Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

SEXTA-FEIRA, 26/10

Leia abaixo a seleção de sexta-feira para a seção Entre Aspas.


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O Estado de S. Paulo


Sexta-feira, 26 de outubro de 2007


DEBATE PÚBLICO
O Estado de S. Paulo


No Rio, a solução Herodes


‘O mal que uma autoridade pode causar ao debate público sobre questões de agudo interesse, por falar muito do que sabe pouco, acaba de ficar demonstrado pela enésima vez com as desastradas declarações do governador fluminense Sérgio Cabral Filho publicadas nos jornais de ontem. Numa entrevista ao site G1, ele defendeu a legalização do aborto para reduzir a criminalidade, comparou os índices de fecundidade (número de filhos por mãe) de bairros como Copacabana aos da Suécia, e os da Rocinha – ‘uma fábrica de produzir marginal’ – aos de Zâmbia e do Gabão. Com isso, rebaixou a conversa de botequim, recheada de meias-verdades e preconceitos inteiros, a discussão, pertinente e infinitamente mais complexa, das possíveis relações entre crescimento populacional, direito à interrupção da gravidez, pobreza e criminalidade.


Para estabelecer o seu nexo simplório entre aborto e ‘violência pública’ (sic), ele citou o best-seller Freakonomics: o lado oculto e inesperado de tudo que nos afeta, dos americanos Steven Levitt e Stephen J. Dubner. No capítulo Onde foram parar todos os criminosos?, escreveram: ‘Segundo um estudo, a típica criança impedida de nascer nos primeiros anos da legalização do aborto (nos Estados Unidos) estaria 50% mais propensa que a média a viver na pobreza; teria igualmente uma probabilidade 60% maior de ser criada apenas por um dos genitores. Esses dois fatores (…) estão entre os mais fortes determinantes de um futuro criminoso. Crescer num lar de genitor solteiro praticamente dobra a propensão de uma criança para o crime. O mesmo ocorre com filhos de mães adolescentes (…). A baixa instrução materna é o fator singular de maior peso para conduzir à criminalidade.’


Há um abismo entre esse texto, com os seus verbos no condicional e os seus substantivos ‘probabilidade’ e ‘propensão’, e a interpretação rombuda que lhe deu o governador fluminense. E, ainda assim, é sabido que as conclusões da dupla têm sido contestadas por respeitados sociólogos e criminologistas, nos próprios Estados Unidos. Além disso, em qualquer parte do mundo, nem mesmo os mais acerbos defensores e defensoras da legalização do aborto invocam a redução da criminalidade em favor de sua tese. (No Brasil, o argumento central é de que se trata de uma questão de saúde pública, dado o alto risco que o procedimento clandestino representa para a imensa maioria das gestantes, por serem pobres.) Já a comparação entre a Rocinha, de um lado, e Zâmbia e Gabão, de outro, constitui um rematado disparate.


Embora a taxa de fecundidade nas favelas cariocas seja de 2,6 filhos por mulher em média, ante 1,7 no resto da cidade, o índice do Gabão é de 5,4, e o de Zâmbia, 6,1. Cabral deixou ainda mais boquiabertos os cientistas sociais com as suas ‘correlações espúrias’, como dizem os estatísticos, entre demografia e violência. No Rio, assinalam, a taxa geral de fecundidade medida pelo Censo de 2000 era de 2,1 filhos por mulher, mas o índice de mortes violentas na população masculina com até 25 anos é o mais alto do Brasil (dados de 2005). Já o Maranhão, por exemplo, onde a fecundidade era de 3,2 filhos por mulher, tem a segunda menor taxa nacional de mortes violentas de homens jovens. Se tivesse fundamento o raciocínio do governador, o Estado nordestino deveria superar o Rio nesse lúgubre ranking. Estatísticas, dizia Roberto Campos, às vezes são como o biquíni: mostram quase tudo, mas escondem o essencial.


O pior é que Cabral anuncia a sua solução Herodes para o problema do aumento da criminalidade bem quando a taxa de fecundidade no País já está perto do mero nível de reposição populacional (um nascimento vivo para cada falecimento). Conforme a mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), o índice brasileiro em 2006 era de 2 nascimentos por mulher. Para se ter idéia do ritmo da queda, em 1970 era de 5,8; em 1990, 2,9. De resto, a relação filhos por mulher vem diminuindo também nas favelas do Rio – apesar de tudo. Pode-se, em suma, advogar ou condenar a liberalização do aborto, pelos motivos que se queiram, mas nunca pensando na proporção de pobres na população, muito menos na proporção de criminosos entre os pobres. E, se favela fosse fábrica de marginais, eles seriam, na Grande Rio, mais de 1,2 milhão.’


 


TV PÚBLICA
O Estado de S. Paulo


Tereza nomeada para TV pública


‘O Diário Oficial de ontem publicou decreto do presidente Lula criando a Empresa Brasil de Comunicação, aprovando seu estatuto, nomeando a jornalista Tereza Cruvinel para o cargo de diretora-presidente e Orlando Senna, atual secretário do Audiovisual do Ministério da Cultura, para o cargo de diretor-geral.’


 


CINEMA
Luiz Carlos Merten


Animação que é falso documentário


‘Co-diretor de Toy Story 2, Ash Brannon entusiasmou-se e não precisou de tempo para pensar quando o produtor Christopher Jenkins lhe acenou com a possibilidade de outra co-direção. Em parceria com Chris Buck, ele assina Tá Dando Onda, que estréia com 221 cópias em todo o País (só duas com legendas). Se você é do tipo que precisa de uma criança para assistir a uma animação, não se acanhe – leve as suas ou peça as de irmãos, parentes, amigos. Tá Dando Onda é muito simpático. Conta a história de Cadu, o pingüim que sempre sonhou em ser um grande surfista, tomando como modelo o lendário Big Z, o campeão dos campeões. A originalidade de Tá Dando Onda consiste em contar a história de Cadu como um documentário dentro do filme. ‘Achei irresistível a idéia de mostrar um personagem de animação com câmeras e microfones à sua frente’, conta Brannon numa entrevista por telefone, desde Los Angeles.


