Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Tânia Alves

Jornalismo feito a partir de declarações de fontes da área pública ou privada tem se disseminado na imprensa de uma maneira geral. É uma prática tão arraigada que, às vezes, o repórter não se dá conta, por comodidade, desconhecimento ou pressa, que jornalismo pode e deve ser muito mais do que isso e não sobrevive de meros pronunciamentos. O jornalismo, além de reproduzir falas de autoridades, deve buscar e primar pela veracidade delas. No entanto, em certas apurações, os jornalistas não atentam para esta distorção. Só que os leitores se mostram vigilantes quando as declarações carecem de coerência.

Foi o que ocorreu quando a editoria de Economia publicou, no dia 17 de março passado, a matéria: “Empresários estudam paralisação e suspensão de impostos” e, no dia seguinte, veio com a negativa desta declaração no texto: “Indústria descarta não pagamento de tributos”. As duas se referiam a declarações feitas pelo presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), Beto Studart, após nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a Casa Civil do governo Dilma Rousseff.

Um leitor estranhou a mudança de uma edição para a seguinte. “Um dia é paralisação e no outro descarta? Mudou de um dia para o outro”, disse. Ele questionava ainda se era viável as empresas e cada cidadão deixarem de pagar impostos em nível federal como estava posto no conteúdo.

FALTOU COMPLEMENTO

De fato, o leitor estava falando ali de apuração, de jornalismo checado e que não se contenta somente com falas, mesmo que elas sejam ditas por autoridades. Após o alerta do leitor, voltei ao primeiro texto e verifiquei que nada além da fala do entrevistado referendava ser possível que as empresas ou os cidadãos deixassem de pagar imposto federal. O conteúdo era em cima da fala da fonte. Em nenhum momento do texto, questionou-se se era possível fazer o que o presidente da Fiec estava alardeando. Também não se explicava qual a legislação que separava os impostos das esferas federal, estadual e municipal.O resultado é que, no dia seguinte, O POVO reproduziu o desmentido tendo como fonte a fala do mesmo entrevistado.

Enviei solicitação para que os editores do Núcleo de Negócios comentassem sobre os dois textos publicados. Recebi a seguinte resposta do editor-executivo de Negócios, Jocélio Leal: “Há relevância no que afirma o presidente da Federação das Indústrias do Estado, pela importância econômica e institucional do setor e da entidade. As duas referidas manchetes se reportaram ao teor de entrevista coletiva concedida pelo presidente e à posição manifestada por ele no dia de sua publicação. A crítica do leitor, pelo visto, é por discordar da Fiec. Quanto a esta discordância, não nos cabe opinar”.

O debate aqui é sobre o fazer jornalístico. Por isso, não cabe dizer que a declaração de uma fonte, dada em coletiva, seja deixada de lado quando se está elaborando uma notícia. As entrevistas são matéria-prima do jornalismo. Falas dos especialistas, dos representantes dos poderes políticos ou privados são importantes para nortear as apurações. E elas devem constar no texto, mas com parcimônia. Em algumas vezes, elas bastam. Só que o jornalista precisa ficar atento, para saber quando é necessário complemento, quando é preciso fazer conexões, ouvir o contraditório. Na primeira matéria, não houve dúvida sobre a declaração da fonte. O conteúdo não se tornou realidade. Mudou de um dia para outro. O leitor reparou.

CADÊ A ESPIRITUALIDADE?

Um leitor que já integrou o Conselho de Leitores do O POVO entrou em contato com a ouvidoria no dia 14 de março passado para questionar sobre a falta de publicação da página “Espiritualidade”. Ela é publicada aos domingos com artigos que versam sobre as múltiplas formas de expressar a fé. “Faz dois ou três domingos que procuro no O POVO e não encontro”, disse, completando que é um dos bons pontos de leitura do jornal aos domingos.

A Espiritualidade foi publicada pela primeira vez em 13 de novembro de 2005. Na estreia, o espaço apresentava artigos do pastor missionário R.R.Soares; do padre Luis Sartorel e do espírita Divaldo Pereira Franco. Os articulistas se revezavam. Foi assim até o último 24 de janeiro (ver fac-símile), quando um artigo foi publicado pela última vez. De lá para cá, foram oito domingos sem a publicação de conteúdo específico. Nenhum aviso sobre o que teria acontecido. É como se a página nunca tivesse existido.

Após o alerta do leitor, perguntei, no comentário interno, o que a Redação responderia sobre o questionamento. Na segunda-feira passada (21/3), após verificar que o dia anterior foi mais um sem os artigos da Espiritualidade, perguntei se a página não seria mais publicada. Não recebi resposta. Enviei formalmente pedido de explicação para a editoria de Opinião, responsável pela edição. A editora da área, Daniela Nogueira, enviou a seguinte resposta: “A Espiritualidade, como página, não será mais publicada. O conteúdo de Espiritualidade continuará sendo veiculado como artigo nas páginas de Opinião”.