Com a escolha de Londres para sediar os Jogos Olímpicos de 2012, um clima de alegria atingiu os setores de mídia, publicidade e relações públicas londrinos – a vitória da cidade significa maiores índices de audiência nas emissoras de TV e tiragem de jornais e, conseqüentemente, mais publicidade e investimentos.
Os Jogos Olímpicos são um dos dez maiores eventos transmitidos pela imprensa mundial. Notícias sobre sistemas de transporte e construções na cidade dominarão os noticiários nos próximos anos e, em 2012, jornais e programas de TV farão edições extras para cobrir os Jogos. Estimativas prevêem um lucro de dois bilhões de libras com os direitos das retransmissões mundiais das Olimpíadas, que serão transmitidas pela BBC, vencedora da licitação sobre os direitos de transmissão exclusiva. Apesar disto, o diretor geral da emissora, Mark Thompson, tem planos para mudar a equipe de 1.800 membros do departamento de esportes, infantil e notícias para Manchester, o que deverá acontecer em 2009.
Susto e rapidez
A mídia britânica ainda estava dedicada a fazer matérias sobre a vitória da capital para sediar as Olimpíadas quando uma série de quatro explosões coordenadas atingiu Londres na manhã de quinta-feira (7/7), deixando cerca de 50 mortos e 700 feridos. As redes de TV e rádio tiveram que se mobilizar para cobrir os atentados em dois dos principais símbolos do Reino Unido – o mais antigo serviço de metrô do mundo e o tradicional ônibus vermelho de dois andares.
A primeira explosão ocorreu as 8h51 na estação de Liverpool Street, e foi seguida por explosões em Piccadilly, às 8h56, na estação de Edgware Road, às 9h17, e pelo ataque ao ônibus perto de Russell Square, às 9h47.
A rádio BBC5 começou a transmitir imediatamente as informações dos atentados e entrevistas com feridos e testemunhas que saíam assustados das estações de metrô. As emissoras de TV BBC, ITV e Five mudaram sua programação para transmitir a cobertura dos atentados à medida que os incidentes foram se esclarecendo. A primeira a informar sobre as explosões foi a Press Association, às 9h15 da manhã.
Na hora seguinte, equipes televisivas e serviços de notícias online estavam mobilizados nas ruas e em estúdios para registrar as cenas do horror na capital britânica. A Sky News passou a transmitir textos corridos sobre os atentados na parte inferior da tela e deslocou suas equipes e um helicóptero para a Liverpool Street. Às 10h45, a emissora já transmitia imagens do local onde o ônibus de dois andares foi atingido e adicionou nas suas legendas um texto para as pessoas entrarem em contato com amigos e parentes para dizer que estavam bem, como foi feito durante o tsunami. Às 11h34, a BBC já atribuía a responsabilidade dos ataques ao grupo al-Qaeda. As emissoras de TV transmitiam a programação jornalística sem pausa para comerciais. A BBC e a Sky News deslocaram seus correspondentes da reunião da cúpula do G-8 na Escócia para cobrir os atentados em Londres.
Agilidade no caos
Os jornais online tiveram de se apressar para fornecer informações aos leitores que acessavam os seus sítios em busca de notícias e os jornais impressos foram forçados a se livrar das coberturas triunfais sobre a vitória de Londres e limpar suas páginas para as notícias dos atentados. Muitos jornais decidiram aumentar sua tiragem, embora antecipassem problemas na distribuição devido às interrupções nas vias de transporte.
O London Evening Standard tinha preparado uma edição especial sobre os Jogos Olímpicos na capital. O gratuito Metro, entregue aos leitores em estações de metrô da cidade, tentou manter normalizada sua distribuição mesmo com diversas estações fechadas. Como ainda era cedo e o sistema telefônico e o serviço de transportes foram paralisados, muitos profissionais não conseguiram chegar ao local de trabalho. Apenas 40% da equipe da ITV foi até a emissora.
Cidadãos viram repórteres nas ruas
As notícias sobre as explosões em Londres espalharam-se em minutos pelo mundo através da internet. O serviço de rastreamento Technorati, que monitora mais de 12 milhões de blogs, informou que mais de 1.300 mensagens foram postadas até as 10h15 de quinta-feira (7/7) – uma hora após o primeiro chamado de emergência até a estação de Liverpool Street – e que houve um aumento de 30% nas atividades de blogs. Nove entre dez procuras na internet eram sobre os atentados. De acordo com Bobbie Johnson, editor da seção online do The Guardian, a rede não ficou congestionada inicialmente porque grande parte dos Estados Unidos ainda estava dormindo quando os incidentes ocorreram.
Flickr, sítio do Yahoo de compartilhamento de imagens usado para postar fotos pessoais, passou a ser utilizado para divulgar imagens das explosões – menos de oito horas depois dos ataques, 300 fotos foram publicadas. A maior parte das imagens e vídeos veio de celulares equipados com câmeras e filmadoras, demonstrando que uma tecnologia originalmente anunciada como entretenimento desempenhou um papel importante na era das notícias instantâneas das vítimas e testemunhas.
Imagens gravadas por passageiros no metrô após as explosões fossem disponibilizadas, em questão de horas, em emissoras de TV e sítios de notícias na internet. Uma foto que circulou o mundo foi a de um homem que cobriu sua boca com um tecido para se proteger da fumaça. A enciclopédia online Wikipedia, um dos sítios que postou a foto, identificou o fotógrafo como Adam Stacey e informou que ele e outros passageiros escaparam do vagão do metrô pelas janelas. O sítio Moblog.co.uk, que também divulgou a foto, disse que até as 18h20 da quinta-feira (7/7) ela tinha sido acessada 36.300 vezes.
