O inglês Hugh Laurie é o exemplo mais atual do ator que foi engolido pelo personagem. Não se trata de Silvester Stallone (Michael Sylvester Enzio Stallone), que se tornou conhecido como o pugilista Rocky Balboa (seis filmes) mas sempre foi Stallone; ou do atual governador da Califórnia, Arnold Schwarzenegger (Arnold Alois Schwarzenegger), de quem nem os personagens Conan e o Exterminador tiraram a identidade.
Poucos saberão quem é Hugh Laurie, mas há três anos se impõe nos primeiros lugares das televisões mundiais, interpretando o doutor House. O claudicante médico de um hospital universitário de New Jersey, que tem uma personalidade difícil e exacerbada pela dor incessante de uma antiga ferida na perna, o que o obriga ao uso abusivo de analgésicos.
Nos Estados Unidos, está entrando na quarta série, enquanto na Itália estamos assistindo à terceira e, desde o ano passado, conta com 5,5 milhões de telespectadores a cada apresentação.
Melhor morder a língua
‘Eu estava convencido que depois de alguns episódios o público teria pedido para que o personagem se abrandasse’ – conta Laurie. ‘Contudo, seu mau humor, geralmente cruel, é o que agrada o público.’
O dr. House tem uma equipe de jovens assistentes que o seguem com uma confiança ilimitada. Muitas vezes desaprovam seu método, mas não põem em dúvida sua capacidade de diagnosticar as mais misteriosas síndromes e doenças infecciosas nos pacientes. House faz testes dolorosos, ignora as terapias mais convencionais, arriscando tudo, mas acaba sempre tendo razão. Certa vez foi ferido à bala pelo marido de uma paciente que o julgou responsável por sua morte. O tratamento de House, no princípio, o curou da dor na perna, mas depois de uns poucos capítulos, a hipótese foi afastada. Ele necessita da dor, pois sem ela não haveria desculpas para sua solidão e humor infame.
Laurie fala de seu dr. House: ‘Tenho minha teoria. Quando li pela primeira vez os originais, gostei muito da independência do personagem. É libertário ver alguém que está se lixando para aquilo que o mundo pensa. Não procura aplausos nem críticas. Está livre para seguir seu caminho, são situações que invejamos. Mas não é um comportamento prático: muitas vezes é melhor morder a língua a dizer o que se pensa na realidade.
Futebol e televisão
Se vivêssemos uma vida de puras verdades nos transformaríamos em psicopatas. O auto-controle se faz necessário. Isso quer dizer que uma pessoa como House está muito bem na televisão. Se o encontrássemos na vida real, provavelmente o espancaríamos.’
O ator pouco fala de sua vida, diz que as coisas que o desagradam, enumeradas, encheriam 500 páginas. É feliz com sua família, gosta de motocicletas e de música, junto com os filhos tem uma banda e tocam juntos.
Esta semana o dr. House, na Itália, bateu em audiência o futebol, com 22% contra 19% no jogo do Milan (time do brasileiro Kaká) pela Champions League. Algo que na Itália soa como incrível, dada a paixão que se tem pelo futebol. Acostumado com o Brasil, quando se enchia o Maracanã de espectadores vestindo bermudas, camisetas e sandálias de dedo, me impressiono ao ver na temporada inverno, estádios cheios de pessoas encapotadas, torcendo pelos seus times debaixo de neve, vento e temperaturas negativas.
A comparação entre o futebol e House deve ser entendida como algo curioso e passageiro. O futebol vive de altos e baixos mas é comum uma constante renovação, há mais de 100 anos. Já com os seriados televisivos isso não acontece; se exaurirão, como foi o caso de Papai Sabe Tudo, Bat Masterson, Bonanza, Rin-tin-tin, Os Intocáveis e O Fugitivo.
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Jornalista