Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Juíza defende privacidade de réu

Leia abaixo a segunda parte da seleção de segunda-feira para a seção Entre Aspas.


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Consultor Jurídico


Segunda-feira, 7 de abril de 2008


CASO THALES SCHOEDL
Priscyla Costa


Imprensa não tem direito a expor privacidade do réu


‘Emissora de televisão não pode mostrar imagens da vida privada sem o conhecimento ou consentimento do personagem, mesmo que esta pessoa seja réu em um crime de grande repercussão pública. O entendimento é da juíza Laura de Mattos Almeida, da 12ª Vara Cível de São Paulo. A juíza confirmou a decisão que proibiu a Rede Record de Televisão de transmitir qualquer imagem ou voz do promotor de Justiça Thales Ferri Schoedl, em que sejam mostradas situações de sua vida privada. Cabe recurso.


‘A emissora pode e deve fazer reportagens sobre o crime de que é acusado o autor. Mas exibir imagens e falas captadas clandestinamente violam o direito à intimidade e privacidade’, considerou a juíza. Os advogados da emissora não foram encontrados pela reportagem da revista Consultor Jurídico para comentar a decisão.


Schoedl é réu confesso de matar um rapaz e ferir outro, em dezembro de 2004. O crime aconteceu em Riviera de São Lourenço, condomínio de veraneio em Bertioga, no litoral paulista. Schoedl disparou 12 tiros com uma pistola semi-automática calibre 380 contra dois rapazes que teriam importunado sua namorada. Diego Mondanez foi atingido por dois disparos e morreu na hora. Felipe Siqueira foi baleado quatro vezes, mas sobreviveu.


No mês de agosto do ano passado, a Rede Record, no programa Domingo Espetacular, apresentado por Paulo Henrique Amorim, trouxe reportagem sobre o cotidiano do promotor, com detalhes de sua vida particular. As gravações foram feitas com câmeras e microfones escondidos. Thales aparecia em academia e numa casa noturna, acompanhado de uma garota. A reportagem Promotor acusado de homicídio permanece impune foi veiculada também em outros programas da emissora.


O advogado do promotor na esfera cível, Frederico Antonio Oliveira de Rezende, do escritório Mesquita Filho, Masetti Neto Advogados, ajuizou ação contra a emissora. Alegou que a reportagem violou os direitos protegidos pelo artigo 5º, X, da Constituição Federal (são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação) e caracterizou abuso do direito de imprensa.


Em setembro de 2007, Rezende conseguiu uma liminar contra a Record. A emissora entrou com Agravo no Tribunal de Justiça, que foi julgado improcedente. Na segunda-feira (31/3), a juíza Laura de Mattos Almeida confirmou a decisão.


‘A emissora de televisão, exercendo sua liberdade de expressão e de imprensa, pode e deve fazer reportagens sobre o crime de que é acusado o autor. Tal proceder, em princípio, não traduz qualquer abuso ou ilícito. Ocorre que, na reportagem, que foi levada ao ar diversas vezes, a requerida extrapolou o direito de imprensa’, reconheceu.


Para a juíza, as imagens do cotidiano do promotor violaram seu direito à intimidade e privacidade, além de não guardar qualquer relação com a apuração do crime do qual Thales Schoedl é acusado. ‘De fato, a divulgação da imagem e da voz do autor, em situações de sua vida cotidiana, como na academia de ginástica e numa casa noturna, acompanhado de uma moça, não tem nenhuma relevância para o interesse público. Nada impede a gravação de imagens do requerente em locais públicos. Porém, constitui ato ilícito a gravação de imagens do autor em ambientes privados, sem seu conhecimento ou consentimento’, considerou.


A juíza fixou multa diária de R$ 100 mil para cada vez que as cenas do promotor forem ao ar. A juíza ressaltou que não proíbe que a reportagem seja veiculada, mas que não sejam mostradas cenas da vida particular de Schoedl na TV.


Idas e vindas


Além da batalha para preservar sua imagem e intimidade, Schoedl luta também para seguir sua carreira. O promotor foi exonerado do Ministério Público logo que ocorreu o crime, mas em maio de 2006 Mandado de Segurança do Tribunal de Justiça de São Paulo revogou a exoneração. Schoedl voltou ao cargo a receber salários e demais vantagens, mas sem exercer suas funções.


No dia 29 de agosto de 2007, por 16 votos a favor e 15 contra, o Conselho Superior do Ministério Público paulista confirmou o vitaliciamento do promotor e o confirmou no cargo, considerando-o apto a reassumir imediatamente suas funções. O promotor chegou a ser designado para assumir o posto em Jales, mas em seguida entrou de férias, adiando por 30 dias sua volta ao trabalho.


Em 3 de setembro, o Conselho Nacional do Ministério Público reverteu a decisão do MP paulista e determinou o afastamento de Schoedl de suas funções. Por liminar, suspendeu ainda o seu vitaliciamento. Com isso, ele perdeu o foro privilegiado e poderá ser julgado pelo Tribunal do Júri. Mas pode ser por pouco tempo. O mérito da questão ainda será julgado pelo CNMP.


Leia a decisão


VISTOS. THALES FERRI SCHOEDL ajuizou ação sob o rito ordinário contra RÁDIO E TELEVISÃO RECORD S/A, almejando, em suma, a condenação da requerida em obrigação de não fazer consistente na proibição de divulgar e veicular sua imagem e voz, provenientes de gravações clandestinas, em quaisquer de seus programas. Alega que, em 26 de agosto de 2007, teve sua imagem e voz, captadas em gravações clandestinas, divulgadas e veiculadas em reportagem exibida pela requerida no ‘Programa Domingo Espetacular’, intitulada ‘Promotor Acusado de Homicídio Permanece Impune’.


Afirma que a mencionada reportagem foi reapresentada por mais cinco vezes, nos dias 26, 27, 29, 30 e 31 de agosto de 2007, em outros programas da emissora-ré. Sustenta que a conduta da requerida acarretou violação aos seus direitos da personalidade, protegidos pelo art. 5°, X, da Constituição Federal, caracterizando abuso do direito de imprensa. Pediu a concessão de tutela antecipada. Juntou os documentos de fls. 30/85. A antecipação de tutela foi deferida (fls. 87/89).


O autor noticiou o descumprimento da aludida decisão a fls. 100/104 e 129/132, juntando, para tanto, os documentos de fls. 105/127 e 133/145. Sobreveio, então, a decisão de fls. 146. O autor juntou aos autos um DVD (fls. 172). Citada (fls. 195), a requerida ofereceu contestação (fls. 174/187), alegando, em suma, que se limitou a fazer uma retrospectiva dos acontecimentos, com o objetivo de recordar o telespectador dos fatos, diante da proximidade do julgamento a respeito do vitaliciamento do autor, tendo em vista o delito cometido na Riviera de São Lourenço.


Aduz que a notícia era de interesse público, razão pela qual não poderia deixar de veicular a reportagem. Sustenta que agiu no exercício da livre manifestação do pensamento, de forma imparcial, cumprindo seu dever de informar a população. Afirma que o interesse público deve prevalecer sobre o particular, até por se tratar de uma pessoa que ocupa um cargo público. Alega que não incitou nenhuma manifestação contra o autor e, também, não utilizou indevidamente as imagens obtidas através de câmera oculta, por se tratar de local e pessoa pública. Por fim, teceu considerações sobre a censura.


Pugnou, assim, pela improcedência da ação. Juntou os documentos de fls. 188/192. Houve réplica (fls. 228/243), com os documentos de fls. 244/256. As partes pediram o julgamento antecipado da lide e afirmaram não ter interesse na designação de audiência de tentativa de conciliação (fls. 258/259 e 262/262)


É o relatório. Fundamento e Decido.


Nos termos do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil, passo a conhecer diretamente do pedido, proferindo sentença, por serem dispensáveis outras provas. Consoante é incontroverso, o autor está sendo processado pela suposta prática dos crimes de homicídio e tentativa de homicídio, ocorridos em 30 de dezembro de 2004, no município de Bertioga, dos quais foram vítimas os estudantes Diego Mendes Modanez e Felipe Siqueira Cunha de Souza. Trata-se de fato público e notório. Na época dos fatos, o autor exercia a função de Promotor de Justiça. Pois bem.


Na reportagem em questão, a requerida se propôs a abordar o envolvimento do autor nos aludidos delitos. A emissora de televisão, exercendo sua liberdade de expressão e de imprensa, pode e deve fazer reportagens sobre o crime de que é acusado o autor, sendo evidente, neste particular, o interesse público. Tal proceder, em princípio, não traduz qualquer abuso ou ilícito, até porque, em nosso país, vige o princípio da ampla liberdade de imprensa, um dos pilares das sociedades democráticas. Ocorre que, na reportagem gravada na fita cassete que acompanha a inicial, levada ao ar diversas vezes, a requerida extrapolou o direito de imprensa.


As imagens do cotidiano do autor, captadas clandestinamente, violam seu direito à intimidade e privacidade, além de não guardarem relação direta com a apuração do crime. De fato, a divulgação da imagem e da voz do autor, em situações de sua vida cotidiana, como na academia de ginástica e numa casa noturna, acompanhado de uma moça, não tem nenhuma relevância para o interesse público. Nada impede a gravação de imagens do requerente em locais públicos. Porém, constitui ato ilícito a gravação de imagens do autor em ambientes privados, sem seu conhecimento ou consentimento.


Com efeito, ensina Alexandre de Moraes que: ‘Os direitos à intimidade e à própria imagem formam a proteção constitucional à vida privada, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas.’ (Direito Constitucional, Décima Nona Edição, Ed. Atlas, São Paulo: 2006, p. 47). Ainda segundo o referido autor, ‘Encontra-se em clara e ostensiva contradição com o fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1°, III), com o direito à honra, à intimidade e à vida privada (CF, art. 5°, X) converter em instrumento de diversão ou entretenimento assuntos de natureza tão íntima quanto falecimentos, padecimentos ou quaisquer desgraças alheias, que não demonstrem nenhuma finalidade pública e caráter jornalístico em sua divulgação.


