Friday, 26 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Transparência que ameaça a segurança

O Washington Post publicou, na semana passada, uma série de reportagens intitulada ‘Top Secret America’, sobre o vasto esquema de segurança montado nos EUA após os ataques terroristas de setembro de 2001. A série, em três partes, foi baseada em centenas de milhares de documentos públicos com os quais o jornal organizou um grande banco de dados com informações sobre cerca de duas mil empresas e organizações governamentais ligadas a serviços secretos no país.

O objetivo do Post era criar um panorama do imenso aparato de segurança nacional. Em seu site, o diário montou uma página para abrigar o banco de dados, onde os leitores podem fazer pesquisas. Antes da publicação da série, membros do governo americano puderam verificar as informações do site e expressar suas opiniões sobre ele. Uma agência governamental criticou alguns dados com justificativas concretas, o que levou o jornal a retirá-los da página. Outra agência foi completamente contrária às reportagens – o que, segundo a repórter Dana Priest, não ajudou em nada. ‘Não é uma discussão sensata quando você apresenta uma questão legítima de interesse público e a resposta é: ‘nós apenas não queremos que as pessoas leiam sobre isso’’, diz ela.

Antes que as matérias fossem publicadas, diversos leitores – possivelmente informados pelas agências sobre os dados contidos nelas – imploraram que o Post não revelasse os nomes de empresas que prestam serviços sigilosos para o governo. ‘Vocês não apenas estão pondo em risco o emprego, mas a vida de pessoas que, como eu, vão trabalhar todos os dias para proteger a segurança desta nação e a vida de seu povo’, afirmou um prestador de serviços em e-mail enviado ao jornal. As críticas continuaram após o início da série.

Sobre precauções e exageros

O editor-executivo do Post, Marcus Brauchli, não revelou ao ombudsman do jornal, Andrew Alexander, detalhes sobre as discussões que teve com membros do governo. ‘Nós tomamos nossas próprias decisões’, ressaltou ele, lembrando que certos cuidados foram tomados em nome da ‘segurança pública’. Uma destas precauções foi limitar a interatividade nos mapas do site, por exemplo.

Ainda assim, Andrew Alexander questiona, em sua coluna deste domingo [25/7/10], se o Post forneceu informações demais. Para Steven Aftergood, especialista em segredos governamentais na Federação de Cientistas Americanos, a resposta é não. ‘Eu ficaria surpreso se um profissional de segurança argumentasse que esta série constitui uma ameaça à segurança nacional’ ou às companhias citadas, diz. ‘A maior ameaça a estes lugares não vem de fora, mas de pessoas de dentro que ou cometem roubos ou manipulam sistemas de dados’.

Já o ex-diretor da CIA John McLaughlin, hoje na Escola Johns Hopkins de Estudos Internacionais Avançados, acredita que o jornal exagerou. ‘Você pode dizer que todas estas informações estão disponíveis ao público, mas o que o banco de dados do Post faz é fazer o trabalho para os nossos adversários’, argumenta. ‘Por que ajudá-los?’.

Na opinião do ombudsman, pesando os prós e os contras, a publicação de ‘Top Secret America’ foi justificada. ‘Cada decisão envolve o equilíbrio entre o benefício para o público e os potenciais riscos’, diz ele, lembrando que o Post foi cauteloso. Alexander lembra que o aparato de inteligência após o 11 de setembro é ‘claramente um tema relevante para o debate público’ e que a transparência de informações só melhora a qualidade deste debate.