Tá Dando Onda é mais uma animação da Sony, dando seqüência a um trabalho que começou com O Bicho Vai Pegar (A Casa Monstro foi produzido à margem do estúdio). ‘O bom de trabalhar na Sony Pictures Animation é que eles não têm idéias preconcebidas. Cada animação é um caso. Tá Dando Onda é diferente de O Bicho Vai Pegar e eu espero que os demais filmes sejam mais diferentes ainda. A animação é cara. Exige imaginação, mas também coisas práticas – tecnologia e investimento. O estúdio faz sua parte, mas nos deixa livres com nosso entusiasmo. Ninguém cria uma boa animação, se encarar a atividade como burocrática.’


Além da fórmula do documentário – com uma introdução que simula filmes, perdão, animações antigas para contar a evolução do surfe -, Tá Dando Onda tem um tema que a Ash Brannon pareceu muito sedutor – a relação pai-filho. Brannon diz que a comunidade de animadores é muito restrita, todo mundo se conhece e acompanha o trabalho do outro. O repórter tem a experiência de haver entrevistado John Lasseter duas vezes, por Procurando Nemo e Carros. Em ambos, a relação pai/filho é essencial. Por que este interesse pelo assunto? ‘Adoro John, mas esta questão é difícil de responder. Acho que tem a ver com família, com relações de poder e autoridade e tudo isso nos ajuda a nos entender e a entender o mundo em que vivemos.’ Brannon acrescenta que conhece Carlos Saldanha e admira o diretor de Era do Gelo 2, que também trata de relações familiares. ‘Na Sony, temos nosso animador brasileiro. É Renato dos Anjos.’


Ele observa que Tá Dando Onda conta a história de um pingüim, mas o animal poderia ser outro, sem prejuízo da história. ‘Fiz uma extensa pesquisa sobre pingüins e descobri coisas muito interessantes sobre eles. Em geral, os associamos ao gelo, mas existem pingüins naturais de áreas tropicais.’ À simples menção dos trópicos, Ash – abreviatura de Ashley – Brannon faz uma revelação. Ele nunca esteve no Brasil, mas é louco pela música e pela cultura brasileiras, leia-se pelo tropicalismo. ‘Sensacional. Há na Tropicália uma riqueza muito grande de ritmos, de cores. É uma fonte inesgotável de influência.’


Já que Brannon trabalhou em dupla com Chris Buck, quais as atribuições de cada um. ‘Eu me ocupei mais da cinematografia, da parte técnica; Chris, da criação dos personagens, mas ambos trabalhamos em conjunto o tempo todo, trocando idéias e fiscalizando o que o outro fazia.’ O que ele quer dizer com ‘cinematography’ – fotografia – numa animação? ‘No tipo de cenários tridimensionais que criamos digitalmente, a câmera é uma ferramenta muito importante e nem um pouco diferente do papel que tem em filmes de live action (com atores de carne e osso).’ Para que uma animação – basicamente, uma fantasia – funcione, Brannon acredita que personagens e situações devem ser verdadeiros. ‘Adoro documentários, que me confrontam com experiências reais. Brincamos de documentário em Tá Dando Onda, mas é fundamental que o espectador acredite no que está vendo na tela. Sem isso, não há empatia.’ Por mais importante que seja o aporte da tecnologia, Brannon tem muito claro o que é essencial para ele. ‘É a emoção, a experiência humana que a gente pode reproduzir por meio de animais, por que não?’ Brannon não tem medo de ser piegas, às vezes? ‘Não, porque se a emoção for sincera e fizer parte da cena, o público vai se emocionar genuinamente.’


O repórter pede exemplos do que Brannon considera esta emoção ‘genuína’? Sua animação preferida não é nenhuma daquelas consagradas – Nemo, Rei Leão, Toy Story, Branca de Neve e os Sete Anões. Brannon tem um carinho especial por Mogli (The Jungle Book), que está completando 40 anos e festeja a data com uma edição especial que já está à venda no Brasil. E live action? ‘Adoro Central Station (Central do Brasil), que também trata de um pai ausente e da busca de um garoto por um pai substituto.’ Brannon prossegue com sua análise do filme clássico de Walter Salles. ‘Acho aquela mulher uma grande personagem, ela se transforma ao longo do filme e nós seguimos, degrau por degrau, as etapas dessa transformação.’ No fundo, é o que também ocorre em Tá Dando Papo. O garoto quer vencer, mas ao reencontrar seu mito ele percebe que existem coisas mais importantes. Não é uma utopia, principalmente neste mundo competitivo, que vive ensinando que você só se destaca se for o melhor? ‘Talvez seja só um sonho, mas não custa disseminá-lo’, diz o diretor. ‘Adoro o que faço, mas agora tenho um filho de um ano. Nada substitui o sorriso do meu filho.’’


 


FECHAMENTO
Sonia Racy


PT vence em Oxford?


‘Muita gente não entendeu, no início do ano, quando a Universidade de Oxford fechou o Centro de Estudos do Brasil – um dos raros institutos dessa natureza na Europa. Agora, parece que a luz se fez. O motivo teria sido – é a voz corrente entre acadêmicos e diplomatas brasileiros – um ataque de birra ideológica do governo Lula.


O centro, criado no governo FHC, era financiado em parte pelo Itamaraty e pela Petrobrás, mas Brasília o considerava um foco de atividades tucanas. E seu diretor, o professor inglês Lesley Bethel, teria assinado sua sentença de morte ao recusar uma vaga para o historiador Luiz Alberto Moniz Bandeira, pensador assumidamente de esquerda, grande amigo do secretário-geral do Itamaraty, Samuel Pinheiro Guimarães.