Assim, não existe qualquer dúvida de que a divulgação de fotos, imagens ou notícias apelativas, injuriosas, desnecessárias para a informação objetiva e de interesse público (CF, art. 5°, XIV), que acarretem injustificado dano à dignidade humana autoriza a ocorrência de indenização por danos materiais e morais, além do respectivo direito de resposta.’ (p. 48). Neste contexto, é evidente que a requerida violou a intimidade, a vida privada e a imagem do autor, direitos expressamente protegidos pelo art. 5°, X, da Constituição Federal, e também pelo art. 21 do Código Civil de 2002. Impõe-se, pois, o acolhimento do pedido inicial, para impedir a requerida de exibir em reportagens cenas que retratem o cotidiano privado do autor, o que, evidentemente, não veda a veiculação de matéria jornalística.


Pelo exposto, julgo PROCEDENTE o pedido inicial, para, tornando definitiva a antecipação de tutela, condenar a requerida a se abster de divulgar e veicular, por qualquer meio de comunicação, reportagem contendo a imagem e a voz do autor, provenientes de gravações clandestinas, que retratem situações de sua vida íntima e privada ou, ainda, divulguem dados e informações de natureza íntima, especialmente a reportagem intitulada ‘Promotor Acusado de Homicídio Permanece Impune’, ressalvando a possibilidade de reapresentação desta reportagem desde que excluídas as cenas que retratem o cotidiano privado do autor, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00. Por sucumbente, arcará a requerida com o pagamento das custas e despesas processuais, bem como com os honorários advocatícios da parte contrária, que fixo em 10% do valor da causa. P.R.I.


São Paulo, 31 de março de 2008.


LAURA DE MATTOS ALMEIDA


Juíza de Direito


Revista Consultor Jurídico, 5 de abril de 2008′


 


 


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Folha de S. Paulo


Segunda-feira, 7 de abril de 2008


DOSSIÊ
Fernando de Barros e Silva


A vida dos outros


‘SÃO PAULO – A ministra Dilma Rousseff entrou na entrevista coletiva de sexta-feira de um tamanho e saiu dela muitas vezes menor. A mãe do PAC encolheu em uma hora. Começou em tom agressivo, dedo em riste, decidida a desqualificar a Folha e sua reportagem; ao terminar, dava a impressão de desacreditar, ela própria, de suas palavras, tantas foram as hesitações, os contorcionismos, os novelos verbais em que se enroscou.


Que a ministra, e não um subalterno, tenha vindo a público tentar se explicar é o ponto positivo que fica de sua pantomima à beira de um ataque de nervos. A quem viu a mise-en-scène sem os olhos embotados pelo oficialismo, ficou evidente que mais uma mentirada deste governo não resistiu à luz do dia.


A performance provocou em mim a sensação, talvez muito particular, de estar diante de um filme sobre os porões da velha Alemanha Oriental. No meio daquele blablablá cinzento, fui remetido para ‘A Vida dos Outros’. Delírio?


Na véspera, o ex-guerrilheiro e, agora, ex-jornalista Franklin Martins, ministro-chefe da Tropa de Choque e da Guerra de Versões, cobrava do jornal que entregasse a sua fonte, cujo sigilo, como ele sabe (ou sabia), é uma garantia constitucional: ‘Quem entregou (o dossiê) para a Folha?’, perguntava, tentando arrastar o ombudsman para sua confusão premeditada.


Horas antes de a ministra falar, Tarso Genro, o Rolando Lero da Justiça, dizia que a PF não poderia investigar o dossiê porque ‘dossiê é conceito, não fato determinado’. Assim, o bacharel do submarxismo oficial inventou o lulo-platonismo.


Na Justiça, o criminalista Márcio Thomaz Bastos foi levado a atuar como advogado de defesa para reduzir danos em crises mais sérias do que essa -no mensalão, na violação do sigilo do caseiro, no dossiê dos aloprados. Os tempos são outros e o lulismo está nas nuvens. Temos até uma caricatura de filósofo a nos distrair no Ministério do Conceito. Enquanto isso, Franklin, Dilma e cia. fazem o serviço pesado.’


 


Valdo Cruz


Sem futuro


‘BRASÍLIA – Com a crise do dossiê dos gastos tucanos, se alguém tinha alguma dúvida, já não deve ter mais. O estado de beligerância entre governo e oposição sepulta, de vez, qualquer chance de algo realmente importante ser aprovado no Congresso até 2010. Culpa do dossiê? Claro que não.


Ele apenas expõe mais nitidamente a impossibilidade de uma convivência civilizada entre governistas e oposicionistas nesta altura do campeonato. Por responsabilidade dos dois lados.


Talvez mais do governo, que poderia ser menos agressivo em suas relações numa fase em que colhe bons frutos na economia e festeja popularidade em alta. É incrível como, mesmo assim, a equipe de Lula cria confusões.


Com isso, temas como as reformas política, tributária e da Previdência já podem ser transferidos para a agenda do próximo Congresso. Do atual, esqueçam.


Resultado: é muito provável que o mandato de deputados e senadores chegue ao fim com um saldo pífio, sem que o Legislativo consiga ocupar um papel propositivo.


O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, sabe desse risco. Ele ainda sonha em aprovar a reforma tributária. A política, que imaginou ser viável, não avançou. Infelizmente, apesar de seus esforços, ficará no mundo dos sonhos.


O fato é que o atual Congresso tende ao imobilismo diante da mistura de dois ingredientes: ânimos acirrados entre governistas e oposição e uma penca de parlamentares se movendo apenas diante das benesses ofertadas pelo Executivo.


Agora, não adianta varrer para debaixo do tapete a crise do dossiê dos gastos tucanos para pôr fim ao estado de letargia congressual. Pelo contrário, é preciso ir até o fim nesse escândalo para que não seja mais um sem solução.


O que fica difícil aceitar é como nosso Parlamento não consegue separar as disputas políticas cotidianas daquilo que realmente interessa ao eleitor, ao país.’


 


INTERNET
Ruy Castro


Vozes no ciberespaço


‘RIO DE JANEIRO – Orson Welles dizia que, certa vez, estivera a um aperto de mão de Napoleão. Queria dizer que, aos seis anos, em 1921, apertou a mão de um homem muito, muito velho que, também em criança, apertara a mão de Napoleão, que morreu em 1821. Improvável, mas possível.


Mais modesto do que Orson, contento-me com o fato de que, a qualquer hora, estou a um telefonema de Carmen Miranda, que morreu em 1955. Para isso, basta telefonar para meu amigo Russo, ex-vocalista e pandeiro do Bando da Lua e que, com a morte recente de Lulu e Harry, é o único sobrevivente entre os antigos músicos de Carmen.


Aos 82 anos, Russo (ele prefere ser chamado de Zeca) está firme, feliz e, há mais de 50, morando no México. Acho um privilégio falar com um homem que cantou durante anos com Carmen, viajou com ela, viu-a rir e chorar, ouviu-a dizer nome feio etc. E que, como todos, nunca superou seu amor por ela.


Outro dia, Russo me mandou um site com vozes ilustres do ‘seu tempo’. Era só clicar. Cliquei e ouvi a dicção estudada de Getúlio, o impagável sotaque de Jânio Quadros, a fala mansa de JK. Uma emoção foi escutar de novo os locutores: Luiz Jatobá, Heron Domingues, Ramos Calhelha. E mais: Ary Barroso comandando seu programa de calouros, Cecília Meireles dizendo um poema e, ‘quando os ponteiros se encontravam’ (ao meio-dia, com sol a pino), Chico Alves cantando seu prefixo, ‘Boa Noite, Amor’.


Outra atração do site é o famoso ‘primeiro registro da voz humana’, pelo americano Thomas Edison, em 1877. Só que, há pouco, descobriu-se que, em 1860, o francês Scott de Martinville já tinha conseguido gravar vozes. Edison sabia de Martinville, mas envernizou a cara-de-pau, patenteou o invento como se fosse seu e ficou com as glórias. É, Zeca, o mundo é dos espertos.’


 


Folha de S. Paulo


Yahoo cria novo sistema para anúncio na internet


‘O Yahoo anunciou a criação de uma nova plataforma de anúncios on-line -o Amp- que pretende impulsionar o mercado publicitário. O anúncio é uma tentativa de convencer os acionistas de que o investimento no Amp é melhor que vender o site para a Microsoft.


A proposta do Amp é facilitar para os anunciantes a distribuição das propagandas para grupos demográficos específicos por meio das classificações no site do Yahoo. O sistema ainda não está pronto para ser colocado no ar, mas o Yahoo exibirá um vídeo on-line demonstrativo do Amp hoje.


No último sábado, a Microsoft encaminhou uma carta à diretoria do Yahoo definindo um prazo de três semanas para que a empresa decida se venderá seus ativos à Microsoft pelo valor de US$ 31 por ação.’


