento e seriedade, caminham juntas para atingir o maior público possível. Há uma frase genial de um ex-diretor da BBC que disse que a emissora transforma o bom em popular e o popular em bom. Até o mais popular dos programas não precisa ser tolo. Ele pode ser inteligente, bem-feito e envolver vários talentos. Por outro lado, podemos ter um programa bastante sério e fazê-lo de forma a entreter’.

No final do programa, Jana Bennett definiu a televisão como ‘um excelente meio de comunicação de massa por meio do qual todos podem partilhar qualidade de maneiras diferentes’. E, sem parecer estar querendo agradar a bancada de entrevistadores e o público do Roda Viva, deixou uma pulga atrás das nossas orelhas:

‘Não creio que só a Grã-Bretanha leve a TV a sério. O Brasil me parece ter uma cultura televisiva bastante séria’.’