Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Emissora tenta esconder erros de brasileiros na F-1

A Rede Globo está numa verdadeira saia justa ao fazer as transmissões de grandes prêmios de Fórmula 1. Os profissionais da emissora vêm ‘mordendo a língua’ para não falar mal dos pilotos brasileiros. Na corrida de estréia da temporada, eles chegaram a truncar informações para despistar os erros dos três pilotos tupiniquins – que deixam de fazer jus ao retrospecto vitorioso de ases voadores do passado nacional. Tanta preocupação tem motivo: a Globo vem tendo dificuldade em renovar os contratos de patrocínio para as transmissões, devido ao baixo índice de audiência. Tanto que o narrador e os comentaristas deixaram de acompanhar as provas internacionais já faz algum tempo.

Por isso, a performance de Felipe Massa, Rubens Barrichello e Nelsinho Piquet está intimamente ligada ao poder de fogo da emissora em relação ao evento. A atitude da Globo, portanto, se explica, mas não se justifica. Afinal, os fãs não merecem ser enganados por repórteres, narrador e comentaristas que costumam desmentir os fatos – no caso, as imagens, que teimam em deixar a turma falando muchochos. Embora opiniões sejam discutíveis para leigos, elas não o são para quem tem experiência de guiar – pelo menos, carros de passeio. O que deixa os profissionais globais em má situação. Sem dizer que, ao invés de comentários, o correto é que os comentaristas façam interpretações dos lances das provas para o público. De preferência sem torcida.

Imagem desmente narrador

No Grande Prêmio da Austrália, Felipe Massa saiu da pista na segunda curva por não conseguir segurar o carro. O narrador Galvão Bueno apressou-se em dizer que ele teria batido, o que não ocorreu. Ao ser desmentido pelas imagens, Bueno se limitou a narrar a imagem, sem os costumeiros comentários indicativos de erro. Mais á frente, Massa se espremeu com outro carro numa curva por ter forçado nitidamente a passagem, provocando um acidente feio para o colega e saindo, aparentemente, ileso. Mesmo depois do replay, Bueno e os comentaristas Reginaldo Leme e Luciano Burti disseram que foi uma disputa normal – quando, na verdade, o piloto brasileiro forçou a barra. Logo depois, Massa parou o carro fora da pista. Galvão disse, sem a informação necessária, que o motor da Ferrari havia quebrado, isentando o seu condutor de qualquer possível erro. No final da prova, a repórter da Globo Mariana Becker, que estava nos boxes, deixou aberto em seu texto de reportagem, para os programas da rede, os verdadeiros motivos da quebra do carro vermelho. A turma conspirou feio a favor da boa imagem de Massa, mas sem sucesso. Dois dias depois, uma revista italiana soltava a informação de que a Ferrari deve se desfazer do brasileiro em 2009.

Outra tentativa de esconder erros teve como personagem o não menos polêmico Rubens Barrichello. A bordo do carro da Honda, o piloto vinha muito bem na prova, em quarto lugar, quando a equipe o chamou para o box. Na saída, Rubinho deixou a área de pit lane com a luz vermelha acesa. Foi punido e desclassificado por isso. Galvão Bueno, com o ar crítico, soltou essa: ‘Olha a Honda fazendo bobagem! Chamaram o Rubinho na hora errada!’, transferindo a responsabilidade do erro tolo à equipe e eximindo de culpa o piloto trapalhão. Mais tarde, a imagem (novamente) desmentiu a Globo, ao mostrar a razão da punição. Mesmo assim, Bueno não se deu por rogado, continuando a afirmar o que só ele não viu (ou não desejava que víssemos).

Barbeiragens e frustrações

Normalmente, os comentaristas expressam as suas opiniões sobre as imagens, o que não aconteceu neste caso específico. Não houve palavra alguma dos outros dois participantes da transmissão – nem a favor, nem contra o que falou Bueno, o que é muito estranho para dois comentaristas deixarem de fazer.

No caso de Nelsinho Piquet, a atuação apagada passou desapercebida pela equipe de transmissão. Como se a estréia do piloto não tivesse acontecido.

O que fica claro no episódio é que o dublê de narrador e comentarista Galvão Bueno justifica nessas horas o seu mega-salário global, chamando para si a responsabilidade de ‘defender’ os protagonistas das provas de F-1, o que em jornalismo pode ser entendido como parcialidade. Isso tudo se aplicaria, claro, para contornar a queda da audiência, o que, convenhamos, é inútil e tolo, como as manobras pouco inteligentes dos pilotos brasileiros na última corrida. Mas como a cobertura das outras TVs sobre o evento sempre é mal feita, os inúmeros fãs de Fórmula 1 vão sendo guiados pelos tendenciosos jornalistas da Globo (como se o engodo fosse suficiente para apagar as barbeiragens e as frustrações deixadas no ar). Quase nunca falando o que pensam. Quase sempre deixando de dizer o que vêem dos pilotos brasileiros na Fórmula 1.

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Jornalista, Salvador, BA