Thursday, 19 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Por uma Rede Nacional de Observatórios de Imprensa

O sistema brasileiro de comunicações é marcado pela oligopolização, por uma ainda incipiente preocupação com a qualidade e por uma total ausência de transparência nos seus processos. Paradoxalmente, os meios de comunicação têm finalidade social e devem prestar um serviço público essencial ao aprofundamento da experiência democrática brasileira, independente da natureza do controle de suas empresas. É a própria Constituição Federal que determina tais contrapartidas sociais.

Apesar disso, a cena midiática nacional ainda não dispõe de uma cultura de consumo crítico dos conteúdos, lacuna que possibilita uma série de desrespeitos aos direitos do cidadão e de distorções do papel da imprensa, em particular na vida brasileira.

São poucas as iniciativas de análise da mídia nacional. O meio acadêmico pode contribuir sobremaneira para a disseminação de um consumo ativo de informação, gerando condições para um controle público de qualidade de produtos, processos e procedimentos. Neste sentido, os projetos universitários de crítica de mídia podem somar esforços e constituir uma Rede Nacional de Observatórios de Imprensa nas instituições de ensino superior.

Esta idéia, surgida no âmbito do Observatório de Imprensa ainda nos anos 1990, foi sendo discutida por diversos atores nos últimos anos. Problemas de viabilidade, de oportunidade e, forçoso afirmar, de qualificação de docentes, mostraram que a idéia, embora viável, fosse sendo adiada. A realidade hoje é outra, felizmente. Quase dez anos depois de sua primeira proposta, a Rede Nacional de Observatórios de Imprensa (Renoi) passa a existir concretamente a partir de agora, podendo expandir seus nós em todas as latitudes brasileiras sempre com a clara finalidade de contribuir para o aperfeiçoamento da mídia nacional, seja monitorando os meios, pesquisando soluções para seus problemas ou fomentando uma cultura de consumo não-passivo da informação, do entretenimento e da diversão.

Para dar corpo e sentido à Rede, apontam-se os pressupostos que a sustentam:

** Faculdades e universidades, públicas ou privadas, de todo o Brasil podem funcionar como nós dessa rede, viabilizando núcleos;

** É desejável que cada instituição participante – organizado em núcleo – tenha um projeto local de operações, e que este convirja com o empreendimento nacional de oferecer um mosaico de leituras críticas dos meios de comunicação;

** Cada instituição constitui um nó da rede. E cada nó reúne professores, pesquisadores e alunos de graduação e/ou pós-graduação em torno de linhas de ação claras e objetivas. É desejável, então, que cada núcleo do Observatório esteja vinculado a grupos de pesquisa, na medida do possível certificados pelas instituições e credenciados no CNPq;

** A Rede deve facilitar a proposição e o desenvolvimento de pesquisas científicas interinstitucionais, dirigidas à análise das diversas realidades do país e à busca de soluções e saídas para o sistema mediático brasileiro;

** Cada núcleo da rede pode se concentrar na realidade regional, produzindo análises da mídia e do noticiário local, abastecendo com conteúdos a Rede;

** Também podem se constituir núcleos para acompanhamento nacional de determinadas coberturas, para avaliação de uma determinada mídia ou outras atividades afins;

** Além de pesquisas e monitoramento dos meios de comunicação local, os nós da rede podem propor e executar eventos, atividades, campanhas de educação para a mídia, etc. Podem também investir em produção jornalística experimental, com definição prévia de objeto, de metodologia e de período de produção, com vistas a desenvolver alternativas ou inovações capazes de minimizar os aspectos problemáticos do diagnóstico obtido. Os observatórios atuam em nível local, mas difundem o conhecimento que geram em escala nacional, global;

** A Rede Nacional de Observatórios de Imprensa deve ter uma configuração plural de projetos nos núcleos regionais, buscando organicidade, movimento e retroalimentação informativa;

** As instituições de ensino superior podem arcar com os custos de implantação, manutenção e expansão dos observatórios locais de imprensa, seja oferecendo infra-estrutura física, bolsas de estudo para os alunos e disponibilizando horas de pesquisa para os professores. Além disso, outras fontes de recursos podem ser buscadas, seja na iniciativa privada ou órgãos de fomento de ciência e tecnologia;

** O que faz da Rede Nacional uma rede não são equipamentos nem instalações físicas, mas a trama entre os participantes do projeto. Assim, os nós devem estar bem conectados, trocando informações, repassando orientações e atualizando seus conteúdos;

** A Renoi é uma rede, e por essa razão, o sistema não tem uma cabeça;

** Todos os núcleos podem ter seus próprios meios de divulgação (como sites, jornais, programas de rádio e TV), mas é indispensável que haja um pólo agregador e difusor das produções de todos os nós;

** Cada realidade regional deve ditar as metodologias e objetos de análise para seus núcleos observatórios de imprensa, garantindo diversidade e adequação. Entretanto, os nós da Rede devem seguir diretrizes que apontem paradigmas conceituais comuns de crítica de mídia;

** A crítica de mídia produzida nos núcleos dos observatórios de imprensa em universidades e faculdades deve ser acompanhada de um processo de sistematização conceitual de seus fundamentos. Deve-se ter em vista permanentemente que tal sistematização pode ser sempre inspiradora de experiências concretas qualificadoras e inovadoras das práticas jornalísticas;

** A Rede deve, então, funcionar como um ambiente de crítica de mídia associada ao esforço de produzir alternativas para superar ou minimizar os problemas apontados.

Por acreditar na mídia brasileira e na sua função social; por entender que a comunicação é um processo que pode contribuir para a promoção de cidadãos emancipados; e para reforçar o direito do cidadão a conteúdos mediáticos de qualidade e com respeito aos valores humanos, firmam este documento os seguintes signatários:

Prof. Dr. Luiz Gonzaga Motta, pelo NEMP – UnB (DF); Prof. Dr. Luiz Martins da Silva, pelo S.O.S. Imprensa – UnB (DF); Prof. Dr. Victor Gentilli, pelo Projeto Estudos do Jornalismo Brasileiro – UFES (ES); Prof. Dr. Josenildo Guerra, pelo Laboratório de Estudos em Jornalismo – UFS (SE); Prof. Dr. Rogério Christofoletti, pelo Monitor de Mídia – Univali (SC); Profª. Ana Lúcia Prado Reis dos Santos, pela Agência Unama – Unama (PA); Prof. Dr. Danilo Rothberg, pelo Observatório de Mídia – USC (SP); Prof. Alan Novaes, pelo Canal da Imprensa – Unasp (SP); Prof. Drnda. Kelly Prudêncio, pelo Núcleo de Estudos em Ética – UFPR (PR); Prof. Dr. Gerson Martins, pelo Comídia – UFRN (RN). [Florianópolis, 29/11/2005]