Tuesday, 19 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1279

Marcelo Beraba

‘A Folha recebe, a partir de hoje, ombudsmans da África do Sul, Austrália, Brasil, Canadá, Colômbia, Dinamarca, Estados Unidos, Holanda, Grã-Bretanha, Portugal, Suécia e Turquia para a 26ª Conferência Anual da Organization of News Ombudsmen, a organização mundial de defensores de leitores de jornais e revistas e de ouvintes e telespectadores de rádios e TVs.

É a primeira vez que o encontro ocorre além dos limites da América do Norte e da Europa. De 1981, quando realizou a primeira conferência, até 1996, EUA e Canadá sediaram todos os encontros. A partir de 1997 foram realizadas conferências em Barcelona, Paris (2001), Istambul (2003), Londres (2006) e, agora, em São Paulo.

O objetivo principal da realização da conferência no Brasil é chamar a atenção para um dos instrumentos de auto-regulação e vigilância da mídia. Poucos jornais, revistas, rádios e TVs do mundo, e menos ainda na América do Sul, adotaram a função de ombudsman na intermediação com seus leitores e ouvintes e com a sociedade.

O trabalho de ombudsman surge da necessidade que a imprensa tem de buscar credibilidade, de acolher e dar espaço para os leitores e de assimilar a pressão crescente da sociedade por ‘exatidão, imparcialidade e equilíbrio’, para usar palavras da própria ONO. Mas, duas observações:

1 – O ombudsman não é a única iniciativa disponível de auto-regulação. Algumas empresas adotam conselhos de leitores, fazem pesquisas com a audiência, abrem espaço para cartas e artigos, têm profissionais responsáveis por criticar internamente o produto e criaram espaços para a correção de erros.

Um dos problemas sérios da imprensa brasileira, e que afeta a sua credibilidade mais do que as empresas avaliam, é a dificuldade de garantir o contraditório e de reconhecer erros. Não é necessário um ombudsman para que a correção pública de erros vire rotina ou para que seja garantido o direito de todos os interesses envolvidos se manifestarem. Só é preciso respeito e vontade editorial.

2 – Não basta nomear um ombudsman. A função só tem algum sentido se as empresas assumirem publicamente o compromisso com valores éticos e com uma linha editorial clara e se garantirem total independência profissional. No caso da Folha, o ombudsman, criado em 1989, foi mais uma das iniciativas assumidas pelo jornal que se comprometeu, através do ‘Manual da Redação’ e do Projeto Editorial, com o exercício de um jornalismo crítico, apartidário, pluralista e moderno. O jornalismo que pratica está de acordo com esses valores? A crítica do ombudsman não se resume a esses pontos, mas deve tê-los como referência permanente.

Por fim, uma questão recorrente: por que mais jornais (além da Folha, de ‘O Povo’, de Fortaleza, e do ‘Jornal da Cidade’, de Bauru), rádios (além da Bandeirantes, de São Paulo, e da Radiobrás) e TVs (além da Cultura, de São Paulo) do Brasil não têm ombudsmans? São várias as razões, mas creio que as principais sejam três: a arrogância de jornalistas e de empresas jornalísticas que acham que estão acima das críticas, não suportam pressões e não admitem o reconhecimento do erro; as dificuldades que as empresas têm, por conta de seus interesses políticos e econômicos, de garantir autonomia e independência aos ombudsmans; e a descrença de muitos na eficácia da função.’

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‘Os observadores’, copyright Folha de S. Paulo, 7/5/06.

‘A conferência anual de ombudsmans coincide com as comemorações dos dez anos na internet do Observatório da Imprensa, principal organização de monitoramento da mídia brasileira.

É curioso que os personagens principais dos dois eventos, Folha e Alberto Dines, tenham estado juntos na primeira experiência de crítica da imprensa, o ‘Jornal dos Jornais’, editado por ele na Folha de 1975 a 1977.

Lá se vão, portanto, 30 anos. Três décadas de grandes transformações no Estado brasileiro, na sociedade e na imprensa. O país saiu de uma ditadura militar para um regime democrático, e uma das mudanças mais interessantes a que assistimos é exatamente no relacionamento da sociedade com os meios.

A imprensa vive hoje sob saudável pressão dos seus leitores, telespectadores e ouvintes e da sociedade. Um dos instrumentos de pressão disseminados a partir da segunda metade da década de 1990 são os institutos de monitoramento.

No Brasil, a referência principal é o Observatório da Imprensa, mas outros institutos conseguem aos poucos se firmar, como a Agência de Notícias dos Direitos da Infância, a Transparência Brasil, o Observatório Brasileiro de Mídia, o Laboratório Doxa e o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, para citar os que conheço por já ter recorrido a eles.
São iniciativas que surgem como questionamento ao modelo de comunicação altamente concentrador de que dispomos e por entenderem que a imprensa tem um papel fundamental na construção da cidadania. Por isso, eles vigiam a cobertura jornalística de temas como desigualdade social, corrupção, violência e processo eleitoral.

A imprensa ainda não está acostumada a escutar essas novas vozes e freqüentemente procura ignorá-las ou desqualificá-las.

Não acho que elas estejam sempre certas nas críticas que fazem, principalmente quando se deixam contaminar por visões partidárias, mas devem ser ouvidas. Elas expressam pontos de vistas diferentes dos que predominam nas redações, procuram fazer uma crítica objetiva a partir de levantamentos estatísticos e de tendências e, mais importante, têm como objetivo melhorar os veículos.’



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‘A ONO – A busca da credibilidade’, copyright Folha de S. Paulo, 7/5/06.

‘Reproduzo, do site da ONO (Organization of News Ombudsmen), dois tópicos que informam sobre a função do ombudsman e os objetivos da instituição.

** Por que um jornal ou emissora devem ter um ombudsman?

Para melhorar a qualidade das reportagens, através de exatidão, imparcialidade e equilíbrio.
Para auxiliar o provedor do serviço noticiário a ser mais acessível e passível de responsabilização perante leitores ou integrantes de seu público, permitindo-lhes assim adquirir maior credibilidade.

Para aumentar o conhecimento dos profissionais dos veículos de comunicação em relação às preocupações do público.

Para economizar tempo aos publishers, editores e diretores das empresas de rádio, televisão e jornais, encaminhando queixas e outras consultas a um profissional responsável por isso.
Para solucionar algumas reclamações que, não fosse esse o caminho, poderiam ser encaminhadas a advogados e resultar em processos judiciais custosos.

** Quais são as finalidades da ONO?

Ajudar a profissão do jornalismo a alcançar e manter padrões éticos elevados nas reportagens, valorizando desse modo sua própria credibilidade entre as pessoas atendidas.
Estabelecer e aperfeiçoar padrões para a função do ombudsman da mídia ou representante do leitor.

Auxiliar na adoção mais generalizada do cargo de ombudsman da mídia em jornais e outros veículos de comunicação.

Propiciar um fórum para a troca de experiências, informações e idéias entre seus membros.
Cultivar contatos com publishers, editores, conselhos de imprensa e outras organizações profissionais, indicar palestrantes para instituições que tenham interesse no assunto e responder a consultas da mídia. [Tradução de Cláudia Strauch]’