A polícia britânica pediu à população de Londres para que as fotografias clicadas nos lugares onde ocorreram as explosões sejam disponibilizadas a fim de ajudar os investigadores na busca aos responsáveis pelos atentados. O lado ruim em contar com fotos de repórteres amadores é que não é possível verificar a veracidade ou origem de uma imagem enviada às pressas.
Kurt Pitzer, porta-voz da World Picture News, que representa fotógrafos profissionais e amadores, alega que fotos tiradas por testemunhas de desastres e eventos importantes proliferaram na rede após o tsunami na Ásia. A melhoria na qualidade das conexões de internet contribuiu para este fenômeno. Dan Gillmor, fundador da Grassroots media, que promove os princípios do jornalismo cidadão, alega que fotos de testemunhas remodelarão o papel das mídias tradicionais ao longo do tempo.
Helen Boaden, diretora de notícias da BBC, diz que minutos após a explosão a emissora recebeu imagens tiradas pelo público e em uma hora já tinha acesso a 50 fotos. Ela acredita que à medida que as pessoas passam a capturar imagens da vida cotidiana, elas pensam consideravelmente em mandá-las para a imprensa quando incidentes maiores acontecem. Mais de 300 mensagens com uma média de três fotos cada e cerca de 30 vídeos foram enviados, ainda na quinta-feira (7/7), para um endereço de e-mail disponibilizado exclusivamente para este fim.
O editor-executivo da Sky News, John Ryley, afirma que este tipo de atitude pode ajudar na democratização das notícias, pois equipes de reportagem geralmente chegam imediatamente após o evento, enquanto as fotos de testemunhas mostram o evento da maneira como aconteceu.
Prudência na divulgação de imagens
Durante anos, os meios de comunicação britânicos evitaram divulgar a seus leitores e espectadores imagens explícitas de catástrofes e atentados. Segundo Javier Farje, membro da equipe da BBC Mundo, esta é uma ‘prática habitual que evita criar mais angústia’. Esta norma não escrita faz parte da cultura da mídia britânica e foi seguida por grande parte dos veículos da imprensa nos ataques terroristas em Londres.
Os britânicos estão acostumados a protestar quando a imprensa reproduz imagens ou conteúdos que consideram inapropriados. A BBC recebe diariamente queixas e a Comissão de Reclamações sobre a Imprensa do Reino Unido (PCC, sigla em inglês) intervém caso os leitores se sintam agredidos pelo que é publicado na imprensa.
A Reuters quebrou esta política dos meios de comunicação ao difundir uma fotografia de um corpo estendido no chão. A porta-voz da agência, Susan Allsopp, explica que a Reuters é uma companhia independente e global, que distribui o material produzido por seus fotógrafos aos seus clientes no mundo.
Com muitas informações disponíveis através da grande mídia e de blogs, as diferenças no tom e no estilo de cobertura conduziram o público a escolher qual fonte acompanhar para ter notícias sobre os atentados. A BBC foi mais cautelosa do que a Sky News, que correu para colocar mais informações – fatos comprovados ou apenas especulações – no ar. A ITV ficou na posição intermediária. A mesma atitude de cautela da BBC pôde ser observada no rádio. Nos jornais, mesmo sem fotos chocantes, as descrições das testemunhas eram muitas vezes fortes demais.
Informações oficiais
Para evitar qualquer situação de pânico, autoridades britânicas alegaram para a população, durante uma hora, que havia um problema elétrico no metrô. Até o momento, esta atitude do governo não foi criticada pela mídia. Javier Farje alega que a BBC não tem nenhum problema em chegar depois da CNN, ‘porque quando buscam a precisão, as pessoas vão à BBC’. A emissora seguiu escrupulosamente a informação oficial, sempre citando fontes no momento de fazer especulações.
Jornais respondem aos ataques
Os editoriais dos jornais britânicos evitam parecer submissos ao terrorismo. O jornal Daily Star escreveu em seu editorial que ‘eles não se abaterão e que farão justiça pelas mortes do 7/7’. O The Sun pede ‘vingança e justiça em nome de Nova York, Washington, Bali, Nairobi e Madri e, nas palavras de Winston Churchill em 1941: nunca se entregue, nunca’.
O Daily Mail afirma que o Reino Unido acordou com um contragolpe depois do triunfo olímpico e que em horas a euforia desapareceu. O Daily Telegraph relata que o contraste entre o triunfo e a vulnerabilidade repentina não poderia ser maior.
O editorial do jornal The Times afirma que ‘há algumas pessoas inclinadas a associar as mortes de Londres com a intervenção no Iraque, mas isto é absolutamente inválido. Londres foi atacado porque extremistas querem iniciar uma guerra santa entre eles e a sociedade democrática’. Já o The Express alega que ‘o envolvimento no Iraque nos tornou um alvo para os extremistas do Oriente Médio, mas não podemos esquecer que estamos lutando por democracia e liberdade da tirania’.
A revista Economist afirma que os atentados foram programados para coincidir com a abertura do encontro da cúpula do G-8 e que a vitória da cidade para sediar os Jogos Olímpicos deu uma ‘dose extra de satisfação aos terroristas’. Segundo ela, Londres estava sob risco desde os ataques do 11/9. Jornais ao redor do mundo também dedicaram suas capas ao terrorismo na capital britânica. Informações de Stephen Brook, Chris Tryhorn, Jason Deans, Chris Johnston, Ownen Gibson e Julia Day [The Guardian, 6/7, 7/7 e 11/7/05], Economist [7/7/05], Yuki Noguchi [Washington Post, 8/7/05], Louise Story [New York Times, 8/7/05], BBC [8/7/05] e Charro Marcos [El Mundo, 8/7/05].