Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Ernesto Rodrigues

‘ALTOS

Modelito diferente

Roda Viva, 29 de junho

Quem acompanhou o Roda Viva com a escritora, empresária e consultora Glorinha Kalil não deve ter tido grande dificuldade para entender a razão pela qual ela é titular de um dos quadros do programa Fantástico, da TV Globo. E antes que a afirmação acima seja interpretada, por setores menos tolerantes do fiel público do programa, como uma crítica irônica e velada deste ombudsman à decisão do Roda Viva de entrevistá-la, é bom esclarecer que o objetivo é bem outro: saudar o ecletismo da pauta do programa e a maneira inteligente e elegante com que a entrevistada respondeu à proposta de se discutir moda e etiqueta sob uma perspectiva menos frívola e anoréxica que a das passarelas das fashion weeks que acabam de mobilizar a mídia do eixo Rio-São Paulo.

Fora de si

Nossa Língua, 13 de julho

Um momento de excelência em matéria de humor e conteúdo didático na edição do Nossa Língua de 13 de julho: o ‘telejornal’ em que o ator Felipe Reis, no impagável papel de Gélson Babosa, apresentador do noticiário, e o professor Pasquale Cipro Neto, abordaram a falta de concordância proposital de Arnaldo Antunes na letra da música ‘Fora de si’.

O amor segundo Beto Rockfeller

Cultura 40 anos

A diferença de Beto Rockfelller – novela lembrada no Especial Cultura 40 anos de 16 de julho – para outras experiências da época e atuais feitas em nome de uma nova teledramaturgia, foi a de ter não apenas transformado conceitos, processos e métodos de realização de telenovela: mesmo sendo revolucionária, ela teve um impacto imenso de audiência. Foi e continua sendo um modelo inspirador para autores e realizadores que se sentem destinados a mudar ‘tudo isso que está aí’.

A lamentar, apenas a tímida ligação do conteúdo do programa de 1979 com os tempos atuais, através da ancoragem de um Antonio Abujamra pouco solicitado em tudo o que ele é capaz de fazer diante de uma câmera. Um programa como esse, assim a maioria dos que têm sido reprisados nas comemorações dos 40 anos da TV Cultura, merecia dialogar um pouco mais com a produção e os realizadores atuais.

A TV que faz bem

Roda Viva, 20 de julho

Para os telespectadores da TV aberta – infelizmente, no caso, apenas aqueles alfabetizados capazes de acompanhar as legendas que traduziram as respostas de Talese – o Roda Viva gravado com o jornalista e escritor em 7 de julho e exibido dia 20, longe de estar chegando ‘por último’ num assunto, foi uma preciosa oportunidade para que milhares de cidadãos não só conhecessem o jornalista e escritor americano mas, principalmente, testemunhassem um debate interessante sobre a ética, a pratica, a lógica e os desafios atuais do jornalismo. Só por essa democrática distribuição de um conteúdo tão importante, interessante e raro na TV aberta, o Roda Viva com Talese já seria justificável, para não dizer obrigatório, considerando-se a tradição e o currículo do programa.

Saúde!

Jornal da Cultura, 21 de julho

O Jornal da Cultura produziu uma matéria na qual o repórter Ricardo Ferraz mostrava a diferença entre o que se poderia chamar de higiene do pânico e a higiene consciente e preventiva em relação a todas as doenças bacterianas e virais que nos ameaçam no cotidiano. Tanto para a nova gripe quanto para as outras doenças que matam muito mais que ela, a matéria mostra que o grande segredo para aumentar nossas chances contra elas continua sendo o velho e bom costume de lavar as mãos.

Guia das profissões

Pé na Rua, 23 de julho

Receita infalível para plantar uma enorme dúvida na cabeça dos críticos que tentam reduzir os rappers brasileiros à condição de iletrados deslumbrados com os originais americanos e equivocados ideológica e culturalmente: assistir ao quadro ‘Profissa’ no qual o programa Pé na Rua fez uma radiografia dessa profissão ainda desconhecida de muita gente. Ao contrário do estereótipo que se tornou um estigma, Fabio Luiz é articulado e faz questão de respeitar todas as regras do bom português. Diz que é admirador de Dostoievisky, Machado de Assis e Sartre e tem, como ídolos na área musical, Quincy Jones e Herbie Hancock.