 


EPIDEMIA
Paulo Capel Narvai


Dengue: incompetência e demagogia


‘O MOSQUITO Aedes aegypti, diz a mídia, causa as mortes por dengue no Rio de Janeiro. Apenas os ‘idiotas da objetividade’ acreditam nisso, diria Nelson Rodrigues. Não é o mosquito que mata, mas a política. No cenário carioca, a política de saúde é vítima da incompetência e da demagogia. Ingênuos ou mal-informados estão aceitando a tese da perda de controle sanitário da dengue por incompetência de ‘todos os governos’. A tese pode ser simpática, parecer justa, razoável, mas é equivocada. E injusta, sobretudo com o ministro da Saúde. A suposta igualdade de responsabilidades não resiste aos fatos nem ao ordenamento institucional, pois são completamente distintas as atribuições dos governos federal, estadual e municipal. Não só no Rio, mas em todo o país. Tem sido assim desde a regulamentação, em 1990, dos artigos que criaram o SUS (Sistema Único de Saúde), na Constituição de 1988. Desde então, cabe aos municípios ‘comandar o SUS’ no seu território, estendendo-se tal comando também aos órgãos de saúde estaduais, federais e às entidades particulares. Para que o comando municipal do SUS não fira a autonomia dos entes federativos, o sistema conta com órgãos colegiados de gestão nos quais estão representadas as três esferas de governo. Cabe, pois, aos municípios exercer esse comando. É o que vem acontecendo em milhares de municípios onde o SUS não só não está falido como tem prestado relevantes serviços. A um custo, vale assinalar, de cerca de R$ 1/dia/habitante. Nos EUA, apenas para comparar, o sistema de saúde custou em 2006, segundo o ‘New York Times’ (8/1/08), R$ 34,5/dia/habitante. Nos últimos anos, além de realizar mais de 2 milhões de partos e 12 mil transplantes, o SUS evitou uma devastadora epidemia de cólera, eliminou a poliomielite e controlou o sarampo. Com tão poucos recursos, sobrevive graças aos baixos salários dos trabalhadores do setor e, paradoxalmente, à sua enorme dedicação. Ao contrário do resto do Brasil, no Rio tem imperado a tese de que as instituições de saúde não se misturam e cada um cuida só do que é seu. Prevalece ali um ambiente de verdadeiro separatismo sanitário que está na raiz dos problemas que a cidade vem enfrentando nos últimos anos. O líder separatista é o prefeito carioca. Com a cabeça na institucionalidade sanitária do século passado, Cesar Maia ignora completamente o SUS como uma política de Estado, que requer ações articuladas das três esferas de governo, e não deste ou daquele governo, deste ou daquele partido. Sua visão parece não alcançar além ‘dos hospitais municipais’. Quem analisa o discurso sobre saúde do alcaide do Rio percebe que ele nada diz sobre o SUS e seus desafios na cidade. Ocupa-se, em geral lamuriento, dos ‘hospitais municipais’, que distingue e separa dos ‘hospitais federais’. Não é correto e não é justo, neste momento, pretender compartilhar iguais responsabilidades com outras esferas de governo. Qualquer criança bem informada sabe que, no caso da dengue, para a qual não há vacina nem medicamento específico para a cura, as ações de controle do mosquito são essenciais no enfrentamento da epidemia. E ninguém ignora que, no sistema de distribuição de responsabilidades do SUS, realizar essas ações cabe ao município. Não se deve tergiversar sobre isso com frases de efeito tais como ‘o mosquito não é nem federal, nem estadual, nem municipal’. Funciona como gracejo, mas não explica nada. Além das mortes, dois aspectos preocupam nos acontecimentos do verão carioca. Primeiro: a atitude do prefeito é emblemática do modo como muitas autoridades públicas olham para a saúde: querem sempre tirar vantagens eleitorais e se livrar dos problemas ao primeiro sinal de dificuldade. Segundo: o apelo à hospitalização e aos especialistas, plenamente justificado dado o descontrole da epidemia, lamentavelmente reforça, até no plano simbólico, uma distorção do SUS. Em vez de investir a maior parte do orçamento nas ações primárias de saúde, os recursos do sistema seguem sendo drenados para os hospitais, que ficam com mais de 80% do dinheiro da saúde pública. E, vale assinalar, mais de dois terços dos leitos hospitalares no Brasil pertencem a organizações privadas. Neste 7 de abril, Dia Mundial da Saúde, muitas famílias brasileiras choram seus mortos, vítimas de um mosquito. De um mosquito? Não: vítimas de políticas públicas, incompetência e demagogia.


PAULO CAPEL NARVAI , 53, doutor em saúde pública, é professor associado da Faculdade de Saúde Pública da USP. Coordena o programa de pós-graduação em saúde pública da USP e representa a universidade no Conselho Municipal de Saúde de São Paulo.’


 


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


Vai faltar rico?


‘Até o ano que vem, deu o portal da Globo em manchete, São Paulo ganha mais três shoppings de luxo, todos ‘vizinhos’ da Daslu. ‘As classes A e B de consumo perdem espaço’, no sentido de verem reduzida sua proporção no país, segundo pesquisa Cetelem, ‘mas não a pose’. Para especialistas, ‘tantos shoppings para alta renda pode deixar alguns a ver navios’. Por ‘descasamento de timing e questão cultural’, a classe C em explosão não deve ter nada em São Paulo, ao menos por enquanto. Só ‘para o futuro’.


CLASSE MÉDIA NORDESTINA


O ‘Financial Times’ de sábado deu duas longas reportagens sobre o Nordeste, com destaque para um prédio em construção em Salvador, ‘o mais alto e caro na cidade’, a ser visto a 40 km. Será ‘um símbolo de que a cidade está pronta para entrar no palco internacional’. Um quarto será vendido no exterior, mas não por falta de demanda, pelo contrário, há uma ‘classe média emergente’ e sedenta. Segundo Liz Gill, enviada do jornal, ‘o Nordeste está no limiar de uma explosão de desenvolvimento’.


DE DAR MEDO


Já o também britânico ‘Independent’ deu sábado um relato de turista de dois momentos de ‘medo’, no Rio e em Salvador. Este pior, com chantagem que começou com pedido de cigarro e terminou em ameaça com faca.


E TEM AS ENCHENTES


E no topo das buscas por Google e Yahoo, sábado, as ‘enchentes no Nordeste’. Ontem no UOL, só abaixo do futebol, ‘Chuva deixa 11 mil famílias desabrigadas no Piauí’, ‘10% das cidades inundadas no Maranhão’ etc.


PERIFERIA É PERIFERIA


Em destaque no especial sobre Martin Luther King no ‘FT’, com tradução no UOL, o enunciado de que, após 40 anos, ‘Pobres da América são forçados à periferia’. Para reverendo seguidor de King, agora ‘a pobreza está cada vez mais escondida’, em ‘enclaves’, também nos EUA. ‘Agora a revolta é silenciosa’, atrás da ‘cerca’.


BOLSA VERDE


Alexei Barrionuevo voltou a escrever no ‘New York Times’ no domingo, com longa reportagem traduzida no UOL sobre a ‘busca de um papel’ pelos povos da floresta na negociação de acordos sobre o aquecimento. Focou uma conferência em Manaus que reuniu líderes de onze países e até ‘observadores da Indonésia e do Congo’, para organizar demandas e ação.


No topo da busca de Brasil no Yahoo, ontem, a ministra Marina Silva anunciou uma bolsa aos moradores que ajudam a preservar a floresta, por ‘eco-serviços’.


PROTEÇÃO EUROPÉIA


Após críticas de imprensa aos subsídios a biocombustíveis nos EUA e até no Brasil, representantes do setor na Europa avisaram ao ‘FT’ que vão exigir tarifas ‘antidumping’ sobre a importação de biodiesel dos EUA. Do Brasil, por enquanto, não.


ÁFRICA E A INFLAÇÃO


Mais do ‘FT’, que deu em manchete que a África ‘entrou na disputa’ por arroz contra Filipinas e outros e fez o preço ‘saltar’ 50% em duas semanas. Artigo na edição partiu da notícia para afirmar que ‘governos não podem mais ignorar a fome’.


AMOR POR UM ESTRANHO


Sexta na primeira página e ontem em longo perfil-entrevista, o ‘NYT’ relacionou ‘a paixão por um estrangeiro’ no enredo do musical ‘South Pacific’, clássico que estreou em remontagem quinta-feira na Broadway, com a súbita paixão da cidade por um ator e cantor ‘estranho’, até ‘anônimo’. A saber, o brasileiro Paulo Szot, em seu primeiro papel num musical.’


 


TELEVISÃO
Daniel Castro


Record assedia até afiliada da TV Globo


‘Depois de tomar várias afiliadas do SBT, a Record quer agora conquistar uma das 121 emissoras que compõem a Rede Globo.


A rede do bispo Edir Macedo negocia a troca de bandeira da TV Leste, retransmissora da programação da Globo em 106 municípios mineiros, que somam 1,6 milhão de telespectadores potenciais. A emissora tem sede em Governador Valadares e cobre o Vale do Aço.


Uma reunião entre executivos da Record e os donos da TV Leste está marcada para esta quarta-feira. O contrato da TV Leste, com a Globo desde 1986, vence no próximo dia 30.


Mas o que levaria uma emissora a trocar a programação líder pela da segunda colocada, que tem pouco mais de um terço da audiência nacional da primeira colocada?


‘Sair da Globo para outra emissora tem um impacto muito grande. Perder o ‘Jornal Nacional’, a novela das oito e o futebol pesa, mas pagar para ter a Globo é muito mais pesado. Além disso, parece que uma emissora ligada à Globo comprou uma TV no Vale do Aço e vão dividir a nossa região. Se ficarmos sem o Vale do Aço, vai ser difícil se manter na Globo’, explica Edson Gualberto, diretor e um dos sócios da TV Leste.


Gualberto enfatiza que as negociações com a Record ainda são ‘embrionárias’.


A Globo fica com a metade das receitas publicitárias locais das afiliadas e repassa a metade proporcional à população da região do que arrecada com publicidade nacional. A Record oferece percentuais maiores para suas afiliadas e costuma pagar ‘luvas’.


A situação balançou a TV Leste. ‘Estamos contratando uma equipe para avaliar se vale a pena ficar com a Globo’, revela Gualberto.


