Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

A opinião de Sua Excelência, o leitor

Em todos os comentários sobre a grande entrevista do novo ombudsman da Folha de S.Paulo, Carlos Eduardo Lins da Silva, este colunista sentiu falta de um ponto: a queda brutal de circulação dos jornais em todo o país. Carlos Eduardo disse que, ao contrário da imprensa americana, a brasileira manteve a credibilidade, embora tenha perdido influência. Tudo bem: se a nossa imprensa manteve a credibilidade, como explicar que a circulação dos grandes jornais tenha caído a menos da metade nos na última década?

Houve época, há aproximadamente dez anos, em que a Folha de S.Paulo vendia 1,5 milhão de exemplares aos domingos. Números não tão altos, mas também estrondosos, eram proclamados pelo Globo, por O Dia. Claro, a internet ainda não competia no mercado de notícias, os sorteios e promoções daquela época não se mantiveram até hoje, surgiram os jornais gratuitos, outros meios de divulgação – até os celulares! – disputam uma fatia do bolo. Mas isto não explica como os jornais que tiravam mais de um milhão de exemplares tenham de contentar-se hoje com 400 ou 500 mil. E há outros fatores a analisar: neste período, a população cresceu, tornou-se um pouco mais rica, e o dólar, a moeda do papel e dos equipamentos, provavelmente está hoje mais barato do que naquela época.

A queda de circulação dos grandes jornais mostra que a imprensa perdeu, sim, credibilidade; perdeu boa parte de sua empatia com o público. É provável que o consumidor de notícias, exposto à Escola Base, ao Bar Bodega e a tantas outras lambanças, tenha concluído que, de tão desmentidos pelos fatos, os jornais talvez não valessem os reais gastos em sua compra. Se é para consumir emoção e ficção, por que não uma telenovela, que ainda por cima é de graça?

Já que estamos em tempos de farto noticiário econômico, vamos imaginar que uma grande empresa de qualquer setor tenha perdido algo como dois terços da venda nos últimos dez anos. Qual teria sido o comportamento de suas ações na Bolsa? E qual o conceito que atribuiríamos aos produtos que perderam mercado em tamanha proporção?



Imprensa e cinema

Nesta coluna, já falamos do clássico A Montanha dos Sete Abutres, de Billy Wilder, com Kirk Douglas, como um grande filme sobre imprensa. Há outros que um jornalista não pode deixar de ver: A Primeira Página, por exemplo, dirigida pelo mesmo Billy Wilder, com Jack Lemmon, Walter Matthau e Susan Sarandon. Ou Ausência de Malícia, dirigido por Sidney Pollack, com Paul Newman e Sally Field.

Mas um dos melhores filmes sobre jornalismo é um faroeste que só trata de jornalismo em uma única frase: é O Homem que Matou o Facínora, dirigido por John Ford, com John Wayne, James Stewart, Lee Marvin e Vera Miles. Sua única frase sobre jornalismo é dita, no fim do filme, pelo diretor de um obscuro jornal de uma minúscula cidade: ‘Quando a lenda é melhor do que o fato, imprima-se a lenda’.

Uma só frase, e definitiva.



A Censura, de novo

Por que os jornais da Paraíba não podem publicar anúncios pornográficos e de serviços de sexo?

Dá uma longa discussão: ao pedir a proibição, o Ministério Público paraibano se baseou no Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 78: ‘revistas e publicações contendo material impróprio ou inadequado a crianças e adolescentes devem ser comercializadas em embalagem lacrada, com a advertência de seu conteúdo’. Já a defesa se baseia na Constituição Federal, que veda a censura.

Que a questão de Direito seja discutida no foro competente. Mas não se pode ignorar que crianças e adolescentes têm acesso fácil a ‘material impróprio ou inadequado’, na TV aberta, na TV por assinatura, na internet. Sim, há a classificação dos programas conforme o horário, mas esqueceram de combinar com as crianças para que elas desliguem a TV no horário que as autoridades acham adequado. E que ninguém use o argumento de que a internet não é massificada: é, sim. E quem não tem internet tem acesso fácil a computadores, onde pode ver e ouvir hits como o ‘Vá Tomar’, o ‘Tapa na Pantera’ e assistir ao Pornotube.

É ruim? Se for ruim, como evitá-la? É coisa para ser discutida entre especialistas. Mas que não se puna um jornal por divulgar coisa muito mais inocente do que se vê em casa, sem pagar nada.



De novo, a Censura

A proibição da Marcha da Maconha vale alguma reflexão. A maconha é ilegal e a Marcha foi considerada apologia de ato ilegal. Certo, mas como é que os defensores do uso da maconha poderão pedir a mudança da lei?

