‘Hoje, vivenciamos um processo de universalização, capaz de construir um maior estreitamento entre as relações políticas, econômicas, sociais e culturais mundiais ou, ao inverso, criar novas formas de ‘guetos’ e ampliar as já existentes’ (SANT’ANNA, 2001)
Sabemos que a comunicação tem sido, através dos tempos, a maneira pela qual os povos desenvolveram sua capacidade de trocar, enviar, receber mensagens, idéias, enfim, de dialogarem entre si. A convergência tecnológica e a globalização comunicativa permitiram tecnicamente que a distância entre os povos se tornasse fator secundário.
Mas, que fatos podem se transformar em notícia? O divisor de águas entre um fato corriqueiro e outro de interesse coletivo possui alguns paradigmas. De acordo com Traquina (1993), ‘para virar notícia, um acontecimento deve possuir uma natureza social e não deve ser, em tese, corriqueiro’. Outro fator importante para o critério de ‘noticiabilidade’ é a carga negativa do fato em questão. Entretanto, a notícia pode estar imbuída da condição de um serviço público e, segundo Ferree e Gamson (1999), ‘quando desprovida deste objetivo, ela se equivale a uma mercadoria, uma commodity, utilizada para atrair audiência e vender publicidade’. Na impossibilidade de registrar tudo o que acontece no mundo, torna-se importante saber o que chamará mais a atenção dos jornalistas e dos leitores. Mathien (1992) explica que ‘uma das hipóteses se baseia na estrutura cultural do leitor, que priorizará aquilo que lhe for culturalmente mais próximo’.
Rotinas profissionais
Uma leitura dos jornais da região do Vale do São Francisco mostra que nem sempre as redações obedecem a esses critérios científicos. É rotineira a existência de informes culturalmente distantes, sejam eles positivos ou negativos. Estudos acadêmicos, além de discussões em encontros e congressos da área de Comunicação Social, têm revelado que isso decorre da ação estratégica do uso da notícia para construir realidades que sejam pertinentes aos interesses de setores específicos. Assim, critérios técnicos são desprezados, prevalecendo interesses econômicos, políticos e comerciais de atores sociais que possuem maior influência sobre o processo de construção da notícia, incluindo-se as próprias empresas de comunicação.
Nem mesmo o crescimento dos movimentos organizados, bem como as políticas de integração social, foram suficientes para propiciar um perfil editorial na mídia escrita da região de forma a viabilizar mais espaço editorial para temas referentes a pessoas portadoras do vírus da Aids, especialmente crianças. Também o advento da internet, que em tese permite a consulta a fontes diversificadas de informação, quase não alterou as rotinas profissionais nem representou um perfil de informações diferenciado aos leitores.
Pauta silenciada
Apesar da escassez das matérias regionais atentadas para o assunto, geralmente, quando tratado por outras mídias (TV, rádio e on-line), o conteúdo relacionado à temática é construído basicamente a partir da produção das grandes agências de notícias ou pautas de assessorias. Aquilo que se transmite reporta um recorte da ‘realidade’ voltado para os interesses políticos – a construção de um centro de apoio, a distribuição de medicamentos, a divulgação de oficinas etc. – que nada ou pouco se aprofunda na rotina diária das meninas e meninos soropositivos. Ao que parece, o vírus HIV só atinge os adultos.
O portador do vírus HIV sempre se apresentou de forma marginalizada nos espaços nobres da imprensa mundial e os jornais brasileiros retratam o mesmo comportamento. Muito pouco se fala daqueles jovens que chegam a desistir dos estudos devido à discriminação e esse pouco sempre é carregado de um contexto sensacionalista, grotesco, privilegiando o negativo.
Em um rápido e fragmentado olhar sobre a mídia nacional, são raras as matérias como a da jornalista Adriana Prado, revista IstoÉ – 30/04/2008. Ainda que na editoria de comportamento (pág. 68), o texto jornalístico intitulado ‘HIV: entrada proibida’, se destaca pela informação transmitida de questões relacionadas aos soropositivos que muitos desconhecem: países que impõem restrições à entrada em seus territórios de pessoas com HIV. Também artigos como o de Letícia Nunes, no Observatório da Imprensa – 13/05/2008, ‘A mídia na luta contra a Aids’, faz lembrar que a doença ainda se alastra, que é uma pauta que não deve ser silenciada pela mídia, mas posta em evidência de forma responsável e livre da criação e manutenção de estigmas.
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Estudante de Jornalismo, Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Juazeiro, BA