ORGANOGRAMA 1


Marcelo Meira é o novo vice-presidente de televisão do Grupo Bandeirantes. Será responsável pela Band, principal veículo do grupo. Substitui Marcelo Parada, que saiu em agosto. As funções vinham sendo exercidas por Walter Vieira Ceneviva, vice-executivo.


ORGANOGRAMA 2


Com a promoção de Meira, o Grupo Bandeirantes passou a ter sete vice-presidências (eram seis). É que as funções de Meira foram desmembradas em duas VPs: administrativa e financeira (Gilson Lagoeiro) e institucional e de redes (Frederico Nogueira).


EXTRA


A Rede TV! vai exibir às terças, às 23h, oito compactos de jogos do Corinthians em São Paulo pela Série B.


MISS BRASIL


O Ministério Público Federal recomendou e a Band acatou. Vai transmitir o Miss Brasil, no próximo domingo, com legenda oculta e contratou uma intérprete de linguagem brasileira de sinais para acompanhar a miss Ceará, deficiente auditiva.


REALITY SHOW


A ESPN Brasil terá 26 câmeras no sambódromo de São Paulo para as transmissões do X-Games, que acontece pela primeira vez na cidade, de 25 a 27 deste mês. E trará dos EUA dois cinegrafistas e um equipamento que transforma dados digitados por juízes em gráficos com sons e movimentos.


DIGITAL


A Rede TV! inaugura hoje suas transmissões digitais em Belo Horizonte. Amanhã, faz o mesmo no Rio.’


 


Cristina Fibe


Especial investiga diabetes pelo mundo


‘Dias comemorativos são um prato cheio para emissoras de TV tirarem da gaveta os tais ‘especiais’. É natural, portanto, que o canal pago Discovery Home & Health aproveite o Dia Mundial da Saúde (um de seus focos), hoje, para exibir ‘Diabetes – A Global Epidemic’ (uma epidemia global).


O programa acompanha uma médica, ex-presidente da associação americana para o diabetes, em viagem por cidades da Austrália, Finlândia, Índia e África do Sul -além do Brasil, representado por São Paulo-, com o objetivo de conscientizar as populações sobre a prevenção e o tratamento da doença.


A dra. Francine Kaufman analisa ainda os fatores econômicos, os hábitos alimentares e as diferenças culturais entre os países, e como esses fatores podem afetar e ser afetados pelo diabetes. Entrevistas com médicos e pacientes entrecortam o documentário.


Em São Paulo, a médica traça um panorama preocupante, depois de enfatizar que o Brasil ‘é muito mais do que praias e belas mulheres’ -e mostrar, é claro, praias e mulheres. ‘[O país] tem uma diferença estatística. São Paulo está entre as dez cidades com mais pessoas com diabetes no mundo.’


‘Depois de andar nas ruas, eu sei por quê’, diz, em meio a imagens de rodízios de carne e pessoas obesas comendo nas ruas.


ESPECIAL DIABETES


Quando: hoje, às 20h


Onde: no Discovery Home & Health’


 


SIMONAL
Luiz Fernando Vianna


Escolhas da reportagem foram apenas jornalísticas


‘Escrevo resenhas de música, mas sou, sobretudo, repórter, e foi nesta condição que escrevi o texto ‘Vida de som e fúria’. As escolhas feitas não me parecem de difícil compreensão para quem atua em jornalismo.


Wilson Simonal, um excepcional cantor, tornou-se tabu ao ter sua imagem associada ao regime militar. O primeiro documentário sobre sua vida (‘Ninguém Sabe o Duro que Dei’) não poderia passar ao largo disso, e ainda teve a ousadia de buscar o contador que foi o pivô da derrocada do artista. Essa redescoberta, somada à dramaticidade da transformação de um astro em pessoa fartamente odiada, dificilmente deixaria de ser o carro-chefe de uma reportagem sobre o tema.


No delicado caso de Simonal, o equilíbrio entre o quanto falar de seu talento e o quanto falar de sua queda é difícil de alcançar. Críticas sempre existirão e, possivelmente, todas têm seu fundamento. Se por um lado a família queria ver ressaltados os dotes musicais, por outro recebi críticas por não ter mostrado ‘provas’ da relação do cantor com o regime militar, como constam do processo de que Simonal foi réu.


Conforme mostrou reportagem da Folha de 26 de junho de 2000, o juiz João de Deus Lacerda Menna Barreto, baseado em três depoimentos (um deles, do próprio Simonal), classificou o cantor, em 1974, como ‘colaborador das Forças Armadas e informante do Dops [Departamento de Ordem Política e Social]’.


‘Provas’ como essa não estão no filme, que não esclarece completamente, portanto, o episódio. O documentário também tem outros objetivos, como bem ressalta Max de Castro e está dito na reportagem, ainda que sem o destaque desejado pela família de Simonal. Sem dúvida, ‘o filme vale a pena ser visto’, assim como o cantor vale a pena ser ouvido. Não creio que meu texto vá prejudicar nenhum dos dois objetivos. Talvez, apesar dos supostos defeitos, até os ajude.’


 


Músico criticou texto


‘Em artigo na última segunda, Max de Castro contestou o texto ‘Vida de som e fúria’ (Ilustrada, 24/3), por considerar que foi enfatizada a parte do filme ‘Ninguém Sabe o Duro que Dei’ sobre a suposta relação de seu pai com o regime militar.’


 


CASO ISABELLA
Nelson Ascher


Crime e liberdade


‘UMA garotinha de cinco anos morre de modo suspeito e, se não o país, pelo menos toda uma cidade maior que muitos países se envolve; jornais, revistas e TV mal falam de outro assunto; gente estranha se comove ou se enraivece a ponto de ir à sua missa de sétimo dia ou esperar, diante da delegacia, a chegada dos suspeitos.


Se as piores suspeitas se mostrarem infundadas, dois inocentes passarão o resto de seus dias tentando limpar as respectivas reputações. Caso se confirmem, porém, estaremos perante um crime que, para a média das pessoas, é dos mais repelentes que existem, a saber, o assassinato de uma criança indefesa pelos adultos aos quais cabia zelar por seu bem-estar.


Crianças continuam, é claro, morrendo diariamente ao redor do planeta, seja de doenças para as quais não faltam prevenção e cura, seja devido à subnutrição ou por causa de acidentes. Mortes assim quase nunca desencadeiam tamanha comoção, algo que não advém, portanto, apenas da extrema precocidade do fim. Dois elementos ajudam a entender essa explosão emocional.


O primeiro é a proximidade. Por mais que os espíritos humanitários a julguem indigesta, a verdade é que uma morte na China nos dói menos que uma no Brasil, esta nos toca menos que uma no Estado, na cidade de São Paulo, no nosso bairro, condomínio e assim por diante, até chegar, mais pungente, ao interior de nossa família. O mesmo se aplica a grupos étnicos, religiosos, profissionais e a classes sociais. É provável que quem professe o amor fraterno universal lide com seus irmãos como se fossem cifras. O segundo elemento é a intencionalidade que, se provada, configuraria o caráter criminoso da morte.


Houve gente que, achando excessivo o número, indignou-se ao ler que um em cada cem americanos adultos está na prisão. Mas, considerando que, por um lado, os EUA, onde vigora o império da lei (rule of law), punem apenas transgressões consideradas criminosas em qualquer nação civilizada, sem cair, como muitas, na barbárie de criminalizar diferenças políticas, religiosas ou comportamentais, e, por outro, também não chegam, como os europeus, à leniência de privilegiar os supostos direitos de uma minoria de predadores em detrimento da segurança da maioria decente, pode-se concluir que sua taxa de criminalidade se aproxima da que se espera em sociedades abertas.


Qual seria assim a razão para que a maioria, embora disposta a aceitar resignada tantas mortes por doença ou acidentes mortais como obra do destino, revolte-se diante de uma única, desde que perpetrada por mãos humanas? Os recursos empregados na prevenção ou, menos útil ainda, na punição de um único assassinato poderiam, desde que investidos, digamos, em saneamento urbano ou em estradas melhores, salvar dezenas ou, quem sabe, centenas de vidas. O cálculo racional não dá lugar a dúvidas: conviria abordar os crimes de sangue como o fenômeno relativamente raro e dificilmente eliminável que são. Elas por elas, não seria melhor encará-los desapaixonada e estoicamente?


A não ser que se creia que são os meios de comunicação que, oportunistas, manipulam os sentimentos das massas, resta somente concluir que, como o que sucede é o contrário, ou seja, são aqueles que, obedecendo às demandas do mercado, fornecem aos consumidores as informações requeridas, então o que se lê nas manchetes reflete fielmente as ansiedades dos leitores. Estes se interessam e sempre se interessarão por crimes, em especial pelos hediondos. E não por uma curiosidade macabra, pois o que querem acompanhar, do começo ao fim, é o espetáculo da justiça.


Esse ritual importa porque, ao contrário dos ultraliberais que, culpando a sociedade, negam a responsabilidade individual, a maioria quer ver suas conseqüências postas em prática. Onde os indivíduos não são responsáveis por seus atos nem têm de responder por seus crimes, não são livres de verdade. Caso não haja punição porque a culpa individual inexiste, tampouco existe a liberdade de não cometer o crime, e tudo é sobredeterminado pelos ‘outros’.


Na falta da autonomia individual, tudo o que há é a coletividade indiferenciada e indiferente, e o crime se torna uma ‘moléstia’ social à espera de curas milagrosas que vão da redistribuição da renda à construção de escolas. Ao se envolverem passional e moralmente com a morte da pequena Isabella Nardoni, os cidadãos estão dando a entender que, desdenhosos da demagogia que procura lhes vender mais Estado, eles querem mesmo é que a Justiça trate seus concidadãos como o que são: pessoas livres e responsáveis pelos próprios atos.’