A propósito, antes que comece a patrulha, este colunista não fuma maconha, nem cigarro, e está convencido de que ambos não prestam, além do que cheiram mal e incomodam quem está por perto. Mas há outras coisas que não prestam que não são ilegais; e há comportamentos e produtos que já foram proibidos que hoje são aceitos. Alguém se lembra do que ocorria com um rapaz quando ‘fazia mal à moça’? Matar ‘em legítima defesa da honra’, lavar os chifres com sangue, já foi um comportamento aceito e livrou muito corno assassino da prisão. Não consumir carne de porco era, para a Inquisição, um forte indício de comportamento judaizante, crime terrível, a ser punido com a fogueira.

As coisas podem mudar, o comportamento pode mudar, a lei pode mudar. Se a Marcha da Maconha fizer a apologia do consumo de drogas, que sejam punidos os infratores. Mas, caso se limite a defender a mudança das leis que coíbem o consumo de maconha, por que reprimi-la?



É a bola, Ronaldo

Dizia Pitigrilli, notável escritor italiano, que todo ser humano tem cinco minutos diários de imbecilidade. A diferença entre os gênios e as pessoas comuns é que, naqueles cinco minutos, os gênios nada fazem e nada falam.

Ronaldo Gorducho, o Fenômeno, foi vítima dos seus cinco minutos. Fez uma imensa besteira que certamente lhe custará caro. E só há uma maneira de levar o caso ao esquecimento: recuperar-se fisicamente, voltar bem ao futebol, fazer gols. No futebol, muita gente enfrentou escândalos, muita gente teve problemas que não viraram escândalos porque ficaram contidos dentro de seus clubes. Os jogadores de medianos para baixo freqüentemente tiveram a carreira liquidada. Os bons jogadores foram ajudados a sair da crise.

Ronaldo é um craque, é boa gente, já deu muitas alegrias à torcida. Voltando a alegrar os gramados, ninguém se lembrará sequer do nome do travesti que o denunciou.



Alckmin, o bondoso

O ex-governador Geraldo Alckmin, tucano que quer disputar a Prefeitura de São Paulo, também foi vítima dos cinco minutos: disse que eleição é um ato de amor e não haverá nenhum atrito.

Os meios de comunicação foram extremamente gentis com Alckmin e se limitaram a transcrever o que disse, sem qualquer análise. Então, vamos à análise. Em primeiro lugar, eleição não é ato de amor coisa nenhuma: é uma luta pelo poder, com  o esmagamento e a destruição do adversário. Segundo, ato de amor exige atrito.



Como é…

Esta é de um grande jornal: ‘Bush quer gastar US$ 770 mil com crise de alimentos’. Meio pouco, não é? Mas quem se der ao trabalho de ler o texto vai encontrar outro número: US$ 770 milhões.

Ainda é pouco, mas a diferença entre o titulo e o texto é de mil vezes.



…mesmo?

E esta vem direto de um tribunal:’Suposto acusado de tentar resgatar presos em Franco da Rocha (SP) obtém liberdade

Que será um ‘suposto suspeito’?



E eu com isso?

Você, caro colega, fica se preocupando com o investment grade, e enquanto isso perde contato com o mundo real. Veja só:

1 – Namorada de Guga mostra o dedo

2 – Taís Araújo passeia com Preta Gil no Rio

3 – Atriz Letícia Spiller exibe novo penteado em festa, no Rio

4 – Cantora Ivete Sangalo leva seu namorado ao cinema

5 – Sem sutiã, Janet Jackson recebe prêmio em Hollywood

6 – Carolina Ferraz circula de vestidinho vermelho pelas ruas do Leblon

7 Deborah Secco usa vestido suspeito

A propósito, que será um ‘vestido suspeito’? 



O grande título

Muita coisa boa apareceu nos meios de comunicação, em termos de títulos notáveis. Há, por exemplo, um daqueles meio misteriosos, que provam que revisor ainda faz falta, mesmo nos maiores veículos:

** Criminosos matam um morre e ferem sete no Campo Limpo

Há um fantástico, segundo o qual quem gosta de alguma coisa gosta de alguma coisa:

** Crianças vegetarianas não torcem o nariz para legumes e verduras

Temos outro que certamente algum leitor perito no assunto poderá nos explicar:

** Padrão de locomoção de tubarões é semelhante ao de seres humanos no mercado

E um que parece imbatível, já que mistura non-sense com rima:

** Mexicanos acampam na esquina onde termina América Latina

Este lembra o falecido programa de TV Times Square. A música de abertura dizia algo como ‘Times Square/é uma esquina’. Sérgio Porto (também conhecido pelo famoso pseudônimo Stanislaw Ponte Preta), redator do programa, talentosíssimo, culto, explicou ao diretor que Times Square, tanto em Londres como em Nova York, era uma praça, não uma esquina. Aliás, ‘square’ quer dizer ‘praça’. O diretor do programa, atarefado, disse-lhe para não encher o saco com besteiras. E a música durou enquanto durou o programa.

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Jornalista, diretor da Brickmann&Associados