Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O balanço de uma gestão

Presidente da SBPJor desde a fundação, Elias Machado, que deixa o cargo em novembro, faz uma avaliação dos dois mandatos da diretoria e aponta os principais desafios para a constituição do jornalismo como área científica com estatuto próprio. Jornalista profissional e doutor em jornalismo pela Universidad Autónoma de Barcelona, Machado atualmente lidera o Laboratório de Pesquisa Aplicada em Jornalismo Digital no Mestrado em Jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina.


As eleições para renovação da diretoria da SBPJor estão marcadas para a assembléia geral da entidade prevista para o dia 16 de novembro, durante o 5º Encontro Nacional de Pesquisadores em Jornalismo, em Aracaju, na Universidade Federal do Sergipe. Uma única chapa, liderada pelo professor Carlos Franciscato, da UFS, se inscreveu para participar do processo eleitoral. Os demais componentes da chapa são Claudia Quadros (UTP), vice-presidente; Claudia Lago (Anhembi Morumbi), diretora administrativa; Tattiana Teixeira (UFSC), diretora editorial; Marcia Amaral (UFSM), Rogério Christofoletti (Univali) e Kenia Maia (UFRN), Conselho Administrativo; e Antonio Hohlfeldt (PUC/RS), Alzira Alves Abreu (FGV), Francisco Karam (UFSC), Guilherme Rezende (UFSJ), José Salvador Faro (UMESP), Sonia Virginia Moreira (UERJ) e Zélia Adghirni (UnB), todos do Conselho Científico.


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Quando da fundação da SBPJor o jornalismo estava ameaçado de desaparecer como subárea na Tabela das Áreas de Conhecimento. Quatro anos depois da criação da entidade o que mudou na pesquisa em jornalismo no país?


Elias Machado – Em primeiro lugar, passamos a ter uma referência nacional capaz de constituir uma identidade e criar parâmetros de qualidade para os pesquisadores da área. Em segundo lugar, estabelecemos relações institucionais com as agências de fomento e com as entidades co-irmãs da área de comunicação com objetivo de legitimar o jornalismo como área científica. Em terceiro lugar, com a Brazilian Journalism Research e a Brazil Conference contribuímos para inserir de forma mais sistemática a pesquisa brasileira no mapa do mundo. Em quarto lugar, passamos a ter um espaço anual para o encontro dos pesquisadores e a divulgação de suas pesquisas e, por último, fomos decisivos como instituição por legitimarmos o jornalismo como área científica com estatuto próprio para reconhecimento pela CAPES do primeiro Mestrado em Jornalismo no país.


Até aqui a formação dos pesquisadores em jornalismo acontecia prioritariamente nos programas de comunicação ou outras áreas nas Ciências Sociais e Humanidades. Em que medida a criação do Mestrado em Jornalismo contribui para a legitimação do jornalismo como área científica?


E.M. – Trata-se de um fato histórico e de grande significado para a legitimação do jornalismo como área científica. Nenhuma área consegue legitimação se for incapaz de produzir ciência e dotar seus pesquisadores com titulação formal. Teremos daqui para frente mestres em Jornalismo e, a médio prazo, deveremos, como ocorre em outros países como Estados Unidos, Espanha e Inglaterra, formar doutores em Jornalismo. Os novos doutores terão condições de dialogar de igual para igual com os colegas de outras áreas e, com o devido conhecimento da tradição de mais de quatro séculos de pesquisa especializada, estarão capacitados para defender os cânones da área e evitar a canibalização dela por pesquisadores de áreas científicas, muitas vezes, mais jovens, mas mais articuladas dentro do sistema formal de institucionalização da ciência no país.


Na assembléia de fundação a diretoria apresentou como uma das prioridades as redes de pesquisa. Quatro anos depois a SBPJor tem apenas três redes informais de pesquisa. O que falta para a multiplicação e a institucionalização formal das redes de pesquisa?