 


LUTO
Folha de S. Paulo


Ator Charlton Heston, 84, morre nos EUA


‘Charlton Heston, vencedor do Oscar de melhor ator pelo papel-título do filme ‘Ben-Hur’ (1959), morreu na noite de sábado, aos 84 anos, em Bervelly Hills, Los Angeles.


Em 2002, o ator americano anunciou que sofria de sintomas do mal de Alzheimer. Ele morreu em sua casa, ao lado da mulher, Lydia, com quem era casado desde 1944. ‘Nenhum homem poderia ter dado mais à família, à profissão e ao país. Em suas próprias palavras: ‘Vivi uma vida tão maravilhosa! Vivi o suficiente para duas pessoas’, disse a família, em nota, sem divulgar a causa da morte.


Heston ficou conhecido por sua atuação em filmes épicos (‘Ben-Hur’, ‘Os Dez Mandamentos’), de ficção científica (‘Planeta dos Macacos’, ‘No Mundo de 2020’) e de catástrofe (‘Terremoto’).


O papel mais controverso, no entanto, foi na vida real, como presidente da Associação Nacional do Rifle (de 1998 a 2003). Isso lhe rendeu uma de suas últimas aparições no cinema, involuntária, no filme ‘Tiros em Columbine’ (2002).


O filme de Michael Moore põe Heston como ‘vilão’ por sua defesa ao direito à posse de armas. À época, porém, a imprensa avaliou que, combalido pela doença degenerativa, o ator pareceu mais inofensivo do que se pretendia mostrar.


Ontem, o site de Michael Moore exibia uma foto de Heston e a reprodução de um pedido da família de que sejam feitas doações ao Fundo de Cinema e Televisão dos EUA.


O presidente americano George W. Bush, que em 2003 outorgou a Heston -ativista político de direita- a medalha da liberdade, a mais alta honraria civil do país, descreveu ontem o ator como um ‘grande defensor das liberdades’. ‘Ele serviu a seu país na Segunda Guerra, militou pelo movimento dos direitos civis [dos negros, nos anos 50], dirigiu um sindicato [dos atores] e defendeu vigorosamente a segunda emenda’, disse, referindo-se ao artigo da Constituição dos EUA que garante o direito dos cidadãos de portar armas.


Nascido em 1924, em Evanston, Illinois, Heston iniciou sua carreira na Broadway como ator e modelo de nu artístico. Em seu começo no cinema, fez ‘O Maior Espetáculo da Terra’ (1952), de Cecil B. DeMille, que voltaria a escalá-lo como o Moisés de ‘Os Dez Mandamentos’.


No Brasil


Seu último filme, ‘Josef Menguele – My Father, Rua Alguém, 5.555’ (2003), em que vivia o nazista, foi rodado no Brasil. O ator brasileiro Odilon Wagner, que fez parte do elenco, diz que Heston sofria dificuldade para se locomover e tinha de ler suas falas em painéis.


‘O diretor [o italiano Egidio Eronico] se revoltou e quis ‘devolver’ o Heston. Disse que tinham vendido gato por lebre, que ele não decorava nada.’ Mas, com a câmera ligada, ‘era outra coisa’. Apesar de ter passado por uma cirurgia no quadril, Heston fez até uma cena de baile com a atriz Denise Weinberg. ‘Ele girava, posicionava-a conforme a câmera rodava ao redor, e ele mal podia andar…’


Com agências internacionais’


 


 


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O Estado de S. Paulo


Segunda-feira, 7 de abril de 2008


FITNA
Gabriella Dorlhiac


Polêmica sobre o Islã põe Europa sob tensão


‘A polêmica criada na semana passada pelo filme Fitna, produção do parlamentar holandês de ultradireita Geert Wilders que fala sobre o Islã, mostra como o assunto tornou-se sensível na Europa de hoje. De um lado, está uma população muçulmana cansada de ser criticada e caracterizada como terrorista. Do outro, os europeus nativos, temendo que qualquer comentário sobre o Islã leve a novas manifestações como as ocorridas em 2005, com a publicação num jornal dinamarquês de charges sobre o Profeta Maomé.


Após a divulgação do curta-metragem Fitna na internet, o que se viu foi um continente respirando aliviado, ao perceber que o filme não era o compêndio de ódio que se imaginava. Mesmo assim, ficou a pergunta: o Islã está se tornando um tabu na Europa?


‘Os muçulmanos radicados em países europeus vêm enfrentando duras críticas ao Islã, especialmente após os atentados do 11 de Setembro. Isso os tornou altamente sensíveis ao assunto. As críticas ao Islã não são vistas apenas como um insulto a sua religião, mas como uma espécie de novo anti-semitismo’, afirmou, por telefone, ao Estado, o especialista em Islã Maurits Berger, da Universidade de Leiden, na Holanda. ‘O problema é que do outro lado você tem uma população européia preocupada com a ortodoxia islâmica, que quer discutir o assunto.’


Segundo Berger, de um ponto de vista estritamente legal, o Fitna – que mostra imagens de atentados da Al-Qaeda intercaladas com versículos do Alcorão – não é um problema. Isso que não quer dizer, no entanto, que o curta-metragem não seja ofensivo aos muçulmanos. ‘A mensagem central do filme é que os muçulmanos são potencialmente perigosos, que o Islã é fascista’, explicou.


PEÇA POLÊMICA


Desde 2004, uma série de incidentes deixou diversos países europeus com os nervos à flor da pele. O primeiro foi o assassinato do cineasta holandês Theo Van Gogh, que havia lançado um filme sobre a repressão do Islã às mulheres, por um muçulmano de origem marroquina. No ano seguinte, o jornal dinamarquês Jyllands-Posten publicou as charges de Maomé, que enfureceram o mundo islâmico.


Após um período de relativa calmaria, o curta de Wilders voltou a causar tensão no continente. Temendo reações por parte da comunidade muçulmana na Holanda (cerca de 6% da população), o governo organizou uma campanha preventiva meses antes do lançamento do filme. Mesmo assim, várias emissoras de TV se recusaram a exibir Fitna. A única que aceitou fez duas exigências: que seus advogados vissem antes o filme e Wilders participasse de um debate sobre o assunto. O parlamentar recusou a oferta.


Na mesma semana em que Fitna foi veiculado na internet, um teatro em Potsdam, na Alemanha, inaugurou a peça Versos Satânicos, com base no livro de mesmo nome de Salman Rushdie. Em 1988, a publicação da obra fez com que uma fatwa (decreto religioso) fosse emitida no Irã, ordenando a morte de Rushdie. Na estréia da peça, o governo alemão reforçou a segurança no teatro.


Em meio a essa polêmica sobram protestos e provocações. As lápides de um cemitério de soldados muçulmanos da 1ª Guerra, em Ablain-Saint-Nazaire, norte da França, amanheceram ontem pichadas com símbolos nazistas. Também ontem, mais de 25 mil pessoas marcharam em Karachi, no Paquistão, num protesto contra o curta-metragem de Wilders convocado por um partido islâmico.


DESAFIO


Com uma população de 53 milhões de muçulmanos, a Europa parece estar tentando adaptar-se à sua nova realidade. A adaptação, porém, não vem sendo fácil. ‘Faz parte da cultura européia criticar a religião ou seus símbolos. Mas isso não é aceito em outras parte do mundo, seja entre cristãos ou muçulmanos’, disse Berger.


Muito além das diferenças culturais, há outro componente na atual tensão no continente. Para a professora de Relações Internacionais da City University, em Londres, Sara Silvestri, ‘a questão do Islã na Europa foi ‘seqüestrada’ por pessoas que dizem representar os muçulmanos ou defender os valores democráticos e liberais da sociedade ocidental’.


‘O assunto vem sendo usado por esses grupos para fortalecer suas posições políticas. A extrema-direita de vários países europeus, por exemplo, explora o tema para reconquistar sua importância. O problema é que os muçulmanos estão ficando espremidos no meio dessa disputa’, afirmou Sara, para quem a única maneira de se superar o problema é ampliar o diálogo aberto entre as comunidades.


Para os especialistas, a questão não é se o Islã é incompatível com a Europa, mas se os muçulmanos estão dispostos a se adaptar. ‘Você não pode comparar uma religião a um sistema político e cultural. É como um japonês budista ler a Bíblia para entender a Europa’, afirmou Berger. A adaptação parece possível, mas será preciso paciência e tempo. ‘Para meus avós, meus pais e até para mim, esse é realmente um assunto complicado. Mas vejo meus filhos, que estudam com muçulmanos, e para eles a questão da diferença cultural simplesmente não existe’, completou.


DISPUTAS RECENTES


02/11/2004


Assassinato


Cineasta holandês Theo Van Gogh é assassinado em Amsterdã pelo muçulmano Mohammed Bouyeri, de origem marroquina. Van Gogh vinha sendo duramente criticado por seu filme Submission, no qual denuncia a repressão do Islã às mulheres.


30/09/2005


Caricaturas


Jornal dinamarquês Jyllands-Posten publica 12 charges, a maioria retratando o Profeta Maomé, gerando uma onda de protestos em vários países islâmicos.


12/09/2006


Citação


Papa Bento XVI cita trecho de um discurso do imperador bizantino Manuel II Paleólogo, do século 14, segundo o qual tudo o que vinha de Maomé era desumano, ‘como sua ordem para difundir a fé que ele pregava por meio da espada’.


27/03/2008


?Fascista?


Político holandês de ultradireita Geert Wilders coloca na internet o curta-metragem Fitna, no qual afirma que ‘o Islã é fascista’. Manifestantes saem às ruas na


Holanda, no Irã e na Arábia


Saudita.


