Uma corte de justiça concluiu na semana passada que Piers Morgan, ex-editor do Daily Mirror, sabia – e até encorajava – que os jornalistas James Hipwell e Anil Bhoyrul, que escreviam a coluna City Slickers, sobre investimentos, investiam em ações de empresas que eram recomendadas por eles aos leitores.
Em 2000, a coluna revelou que a empresa Viglen Tecnology estava se preparando para explorar a internet e as ações da companhia subiram espantosamente, gerando lucros tanto para o proprietário da Viglen quanto para os colunistas e Morgan, que haviam investido nas ações da empresa.
Hipwell, demitido do Mirror após ser acusado de negociar com os papéis do mercado acionário sobre os quais escrevia, alegou que Morgan havia dito que para ele fazia sentido investir em ações que ele recomendava, usando a analogia: ‘você não deve aprender a dirigir com alguém que nunca esteve em um carro – você não aprenderia de um manual’. Quando perguntado no tribunal se Morgan sabia da compra das ações pelos colunistas, Hipwell respondeu que o ex-editor não escondia isto de ninguém. ‘Eu fui encorajado por ele a comprar ações. Ele disse que se estávamos dando dicas sobre o mercado acionário, ele estaria feliz se nós estivéssemos negociando’, afirmou.
Apesar da atividade não ser ilegal, o código de conduta da Press Complaints Commission (PCC), entidade responsável por supervisionar a imprensa britânica, estipula que os jornalistas não devem investir em ações sobre as quais escrevem.
No tribunal, Paul Vickers, diretor do grupo Trinity Mirror, contou que era de sua responsabilidade assegurar que as cópias do código de conduta fossem colocadas na redação e que a equipe tinha conhecimento dele. No entanto, Hipwell alegou nunca ter visto o código e não sabia de nenhuma regra interna que proibia ou desencorajava a compra de ações sobre as quais ele escrevia. Vickers reconheceu a falta de regras concretas sobre investimento em ações em um e-mail enviado à equipe em 2000, quando as notícias sobre as atividades do editor e dos colunistas foram publicadas em um outro jornal. ‘O grupo está finalizando normas de conduta que serão disponibilizadas na próxima semana’, dizia o e-mail.
O ex-colunista contou também que Martin Cruddace, advogado do Mirror, estava ciente da compra das ações e que ele mesmo havia participado de algumas delas. Cruddace havia dito no tribunal que não tinha conhecimento de que as ações que ele estava comprando seriam recomendadas pela City Slickers.
Hipwell é acusado de ter conspirado para criar uma impressão errônea do valor dos investimentos na coluna de investimentos, mas nega que seu trabalho não fosse bem apurado, alegando que o jornal foi indicado como sendo o segundo mais preciso em dicas do mercado acionário em uma pesquisa realizada pelo Sunday Times em 2000. Ele também teria afirmado que havia mentido anteriormente para a empresa Lovells, contratada pelo grupo Trinity Mirror para investigar o caso, por pressão de Cruddace e da editora Tina Weaver, com o objetivo de proteger Morgan. ‘Eu deveria deixar claro que Morgan não sabia da matéria sobre a Viglen antes dela ser publicada’, revelou Hipwell. Em um segundo encontro com os representantes da Lovells, quando o ex-colunista já sabia que seria demitido, ele não teria mais sustentado sua versão original. Por esta razão, o julgamento de Morgan ainda continua.
Para evitar o conflito de interesses, em julho deste ano a PCC determinou que os profissionais de imprensa que fazem recomendações de mercado acionário deveriam informar também a seus leitores sempre que eles ou seus familiares tiverem algum interesse financeiro em alguma companhia que recomendem. Informações de James Daley [The Independent, 15/11/05] e de Simon Bowers [The Guardian, 16/11/05].