E.M. – Lamentavelmente, os pesquisadores em jornalismo têm escassa tradição de pesquisa em equipe e menos ainda em redes institucionalizadas. Em parte devido à inexistência de pós-graduação específica e ao reduzido número de Linhas de Pesquisa em Jornalismo nas pós-graduações em Comunicação. Até aqui cumprimos uma primeira etapa de aprovar parâmetros formais para articulação das redes e induzir nossos associados a adotarem práticas mais coletivas de pesquisa. Daqui para frente caberá aos novos diretores implementar políticas capazes de traduzir em redes formais os grupos informais hoje existentes e induzir colegas com objetos de pesquisa similares a partirem para a criação de redes temáticas. A abertura de novas Linhas de Pesquisa em Jornalismo como ocorreu recentemente na Unisinos e do Mestrado específico na UFSC tende a contribuir para estimular novas parcerias no futuro próximo. Caberá agora aos pesquisadores em Jornalismo aproveitar melhor os mecanismos de financiamento como os editais de cooperação internacional da CAPES e do CNPq e nacionais como o PROCAD da CAPES.


A SBPJor nasceu com 94 associados. Hoje são 335 pesquisadores filiados, 153 deles doutores. O crescimento da entidade resultou da adesão espontânea ou houve uma prática sistemática de atração de novos membros?


E.M. – Desde a fundação da entidade sempre tivemos muito claro que necessitávamos ter uma política permanente de atração de novos associados. Somente se fossemos capazes de aglutinar os pesquisadores de todo o país teríamos condições de constituir uma referência nacional para a pesquisa em jornalismo. Ao longo dos últimos quatro anos fizemos diversas campanhas de filiação e adotamos estratégias como a colocação de bancas para filiação nos congressos da SBPJor, Compós e Intercom. Os resultados são animadores. Em dois anos mais do que duplicamos o total de filiados. Se mantivermos campanhas sistemáticas de filiação – e esta será uma das prioridades da nova diretoria pelo que consta no programa dela – poderemos chegar aos 500 associados nos próximos dois anos. E, quanto mais forte for a SBPJor, mais aumenta a adesão espontânea dos pesquisadores, interessados em participar da entidade e compartilhar experiências com os colegas de maior prestígio no país.


A diretoria da SBPJor que deve ser eleita apresenta uma executiva com vários colegas mais jovens e o conselho científico com pesquisadores muito experientes. Até que ponto a consolidação do jornalismo como área científica depende do aparecimento de novas lideranças?


E.M. – Penso que a renovação das lideranças no comando da SBPJor seja um dos fatos mais importantes para a consolidação da entidade e do jornalismo como área científica. Uma entidade somente vai ser forte se estiver aberta à mudança de gerações no poder e estimular o aparecimento de novas lideranças. A mescla de colegas experientes com lideranças mais jovens garante uma simbiose entre tradição e experiência com renovação e novas perspectivas de trabalho que tem tudo para dar certo. Aos novos diretores cabe a tarefa de apresentar projetos para consolidar nossa entidade dentro do contexto da pesquisa científica em comunicação e garantir ao jornalismo o status de ciência com estatuto próprio.


A BJR, como primeira revista científica publicada em inglês e com conselho científico com maioria de pesquisadores internacionais constitui uma das principais contribuições da SBPJor para a área da Comunicação. Como a diretoria conseguiu superar as dificuldades e tornar viável uma proposta tão ousada como a BJR?