29/03/2008


Versos Satânicos


Temendo protestos, governo alemão reforça policiamento na estréia da


peça Versos Satânicos, baseada no livro de Salman Rushdie,


na cidade de Potsdam’


 


Nívea Terumi e Alexandre Gonçalves


‘Quem ofende Alá são os terroristas’


‘Entrevista: Magdi Allam Vice-diretor do jornal italiano ‘Corriere della Sera’ e muçulmano convertido ao cristianismo; Considerado no passado um dos muçulmanos mais influentes da Europa, Allam diz que o Islã não favorece o diálogo


Magdi Allam já foi considerado o mais proeminente muçulmano na Itália. Vice-diretor do principal jornal do país, o Corriere della Sera, foi batizado pelo papa Bento XVI na semana passada, na Basílica de São Pedro. Nesta entrevista ao Estado, Allam defendeu o polêmico curta-metragem Fitna do holandês Geert Wilders, que mescla cenas de ataques terroristas com trechos do Alcorão. Afirmou não acreditar num ‘Islã moderado’, mas sim no diálogo com ‘islâmicos moderados’.


O que o sr. achou da polêmica gerada pelo documentário ?Fitna??


Quem ofende o Islã não é o europeu que denuncia o terrorismo islâmico, mas os responsáveis por esses atos de terror. O secretário-geral da ONU (Ban Ki-moon) sugeriu que o documentário fosse censurado. Ele deveria condenar o extremismo, que produziu a realidade apenas retratada nesse documentário.


O sr. acredita em um Islã moderado?


Não. Os escritos de Maomé não fundamentam uma disposição ao diálogo. Neste caso, toda a ‘moderação’ vem de uma reinterpretação dos textos sagrados. Porém acredito em islâmicos moderados. Com eles, é possível e necessário dialogar.


Quais são as raízes do terrorismo atual?


Com a derrota da ideologia pan-arabista na Guerra dos Seis Dias (1967), houve um processo interno de radicalização do Islã, que levou ao poder, em alguns países, grupos extremistas. Mas a principal causa dessa escalada de violência foi o empenho de Osama bin Laden, um milionário saudita que conseguiu ‘globalizar’ o terrorismo. Hoje, o extremismo islâmico na Europa tornou-se um fenômeno autóctone, com pessoas de cidadania européia dispostas a participar da Jihad (guerra santa) e, eventualmente, promover atentados suicidas como vimos em Londres em 2005.


Conversões como a sua não podem tornar mais difícil a vida dos cristãos em países islâmicos?


Já assistimos à perseguição dos cristãos no Iraque, no Egito, no Sudão e em outros países. Os muçulmanos convertidos ao cristianismo são condenados à morte por apostasia (renúncia à fé). Mas, mesmo na Europa, não há reciprocidade religiosa. Milhares de europeus puderam converter-se, com toda segurança, ao Islã. O mesmo não ocorre com muçulmanos convertidos ao cristianismo. Na maior parte dos casos, vivem clandestinamente sua nova fé. Quis chamar atenção sobre a necessidade de que essas pessoas saiam das catacumbas. Tenho exigido que o Estado e a Igreja protejam os convertidos. Só assim a Europa terá autoridade para pressionar por liberdade religiosa nos países islâmicos.


Como o sr. definiria a postura de Bento XVI com relação ao Islã?


Defendi o papa firmemente depois do seu discurso na Universidade de Ratisbona (Alemanha). Não o considerei inoportuno ou provocativo. Posso dizer o mesmo do meu batismo. No diálogo com outras religiões, este papa, em vez de partir de questões dogmáticas, dificilmente conciliáveis, prefere refletir sobre os valores universais e os direitos fundamentais do homem, onde seria possível um entendimento também no plano religioso. Creio que isso é uma revolução.


Como o sr. vê o cristianismo na Europa?


A Europa atravessa uma profunda crise de valores e de identidade. Amplos setores abraçam o relativismo ético, que nos leva a imaginar que todas as religiões são iguais, prescindindo dos seus conteúdos, e a abraçar o ‘politicamente correto’ que nos cala frente a injustiças para não ferir suscetibilidades.’


 


INTERNET
Gerusa Marques


Empresas levarão internet de graça para escolas públicas


‘Depois de nove meses de negociação, governo e empresas de telefonia lançarão amanhã, no Palácio do Planalto, um programa para levar internet gratuita, em banda larga, a 55 mil escolas públicas de todo o País, até dezembro de 2010. O lançamento exigiu tanto tempo de negociação porque foi preciso fazer um ajuste nos contratos das operadoras. As concessionárias ficaram desobrigadas de instalar Postos de Serviços de Telecomunicações (PSTs), uma espécie de telecentro, com orelhões e acesso à web, mas, em contrapartida, a estrutura que será espalhada pelo interior do País incluirá a internet em alta velocidade para todas as escolas públicas urbanas.


O projeto, que será implantado pelas concessionárias de telefonia fixa, é considerado um dos mais importantes do segundo mandato de Lula e seu lançamento será usado pelo governo para tirar o foco da crise em torno do dossiê da Casa Civil sobre os gastos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.


Para a cerimônia, foram convidados os ministros da Casa Civil, Dilma Rousseff, das Comunicações, Hélio Costa, e da Educação, Fernando Haddad, além do presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Ronaldo Sardenberg, e dos presidentes das concessionárias, entre elas, a Telefônica, a Oi e a Brasil Telecom.


MODELO


O acordo pode representar um primeiro passo para concluir a meta do governo de levar internet em alta velocidade a todas as escolas públicas do País. Esse modelo de universalização dos serviços pode ser usado também como medida compensatória para permitir a compra da Brasil Telecom pela Oi, hoje proibida pela legislação. As duas empresas, juntas, levariam a banda larga a cerca de 90 mil escolas públicas restantes, instaladas na zona rural.


O programa, que já foi aprovado pela Anatel, prevê que as empresas, até dezembro de 2010, construam a infra-estrutura de banda larga para permitir o acesso à internet em 3.439 municípios. Hoje, apenas 2.125 municípios dispõem desses serviços. A idéia é de que as concessionárias levem a infra-estrutura até a sede da cidade. A partir daí, a própria concessionária ou outras empresas que aluguem a rede poderão oferecer serviços de internet à população em geral.


Dos 3.439 municípios, 40% deverão ser atendidos até dezembro deste ano. No fim de 2009, 80% do total já terão de dispor da infra-estrutura de banda larga, e todos os municípios terão de ser atendidos até o fim de 2010.


A maior ampliação da cobertura de banda larga terá de ser feita pela Oi. Do total de municípios, 2.730 estão na região atendida pela Oi, em 16 Estados (do Rio de Janeiro ao Amazonas); 452, na área da Brasil Telecom (regiões Sul, Centro-Oeste e Estados de Tocantins, Rondônia e Acre); e 257, na área da Telefônica (no Estado de São Paulo).


INTERNET NO ENSINO


Programa: banda larga nas escolas públicas urbanas e do interior


Meta: 55 mil escolas públicas urbanas terão internet gratuita em alta velocidade


Prazo: 2010 é o ano limite para concluir a instalação do programa


Exclusão: 90 mil escolas públicas rurais ficarão de fora


Área de abrangência: 3.439 municípios do interior passarão a ter banda larga


Início: 40% dos municípios deverão ser atendidos até dezembro; no fim de 2009, atendimento tem de chegar a 80%


Situação atual: 2.125 municípios já têm hoje acesso à internet em alta velocidade’


 


O Estado de S. Paulo


Microsoft dá 3 semanas para Yahoo decidir sobre oferta


‘Pela primeira vez, a Microsoft assume publicamente que pode entrar em uma disputa hostil pelo controle do Yahoo. Em e-mail neste sábado à direção da empresa, a Microsoft estabeleceu um ultimato, fixando um prazo de três semanas para que um acordo de fusão das duas companhias seja concluído.


Na carta, o diretor-executivo da Microsoft, Steve Ballmer, ameaça negociar diretamente com os acionistas da companhia, caso o Yahoo continue a rejeitar a oferta apresentada dois meses atrás. Ele ainda sinaliza que a empresa pretende trabalhar pela eleição de um novo comitê de diretores, caso a junta atual não responda positivamente dentro do prazo.


Ballmer também alerta que o valor a ser oferecido aos acionistas pode ser menor que a oferta inicial. ‘Se nos obrigarem a fazer uma oferta diretamente aos acionistas, essa medida terá um impacto indesejável no valor da companhia.’


De acordo com uma pessoa próxima à diretoria do Yahoo, a empresa está avaliando a carta de Ballmer. A expectativa é de que uma resposta rejeitando as negociações seja dada ainda hoje. Especialistas em fusões e aquisições dizem que, sem uma alternativa, acionistas do Yahoo estão propensos a votar a favor de uma oferta da Microsoft, mesmo por preço menor.


A oferta para comprar o Yahoo foi apresentada pela Microsoft em 31 de janeiro. Na época foram oferecidos US$ 44,6 bilhões em dinheiro e ações, valor que estava 62% acima do valor de mercado. O conselho da empresa rejeitou a proposta – que hoje, em razão da substancial desvalorização das ações da Microsoft, está avaliada em US$ 40 bilhões – alegando que ela estava abaixo do valor real da companhia. Desde então, o Yahoo tentou costurar alianças com o Google, News Corp. e Time Warner. Entretanto, nenhuma proposta alternativa à oferta da Microsoft foi apresentada.’


 


MARCAS
Marili Ribeiro


Em cartaz, patrocínio no letreiro do teatro


‘Não adianta mais procurar pela casa de show Tom Brasil em São Paulo. Agora ela passou a se chamar HSBC Brasil. Uma troca com a qual o público vai ter de se acostumar, assim como já aconteceu com o Palace, que virou DirectTV Music Hall, depois CIE Music Hall, e, atualmente, chama-se Citibank Hall. Mesmo assim, muitas pessoas ainda insistem em combinar encontros para o show no Palace.