Encontrado ontem, Bethel, que está no Rio de Janeiro, não nega que o episódio com Bandeira aconteceu. Mas avisa que houve outras razões este fechamento. Entre elas, a de que já existe em Oxford um Centro de Estudos Latino-Americanos. ‘ Ridículo’, classifica Bethel, o pretexto de se cortar a mesada por causa do episódio Moniz Bandeira. Oxford ‘jamais abrigaria um centro comprometido ideologicamente com qualquer governo’, diz ele. E mais. Afirma que Bandeira não foi recusado: ‘Ele pleiteou uma vaga num momento em que não tínhamos um cargo adequado, com salário. E não aceitou a oferta de uma visiting fellowship sem verba.’


As broncas do PT deixam o professor indignado. Ele diz que tem excelentes relações com tucanos e petistas, que é amigo pessoal de Lula e de FHC.


Aposentado desde o início do mês, o professor batalha por novos apoios para reabrir o centro. Sem Oxford, os estudos sobre o Brasil na Europa se limitam agora à Sorbonne, onde está o historiador Luiz Felipe Alencastro, e centros menores na Espanha. Ao expirar, o centro de Oxford tinha, além de Bethel, cinco ou seis outras pessoas e entre 15 e 20 bolsistas brasileiros.’


 


TELEVISÃO
Alline Dauroiz


Restrição a anúncios


‘Com a estréia do novo Vila Sésamo, na segunda-feira, a TV Cultura pretende adotar uma nova atitude na hora de vender espaços publicitários em sua programação infantil. A Sesame Workshop, ONG norte-americana detentora dos direitos do programa, exige que os países que exibem suas produções sigam à risca os princípios pedagógicos da instituição, o que, muitas vezes, foge à lógica comercial.


O programa, com uma hora de duração, será exibido de segunda a sábado e terá três minutos de intervalo comercial. Os filmes comerciais prometem não anunciar produtos, apenas divulgar o patrocinador, com mensagens que valorizem a formação das crianças. Um exemplo é a série da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), que mostra a importância da química na vida das pessoas.


‘Queremos atrair parceiros que compreendam como é positivo associar suas marcas a um projeto educacional como o Vila Sésamo’, explica o diretor-presidente da Cultura, Paulo Markun. A idéia é estender o modelo a toda a programação infantil. ‘Mas isso não poderá ser feito a curto prazo. Há contratos que não podem ser rompidos’, diz ele.’


 


MÚSICA
O Estado de S. Paulo


‘O jazz europeu tem uma diferença, mas é cultural’


‘Sueca como Neneh Cherry, a cantora Lisa Ekdahl foi escalada de última hora para substituir a cantora italiana Roberta Gambarini, que também cancelou a vinda ao Brasil no último instante por recomendação médica. Ela canta hoje no Auditório do Ibirapuera. Pode ter sido um motivo chato, mas a troca tende a ser saborosa: Lisa tem arrepiado platéias na Europa com sua voz meio de menina (como a de Madeleine Peyroux ou Billie Holiday), reinventando standards como Cry me a River, de Arthur Hamilton, ou Love for Sale, de Cole Porter. Ela falou ao Estado anteontem.


Vai ser sua primeira vez no Brasil?


Eu estive aí há uns dois anos, em Salvador, mas não cantando. Adorei, é bem diferente da Suécia, muito mais animado.


Alguns críticos vêem algo da canção de cabaré dos anos 20 e 30 em seu estilo.


Adoro aquele jeito de cantar, mas não é uma influência. Fui muito influenciada por Billie Holiday. Vou ao Brasil com uma formação que inclui guitarra, baixo e trompete.


Já vi a cantora Keren Ann cantando com uma banda assim.


Sou amiga de Keren. Ela é realmente uma cantora especial.


E quanto a Neneh Cherry, sua compatriota.


Ora, todo mundo ama Neneh Cherry!


Alguma brasileira em sua lista?


Elis Regina. Cantarei algumas bossas em meu show, mas não vou me arriscar em sua língua. Vou ficar com os versões de cantores americanos para a bossa nova brasileira. Acho que o jazz europeu tem de fato uma diferença, mas ela está talvez na cultura. É claro que é diferente. Tem até o meu sotaque. Mas é duro para mim dizer no que sou diferente das demais.’


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Folha de S. Paulo


Sexta-feira, 26 de outubro de 2007


TROPA DE ELITE
Nelson Motta


Sonho americano, pesadelo carioca


‘RIO DE JANEIRO – O capitão Nascimento ficaria surpreso: o Departamento de Polícia de Nova York admite que, apesar de seus esforços, a cidade é a maior consumidora de drogas do mundo. Mas a criminalidade e a violência urbana -sob controle de uma força policial eficiente, honesta, bem paga e aparelhada- só diminuem.


Sim, é possível. Apesar do poder do tráfico, que disputa o abastecimento de tão rico mercado, não há balas perdidas nem guerras de quadrilhas, nem infiltração no aparelho policial e judiciário, nem tortura e impunidade. Ninguém diz que, se os nova-iorquinos parassem de consumir drogas, a criminalidade acabaria. Eles viveram a experiência da Lei Seca, quando o crime se organizou a partir da indústria clandestina de bebidas.


Desde a histórica campanha ‘Tolerância Zero’, do prefeito Giuliani, nos anos 90, que começou com uma implacável limpeza na polícia, os índices de criminalidade violenta despencaram em Nova York, apesar do crescimento do tráfico de drogas. Mas os roubos, assaltos, homicídios, estupros e seqüestros caíram drasticamente, e Giuliani foi reeleito com apoio até da oposição.


A polícia de Nova York persegue traficantes e consumidores, não aceita subornos, denuncia e pune com rigor seus desvios e violências, assume as suas responsabilidades e faz o que tem que ser feito, para o que são pagos: garantir segurança e liberdade aos cidadãos.


Enquanto isso, no Rio, dizem que o tráfico é a origem de todos os males que assolam a população. Parece até que se ele acabasse a cidade voltaria a ser o paraíso tropical dos anos dourados. Mas, se o ‘movimento’ acabasse, eles não venderiam doces: seriam legiões de bandidos desempregados e armados descendo sobre a cidade indefesa. Sofia não teria pior escolha.’


