O jornalista afegão Ali Mohaqeq Nasab, sentenciado a dois anos de prisão por publicar artigos polêmicos em uma revista local, foi libertado na semana passada. A liberdade teve um preço. Nasab teve que se desculpar formalmente pelo que publicou. Após se recusar a fazê-lo por três meses, o jornalista afirmou diante de um tribunal de apelação que se desculpava por divulgar artigos sobre direitos das mulheres, o Islã e o sistema judiciário afegão.
Em seus textos, Nasab defendia que mulheres deveriam receber o mesmo tratamento que homens no tribunal, questionava o uso de punições físicas para crimes e sugeria que pessoas que abandonavam o Islã não deveriam ser executadas.
O caso chamou a atenção de organizações internacionais de defesa dos direitos humanos e deu início a um acalorado debate no Afeganistão. Religiosos linha-dura defendiam que Nasab deveria ser condenado à morte, enquanto ativistas em defesa da liberdade de expressão e dos direitos das mulheres pediam a libertação do jornalista. ‘A libertação de Nasab é um sinal encorajador’, afirma Nader Nadery, que preside a Comissão Independente de Direitos Humanos do Afeganistão. ‘Mas o caso levanta um precedente ruim para a liberdade de expressão, pois desencoraja jornalistas e promove a auto-censura’.
Liberdade?
A imprensa do Afeganistão cresceu nos últimos quatro anos, desde que o país deixou de ser controlado pelo regime Talibã, em 2001. Pela nova constituição, a mídia tem liberdade para publicar e transmitir sem medo de repressão. Mas líderes locais intimidam repórteres e juízes conservadores ocasionalmente tentam punir jornalistas que ousam abordar temas controversos.
Ao retornar ao Afeganistão no ano passado, após um longo exílio no Irã, Nasab começou a publicar uma revista intitulada Direitos das Mulheres. Foram artigos da edição de maio da revista que chamaram a atenção de um clérigo muçulmano, que denunciou que Nasab teria abandonado a religião. Ao apelar, em setembro, ele foi detido sob acusação de blasfêmia. Promotores afirmaram que os polêmicos textos do jornalista provavam que ele tinha, de fato, abandonado a religião – o que é considerado crime. Foi pedida a pena de morte, mas o tribunal decidiu pela sentença de dois anos de prisão.
A decisão desagradou um grupo de conservadores do país, que pediu que Nasab fosse enforcado se não mostrasse arrependimento. Por outro lado, organizações internacionais e embaixadas ocidentais protestavam pela soltura do jornalista. O presidente Hamid Karzai foi cuidadoso para não desagradar nenhum dos lados, defendendo seu apoio à liberdade de imprensa, mas insistindo que não poderia interferir nas decisões do judiciário.
Um dos juízes que decidiu pela libertação de Nasab disse que, se o jornalista não se arrependesse, acabaria executado. ‘É o único modo. É dito na sharia (lei islâmica) que, se alguém se arrepende [de ter abandonado o Islã], deve ser perdoado. Foi isso o que aconteceu’, afirmou. Informações de Griff Witte [Washington Post, 23/12/05].