Apesar da repercussão sobre as imagens encenadas e alteradas no sul do Líbano ter ocupado manchetes há algumas semanas na mídia mundial, essa é apenas parte de uma questão maior: o papel das imagens em descrever fielmente o conflito iniciado em 12 de julho entre Israel e Hezbollah.
De acordo com artigo de Lorne Manly [The New York Times, 14/8/06], as organizações noticiosas, americanas em particular, têm dificuldades em determinar como e em que proporção as imagens de civis mortos e feridos deveriam ser exibidas em sua cobertura quando o número de baixas de um lado do conflito é bem superior ao do outro.
O ‘cálculo jornalístico’ fica mais difícil com o envolvimento do conflito entre árabes e israelenses, assunto que assusta como poucos qualquer editor de notícias, e o Hezbollah, organização considerada terrorista pelo governo dos EUA.
Mas as decisões ficam ainda mais complicadas com o poder de fotografias e imagens de TV, que evocam e provocam de forma que não acontece com palavras ditas e escritas. ‘Imagens são o que tocam as pessoas’, disse Jane Arraf, assessora de imprensa do Conselho de Relações Exteriores. ‘No final das contas, as pessoas retêm imagens muito simples quando não estão realmente engajados ou concentrados num assunto’.
Editores e executivos de jornais, revistas e emissoras afirmam não ter uma fórmula para noticiar justamente um assunto destes sob esse prisma. ‘Não se trata de um evento esportivo em que estamos somando pontos para ambos os lados’, disse Jonathan Klein, presidente da CNN nos EUA.
De qualquer forma, afirmam estar conscientes da necessidade de manter um equilíbrio no tempo ou espaço dedicado a cada lado, principalmente em relação a imagens, dado o seu poder potencial. ‘Fotos são mais traiçoeiras que palavras porque seu conteúdo é em grande medida emocional, visceral, e porque não se pode editar seu conteúdo’, disse Bill Keller, editor-executivo do New York Times. Em um caso de notícias contínuas como este, o jornal baseia suas escolhas fotográficas em uma série de fatores, incluindo qualidade, originalidade e relevância. ‘Você não diz ‘ontem demos inocentes libaneses mortos na capa, então hoje teremos que dar o mesmo espaço para inocentes israelenses mortos’. Mas você tenta, com o passar do tempo, mostrar todas as conseqüências da guerra’, afirmou Keller.
Richard Stengel, editor-geral da revista Time, afirma que, se por um lado preocupações com justiça entram em seu julgamento, por outro não são o primeiro fator decisivo nesse caso. ‘Não é uma questão de tomar lados, mas de se tratar de um período de grande tormento para ambos’.
Cabo de guerra
Jon Banner, produtor executivo do World News With Charles Gibson da ABC, disse que não consegue pensar em um evento recente que tenha sido mais difícil de cobrir que esse no sul do Líbano, devido à complexidade do assunto e à natureza poderosa das imagens. A ABC tentou, durante toda sua cobertura do conflito, dar um segmento do Líbano e um de Israel, de forma a contar a história de ambos os lados.
Para alguns, essa é uma negligência do dever jornalístico. Alguns críticos de Israel dizem que o Líbano deveria merecer mais destaque porque o número de mortos foi maior do lado do Hezbollah. Já os pró-Israel dizem que a comparação deveria ser moral, sendo Israel uma nação democrática exercendo seu direito de autodefesa enquanto o Hezbollah é uma organização terrorista que usa o povo libanês como escudo humano.
Outros, no entanto, acham que entendimento é a chave do sucesso jornalístico. ‘Proporcionalidade é um termo sem sentido em um conflito desse tipo’, disse Charles Johnson, dono do blog Little Green Footballs, conhecido por ter revelado a manipulação de diversas imagens no conflito no sul do Líbano, entre as quais a que culminou na demissão de um fotógrafo da Reuters. O Hezbollah, para ele e outros críticos, é um grupo niilista sem pudor de sacrificar civis.
Max Boot, do Conselho de Relações Exteriores e colunista do Los Angeles Times, e Davis Hanson, da Hoover Institution de Stanford, dizem que baixas civis, apesar de lamentáveis, nunca foram fator decisivo na justiça de uma guerra.
Para Hanson, parecia ter mais imagens mostrando a angústia do Líbano e ele gostaria de ter visto mais equilíbrio. ‘Não é culpa minha que os Katiushas ainda são primitivos e não têm capacidade nuclear’, disse.
Executivos de organizações noticiosas receberam duras críticas de todos os lados por sua cobertura do conflito no Oriente Médio. Os leitores ‘não querem que mantenhamos equilíbrio na cobertura’, afirmou Keller, ‘mas que mostremos a moralidade da guerra como eles próprios vêem’.