 


SOBRE O ISLÃ
José Sarney


O islã, judeus e cristãos


‘SE HÁ UM POVO sofrido é o curdo. A história não tem sido generosa com eles. Seu sofrimento é milenar. Agora, uma vez mais, eles estão no meio de um massacre. Pelo que eles lutam há séculos? Por uma nação independente, que se chamaria Curdistão.


Eles têm língua e costumes próprios, e são muçulmanos. Acontece que estão espalhados: 34% moram na Turquia, 26% no Iraque, 6% na Síria e 6% no Irã. Esses números eu recolhi de um livro excelente e muito bem escrito, que é ‘Sobre o Islã’, de Ali Kamel.


Já escrevi várias vezes sobre os curdos, desde o massacre a gás feito por Saddam, em 1991, em Kirkuk, passando por episódios da guerra até este ano sobre o genocídio de Sinjar. Acontece que, como acentua Ali Kamel, o Iraque não é um caldeirão de etnias. Há apenas duas: árabes e curdos. A grande divisão é entre xiitas e sunitas. Os curdos são em maioria muçulmanos sunitas.


O livro de Kamel ajuda a compreender o mundo de controvérsias e coincidências entre as três religiões monoteístas vindas de Abraão -judeus, cristãos e muçulmanos- e a convergência de seus princípios básicos.


Só quem visita aquela região, como eu fiz há oito anos, à Síria e ao Egito, e há dois anos, à Jordânia, vendo como seus povos se subdividem em seitas, ritos e grupos, pode compreender como é complexo o que ali acontece e como é difícil encontrar soluções. Houve mesmo uma reunião do InterAction (organização de ex-chefes de Estado e de governo de que faço parte) com teólogos católicos, protestantes, muçulmanos, judeus, budistas, hinduístas e confucionistas na tentativa de descobrir um caminho de entendimento para a humanidade.


É essa busca de desfazer equívocos e encontrar esse terreno comum que descreve o livro de Ali Kamel.


Nesses debates foi encontrado um ponto em comum entre todas elas: ‘Não façam a ninguém aquilo que não querem que lhe façam’.


Fiquei impressionado quando li sobre a lei islâmica, conhecida como Charia, que se baseia em normas fixas, quase regimentais, e chega a detalhes incríveis, curiosidades para nós, até mesmo regras sobre depilação, remoção de sobrancelhas, coito interrompido, não abandonar a mulher nos dias de menstruação, abate de animais cortando a cabeça e tantas e tantas normas, que as sucessivas gerações não flexibilizaram.


O livro do Ali Kamel é um repositório fantástico de informações e dados nunca antes revelados em língua portuguesa e envolve sobre o assunto um saber enciclopédico, que merece ser conhecido e lido.’


 


TV PÚBLICA
Folha de S. Paulo


Decreto que cria a TV pública é publicado no ‘Diário Oficial’


‘Um decreto publicado ontem no ‘Diário Oficial’ da União oficializou a criação da Empresa Brasil Comunicação, gestora da TV pública que será inaugurada no dia 2 de dezembro.


Também foi oficializada a nomeação da jornalista Tereza Cruvinel para diretora-presidente da rede, e de Orlando de Salles Senna, atual secretário do Audiovisual do Ministério da Cultura, para diretor-geral da empresa.


O decreto é mais uma formalidade para a TV Pública sair do papel. Há cerca de 15 dias, o governo editou medida provisória autorizando a criação da nova empresa, que surge da fusão da Acerp (Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto), que leva ao ar a TV Educativa do Rio e a TV Educativa do Maranhão, e a Radiobras, estatal federal. O capital social da TV Pública é de R$ 200 milhões. O orçamento para 2008 é de R$ 350 milhões, mas sua meta obter mais R$ 60 milhões com publicidade.


A TV pública nasce vinculada à Secretaria de Comunicação Social, mas o estatuto diz que ela terá ‘autonomia em relação ao governo’.’


 


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


Tsunami de dinheiro


‘Sob o título ‘The view from Cloud 9’, algo como ‘A vista desde a felicidade’ ou ‘euforia’, a ‘Economist’ diz ‘por que o Brasil parece em melhor estado do que muitos outros emergentes’. Citando a ‘febre de lançamentos de ações’, diz que ‘três coisas aconteceram’. ‘Primeiro, as taxas de juros caíram. Segundo, foram tomados passos para melhorar a governança corporativa. E terceiro, as finanças públicas do Brasil foram contidas por uma combinação de cuidar bem da casa e o boom de commodities’. E agora, diz, ‘até Warren Buffett está comprando a moeda brasileira’.


Na capa do ‘Wall Street Journal’, a ‘luta’ dos bancos centrais dos emergentes, Brasil inclusive, com os ‘bons tempos’. Tempos de ‘inundação de dinheiro’, que ‘agora é um tsunami’. O ‘WSJ’ ouve Jim O’Neill, o visionário dos Brics, para quem ‘é um novo mundo’.


DOS MAIORES


Na manchete do ‘Valor’ e em reportagens no ‘WSJ’ e no ‘Financial Times’, a abertura de capital da Bolsa de Valores de São Paulo e o acordo da Bolsa Mercantil & de Futuros com sua congênere de Chicago.


O ‘Valor’ deu números e falou em ‘quinta maior emissão de ações do mundo neste ano’, sobre a Bovespa. O ‘WSJ’ destacou que o IPO ‘pode abrir a porta para negócios latino-americanos’ e descreveu o lançamento como ‘um dos maiores por uma bolsa de valores’ no mundo. Sobre a BM&F, ‘FT’ e ‘WSJ’, em mais de um texto, citaram que o acordo ‘é o primeiro do gênero entre uma bolsa americana e uma latino-americana’.


O ‘WSJ’ notou que a legislação evita venda total, aqui.


