Em artigo intitulado ‘Sexo explícito e linguagem chula não é opinião‘, publicado neste Observatório, o advogado Raul Bradley da Cunha lembrou, dentre outras questões, que: é preciso distinguir censura de opinião de censura moral, pois uma coisa é cuidar-se da regulação de cenas de sexo em novelas e outra é tratar-se de programas jornalísticos; que o Estado brasileiro não presta os devidos serviços de atendimento a crianças em creches para que os pais possam trabalhar na certeza de que seus filhos não estão assistindo a programas incompatíveis com suas idades; e que parece o Brasil, também nesse particular, ter passado da ditadura à anarquia.
Oportuna a análise do articulista acima citado, pois se faz necessária a consciente separação entre censura moral e censura de opinião. Contudo, mesmo quando se examinam os programas jornalísticos, que modernamente passaram a não apenas divulgar as notícias, mas também a comentá-las (concordando ou discordando o jornalista com o que está sendo veiculado) através de expressões verbais e corporais, verifica-se o grau de induzimento, de condução e de controle da sociedade que os telejornais operam diariamente. Afinal, são apresentados por pessoas bem vestidas, com dentição completa e bonita, e que, geralmente, usam bem o vernáculo português. Tudo isso é imagem que sugere ao povo confiança e credibilidade.
Seara simplista
Dada sua grande participação nesse contexto, a TV – certamente por contar com a imagem, que por natureza atende e agrada ao sentido da visão humana – é o meio que se mostra mais apto a criar, na psicosfera social, um ideário de credibilidade. A confiança que a população credita à TV nasce e se reproduz do efeito de verdade que as imagens são capazes de proporcionar.
Junto a essas imagens, os relatos, as histórias e os casos verossímeis completam a crença popular na existência da verdade acerca do que é transmitido difusamente.
Numa observação mais atenta, verifica-se, por conta do poder de penetração da TV, que o debate envolvendo o controle por parte do Estado sobre os meios de comunicação precisa ganhar maturidade e sair da seara simplista que reduz a questão à censura. Censura pejorativamente lembrada de um período de exceção que viveu o Brasil sob a égide do poder militar.
O ParaPan 2007
O que se viveu nas épocas das ditaduras, seja do Estado Novo de Vargas, seja a dos militares, não deve servir como escudo para não se tratar da necessária e adequada regulação que os meios de comunicação devem experimentar. Inclusive para que possam ser reais parceiros na construção de um projeto de país que se quer desenvolvido.
Por meio da linguagem televisiva, a sociedade é controlada. Quando deveria controlar os conteúdos programáticos das emissoras que prestam serviço público, embora, às vezes, não pareçam.
Por seu turno, muitas das ações e dos programas levados a efeito pelos governos não encontram nas grades programáticas da TV o apoio de que tanto precisam. É que parece faltar congruência temática entre programas governamentais como o de combate ao turismo sexual e à prostituição infantil, por exemplo, e as telenovelas, os comerciais e as demais atrações que apelam para a sexualidade de forma incisiva.
Poucos sabem, mas ocorreram os Jogos Pan-Americanos para portadores de dificuldades físicas, no Rio de Janeiro, neste mês de agosto de 2007 e, enquanto o governo federal e a sociedade têm buscado reformar instalações físicas, valores e preconceitos a fim de garantirem a inclusão dessas pessoas na sociedade, as redes de televisão mal deram boletins diários do evento. Sequer a solenidade de abertura foi transmitida.
Responsabilidade e respeito
Em 22 de agosto de 2007, a imprensa escrita de grande circulação publicou fotos tiradas dos computadores dos ministros do Supremo Tribunal Federal, que mostram diálogo entre eles durante a sessão relativa ao processo dos acusados do ‘mensalão’.
Não é proibido que juizes troquem opiniões e idéias acerca de matérias que precisam decidir. Isso tanto o fotógrafo quanto os responsáveis pela redação do jornal sabem. Sendo assim, parece ficar claro o interesse menor de fofoca e sensacionalismo na publicação de tal matéria.
Neste país, que tentamos construir há 507 anos, mesmo com toda a paralisia institucional provocada pelos regimes políticos de exceção, estamos resolvendo nossas dificuldades dentro do direito e no seio das instituições. A imprensa não ficará bem na foto se não agir de forma responsável e respeitosa para com a sociedade e suas instituições legitimamente constituídas.
Controle público-social da mídia
Com a criação do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, até o Judiciário passa pelos crivos do controle sócio-institucional. Por que os meios de comunicação ficariam de fora dessa nova visão de controle que a sociedade fez chegar a quase tudo?
Se é garantido constitucionalmente o direito de livre expressão, é preciso se universalizar tal direito. Pois não parece permitido se falar numa política de regulação público-social dos meios de comunicação, que logo se levantam discursos pouco democráticos e bem distorcidos que, em vez de trazerem luz ao tema, lançam mão de concepções preconceituosas que misturam na cabeça do povo questões como: controle X ditadura e direito à liberdade X abuso de direito.
Como o Estado exerce sua competência, também constitucional, de explorar diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão os serviços de radiodifusão sonora e de sons e imagens (CF. art.21, XII, a), quem autoriza, concede ou permite a exploração daquilo que por natureza é público, deve ter o direito-dever de ao menos regulá-lo e torná-lo mais útil à sociedade.
Parece chegada a hora da criação pelo Estado brasileiro de órgão de controle público-social dos meios de comunicação, deixando claro que o Estado não pode ser confundido com o governo. Não restam dúvidas acerca da necessidade de se exercer o controle público-social dos conteúdos difundidos pelos meios de comunicação. Pois comunicação é tema garantido constitucionalmente como de interesse público e ao povo não se pode negar o direito de cuidar do que é seu.
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Servidor público municipal e estudante de Direito, Ipojuca, PE