O risco de causar antipatia ou desconforto com a mudança de nome não preocupa o diretor de marketing do HSBC, Glen Valente. ‘Estudos mostram que a assinatura na frente do nome dá o efeito de exposição de marca em guias de programação cultural que queremos atingir e onde um banco jamais estaria. Isso acontece não só aqui, mas também nos EUA, onde temos o HSBC Arena’, diz. ‘A médio prazo, os usuários aprovam ao perceber que investimos em qualidade como a troca do sistema de som do antigo Tom Brasil.’


Mudar o nome de um espaço cultural para associá-lo a uma marca é uma tendência em ascensão entre as empresas quando investem em patrocínio cultural no Brasil. ‘Não é um fenômeno global, pelo menos não com a força que é feito aqui’, diz o diretor-geral da Interbrand, Alejandro Pinedo. ‘É um recurso que pode ajudar na percepção positiva de serviços financeiros, normalmente associados à frieza do lucro.’


Para Pinedo, o problema da utilização do recurso está no excesso . ‘Quando não há relação com os valores da marca soa estranho’, diz ele. ‘ Mas quando é pertinente funciona bem’, opina o vice-presidente de criação da agência de publicidade Ogilvy, Anselmo Ramos . ‘Um bom exemplo’, diz ele, ‘seria o Credicard Hall, que é um lugar onde se compra ingresso com cartão de crédito. Já o Teatro Cosipa (empresa siderúrgica do Grupo Usiminas) parece esquisito’.


O Teatro Cosipa foi inaugurado há pouco menos de um mês em São Paulo. Iniciativas recentes na categoria não faltam. O Rio ganha em breve o Teatro Oi Casa Grande, em substituição ao antigo Teatro Casa Grande, além do recém-alterado HSBC Arena, no lugar do Rio Arena. Isso, sem falar nas salas de cinema batizadas como: Cine TAM, IG Cine, Cine Bombril, Espaço Unibanco e HSBC Belas Artes.


‘Existe uma certa agressividade na ações de marketing cultural no momento, que faz com que as empresas sejam cada vez mais ousadas em suas solicitações para expor suas marcas’, diz Marcelo Araújo, diretor da Pinacoteca de São Paulo. ‘Já tive demandas como o pedido para que a logomarca da patrocinadora de uma mostra fosse colocada nas etiquetas de identificação das obras em exposição. No caso da Pinacoteca, há limites bem claros de uso desses espaços e eles nunca podem incomodar o visitante.’


Os investimentos em patrocínio não se alteraram nos últimos cinco anos conforme os dados levantados entre os cem maiores anunciantes do País, em uma pesquisa do instituto TNS Science. Deteriam cerca de 3,3% do total das verbas aplicadas em ações de marketing.


Pedro Geraldo Bianco Jr, presidente da Dançar Marketing, empresa que há 26 anos dedica-se ao marketing cultural e tem entre seus clientes o próprio HSBC, discorda e argumenta que a possibilidade de renúncia fiscal para investimentos em patrocínio cultural não costuma ser quantificada nessas projeções. ‘O volume de recursos aplicados por meio da Lei Rouanet deu um salto nos últimos quatro anos – de R$ 200 milhões para R$ 500 milhões por ano’, diz Bianco.


Entre os vários formatos de patrocínios, há desde os mais caros, porém com visibilidade garantida (caso dos ‘eventos proprietários’ que levam a assinatura da empresa), até os patrocínios pontuais, que são mais baratos, como trazer um artista ou uma exposição de arte. Essas opções se beneficiam da Lei Rouanet. O mesmo não vale para a aplicação do nome em uma propriedade.’É um investimento de risco, porque não adianta ter um belo espaço se o conteúdo for pouco atrativo e não gerar notícias para que a marca seja percebida’, diz Bianco.


O Brasil é carente de iniciativas, diz quem acompanha o tema, até para justificar a atual onda de mudanças de nome. No exterior há mais cuidado com a questão. Os ingleses não se interessam por isso , diz Ramos, da Ogilvy. A pedido do Estado, ele fez uma pesquisa sobre os espaços britânicos e os classificou segundo o nome do lugar, tipo Hampton Court Place, de acordo com as denominações clássicas, como Royal Academy, ou originais, caso do Barbican. ‘Para não dizer que não achei nada, vi o Bank of England Museum’, diz Ramos. Sorte dos ingleses que não perdem suas referências culturais.’


 


CASO ISABELLA
Sérgio Durán


Caça ao assassino leva mais de 200 mil ao Orkut


‘Depois de lotar com mais de 100 mil recados a página no Orkut da mãe de Isabella Oliveira Nardoni, Ana Carolina Cunha de Oliveira, os internautas criaram cerca de dez comunidades no site de relacionamentos. Em comum, além das mensagens de solidariedade e pedidos de justiça, há a condenação quase unânimes do casal atualmente preso – o pai, Alexandre Alves Nardoni, e a madrasta, Anna Carolina Trotta Jatobá.


Na comunidade ‘Em Memória, Isabella Nardoni’, com 15.253 integrantes ontem, o tópico ‘Reconstituição do Crime’ era o mais concorrido. Nas mensagens, há variações de diálogos que teriam sido travados entre o pai e a madrasta, após terem cometido o crime.


Na maior comunidade, ‘Justiça para Isabella Nardoni’, que somava 52.279 integrantes ontem, o tópico ‘Alexandre Nardoni pode ser inocente’ era o segundo mais concorrido, com quase 500 mensagens. O mais acessado era um que debatia a autoria do assassinato. A enquete da comunidade somava 169 votos à tarde e questionava os internautas sobre quem assassinou Isabella. Só 2% não apontaram a madrasta ou o pai – ou mesmo os dois juntos.


As outras duas comunidades mais concorridas, ‘Isabella – Queremos Justiça, com 40.168 membros, ontem, e ‘Pra Sempre Anjinha Isabella’, com 45.081, também investiam em debates sobre a autoria do crime. Na ‘Isabela Oliveira – Luto (Oficial), com 24.574 pessoas, que também investia na busca da autoria do crime, houve quem acusasse a mãe. Em ‘Isabella Nardoni quem a matou?’ (21.400 membros), há links para as páginas de integrantes da família da mãe da menina.


TIO DE ISABELLA


Leonardo Oliveira, irmão de Ana, tio de Isabella, é um dos participantes das comunidades que lembram a morte da sobrinha. Em seu álbum de fotos, aberto a todos os integrantes do Orkut, há várias tiradas com Isabella. O mesmo faz Junior Camargo, namorado de Ana, a mãe, que exibe 31 fotos, uma das quais tirada dentro de um avião, ao lado das duas.


‘Gostaria de entrar na página de cada um de vocês que deixaram uma mensagem para mim ou para a minha filha, mas será quase impossível. Então deixo de uma vez só a todos o meu abraço bem apertado’, diz a avó de Isabella, mãe de Ana, Rosa de Cunha de Oliveira, em seu perfil no Orkut.


Nenhuma comunidade traz links ou espaço dedicado à família do pai ou da madrasta de Isabella. Também não há nenhuma comunidade ou grupo de internautas que assuma a defesa do casal.’


 


OLIMPÍADAS
O Estado de S. Paulo


Protestos e 36 presos em Londres


‘A passagem da tocha olímpica pela Inglaterra, ontem, foi tumultuada, mas o que ocorreu deve ser apenas um aperitivo do que é esperado hoje, em Paris. Em Londres, sobrou confusão e protestos em defesa dos direitos humanos no Tibete durante a passagem do símbolo olímpico. Segundo a Scotland Yard, 36 pessoas foram presas, inclusive uma que conseguiu tomar a tocha de uma dos integrantes do revezamento, a apresentadora de TV Konnie Huq, e duas que tentaram apagar a chama com um extintor.


Milhares de pessoas enfrentaram a neve em Londres para protestar. Num ponto do trajeto, um condutor da chama entrou em um ônibus com o slogan do revezamento – ‘Acenda a paixão, compartilhe o sonho’ -, para evitar os manifestantes, que carregavam bandeiras do Tibete ou cartazes com os dizeres ‘Vergonha na China’ e ‘Parem as matanças. Parem a tortura’. Parte do percurso foi mudada em cima da hora para que a embaixadora da China em Londres, Fu Ying, participasse do revezamento.


O primeiro-ministro da Inglaterra, Gordon Brown, recebeu a tocha em frente à sua residência, em Downing Street, gesto criticado pelos ativistas pró-Tibete. O trecho mais tenso do percurso foi a passagem da chama pelo bairro de Nothing Hill.


O porta-voz do revezamento da tocha, Qu Yingpu, se destacou pelo zelo em cumprir o protocolo. No entanto, a frase de que a tocha havia trazido ‘esperança e amizade’ a Londres ficou totalmente fora de contexto. O show da banda Sugarbabes, previsto para o fim da festa, foi cancelado.


SABOTAGEM


Não é apenas na Europa que a passagem da tocha preocupa. O chefe do Partido Comunista Chinês no Tibete, Zhang Qingli, pediu que todos os departamentos de segurança não economizem esforços para fazer com que o translado da chama olímpica pela região ocorra de forma pacífica. Segundo ele, ‘pessoas próximas ao dalai-lama estão planejando novas atividades de sabotagem’.’