CAI O DESEMPREGO…


Na manchete do site da Reuters Brasil, ontem, ‘Economia forte ajuda a reduzir desemprego no país’, destaque também no UOL e outros. E ‘o IBGE já projeta para dezembro um recorde de baixa’.


E O BC AVISA


A queda ‘maior do que a esperada’ no desemprego ecoou também por Bloomberg etc. ‘Mas’, sublinhou a Associated Press, ‘maior demanda interna pode elevar a inflação, diz o Banco Central’.


TELE VS. TELE


Nos sites dos espanhóis ‘Cinco Días’, ‘ABC’ e outros, a Telefônica ‘dá por boas as restrições da Anatel’ e ontem ‘fechou a compra’ da TIM. E o ministro italiano do setor saudou a Anatel pela decisão que impôs, diz a Thomson Financial, ‘condições mais suaves que as esperadas’.


Carlos Slim, da rival Telmex, ‘saudou as restrições’, ele também. ‘Está muito bem.’ No mexicano ‘El Financiero’ e por aqui, anunciou investimentos de R$ 2 bi no Brasil para ‘incrementar sua presença nacional’. E depois foi se encontrar com a Globo, segundo o blog de Lauro Jardim.


MICROSOFT LEVA UMA


No ‘New York Times’ e outros, ‘a Microsoft venceu uma batalha de grande peso com Google e Yahoo’ e fechou acordo de publicidade com o Facebook, site social que já ameaça o MySpace nos EUA.


GOOGLE NEM AÍ


O Google reagiu insinuando que a Microsoft ‘pode ter comprado acima do valor’ -e lembrando que já tem o Orkut, ‘concentrado no Brasil e na Índia’, e um acordo de publicidade com o MySpace.’


 


TECNOLOGIA
Folha de S. Paulo


Vista e Halo elevam lucro da Microsoft


‘O lucro da Microsoft avançou 23% no terceiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período de 2006, para US$ 4,29 bilhões. O faturamento, de US$ 13,76 bilhões, cresceu 27% em igual período.


As fortes vendas do sistema operacional Windows Vista e do jogo Halo 3 ajudaram no resultado.’


 


INTERFERÊNCIA
Folha de S. Paulo


Rádio pirata levou Congonhas a fechar, diz FAB


‘Uma interferência de rádios piratas provocou o fechamento para decolagens dos aeroportos de Congonhas e Cumbica anteontem por volta das 22h.


Eles fecharam cerca de dez minutos, segundo a Aeronáutica, por interferências nas duas aéreas por onde os aviões passam. Ontem, a Infraero (estatal que administra os aeroportos) disse à Folha que o problema foi causado pela ‘intensidade de operações’, o que a Aeronáutica desmente.’


 


TELEVISÃO
Daniel Castro


Ministério ameaça programa evangélico


‘O Ministério da Justiça abriu um processo que pode resultar na primeira reclassificação de um programa evangélico, que passaria a ser impróprio para antes das 20h. Para o governo, o ‘Vitória em Cristo’, apresentado pelo pastor Silas Malafaia, da Assembléia de Deus, contém ‘linguagem depreciativa e conteúdos verbais que expõem lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros a situações humilhantes ou degradantes’.


Exibido pela Band, Rede TV! e CNT entre 12h e 17h, o ‘Vitória em Cristo’ está fazendo campanha para que evangélicos enviem e-mails a senadores contra a aprovação de ‘lei que beneficia a homossexualidade’ _na verdade, projeto que torna crime a discriminação sexual e de orientação sexual.


No programa, Malafaia (que compra horários nas TVs) defende que ‘ninguém nasce homossexual’, porque ‘não existe cromossomo homossexual’. Diz que o homossexualismo é ‘distorção’ e ‘aberração’.


Malafaia argumenta que não ofende os gays, que apenas os critica. Impedir isso, diz, seria censura. ‘No Brasil, você critica Deus, o Diabo, a Igreja Católica, os evangélicos, os políticos. Mas os homossexuais são incriticáveis. Se criticar, é chamado de homofóbico. Isso é pior do que Hugo Chávez e Fidel Castro. Já falei para o ministro Tarso Genro que, se censurarem meu programa, esse governo será chamado de preconceituoso’, afirma o pastor.


BOING ‘Duas Caras’, a novela das oito da Globo, registrou 43 pontos no Ibope da Grande SP nos três primeiros dias desta semana. O resultado animou a cúpula da emissora. Avalia-se que a novela, agora, é um Boing próximo da velocidade de cruzeiro.


SACOLINHA Presidente da TV Cultura, Paulo Markun está fazendo campanha na Assembléia Legislativa de São Paulo por emendas ao Orçamento do Estado destinando mais verbas para a emissora.


SAUDADES O ‘padrão Globo de qualidade’ mandou lembranças no ‘Show do Intervalo’ de anteontem. Em duas ocasiões, Galvão Bueno anunciou material (entrevista com Romário e gols de Robinho) que não entrou no ar.


FESTIVAL A MTV será de novo a emissora oficial do Tim Festival. Promete uma cobertura completa, com flashes ao vivo, dos shows de hoje e amanhã no Rio de Janeiro. E deve gravar a apresentação do The Killers.


RUN, MARIA, RUN Bianca Rinaldi, a Maria de ‘Caminhos do Coração’, inicia hoje uma maratona em São Paulo. Nas cenas, que serão gravadas até quarta, sua personagem correrá muito pelas ruas da cidade (principalmente as da Liberdade). Será perseguida por Leonardo Vieira.


BATISMO A mudança de nome de ‘Ídolos’, que a Record exibe a partir de 2008, é um capricho da emissora. A marca pertence à Fremantle, dona dos direitos e sua parceira _e não ao SBT.’


 


BREVES
Mônica Bergamo


Laços


‘Um dos maiores negócios na área da publicidade pode ser fechado ainda este ano: voltaram a esquentar as conversas entre o grupo americano Omnicon e a agência brasileira Lew Lara. As tratativas estão sendo feitas por meio da TBWA, um dos braços do grupo no Brasil.


