Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Lula ladeira abaixo

Em junho, a revista semanal do diário italiano Corrierre della Sera publicou pequena matéria assinada por Luisa Pronzato em que se afirmava que o mito Lula começa desabar. A última queda de prestígio do presidente brasileiro verificou-se com o salário mínimo proposto por alguém que passou a vida inteira querendo que este tivesse aumentos significativos. Acrescenta a matéria que essa não foi a única traição do presidente incensado pelas esquerdas, tendo à frente aquela italiana de Maximo D’Alema (Democráticos de Esquerda) e Fausto Bertinotti (Refundação Comunista).

Aquele era o Lula que barraria os tentáculos das multinacionais e do FMI. O Lula de hoje é o que deu livre caminho para o plantio de soja geneticamente modificada. ‘A sua política ambiental me desiludiu’, diz Alfonso Scanio (líder do Partido Verde), que em 2002 o havia saudado como um ‘verdadeiro presidente’. Lula deveria ser um das terras e da Terra, todavia em 2003 o desflorestamento no Brasil aumentou; prometeu a reforma agrária, depois reduziu o plano a menos da metade. Alfonso ainda faz alusão à quase expulsão do correspondente do The New York Times, que se fosse consumada por um presidente de direita, este seria acusado de liberticida. E conclui: ‘É verdade, essa foi uma queda de estilo’.

Caminhos semelhantes

Até aí, tudo bem: o Corriere é o típico jornal conservador, não se poderia esperar algo muito diferente. Mas no domingo (20/6), o La Repubblica, que é desde sua fundação (1975) um jornal de esquerda, dedicou uma página inteira a Lula com título e subtítulo que dizem tudo: ‘Lula, as esperanças traídas, quebra-se o sonho brasileiro’; ‘Entre gafes e programas eleitorais não mantidos, a imagem do presidente brilha sempre menos’. O texto é assinado pelo enviado Maurizio Ricci.

Como não poderia deixar de ser, a matéria começa pela grande gafe do presidente no caso do repóter Larry Rohter, do NYT. ‘Agora, cada vez que, em ocasiões oficiais, Lula se interrompe para pegar um copo de água, os flashes dos fotógrafos crepitam como metralhadoras’. Continua Ricci explicando que este é o preço que Lula está pagando pela sua maior gafe em 500 dias de governo – a de ter revogado o visto de permanência do correspondente do jornal nova-iorquino que o havia acusado de beber muito.

Mesmo agora com o caso encerrado, a raiva o presidente continua: não aceitou o conselho de convocar Larry Rother ao Palácio do Planalto e enterrar o assunto num conversa a dois, quem sabe terminada com um drinque.

O artigo de Ricci continua citando ‘Josias de Souza, chefe de redação em Brasília da Folha de S.Paulo, o maior jornal do país’, que explica a raiva de Lula uma vez que este tem um passado familiar de alcoolismo. Na cachaça afundaram seu pai Arístides, antes deste sua avó materna Otília, e agora seu irmão mais velho Jaime está indo pelo mesmo caminho. ‘Nas profundezas de suas lembranças – acrescenta Souza – existe um cemitério de copos.’

‘Consciência tranqüila’

No entanto essa gafe contra um jornalista teve a aprovação da maioria dos brasileiros, pois o fundo da alma de Lula e sua história são as mesmas de muitos brasileiros. Esse é o maior patrimônio do ex-metalúrgico e certamente o último que lhe ficou. O índice de aceitação, no momento máximo do ‘efeito Lula’, está muito longe do atual. Agora terá que enfrentar as eleições municipais que deverão se transformar num referendum. Ele é o homem que chegou ao poder prometendo um ‘espetáculo de crescimento’ e entra na campanha eleitoral dizendo e repetindo a palavra mais difícil para um político: ‘paciência’.

Ricci cita Carlos José Marques da revista IstoÉ, quando este diz ‘governar é mais que prometer’. As promessas mais espetaculares terminaram todas no vazio: o Fome Zero está encalhada; a Farmácia Popular, que daria remédios a preços subsidiados, está indo bem devagar; e o programa Brasil Sorridente, concebido para distribuir gratuitamente próteses dentárias num pais onde 14% da população não têm mais dentes, ainda não decolou. O crescimento do PIB, previsto de forma otimista para 2004, será de 3,5% – insuficiente para evitar o aumento do desemprego. Outro problema é a queda do investimento externo: em 2000 foi de quase 40 bilhões de dólares, caiu em 2002 para 20 bilhões de dólares e, em 2003, para 10 bilhões de dólares.

A mesma página do La Reppublica traz ainda uma entrevista com Lula feita por Francesc Relea, do El País, na qual o presidente brasileiro queixa-se, como sempre, da ‘herança maldita’ que recebeu ao assumir. Quanto à sua queda de popularidade, diz não se importar e ter a consciência tranqüila.

A cada pesquisa seu índice de aceitação vem caindo e, agora, até para os ‘companheiros’ da mídia italiana ele começou a descer a ladeira.

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Jornalista