Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Plínio Bortolotti

Nesta semana, estiveram em Fortaleza dois representantes do Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), Carlos Lauría (coordenador para as Américas) e Sauro Gonzalez Rodrigues (pesquisador). O CPJ é uma organização independente, sem fins lucrativos, fundada em 1981, e tem como objetivo promover a liberdade de imprensa, defendendo os jornalistas para que estes possam trabalhar livre de represálias e ameaças, sejam governamentais, judiciais ou de grupos privados. O CPJ tem sede em Nova York, acompanhando a situação da imprensa em todos os continentes (www.cpj.org).

A visita do CPJ ao Ceará e também a Pernambuco teve o objetivo de preparar um informe especial sobre a liberdade de imprensa e a situação dos jornalistas nos dois estados. Em seu trabalho de pesquisa, os representantes do CPJ falaram com repórteres e editores de jornais impressos, rádio e TV; consultaram entidades de direitos humanos e professores de jornalismo. Além de verificar essas questões gerais, a visita aos estados nordestinos teve o objetivo de aprofundar a análise sobre dois casos específicos: o assassinato dos radialistas Nicanor Linhares, em Limoeiro do Norte (2003), e de José Carlos Araújo, na cidade pernambucana de Timbaúba (2004). Lauría considera ‘emblemáticos’ esses dois casos, pois observa que a violência contra os jornalistas no Brasil acontece mais no interior do País, principalmente no Norte, Nordeste e regiões fronteiriças com o Paraguai. ‘Nos grandes centros urbanos, os jornalistas podem investigar temas de corrupção e criticar autoridades sem temer por suas vidas, mas nas áreas mais distantes, onde o poder do governo central é débil ou inexistente, eles ficam à mercê da violência’.

Mas Lauría também destaca que a forma de operar das estações de rádio no interior do Brasil ‘é muito particular’. Para ele, fica difícil estabelecer se o que os radialistas, em sua maioria, fazem é ‘jornalismo, propaganda política ou uma mistura de ambos’. Segundo Sauro Gonzalez, no caso de Nicanor Linhares, ‘ainda não há elementos suficientes para afirmar se ele foi assassinato somente por sua atividade jornalística ou se existem outras implicações. Tudo indica que a violência sofrida foi devido a denúncias que ele fazia contra autoridades, mas as investigações precisam ser aprofundadas’.

Lauría não vê possibilidade de fazer jornalismo com autonomia no interior do País, estando as rádios, os principais meios de comunicação, sob controle de grupos políticos. ‘Se o dono da rádio é um político, não vai querer saber de jornalismo independente.’ Ele também vê como agravante a baixa qualificação profissional: ‘Os radialistas fazem um curso de duas semanas e transformam-se em jornalistas.’

Anualmente, o CPJ divulga um relatório sobre as condições da liberdade de imprensa em todo o mundo, país a país, relacionando os jornalistas ameaçados e os que foram mortos no exercício da profissão. A organização também lista ocorrências com necessidade de investigações mais aprofundadas, pois fixa-se na denúncia dos casos em que a violência relaciona-se à tentativa de impedir o trabalho jornalístico.

O nome, de novo

O título da matéria, publicada na edição de sexta-feira (pág. 7), foi Pedagogo denuncia ter sido alvo de racismo em supermercado. Mas quem ler a notícia não ficará sabendo que o caso se passou em uma das lojas da rede de supermercados Extra. Paulo Roberto de Souza Silva e sua mulher, ambos negros, foram detidos por policias civis, acionados pela administração do supermercado, quando compravam um computador na loja do bairro Montese, usando um cartão de débito automático em conta bancária. O motivo alegado pela empresa para ter chamado a polícia foi uma suposta divergência entre o número do cartão apresentado e o comprovante que saiu impresso na hora do pagamento.

Segundo a administração, em casos assim, o ‘procedimento’ da empresa seria avisar a polícia. Sob suspeita de estelionato, o casal foi levado à delegacia, onde o caso se esclareceu. Paulo Roberto disse ao O Povo que, no supermercado, não teve nem mesmo a oportunidade de mostrar contracheques e crachá da instituição para a qual trabalha, nem extratos bancários de sua conta, de forma a provar que não cometia nenhuma irregularidade. Resumidamente, os fatos são esses, de acordo com o que O Povo publicou.

Segundo a editora de Fortaleza, Tânia Alves o nome da empresa foi omitido por não haver nada comprovado contra ela. ‘Se no decorrer do processo que o pedagogo pretende mover contra o supermercado, este for condenado, o nome da empresa será publicado’, afirma Tânia. (A editora diz ter havido uma falha ao não se explicar esse procedimento aos leitores, no texto da notícia.)

Como anotei em coluna recente, O nome do shopping (9/7), considero absolutamente equivocada essa forma de proceder. Além de ser errado do ponto de vista jornalístico, fica a impressão, para muitos leitores, que o jornal está se submetendo a injunções econômicas. Mas preciso deixar registrada a discordância com leitores que vindicaram um texto condenatório ao Extra. O papel da reportagem é ouvir todos os envolvidos e fazer um relato veraz e objetivo dos fatos. De posse das informações que o jornal tem por dever publicar, cabe a cada leitor fazer seu próprio juízo.

Observe-se que, deixando de publicar o nome do estabelecimento onde se deu a ocorrência, o jornal lançou suspeita generalizada sobre todos os supermercados do bairro Montese. Também é preciso lembrar que acusações contra Extra circulam em listas da internet, sem a versão da empresa. Portanto, como esta parece ser uma situação que acarreta danos a todos os envolvidos, incluindo os leitores, fica difícil avaliar os motivos do jornal para aferrar-se ao procedimento aqui comentado.