BRIGA DE BAR


A AmBev está sendo processada pela Promotoria do Consumidor de SP por uma propaganda da cerveja Caracu, exibida em 2006, com o slogan ‘Caracu é igual mulher: gostosa pura ou turbinada’. A ação, do promotor João Lopes Guimarães Júnior, baseia-se em parecer do Conselho Federal de Psicologia, que considerou o texto ‘discriminatório e ofensivo às mulheres’. E pede indenização por dano moral. A AmBev diz que não foi notificada.


SOB O CÉU DE ESTAMIRA


‘Estamira’, que conseguiu a proeza de ficar seis meses em cartaz em São Paulo e de ser visto por 45 mil pessoas, público considerado grande para um documentário, vai virar DVD duplo. Num deles estará o filme original, que retrata a vida da catadora de lixo. No outro, ‘Estamira para Todos e Para Ninguém’, serão mostradas conversas dela com os amigos do lixão e extras com bastidores e entrevista com o diretor, Marcos Prado.


TROPA NO BAÚ


E o SBT de Silvio Santos também procurou os produtores de ‘Tropa de Elite’ para discutir a realização de uma minissérie baseada no filme.


LIVRARIA


A Academia Brasileira de Letras doará 2.000 livros infantis para dez bibliotecas criadas pelo Instituto Brasil Leitor.


Oito cidades vão receber os títulos.


RECEITA


A Nova Fronteira lançará um selo para livros de ‘desenvolvimento pessoal’. O ‘Sem Fronteira’ terá como primeira autora Ana Maria Braga. Ela dirá como aplicou o best-seller ‘Leis da Atração’ em sua vida.’


 


MÚSICA
Thiago Ney


A rebeldia em 2007


‘O NOVO disco de Britney Spears, ‘Blackout’, chega às lojas na semana que vem. O título não poderia ser mais irônico. Porque Britney estava sem lançar álbum desde 2003, mas nunca esteve tão em discussão como nos últimos dois anos.


Nem Pete Doherty nem Amy Winehouse foram tão minuciosamente escrutinados. Por quê? Talvez porque Britney já tenha vendido 80 milhões de cópias de seus discos. Talvez porque Britney esteja recusando o papel de princesinha pop.


A performance da cantora foi o assunto do VMA (a premiação da MTV americana) deste ano. Claro, ela fez playback e, no palco, tentando dançar e rebolar, parecia catatônica, mas o que realmente pareceu incomodar muita gente foi o fato de ela estar ‘gorda’.


O que é engraçado: estamos há tempos criticando modelos e atrizes anoréxicas pelo mau exemplo que passam a crianças e adolescentes inseguras, mas, quando Britney aparece com um pouquinho de volume em seu abdômen, é achincalhada por não estar magérrima.


A cantora teve atitudes não muito elogiáveis, como bater em fotógrafos com guarda-chuva, mas foi massacrada porque foi vista em algumas noitadas sem calcinha. Sim, uma mulher de 25 anos ousou sair de casa e se deixou fotografar sem calcinha. Sem contar que, em outra ocasião, a meliante foi vista nas ruas de Los Angeles com os cabelos totalmente raspados. Sim, careca. Caramba… Chama o Bope!


Foi nesse clima que a cantora produziu ‘Blackout’, que iria ser lançado em novembro, mas, devido à indesejada chegada à net, teve a data antecipada para a semana que vem. ‘Blackout’ é um disco de produtor -nos créditos, aparecem vários deles. O destaque é Danja (que já trabalhou com Justin Timberlake).


Em ‘Piece of Me’, Britney afirma: ‘Eu sou Miss América desde que tenho 17 anos/ (…) Um outro dia, um outro drama/ (…) Vocês querem um pedaço de mim’. Já em ‘Why Should I Be Sad’ canta: ‘Meus amigos diziam que você iria me enganar/ Mas eu dizia que eles estavam loucos/ Enquanto isso eu chorava, rezava/ Era tudo verdade?’.


‘Radar’ e ‘Break the Ice’ entram na seara de Rihanna e Beyoncé: batidas fortes, sintetizadores lascivos, jogos vocais. ‘Gimme More’, ‘Toy Soldier’ e ‘Perfect Lover’ são divertidas, melhores do que qualquer coisa feita por Gwen Stefani e lembram os bons momentos de Nelly Furtado. Electro-pop, ‘Heaven on Earth’ não ficaria fora de lugar num disco de Miss Kittin ou Scissor Sisters.


Ela provavelmente não queria e nem tem consciência disso, mas, se a música pop teve um pouco de rebeldia neste 2007, boa parte é responsabilidade de Britney Spears.


 



Thiago Ney e Marco Aurélio Canônico


Neneh Cherry apresenta ‘soul quebrado’ com sua nova banda


‘Dá para chamar de trip hop, de rap eletrônico, de soul pop. Neneh Cherry prefere outra definição: ‘Chamo de ‘broken soul’ [soul quebrado]. É soul, mas não o tradicional. Jornalistas precisam catalogar a música, então dizem que é trip hop’.


Cherry está falando do CirKus, banda em que canta ao lado da pós-adolescente Lolita Moon, do tecladista Kamil e do guitarrista Burt Ford -que, na verdade, é Cameron McVey, que colaborou com o Massive Attack em ‘Blue Lines’ (1991) e é marido de Neneh Cherry.


O grupo está escalado para o Tim Festival e se apresenta amanhã, no Rio; domingo, em Vitória, e segunda, em São Paulo (no Auditório Ibirapuera).


No Brasil, o CirKus mostrará faixas de seu único álbum, ‘Laylow’, que recebe lançamento brasileiro. Cherry encarou o disco como um escape à sua carreira-solo.


