Começa o terceiro ano da universidade. É espantoso conviver com pessoas que ingressam em uma instituição sem ao menos terem a certeza de que optaram pelo curso correto e que, mesmo assim, ignoram essa situação e a vão levando ‘da maneira que der e enquanto puderem’. Caso a ‘sorte’ resolva colaborar, uns, felizmente, conseguem se encontrar e terminam o curso. Mas outros, caso a ‘sorte’ não coopere, descobrem a escolha errada já com o curso em andamento.
Talvez isso seja reflexo de duas coisas. Primeiro: a de uma pressão social cada vez mais notória – marqueteira das próprias escolas de ensino superior – que transmite aos jovens uma ‘idealização’ do quão é importante tornar-se universitário – e, de preferência, logo após o término do colegial; segundo: o da propaganda que cada profissão acaba fazendo de si mesma e exibindo para o mundo. No caso do jornalismo, não é diferente. É um dos ofícios que mais expõe a sua forma de trabalho, mas que muitas vezes acaba ‘atraindo adeptos’ somente pelo ‘luxo’ que parece oferecer.
Nessa trajetória de ‘descobertas pessoais’ pela qual todos universitários passam, e da qual faço parte, uma das matérias presentes em minha grade-horária este ano chama-se Teoria do Jornalismo e nos oferece como base os estudos do jornalista-professor Nelson Traquina.
Pergunta simples
De acordo com Traquina, é necessário entender o jornalismo para poder abordá-lo. E, a partir da afirmação de que a notícia é uma ‘construção’ social, o autor explica as teorias: do espelho; gatekeeper; organizacional; de ação política; estruturalista e a etnoconstrucionista. No entanto, ele afirma: ‘A utilização do termo teoria é discutível porque pode também significar (…) uma explicação interessante e plausível e não um conjunto elaborado e interligado de princípios e preposições. De notar, também, que estas teorias não se excluem mutuamente, ou seja, não são puras ou necessariamente independentes umas das outras [Traquina, Nelson. ‘Teoria das Notícias’. In: O estudo do jornalismo no século XX. Pag. 65]’.
O objetivo aqui não é descrever tais teorias, mas tentar relatar como elas foram capazes de responder às dúvidas ‘daqueles’ que optaram, sem total certeza, pelo jornalismo.
Já na aula inaugural, acredito que o professor que ministra a matéria conseguiu deixar aquela sensação de curiosidade, de interesse, nos alunos, para que houvesse uma participação efetiva de todos ao longo do semestre. E fez isso de modo com que pensássemos, cada um na sua individualidade, primeiramente na seguinte questão: o que é jornalismo? A pergunta era simples, mas ninguém respondeu. Pensei ser uma daquelas indagações feitas aos alunos que não exigem uma resposta oral e, ao quase replicar de maneira objetiva, que era o lidar com as informações, achei tão óbvio que também fiquei quieta.
Tivemos ‘sorte’
E vieram as outras: ser jornalista realmente é o que quero? Se for, que tipo de jornalista serei? Quais são os meus ideais de profissão e para onde estes irão caso não possa exercê-los da maneira que acho pertinente?
Confesso que, apesar de já ter respondido a essas questões, fiquei um tanto quanto perturbada ao pensar que poderia ter feito a ‘escolha errada’. Afinal, foi a primeira vez que essas indagações foram devidamente contextualizadas. E nesse mesmo momento pude presenciar que para aqueles que a profissão significa glamour ou ‘rentabilidade’, a própria presença em sala de aula começava a ser questionada.
Não demorou muito para que o professor – observador atento à inquietação inicial em sala de aula – lançasse perguntas como uma rajada de metralhadora – e, metaforicamente, percebi que a intenção dele era justamente fazer com que nos sentíssemos alvejados. Por que as notícias são como são? Elas são o espelho da sociedade, ou uma construção feita por mim ou por vocês, futuros jornalistas, dessa mesma sociedade?
E foi nessa hora que notei o ‘despertar’ de muitos alunos para a realidade na qual estavam conduzindo suas vidas ou, pelo menos, quatro anos dela. Desde essa aula, discussões proveitosas estão acontecendo (dentro e fora da classe) após a explicação das teorias do Jornalismo – já que o ingênuo conceito compartilhado pela grande maioria em sala de aula de que ‘ser jornalista é apenas informar com total imparcialidade, sem interferência organizacional da empresa, política dos que estão à frente de uma instituição e cultural da própria formação de vida’, começou a cair por terra.
Com tais observações, quis expor uma situação vivida por mim e, de forma simples, ressaltar a importância de como dúvidas, aparentemente pueris, podem elucidar nossa mente, se devidamente analisadas, e fazer com que evitemos a escolha errônea de uma profissão.
Felizmente, eu e mais alguns colegas aspirantes a jornalistas, constatamos estar no caminho certo. Tivemos ‘sorte’…
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Estudante de Jornalismo pelo Centro Universitário Fiam-Faam, São Paulo, SP