Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Jornal de ontem ou de hoje: dá na mesma…

Sou assinante da Folha, do Estadão e, por ofício, sempre dou uma espiada em outros jornais pela internet. Não sei bem porque assino os dois, pois são todos os dias praticamente idênticos – diferenciados quase só por colunistas, linguagem e diagramação: um mais sisudo, outro pretensamente descontraído. Dá até a impressão de que os editores se comunicam com a ‘concorrência’ antes de cada edição para trocar figurinhas. Noves-fora, sobram as notícias, muitas vezes com informações desencontradas entre um e outro. Faço uma regra-de-três para tentar apreender a impossível ‘verdade dos fatos’.

Daí vem acontecendo que acordo muito cedo e os jornais ainda não chegaram. Enquanto não chegam, leio mais atentamente as edições do dia anterior. E não dá para driblar uma constatação alarmante: dá na mesma. Os jornais de ontem pouco diferem dos jornais de hoje. Talvez pelas antecipações lacônicas dos noticiários de TV e, principalmente, da internet das madrugadas. Ou, quem sabe, pela absoluta falta de pauteiros ou disposição editorial/financeira na imprensa escrita.

Dá na mesma‘ é broxante para qualquer jornalista que lê com segundas intenções, tentando não descuidar das entrelinhas. Porque fica parecendo que o Brasil e o Mundo de anteontem são os mesmos dos de hoje e dos de amanhã (pode até ser, pois os jornais são diários). Mas parece-me claro que a penúria editorial descarta cada vez mais as chamadas ‘matérias especiais’, e o antigo e superado ‘furo’ foi confinado a duas ou três revistas semanais ou, paradoxalmente, anunciado para a próxima edição do jornal impresso ou com hora marcada no Fantástico.

Uma experiência simples

Até há pouco, o jornal de ontem servia para embrulhar carne no açougue. Mais recentemente, servia para reciclagem. Hoje, nem para uma coisa nem outra: os açougues usam plástico, a tal reciclagem é uma intenção louvável que empaca na impossibilidade de captação e sofrível processamento.

Sobra o jornal de ontem para ser lido hoje – ou a qualquer hora. Sem prejuízo da atualidade que, teoricamente, é o objetivo primeiro da imprensa. O rádio dá um show de onipresença e instantaneidade, a TV produz um jornalismo basicamente editado para consumo no padrão ‘trinta segundos’ e a imprensa escrita arremeda imprudentemente essas mídias, perdendo terreno na área do aprofundamento que deveria ser sua característica.

Antes de cair na tentação de rotular estes comentários como ‘desencantados’ ou ‘derrotistas’, faça uma experiência simples: não assista aos noticiários de TV de hoje, amanhã cedo não acesse a internet e leia atentamente seu jornal de ontem.

Você vai constatar que dá na mesma.

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Jornalista, Carapicuíba, SP