‘Queria trabalhar de uma maneira diferente. Ser artista tem a ver com viajar, estar em lugares diferentes, absorver experiências. Eu estava me acomodando como uma cantora pop, alguém como Jennifer Lopez, Beyoncé… estaria num lugar estranho’, conta, por telefone, à Folha. ‘Com a banda, senti mais liberdade para arriscar. Mas provavelmente farei um disco solo no ano que vem.’


O disco ‘Laylow’ começou a ser produzido por Ford e Kamil, numa casa na Inglaterra. A dupla chamou Lolita para entrar com algumas vozes. Em seguida, veio Cherry. ‘Estava junto quando tudo começou. Eu ouvia as faixas e me via nelas, me sentia como um fantasma dentro dessas canções. Então fiquei bem feliz quando eles me chamaram para cantar.’


Ao vivo, o CirKus é bem diferente do mostrado em estúdio, em canções como ‘Time for the Whistle’, ‘Starved’ e ‘Your Such an Assh…’ (para ouvir: www.myspace.com/cirkus).


‘A dinâmica mudou, é bem diferente de quando estávamos no estúdio. [Ao vivo] parece mais forte, às vezes até rock. Somos em seis no palco. Não me pergunte como será o show. Muda a toda hora’, brinca.


Trilhas e parcerias


Quem abre para o CirKus no Rio e em São Paulo é outro ex-colaborador do Massive Attack, o escocês Craig Armstrong.


De formação erudita, o músico é mais conhecido por suas trilhas para o cinema -trabalhou, por exemplo, com Baz Luhrmann (em ‘Romeu e Julieta’ e ‘Moulin Rouge’)-, mas vem para o Brasil com o projeto eletrônico experimental Winona, formado no ano passado com seu amigo Scott Fraser e que conta com vocais da atriz francesa Laurence Ashley e da cantora britânica Lucy Pullin.


‘Usamos sintetizadores antigos, é um projeto que eu queria fazer há tempos’, diz Armstrong à Folha, por telefone. Ele descreve o som do grupo como ‘pop europeu glacial’.


Armstrong também tem uma vasta lista de colaborações que inclui outra estrela que toca no festival, Björk.


‘Sou grande fã dela, acho que é uma artista fantástica. Talvez possamos fazer algo ao vivo.’’


 


Marco Aurélio Canônico


Tim sofre baixa e tem shows extras de Cat Power e Antony


‘O Tim Festival anunciou ontem sua segunda baixa nesta edição: a canadense Feist, que se apresentaria hoje no Rio, amanhã em São Paulo e no domingo em Vitória, foi ‘acometida por uma crise de labirintite aguda’, segundo a organização, e, não podendo viajar, cancelou suas participações no evento.


O primeiro cancelamento, também por motivos de saúde, havia sido da jazzista italiana Roberta Gambarini, que se apresentaria hoje em SP e amanhã no Rio, e foi substituída pela sueca Lisa Ekdahl.


No lugar de Feist, que tocaria em dois palcos com ingressos esgotados -hoje, na Marina da Glória, e amanhã, no Auditório Ibirapuera-, o Tim acertou shows extras de Antony and the Johnsons (no Rio) e de Cat Power (em SP e Vitória).


Com isso, o cantor americano fará dois shows em seqüência hoje, no Rio (nos palcos Tim Volta e Novas Divas, ambos esgotados), e Cat Power tocará duas noites além do previsto -uma em SP, também já sem ingressos, e outra em Vitória.


As entradas já vendidas para as apresentações de Feist continuam valendo para os novos shows. Os espectadores que preferirem receber o dinheiro de volta podem solicitá-lo, munidos do ingresso, no ponto-de-venda onde fizeram a compra.


Quem comprou no site da Ticketmaster pode pedir a devolução na página da empresa (www.ticketmaster.com.br). Mas os que pretendem pegar seu dinheiro de volta devem correr, pois, segundo a organização do festival, ‘o prazo máximo para a devolução do dinheiro é até o dia do evento em cada praça, na hora de abertura dos portões’.


Diferentemente de Power e Antony, já relativamente famosos por aqui (foram os primeiros a terem ingressos esgotados neste Tim), Lisa Ekdahl, a primeira substituta anunciada, é virtualmente anônima.


A sueca já havia visitado o país -tem amigos em Salvador, onde passou três semanas-, mas nunca tocou por aqui, tampouco tem seus discos (a maioria em sueco) à venda.


Sucesso em seu país, onde está em turnê, Ekdahl fará um show diferente no Brasil, menos centrado em seus dez álbuns, quase todos de tom pop alegre, e mais no estilo do palco em que vai tocar, o Euro Jazz.


‘Vou com uma pequena banda de quatro pessoas e vou tocar bossa nova e standards do jazz. Também quero tocar uma ou duas canções minhas, em sueco’, diz à Folha.’


 


Luiz Fernando Vianna


Álbum duplo faz passeio pelo choro desde 1870


‘São 28 faixas com 28 formações instrumentais diferentes. O músico Henrique Cazes quis ‘fugir da mesmice’ e mostrar no CD duplo ‘Uma História do Choro’ a diversidade do gênero. Com produção sua e de Katsunori Tanaka, japonês com muitas passagens pelo Brasil, o disco está sendo lançado aqui e no Japão simultaneamente.


O passeio começa na década de 1870 com ‘Flor Amorosa’, de Joaquim Callado. Leonardo Miranda toca uma flauta de ébano semelhante à que Callado usava. Mas também entram trombone (Zé da Velha), trompete (Silvério Pontes) e percussão (Beto Cazes), que não eram utilizados na época.


‘O ‘Flor Amorosa’ resume a idéia do disco. Começa meio formal, só com flauta, cavaquinho e violão, como era naquele tempo, e depois vira uma festa, como são as rodas de choro hoje’, diz Cazes, 48, que toca cavaquinho e violão tenor no disco, encabeçando um time de 26 músicos.


O primeiro CD contempla outros pioneiros, como Henrique Alves de Mesquita, Patápio Silva, Anacleto de Medeiros e Ernesto Nazareth.


