Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Religião se discute?

No fim de outubro, o jornalista Paul Vitello, que cobre assuntos religiosos para o New York Times, escreveu um artigo sobre um novo blogueiro: o arcebispo Timothy Dolan, que assumiu este ano a tarefa de liderar 2,5 milhões de católicos na arquidiocese de Nova York. Vitello não imaginou que, ao final do dia em que o artigo foi publicado, Dolan iria citar matérias e colunas do NYTimes no seu blog para dar exemplos de anticatolicismo. ‘Não é hiperbólico chamar o preconceito contra a Igreja Católica de um passatempo nacional’, disparou Dolan. O comentário foi um ataque duro ao jornal, vindo de um homem que havia sido descrito pelo mesmo diário há seis meses, quando assumiu o cargo, como flexível, caloroso e avesso a confrontos, diz o ombudsman Clark Hoyt em sua coluna de domingo [8/11/09].

Dolan prosseguiu em seu blog, alegando que, para ter exemplos de como a igreja é tratada injustamente, basta conferir alguns artigos nas últimas semanas no NYTimes, como uma coluna de Maureen Dowd sobre o tratamento de freiras pela hierarquia da igreja e uma matéria de capa sobre um padre que teve um filho com uma antiga frequentadora de sua paróquia.

O arcebispo teria submetido seu comentário ao NYTimes, para ser publicado como um artigo de opinião, e muitos leitores questionaram por que ele não foi divulgado pelo jornalão. David Shipley, editor das páginas de opinião, informou que o espaço ‘nunca foi um fórum para respostas diretas a artigos’. Por isso, sugeriu que o arcebispo submetesse uma carta ao editor, o que Dolan se recusou a fazer, pois não queria resumir o texto e deixar de fora pontos-chave.

Foco

O post de Dolan fez Hoyt pensar se é justo escrever e criticar a liderança de uma religião que tem uma posição única de influência – é tanto lar espiritual para ¼ da população americana como também uma instituição que administra sistemas escolares, fornece serviços sociais e procura influenciar nas políticas públicas. Nestas discussões, sempre vem à tona a cobertura da mídia sobre os escândalos de pedofilia da igreja. Um dos exemplos citados pelo arcebispo no blog era um artigo de capa do NYTimes sobre abuso sexual de crianças na comunidade ultraortodoxa judia no Brooklyn. Segundo ele, faltou a ‘ira’ que está sempre presente na cobertura de pedofilia da Igreja Católica. O tema, diz, é muito mais amplo, mas a mídia parece focar apenas nos católicos.

Há uma tensão inerente entre jornalismo, que deve ser cético da autoridade, e uma igreja que dá grande ênfase a ela. Os repórteres do NYTimes defendem a cobertura do jornal. Laurie Goodstein, correspondente nacional de religião, afirma que o diário divulga casos de abuso sexual ocorridos em muitas religiões, mas a matéria envolvendo católicos foi maior porque havia um maior número de acusações e mais acordos legais. Em relação à coluna de Maureen, Dolan escreveu que os argumentos levantados por ela até eram legítimos, mas sua linguagem refletiu muito o preconceito contra a igreja. A colunista não pensa desta maneira. ‘Longe de ser anticatólica, minha coluna foi uma expressão de raiva e angústia de uma católica sobre a crise moral na minha igreja’.