Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Pânico no Congresso

Proposta pelo senador Heráclito Fortes – ex-PFL – em setembro de 2006 depois de apresentar denúncia e brandir documentos sobre sete milhões e meio de reais repassados pelo governo federal à Sociedade Amigos de Plutão, a CPI das ONGs foi aprovada agora, outubro de 2007. Pelo jeito, o Senado começa a ensaiar o próximo capítulo da novela Pânico no Congresso, da TV Senado! ‘Corage’! Só mesmo o bordão do personagem Christian Pior – do programa Pânico na TV, da Rede Record – pode expressar as situações vexatórias a que se prestam, infelizmente, alguns de nossos senadores.

Em setembro de 2006, apesar das muitas ‘crises’ que atingiram o governo federal e o PT, as pesquisas indicavam como praticamente garantida a re-eleição em primeiro turno do presidente Luís Inácio Lula da Silva. O ex-pefelista, num forte arroubo ético, tentou dar alento ao candidato da oposição, ao já praticamente derrotado Geraldo Alckmin. Propôs a CPI das ONGs, o próximo escândalo, a próxima ‘crise’, para evitar o naufrágio eleitoral da coligação PFL-PSDB. O objetivo era, nas palavras do senador Fortes, ‘estancar esse sangradouro de recursos públicos, que deveriam ter a sua destinação para as necessidades mais urgentes e imediatas da Nação, como saúde, educação, estradas, e não para entidades como aquela ‘Amigos de Plutão’, que nós não sabemos, em termos de prioridade, que serviço presta à Nação’. A referência infeliz jogou por terra a estancação pretendida pelo senador. O presidente operário se re-elegeu, ele e muitos dos petistas ditos ‘mensaleiros’. Em contrapartida, candidatos do PFL e do PSDB, os mais destacados pela imprensa como ‘paladinos da moral no Congresso’, tiveram os mandatos cassados pelo voto do povo brasileiro.

Um povo ‘desmemoriado’

Para os que não lembram, a criação da ONG Sociedade Amigos de Plutão, foi a ‘metáfora’ utilizada pelo jornalista Carlos Chagas em matéria publicada na Tribuna da Imprensa Online, em 29 de agosto de 2006, para expressar sua preocupação, legítima, com a criação de ONGs mas que, nas entrelinhas, pareceu estar mais preocupado com a re-eleição do presidente Lula. No açodamento que caracterizou a atividade dos congressistas e de alguns jornalistas à época, o experiente senador Fortes caiu na pegadinha de um outro jornalista, o Cláudio Humberto, ex-assessor do presidente Collor.

O que causa espécie não é a aprovação da CPI das ONGs nem o senador Heráclito Fortes ter caído numa pegadinha. Mas, sim, a certeza que o senador tem de que somos um povo desmemoriado. A mesma certeza que faz com que acredite que mudança de nome apaga o passado pefelista associado à ditadura e ao atraso do Brasil! ‘Corage’!

Nascida de uma pegadinha

Não resta dúvida que há muito que investigar sobre as ONGs. Não só em relação aos repasses de dinheiro público, seja federal, estadual ou municipal, como também a vinculações político partidárias no Brasil e no exterior, especialmente com organismos internacionais de pesquisa e com multinacionais que atuam no campo da biotecnologia, com ênfase nas que operam na Amazônia brasileira.

O problema é saber se vai ser mais um cenário montado, como antes, com fins eleitoreiros, ou se o Senado vai mesmo investigar a fundo as ONGs, esse artifício usado pelo neoliberalismo para substituir a atuação do Estado na área social. Artifício que, sob as bênçãos do PSDB, inaugurou a capilaridade da corrupção no Brasil. Se for mais uma panacéia eleitoreira, só acrescentará mais descrédito à imagem já desgastada do Senado. Mais uma CPI desmoralizante a ser engolida pelo valerioduto mineiro!

A julgar pelo passado, é o que se pode esperar de uma CPI nascida de uma pegadinha. ‘Corage’!

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Jornalista, Lauro de Freitas, BA