BAIXOS

O fim do Pé na Rua

Em resposta à sugestão feita aqui para que os telespectadores tivessem mais informações sobre as razões do fim do programa Pé na Rua – respeitados os limites naturais e legítimos que justificam o sigilo sobre informações de ordem interna, administrativa e estratégica da TV Cultura – o coordenador de Conteúdo e Qualidade, Gabiel Priolli, informou que considera o assunto encerrado. Uma pena. E mais alguns corpos de separação entre quem faz e quem recebe os conteúdos da emissora…

Tombo na passarela

Roda Viva, 29 de junho

A lamentar, e muito, para quem acompanhou a retransmissão da entrevista pela televisão, no horário tradicional do Roda Viva, o fato de o programa ter sido atingido abruptamente por um longo break comercial que interrompeu, pelo meio, uma frase de Glorinha Kalil. A lamentar, ainda, a solução dada ao problema: na volta do intervalo comercial, o trecho interrompido da entrevista simplesmente não foi retomado. E ficamos por isso mesmo…

A obsessão de Abu

Provocações, 10 de julho

Cabe registrar aqui a estranheza de um comportamento cada vez mais previsível – e igualmente incompreensível – de Antonio Abujamra, quando o entrevistado do dia tem a infelicidade de ostentar, no currículo, a condição de jornalista. A obstinação com que Abujamra tenta arrancar de seus convidados jornalistas a confissão de que o que fazem não tem ética chama atenção, por superar, em intensidade e freqüência, as provocações que Abujamra faz regularmente com outras categorias profissionais. Incluindo, todos sabemos, sua querida classe teatral.

O amor segundo B. Schianberg

Direções

Se o objetivo da minissérie ‘O amor segundo B. Schianberg’ não era audiência, como disse à Folha de S. Paulo o diretor da TV Cultura responsável pela exibição da minissérie, qual a justificativa para exibir um conteúdo como esse num horário durante o qual milhares de pessoas buscam alternativas interessantes, ricas e saborosas para a programação dominical das redes comerciais? Qual o sentido de exibir um clássico laboratório de teledramaturgia como se fosse obra acabada, além da soberba que se camufla no biombo esgarçado da liberdade de expressão?

A satisfação intelectual e estética do telespectador, por este critério, não é problema do artista ou da emissora. Ao contrário, o que se propõe, indiretamente, é que o telespectador, por ser praticamente dispensável nesse processo, simplesmente procure outro canal. E, sob pena de ser considerado ignorante ou esteticamente insensível, não se atreva a desconfiar que a TV Cultura, muitas vezes, compra – e passa pra frente, com sua conceituada chancela – o caótico como se fosse o complexo, o confuso como se fosse o flexível, o incompreensível como se fosse o sofisticado e o equívoco como se fosse vanguarda.

Macacos

Jornal da Cultura, 21 de julho

O flagrante do assalto dos macacos de um zoológico da Inglaterra ao porta-malas e ao bagageiro do carro de uma família visitante tinha um impacto inegável, pela inusitada semelhança do gesto dos babuínos com o que fazem muitas gangues de humanos ao redor do mundo. Por isso mesmo, a imagem era merecedora de espaço em qualquer telejornal do planeta. Jamais, no entanto, nas manchetes de abertura, ao lado de tantos fatos graves do dia.

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Conteúdo sustentável, 6 de agosto

Vale a pena registrar, em detalhes, um momento emblemático do tipo de abordagem franca, abrangente e efetivamente não excludente que, na opinião deste ombudsman, deveria permear todos os programas dedicados à questão da sustentabilidade e destinados ao público múltiplo, não engajado e culturalmente desigual da TV aberta brasileira.

Aconteceu durante um quadro, sob o bem-humorado título ‘Eco sem saída’, no episódio do Ecopratico que mostra a incursão da equipe do programa na ampla e moderna casa da família Ribas, no bairro do Butantã, em São Paulo. A apresentadora pergunta:

‘Produtos orgânicos ou industrializados? Qual é a prioridade aqui nesta casa?’

O dono da casa, Roberto, dispara:

‘A prioridade é a realidade. Alimento orgânico é uma fantasia que as pessoas fazem, achando que aquilo é uma solução. Não é uma solução porque você não consegue produzir alimento para bilhões de pessoas com cultivo orgânico. Por mais que a gente não goste dos defensivos agrícolas, é a maneira que o mundo escolheu e encontrou para não passar fome’.