Foram eles que começaram a dar uma cara brasileira a músicas européias como a polca, a valsa e a habanera.


Essa cara ganhou o nome de choro: primeiramente, uma maneira de tocar; depois, um novo gênero.


Cazes tomou liberdades como misturar o ‘Tema de Klezmer’, tocado por judeus nômades, à polca ‘Sultana’, de Chiquinha Gonzaga.


‘Como diz o Tanaka, não tem problema fazer um pouco de fantasia, desde que ela seja convincente. Foram judeus russos, por exemplo, que trouxeram o violão de sete cordas para o Brasil. No choro, é mistura de tudo o que é lado’, diz ele, autor do livro ‘Choro – Do Quintal ao Municipal’.


Divisor de águas


Pixinguinha, o nome mais importante da história do choro, fecha o primeiro CD e abre o segundo, representando o papel de divisor de águas, daquele que aglutinou diversas referências (afro, rurais, do teatro de variedades) numa forma musical. ‘Lamentos’ foi escolhido como marco dessa nova fase.


Benedito Lacerda, Abel Ferreira, Radamés Gnattali, Jacob do Bandolim e Waldir Azevedo são outros compositores do segundo CD, que não chega até autores do momento.


‘Não dava para fazer um CD triplo. E os contemporâneos têm sido gravados. É um assunto que está mais ou menos coberto’, justifica Cazes. O músico e produtor também explica por que faltam nomes importantes num projeto cujo subtítulo, por decisão da gravadora, é ‘Os maiores solistas da atualidade interpretam clássicos do choro’.


‘O Hamilton de Holanda é o melhor bandolinista de todos os tempos, mas pode não ser o melhor para tocar ‘Picadinho à Baiana’, do Luperce Miranda. Muita gente boa poderia ter participado, mas escolhemos em função do repertório’, afirma ele.’


 


CINEMA
Folha de S. Paulo


Debate põe críticos e cinéfilos à prova


‘Os críticos Leon Cakoff, diretor da Mostra de SP, Luiz Zanin Oricchio, do ‘Estado de S. Paulo’, e Inácio Araujo, da Folha, expressaram opiniões antagônicas sobre a condição atual da crítica de cinema e da cinefilia, em debate anteontem.


Contrariamente ao anunciado pela Mostra, a discussão -em torno do lançamento da edição brasileira de ‘A Rampa’ (Cosac Naify), do crítico francês Serge Daney (1944-92)- não teve a participação do presidente da Cinemateca Francesa, Serge Toubiana. Cakoff disse que, por razões de saúde, Toubiana cancelou primeiro sua vinda ao Brasil e, depois, a videoconferência que o juntaria ao debate, a partir de Paris.


Ao anunciar a realização do encontro, antes do início da Mostra, Cakoff ressaltou sua intenção de discutir a ‘crise da cinefilia’ e a ‘perda de credibilidade dos críticos’, fenômenos que julga estar em curso.


‘Não sei se estou alienado do mundo, mas não estou vendo crise da crítica’, argumentou anteontem Araujo. Para o crítico da Folha, ‘vivemos um momento dos mais interessantes, desde a internet, que deu nascimento a uma geração de críticos e a uma cinefilia que trabalha baixando filmes’.


Araujo avalia que ‘um bom esquema de repartição [virtual dos filmes] retoma o sistema da cinefilia’. Cakoff, que é também distribuidor e exibidor, replicou que ‘se o cinéfilo não é uma raça em extinção, ele não está presente onde a gente quer que ele esteja, que é no espaço coletivo [das salas de cinema], e não solitário. Acho isso um fenômeno lamentável’.


Já Zanin disse que ‘a crise mais acentuada da crítica cinematográfica se deve à pluralidade dos discursos. As certezas já não são levadas a sério’.


Em defesa da disposição crítica à compreensão dos filmes, Cakoff afirmou que ‘não existe filme ruim. Na pior das hipóteses, um filme ruim serve para você compará-lo com outro melhor’ e reivindicou que críticos possam ‘mudar de opinião, não só como sinal de coragem interna, mas por um processo de aprendizado’.


Araujo definiu a crítica como ‘um esforço de compreensão’, mas afirmou que ‘a escrita jornalística é agressiva, por mais delicado que se tente ser, dizer que eu não gostei do filme que você gosta é violento’.’


 


Sérgio Rizzo


Programa ‘É Tudo Verdade’ celebra 3 anos


‘Antes de ‘O Cangaceiro’ (1952), Lima Barreto (1906-1982) dirigiu cerca de 30 documentários. Um dos mais conhecidos, produzido pela Vera Cruz e premiado no Festival de Veneza, é ‘Santuário’ (1951), sobre os 12 profetas de Aleijadinho, que integra a sessão especial de curtas comemorativa ao terceiro aniversário do programa semanal ‘É Tudo Verdade’.


Além da expedição de Barreto a Congonhas do Campo (MG), a seleção -exibida amanhã, às 21h, com reprise no domingo, às 16h, no Canal Brasil- traz como outro destaque ‘Fala Brasília’ (1966), que Nelson Pereira dos Santos rodou para o extinto Instituto Nacional de Cinema Educativo, sobre as diferentes formas de expressão em português que se encontraram no Distrito Federal.


A sessão inclui os documentários musicais ‘Chorinhos e Chorões’ (1973), de Antonio Carlos Fontoura, e ‘Tim Maia’ (1986), de Flávio Tambellini, ‘A Pessoa É para o que Nasce’ (1998), que Roberto Berliner depois retomou em longa, e ‘Senhora Liberdade’ (2004), de Caco de Souza, sobre fundador do Comando Vermelho.


Com apresentação e direção-geral de Amir Labaki, o ‘É Tudo Verdade’ já exibiu 176 títulos em 116 programas. Esforço notável para levar à TV a filmoteca básica do documentário brasileiro, merece chegar a uma audiência maior.


É TUDO VERDADE


Quando: amanhã, às 21h


Onde: Canal Brasil’


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