A questão feminina foi tema de duas matérias esta semana. Uma com origem no Fórum Econômico Mundial, outra do New York Times. O Fórum Econômico Mundial centralizou sua pesquisa na igualdade entre sexos, com ênfase maior no aspecto econômico, mas também menciona a participação política. E o quadro, pelo menos no que se refere ao Brasil, não poderia ser menos animador:
‘O Brasil ficou em 74º lugar no ranking de igualdade entre os sexos, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial, divulgado nesta quinta-feira (8). O país caiu sete posições em relação ao ano passado, mas o relatório ressalvou que a queda é devida à entrada de novos países na contagem. O Brasil mostrou melhora em indicadores de participação econômica, renda estimada e igualdade salarial para trabalhos semelhantes. No entanto, o Brasil continua apresentando uma performance relativamente ruim na educação e na representação política.’ (Folha de S.Paulo, 8/11/2007)
Enquanto no Brasil as mulheres continuam tendo pouca participação política, um movimento diferente acontece na América Latina, de acordo com matéria do New York Times:
‘O termo espanhol ‘equidad género’, ou ‘igualdade de gênero’, ganhou novo significado na semana passada, quando Cristina Fernández de Kirchner passou voando pelo teto de vidro na Argentina e se tornou a primeira mulher a ser eleita presidente, democraticamente, na história do país. Mesmo com o empurrão que obteve da presidência bem-sucedida de seu marido, Néstor Kirchner, a ascensão de Cristina Kirchner de senadora e primeira-dama a líder deste país de 40 milhões de habitantes não deveria causar surpresa. […] No ano passado, os chilenos elegeram Michelle Bachelet, a primeira mulher presidente da América do Sul, enquanto Portia Simpson-Miller era eleita a primeira mulher premiê da Jamaica. Lourdes Flores ficou no ano passado a um ponto percentual de romper a barreira de gênero no Peru, quando perdeu para Alan García no primeiro turno eleitoral de lá.’ (6/11/2007)
Isto quer dizer que os homens latino-americanos estão menos preconceituosos e reconhecem a capacidade política das mulheres? Parece que não. O artigo do New York Times dá uma explicação diferente para o fenômeno:
‘‘As mulheres estão sendo eleitas como resultado da busca desesperada por renovação da elite política’, disse Marta Lagos, diretora executiva da Barômetro Latino, uma empresa de pesquisa com sede em Santiago, Chile. ‘Elas não são conhecidas como grandes líderes e, infelizmente, não estão ascendendo ao poder por mérito próprio, mas por romperem com o esquema tradicional dos líderes políticos. Ainda assim, a ascensão delas ao poder ressaltou o fato de que ser mulher na América Latina está se tornando cada vez menos um obstáculo para se chegar a um posto superior.’ Alguns analistas vêem o recente sucesso das mulheres como parte de uma abertura mais ampla no cenário político para grupos não-tradicionais, que até recentemente seriam inelegíveis. Evo Morales na Bolívia, Alejandro Toledo, no Peru, e até mesmo Hugo Chávez, na Venezuela, prevaleceram na última década apesar de serem figuras de pele mais escura e carecerem da mesma formação educacional de seus tradicionais adversários brancos. O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, um ex-metalúrgico com estudos apenas até a sexta série, também mostrou quão aberta a política se tornou nesta região.’
Foco enviesado
Para explicar a ‘abertura’ política na América Latina e o crescente sucesso das mulheres, o jornal norte-americano acabou dando um show de preconceito ao falar de ‘figuras de pele mais escura’ sem ‘formação educacional’, e ao dizer que uma das explicações para a presença feminina na política são as ‘cotas de gênero’ que obrigam os partidos políticos a incluir mulheres em seus quadros. As mesmas cotas foram o tema do artigo de Dora Kramer no Estado de S.Paulo de domingo (11/11). Dora fala da decisão de um juiz eleitoral do Rio de Janeiro que recomendou ao Ministério Público impugnar as chapas eleitorais que não tiverem 30% de mulheres em seus quadros.
E é a articulista do Estadão que comenta a forma como os assuntos femininos e a participação das mulheres na política são tratados pela imprensa no país:
‘A notícia saiu pequena nos jornais de segunda-feira passada e não teve repercussão. Ninguém deu maior importância ao tema, como de resto dele não se fala, a não ser no Dia Internacional da Mulher para insistir, sem avançar, sempre na mesma dúvida: por que a presença de mulheres, tão acentuada em outras áreas, é baixa na política?’
Entre outros culpados talvez tenhamos que incluir a imprensa, que dá mais importância às mulheres envolvidas com políticos e escândalos, ou as que se comportam de forma inadequada, do que as que, embora minoria no Congresso, conseguem fazer um bom trabalho.
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Jornalista