Tuesday, 26 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Carta Capital

FSP CONTESTADA
Mino Carta

As implicâncias da Folha de S.Paulo

‘O jornal Folha de S.Paulo prima pelo didatismo, sem que seu empenho contemple fidelidade canina pela verdade factual. Não era essa a característica mais marcante da Folha dirigida por Claudio Abramo, que a tornou importante e para quem o respeito pela verdade factual era o primeiro objetivo do jornalismo.

Claudio assumiu a direção da redação há pouco mais de 30 anos e a deixou a 17 de setembro de 1977, em conseqüência das pressões do general Hugo Abreu, cabo eleitoral do general Silvio Frota, ministro do Exército e candidato dos falcões da ditadura à Presidência da República. Mas, sem considerar as opções políticas dos patrões, a diferença entre a Folha de Claudio e a de hoje talvez resida naquela no propósito de nivelar por cima, e nesta no de nivelar por baixo.

Na semana passada, tive a rara oportunidade de entrevistar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O meu velho e caríssimo amigo Lula. Faço questão de sublinhar que não houve pauta prévia e que o entrevistado freqüenta dados e números da situação e do seu desempenho com absoluto desembaraço. Conhece-os de cor e salteado.

Lá pelas tantas, disparou contra a oposição, denunciou-lhe o golpismo. Como de hábito, CartaCapital chegou às bancas paulistanas na hora do almoço de sexta-feira 9. Agências de informação transmitiram um resumo da entrevista, o eco alcançou Montevidéu, onde se realizava a reunião dos presidentes do Mercosul, e os enviados dos jornais brasileiros pediram a Lula que esclarecesse seu pensamento. Foi a manchete do sábado.

Não me causa surpresa, e muito menos mossa, que nas primeiras páginas não se citasse CartaCapital para explicar as razões da súbita curiosidade. Nem se fale da possibilidade de citar o autor da entrevista. Tais são os vezos do jornalismo nativo. Omita-se. Ignore-se. Aquilo que não foi divulgado não aconteceu.

Páginas internas, estas sim, referiram-se à entrevista e à revista, até largamente. E aí, na ribalta, o didatismo da Folha. Página A6, edição de 10 de dezembro, coluneta lateral convida o leitor: Saiba mais. Título: CartaCapital apoiou Lula em editorial de 2002. Conta-se que na última campanha apoiamos o candidato petista e que o presidente compareceu a dois eventos promovidos por esta revista, da qual ele gosta.

Como não se cansa de publicar, a Folha volta a aludir ao fato de que o governo ‘não nos nega anúncios’, como eu próprio escrevi nesta mesma página, ao contrário do governo do grande democrata Fernando Henrique Cardoso.

Enfim o fecho do precioso informe atribuído à redação da Folha: CartaCapital teve tiragem de 35.300 exemplares em setembro. Já aqui a verdade factual entra em órbita. Em setembro, a tiragem média foi de 65.160 exemplares, conforme haverá de se apurar nos relatórios do IVC. Em outubro foi de 68.825, em novembro de 72.975. Previsão para este dezembro: 75.575.

Analisemos, porém, o didatismo. Sobram as dúvidas. Aplicado para desqualificar a entrevista e o entrevistador, ou para insinuar as razões pelas quais Lula falou com a formiga em vez de convocar os elefantes? Sim, há cerca de 30 anos o torneiro mecânico me honra com sua amizade e certa vez, há 25, abri em sua homenagem um Brunello di Montalcino trintão. Creio mesmo, tê-lo presenteado, in illo tempore, com sua primeira gravata, azul-marinho salpicada de bolinhas brancas. Composta, e até solene.

Não são estes, contudo, os motivos do apoio de CartaCapital à sua candidatura. Ocorre que a tínhamos como a melhor, na circunstância. Decisão legítima, bem diferente da hipocrisia de quantos alardeiam isenção, objetividade, eqüidistância, pluralismo etc. etc. Agora, digo eu ao leitor: saiba mais.

Tempos da campanha de 2002, a direção da Folha convida Lula para um almoço nas belas dependências da empresa. Anfitrião, Octavio Frias de Oliveira. O filho, Otavinho, diretor da redação, chega atrasado. E mal toma assento, pergunta ao hóspede algo em torno da sua falta de diploma. Cabe ser primeiro mandatário do Brasil a quem carece de estudo? Não será exagerada, descabida, ousada além da conta, a sua pretensão?

A implicância fermenta, o convidado ergue-se e se retira, com passadas de metalúrgico. Pai Octavio, que conhece as regras de cortesia, segue apressadamente, constrangido, tenta levar o candidato ofendido de volta à mesa. É tarde, Lula está no elevador, e se vai.

A redação da Folha enxerga em Otavinho um colega. Um jornalista. Colhe-me certa perplexidade. De todo modo, para quem comanda redações apinhadas, deve ser difícil digerir uma semanal bem pensada, bem escrita, bem impressa, produzida por 11 profissionais (disse 11) à sombra de uma empresa pequena, porém valente, que não deve coisa alguma a ninguém. CartaCapital, da Editora Confiança.’

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