Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O Globo


MÍDIA & PROPAGANDA
Carolina Brígido e Regina Alvarez


O ano da publicidade


‘No ano eleitoral, em que uma bem-sucedida campanha conseguiu garantir ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva mais um mandato de quatro anos, o governo aumentou 52% acima da inflação os gastos com publicidade, comparados com 2002, quando o então candidato governista foi derrotado nas urnas. Essas despesas chegaram a R$337,2 milhões entre janeiro e outubro deste ano, quando no mesmo período de 2002 somavam R$221,7 milhões, já corrigidos pela inflação do período. Em relação a 2005, os gastos do governo com publicidade cresceram 38,1% acima da inflação, nos dez primeiros meses do ano, mesmo com as restrições impostas pela lei eleitoral à publicidade institucional e outras formas de propaganda oficial.


De janeiro a outubro de 2005, o Executivo gastou R$244,1 milhões com publicidade, já considerando valores corrigidos pelo IPCA. Em 2006, o governo concentrou seus gastos no primeiro semestre, porque a lei eleitoral impede a veiculação de publicidade institucional nos três meses antes do pleito. Mas, ainda assim, considerando os gastos totais registrados no Orçamento até outubro com a divulgação das ações do governo – publicidade institucional, de utilidade pública, produção de material gráfico, entre outros – as despesas superaram o montante de 2005.


O levantamento – feito pela consultoria técnica de Orçamento da liderança do PFL no Congresso, com base nas informações do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) – mostra também que os gastos com publicidade realizados pela Presidência da República, nos primeiros dez meses do ano, chegaram a R$181,3 milhões, 37,4% além do valor pago no mesmo período de 2005, quando essas despesas foram de R$131,9 milhões, já corrigidos pela inflação.


Se comparados com as despesas da Presidência no mesmo período de 2002 (R$44,8 milhões), o aumento real chega 304,6%. Mas, neste caso, este aumento não pode ser considerado real, pois a base de comparação não é a mesma, já que o governo Lula decidiu centralizar toda publicidade institucional na Secretaria de Comunicação (Secom), ligada à Presidência da República, o que não acontecia no governo anterior.


Especialista aponta contradição do PT


O cientista político Leonardo Barreto, professor da Universidade de Brasília (UnB), considera que existe uma contradição clara entre o discurso adotado pelo PT na gestão de Fernando Henrique Cardoso, contra gastos excessivos com publicidade, e a prática do governo Lula. Mas destaca que essa é uma postura de todos os governos e não apenas do atual.


– No período eleitoral, as pessoas associam os governantes ao candidato. Então, fazer propaganda para o Estado é fazer propaganda para os ocupantes dos cargos, e o contribuinte acaba pagando a conta – afirma Barreto.


Na visão de Barreto, o Congresso teria que discutir um limite para esses gastos, no âmbito da reforma política.


– O Congresso tem que regulamentar essas despesas para evitar abusos. A gente não pode esquecer que a maior parte dos escândalos de corrupção do ano passado estiveram ligados a gastos com publicidade – diz Barreto.


Para o líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ), o correto seria proibir gastos com publicidade um ano antes do processo eleitoral.


– Do jeito que está, é desperdício de dinheiro. Mas isso não é exclusividade do governo Lula. Em muitos municípios e governos estaduais se joga dinheiro fora com publicidade e a população paga por isso – afirma o líder.


Já o vice-líder do governo na Câmara, deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), defende a divulgação das ações do governo através da publicidade, mesmo em época de eleição:


– Acho que a publicidade governamental é necessária, porque precisamos mostrar à população o que o governo faz. A publicidade é essencial para que a população conheça os benefícios a que tem direito. É necessária e importante. E o volume de investimento (em publicidade) está ligado ao número de programas.


Albuquerque argumenta que o governo tem ampliado os contatos de informação com a população, como é o caso da convocação para o recadastramento no INSS e informações sobre o Imposto de Renda. E esse contato é feito através da publicidade oficial.


– Aumentou muito a gama de prestação de serviços. Não existe outra forma de chegar à população – afirma.


A Subsecretaria de Comunicação Institucional da Secretaria-Geral (Secom), que é responsável pela publicidade do governo, pediu um prazo até amanhã para analisar os dados recolhidos no Siafi e se manifestar sobre o levantamento.’



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Oposição busca forma de conter despesas


‘Os gastos crescentes do governo com publicidade motivaram a oposição a apresentar, ano passado, uma proposta de emenda constitucional (PEC) para conter esse tipo de despesa. A intenção é proibir o poder público de tirar dinheiro do erário para custear propagandas que não sejam de utilidade pública – como é o caso das campanhas nacionais de vacinação, de contenção da violência no trânsito ou de combate ao tabagismo.


Gastos são excessivos, constata deputado


Segundo o autor da proposta, o ex-deputado Moreira Franco (PMDB-RJ), o governo não precisa noticiar seus feitos, pois a imprensa já cumpre essa função.


– Os gastos com publicidade são excessivos e só servem para manipular a opinião pública. É muito mais útil ao cidadão que o governo gaste em saúde e educação. Também é bom lembrar que no Brasil, recentemente, a ligação do poder público com agências de publicidade é uma fonte de corrupção desenfreada – avalia Moreira Franco.


A outra exceção prevista na PEC contempla produtos desenvolvidos por empresas públicas que são colocados à venda. É o caso dos anúncios de gasolina, óleos e aditivos desenvolvidos pela Petrobrás.


Mas a proposta não desperta muito interesse no Parlamento. A última vez que esteve em discussão foi em novembro de 2005, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Nem chegou a ser votada. Desde então, o assunto foi esquecido. Segundo Moreira Franco, com a proximidade do período eleitoral, os interesses em modificar as regras para publicidade no poder público desapareceram.


Em junho deste ano, a oposição também tomou outra medida contra os os gastos com publicidade do governo Lula, que considerou excessivos: pediu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que intime o governo federal a informar as cifras.


A informação foi prestada e, em seguida, o PFL entrou com um pedido de investigação eleitoral no tribunal para verificar se os gastos foram feitos de forma legal.


O partido suspeitou que o governo tenha infringido o dispositivo da Lei Eleitoral que proíbe o poder público de gastar com publicidade – no caso de propaganda institucional – em ano de eleições mais do que no ano anterior ou na média dos últimos três anos. A punição para o crime é a aplicação de multa e cassação do diploma do candidato à reeleição, se vencedor. O caso está sendo examinado pelo corregedor eleitoral, ministro César Asfor Rocha, e não tem prazo para ser concluído.’


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Chances de condenação do governo são pequenas


‘No entanto, avalia-se no meio jurídico que as chances de condenação do governo nesse processo são pequenas. Isso porque os limites de gastos impostos pela lei referem-se à propaganda institucional.


Os gastos com campanhas de utilidade pública, por exemplo, são liberados. Além disso, seria necessário avaliar caso a caso todas as publicações do governo incluídas no conceito global de publicidade para saber quais são realmente de utilidade pública e informativas ao público, e quais são mera forma de exaltação do governo e seus feitos.’


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