E.M. – Antes de mais nada, uma diretoria da SBPJor deve sempre ter a ousadia de executar projetos capazes de contribuir para elevar os parâmetros de qualidade e de legitimação da pesquisa em jornalismo. Ao lançarmos a BJR em inglês sabíamos que daríamos um exemplo aos demais colegas do campo da comunicação ao mesmo tempo em que sinalizaríamos para os nossos filiados de que devemos internacionalizar os resultados de nossas pesquisas. Em cada época histórica predomina a hegemonia de uma língua como a língua franca entre os cientistas e, na atualidade, quem quiser se comunicar com colegas de outros países e tradições acadêmicas tem que publicar em inglês. Como todos nossos projetos, a BJR resultou de um trabalho confiado a uma equipe com profissionais talentosos e competentes. Neste caso, liderados pelos colegas Luiz Gonzaga Motta, editor e Dione Moura, diretora editorial. No começo muita gente perguntava se seria possível manter uma revista com periodicidade e qualidade em inglês. Três anos depois do lançamento e mantida a periodicidade e o alto nível dos conteúdos creio que ninguém mais duvida do acerto de nossa iniciativa. Recebemos o apoio de colegas do mais alto nível que participam do conselho editorial, dos pesquisadores que enviam seus textos já traduzidos para o inglês e muitos elogios de pesquisadores que recebem a BJR em todas as latitudes do planeta. A diversidade, a quantidade e a qualidade da pesquisa em jornalismo no país e o recebimento de textos de colegas de outros países são uma garantia para a continuidade e a melhoria da BJR no futuro próximo.


Desde a criação em 2003, a SBPJor vem trabalhando para estreitar relações com as entidades co-irmãs para fortalecer a área de Comunicação. O que representa para a área de Comunicação a fundação da Federação das Associações de Comunicação?


E.M. – Quando criamos a SBPJor tínhamos a clareza que somente chegaremos ao nosso objetivo estratégico de constituir as Ciências da Comunicação como uma Grande Área de Conhecimento se reconhecermos a diversidade existente em nosso campo. Sociedades científicas articuladas em torno de objetos específicos como o jornalismo são um ponto de partida para a legitimação de nossa área frente aos formuladores da política de ciência e tecnologia no país. De lá para cá acompanhamos a fundação de várias outras entidades co-irmãs. A SBPJor esteve presente no I Fórum das Associações Científicas e Acadêmicas de Comunicação (SOCICOM), promovido pela Intercom, em Santos, neste ano e propusemos a criação da Federação, sugestão aprovada por unanimidade por todas as entidades participantes. Ao criarmos a Federação, por um lado, pela primeira vez teremos uma instituição encarregada de formular políticas estratégicas e de elaborar estudos prospectivos para dialogar com os órgãos de fomento, empresários da comunicação, movimentos sociais e o Governo nos planos Federal, Estadual e Municipal. E, por outro, dotaremos a área de mais racionalidade na interlocução com estes atores sociais porque negociaremos sempre em bloco para atender aos interesses estratégicos de legitimação das Ciências da Comunicação como Grande Área de Conhecimento, evitando a disputa interna ao campo que apenas contribui para a pulverização dos escassos recursos existentes e conduz a falta de apoio para determinadas subáreas de conhecimento ainda pouco consolidadas.


O exercício de um cargo como a presidência da SBPJor exige grande dedicação e depende de muitos apoios. Depois de quatro anos como presidente qual o sentimento ao deixar da diretoria da entidade?


E.M. – Em primeiro lugar de agradecimento. Gostaria de agradecer a todos os meus colegas por me darem a possibilidade de presidir a SBPJor por dois mandatos, que considero a mais alta honraria concedida a um pesquisador em jornalismo, e poder contribuir para a institucionalização do jornalismo como ciência em nosso país. Em segundo lugar, gostaria de agradecer aos meus colegas de diretoria, no primeiro e segundo mandatos. O trabalho colegiado e em equipe orientou toda a nossa atuação ao longo destes quatro anos. Sem a dedicação, a competência e a lealdade da executiva e dos conselhos administrativo e científico jamais teríamos conseguido colocar em prática todos os nossos projetos. Em segundo lugar, gostaria de agradecer a todas as instituições públicas e privadas que apoiaram nossos projetos, em particular o CNPq e a CAPES. E, por último, de missão cumprida. Penso que conseguimos executar a quase totalidade dos projetos apresentados em nossos programas submetidos aos associados da SBPJor como realização de congressos anuais e da Brazil Conference, criação da Brazilian Journalism Research, lançamento de publicações regulares como o SBPJor Notícias, manutenção de Listas de discussão, lançamento de Sítio Web próprio, Biblioteca On-line de Jornalismo, automatização da parte administrativa e representação institucional frente às agências de fomento e regulação como CNPq e CAPES.

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