 


É TUDO VERDADE
Luiz Carlos Merten


Documentário sobre Waly Salomão é o vencedor


‘Como se pode retratar, esteticamente, a obra de um artista multimídia (e inovador) como Wally Salomão? Certamente não por meio de um documentário convencional. Por sua ousadia na investigação da vida e da obra do artista, o júri nacional do 13º Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade elegeu no sábado à noite, em cerimônia realizada no CineSesc, o filme de Carlos Nader, Pan-Cinema Permanente, como o melhor da competição nacional. Entre os jurados estavam o diretor Renato Barbieri e a montadora Vânia Drebbs. Pan-Cinema ganhou, além do troféu, um cheque de R$ 100 mil da CPFL Energia, uma das principais patrocinadoras (com a Petrobrás) do evento criado há 12 anos pelo crítico Amir Labaki.


Ao subir ao palco para os agradecimentos, o diretor disse que teve tempo de assistir a apenas um filme da competição brasileira e foi justamente Simonal – Ninguém Sabe o Duro Que Dei, de Cláudio Manuel, Micael Langer e Calvito Real. O trio ganhou uma menção honrosa por seu trabalho, mas Carlos Nader reconheceu que é muito bom e poderia ter sido o vencedor. Outra menção foi para O Aborto dos Outros, de Carla Gallo, que discute o polêmico tema contido em seu título. O prêmio de melhor curta da competição nacional foi para Remo Usai – Músico para o Cinema, de Bernardo Uzeda, que homenageia o compositor de grandes filmes brasileiros nos anos 60. O júri também atribuiu uma menção honrosa para Dossiê Rê Bordosa, de César Cabral, que mistura documentário, ficção e animação para tentar descobrir por que o cartunista Angeli matou sua mais famosa criação.


Amir Labaki apresentou os números deste ano e, sem entrar em maiores detalhes, disse que a 13ª edição teve um crescimento médio de 21% em São Paulo e no Rio. Mais 30% de cariocas assistiram ao É Tudo Verdade em 2008. Em São Paulo, o aumento de público foi menor -10% .


O festival terminou ontem nas duas cidades, mas deve viajar agora por Brasília, Bauru e…, no Rio Grande do Sul. O júri da competição internacional, integrado pelo fotógrafo e diretor Walter Carvalho, premiou o longa Cosmonauta Polyakov, da alemã Dana Ranga. Durante um ano e dois meses, o russo Vallery Polyakov permaneceu no espaço, transformando-se no cosmonauta que por mais tempo ficou fora da Terra.


O prêmio de curta da competição internacional foi para Apenas Um Odor, do libanês Maher Abi Samra. Durante dez minutos e por meio de cinco planos, o cineasta mostra como voluntários tentam resgatar as vítimas de mais um bombardeio em Beirute. O título vem do fato de que a missão humanitária tem o objetivo de impedir que, no limite, o cheiro dos mortos contamine os vivos.


Nas duas competições, os júris deixaram clara sua dificuldade de escolher, devido ao elevado número de curtas e longas documentários que participaram do concurso. O 13º É Tudo Verdade mostrou que inovações de linguagem são muito bem-vindas. Forma e fundo unidos fazem do evento uma janela aberta para quem quiser entender mais (ou melhor) o mundo contemporâneo.’


 


TELEVISÃO
Shaonny Takaiama


Duas Caras vai ao ar mais tarde


‘A partir de amanhã, a novela das 9 da Globo passa a ir ao ar às 21 h mesmo. É, em Estados como o Acre não era assim.


À meia-noite de hoje, vence o prazo dado pelo Ministério da Justiça para que as emissoras do Amazonas, Mato Grosso do Sul, Pará, Rondônia, Roraima e Acre atrasassem em uma ou duas horas a transmissão de sua programação, em relação às emissoras cabeça de rede, situadas na região Sudeste.


Nesses locais, de fusos horários diferentes de Brasília, as programações terão de ser gravadas e exibidas pelas TVs abertas somente nos horários da classificação indicativa de cada programa. Isso se faz necessário para cumprir as determinações da Portaria 1.220 e evitar que crianças e adolescentes tenham acesso a programas inadequados para suas idades. No Acre, por exemplo, Duas Caras, classificada para às 21 h, ia ao ar às 19 h por causa do fuso.


A portaria causou furor entre as afiliadas da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert). Elas alegam que, para se adaptar às determinações do MJ teriam gastos com compra de equipamentos e contratação de pessoal.


Mesmo assim, o diretor-geral da Abert, Flávio Cavalcante Júnior, garante que as emissoras vão cumprir a portaria. ‘Essa medida é inócua e vai levar a uma corrida pela compra de parabólicas.’


Com essas antenas, o público assiste à programação da cabeça de rede, no horário normal, e sem os comerciais locais. ‘A publicidade local vai sair perdendo’, diz Cavalcante.


O diretor afirma ainda que a determinação do Ministério da Justiça não tem apelo entre a população. ‘Fizemos uma pesquisa e constatamos que 80% da população se sente muito incomodada com essa alteração na programação, porque se trata de um hábito de 30 anos.’’


 


O Estado de S. Paulo


Ruy Castro e Paulo Lins na TV Cultura


‘Hoje, às 20 h, o programa mensal Letra Livre, da TV Cultura, vai reunir Ruy Castro e Paulo Lins para discutir o universo da literatura. Sob mediação e apresentação do crítico literário Manoel da Costa Pinto, o biógrafo de Nelson Rodrigues, Carmen Miranda e Garrincha e o autor do romance sobre a favela carioca Cidade de Deus, que originou o filme de Fernando Meirelles, vão confrontar idéias e discutir o rumo da literatura brasileira. O Letra Livre vai ao ar sempre na primeira segunda-feira de cada mês e procura levantar questões importantes relacionadas à literatura contemporânea e sua relação com a sociedade.’


 


TEMPOS MODERNOS
Matthew Shirts


Auto-atendimento


‘Quando lhe dá na telha, meu pai escreve crônicas e as publica em jornais ou revistas dos Estados Unidos. É um hobby que pratica há pelo menos 40 anos, desde a minha infância. A última discute a questão da produtividade. ‘Tudo que eu queria fazer’, começa, ‘era conectar minha nova TV de alta definição ao aparelho de DVD ultrapassado.’


Apesar dos seus 74 anos, meu pai, Garry, é chegado em tecnologia. Vive hoje na Califórnia. Grava todos os dias um programa de rádio australiano, seu favorito sobre informática, e depois o passa para o iPod, para ouvir à noite, na cama, antes de dormir. É uma figura, o velho.


Lê o manual do televisor de alta definição, mas diz que é incompreensível. Busca um telefone de atendimento ao consumidor. Encontra-o escondido em meio a um parágrafo no último capítulo do livrinho. Liga. Ouve uma mensagem dizendo que a ligação pode ser monitorada para garantir a qualidade do atendimento. Diz ‘para ninguém em particular’ que qualidade seria permiti-lo falar com uma pessoa. Começa seu périplo através dos números do teclado. ‘Aperte 1 se você quer comprar uma TV ou um DVD, aperte 2 se quiser o endereço de uma loja…’ O número 9 oferece assistência técnica.


Mas não vai ser fácil, como você pode imaginar. Enfrenta novas opções de teclas até encontrar o modelo da sua TV. É informado do tempo de espera e do número de pessoas já na linha, à sua frente na fila. Ouve música de elevador. ‘A maioria das suas dúvidas pode ser resolvida através do site da companhia’, lhe assegura a voz gravada. Decide ser um consumidor obediente. Vai até o site, enfrenta anúncios pop-ups e animações que piscam, mas não consegue nenhuma informação prática.


Através do Google encontra um grupo de discussão e um dos participantes oferece, ‘em inglês compreensível’, a resposta à sua dúvida. ‘Obrigado, obrigado, quem quer que você seja’, escreve meu pai.


Precisa ir até uma lojinha comprar um cabo. Na volta, pára para colocar gasolina. Hoje em dia, não há contato humano nos postos dos Estados Unidos. Passa-se o cartão de crédito, você mesmo coloca a gasolina, entra no carro e sai. Sempre me dá uma sensação de vazio espiritual, um frio na barriga. Nessa ocasião, meu pai nota que há um atendente sentado dentro do posto, lendo. Sequer levanta o olhar da revista. Reclama: ‘Antigamente era eu que lia a revista no carro, enquanto ele enchia o tanque, limpava os vidros e fazia o troco.’


Em casa, ao encontrar notícias da crise financeira americana, lembra-se de Alan Greenspan, ex-presidente do Banco Central dos EUA dizendo, anos atrás, que não era preciso se preocupar com a inflação porque a produtividade do trabalhador americano só cresce, graças aos computadores. ‘Ninguém dá o merecido crédito a mim e ao cara simpático do grupo de discussão na internet.’ O título da crônica do velho é: ‘Cresce a produtividade de todo mundo, menos a minha.’


O professor Antônio Pedro Tota, da PUC de São Paulo, conhece meu pai. Quando saímos para praticar o pedestrianismo na Sumaré, semana passada, contei a história da crônica. Ele riu e disse que era parecida com uma idéia do nosso amigo Gilberto Felisberto Vasconcellos. Sociólogo, o Felisberto inventou um conceito, brasileiríssimo, para descrever o fenômeno, segundo Tota: o ‘self mais valia’.


‘Self’, como se sabe, pode ser traduzido para o português como ‘auto’ ou ‘em si’. Para quem não sabe, ‘mais valia’ é o conceito criado por Karl Marx para designar a diferença entre o valor produzido pelo trabalho e o valor pago ao trabalhador, que seria o mecanismo básico da exploração capitalista. Se, com seu trabalho, você ganha 10 e o capitalista 100, o valor da mais valia seria 90, pelo menos num entendimento rudimentar.


‘Self mais valia’ soa engraçado. Mas de Petrópolis, onde vive o Felisberto, a Del Mar, na Califórnia, onde mora meu pai, vêm interpretações semelhantes do momento. Sinal de que o espírito da época, o chamado zeitgeist, se globaliza.’


 


 


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