Logo depois, a mulher de Roberto, Margot, entra na conversa:

‘Uma vida boa, uma vida de qualidade, é pra poucos. Mas o que a gente almeja que um dia seja para todos. Não é por isso que a gente não vai querer uma vida boa e de qualidade. Infelizmente, na minha opinião, o luxo que é a comida orgânica é para poucos. Não é por isso que a gente não tem que batalhar para que ele um dia seja para todos’.

No momento seguinte, Zuzu, a especialista em sustentabilidade do Ecopratico, contextualiza:

‘Sustentabilidade é um a palavra nova. Há muito pouco tempo o homem passou a questionar suas atitudes frente à natureza. E rapidamente destruímos patrimônios que levaram milhões de anos para serem formados. As contradições são muitas. Temos mais perguntas que respostas. Ainda caminhamos na direção de equilibrar ecologia com economia. Quando pagamos mais por um produto ecológico, ele deveria equacionar este dilema. As soluções tecnológicas estão aí, mas nem todas passaram pela prova do tempo.

Temos opções, por exemplo, para substituir as telhas de amianto, mas será que as novas telhas, feitas de material reciclável, são duradouras e resistentes? E o velho telhado de barro, extremamente eficiente do ponto de vista térmico, mas que exige um consumo de madeira muito maior?

Estamos em fase de testes. Pesquise, descubra como você pode fazer a sua parte. Experimente tecnologias ecológicas desde que sejam econômicas para você.’

Não poderia haver algo mais sustentável, pelo menos em matéria de programas ecológicos feitos para a TV aberta.

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O fim do Pé na Rua, 5 de agosto

As explicações dadas aqui neste espaço pelo coordenador do Núcleo de Conteúdo e Qualidade da TV Cultura, Gabriel Priolli, sobre a retirada do ar do programa Pé na Rua, foram assunto de uma série de novos emails nos quais os telespectadores questionaram as razões de ordem orçamentária apresentadas por ele. Este ombudsman também recebeu uma mensagem de Anna Terra, diretora do Pé na Rua até a última edição do programa e já desligada da emissora. Ela contesta as razões financeiras, alegando que o programa não desestabilizava o orçamento da emissora.

Em função da inegável repercussão do fim do Pé na Rua, considero importante que Gabriel Priolli volte ao assunto e, respeitados os limites naturais e legítimos que justificam o sigilo sobre informações de ordem interna, administrativa e estratégica da TV Cultura, compartilhe com os telespectadores, da forma mais detalhada possível, as razões, prioridades e contingências que o levaram à decisão de tirar o programa do ar.

Pane

Por um bom período, no início da noite desta terça, 4 de agosto, durante um episódio da série ‘Tudo que é sólido pode derreter’, quem sintonizava a TV Cultura através da NET, pelo menos no Rio de Janeiro, só teve o áudio. Na tela, o que aparecia era um mosaico típico dos travamentos de sinal digital. Foram longos e intermináveis minutos que certamente causaram grande irritação entre os admiradores da série.

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As razões do corte, 3 de agosto

Transcrevo mensagem recebida do coordenador de Conteúdo e Qualidade da TV Cultura, Gabriel Priolli, sobre a decisão da emissora de retirar o programa Pé na Rua do ar:

Caro Ernesto,

Em respeito às manifestações dos nossos telespectadores, que estranham o cancelamento do programa ‘Pé na Rua’ e solicitam o seu retorno à grade de programação da TV Cultura, a direção da emissora tem a informar que lamenta não poder mantê-lo neste momento. A despeito de sua notória qualidade, da qual sempre nos orgulhamos, o ‘Pé na Rua’ mobiliza um grande volume recursos operacionais e financeiros, que não é possível manter alocados nele, sem afetar o nosso equilíbrio orçamentário. Para melhor utilização desses recursos, eles serão redistribuídos e, em parte, aplicados em um novo programa, também diário, também voltado ao público jovem, que estreará no final do mês de agosto em curso.

Quando for possível, o que só poderá ocorrer a médio prazo, a direção da emissora considerará o retorno do ‘Pé na Rua’, como anseia uma expressiva parcela do nosso público. Mas, até que isso possa se viabilizar, ficará do programa, para a TV Cultura, o seu exemplo de criatividade, inteligência e qualidade, a inspirar as atuais e as futuras produções da emissora.

Abraço

Gabriel Priolli

As razões de ordem orçamentária são claras. E aumentam exponencialmente a expectativa sobre a difícil tarefa que a emissora se impôs de substituir satisfatoriamente um programa tão bom e tão querido como o Pé na Rua.’