Mais um ano de violência contra jornalistas e de repressão à imprensa. Foram 63 jornalistas assassinados em 2005 e mais de 1.300 casos de ataques físicos e ameaças a estes profissionais. Os dados são do relatório anual sobre liberdade de imprensa da organização Repórteres Sem Fronteiras, divulgado nesta quarta-feira [4/1/06].
Ano mortífero
2005 foi um dos anos com mais mortes de jornalistas por causa de seu trabalho na última década. O total de 63 jornalistas assassinados em diversos países só perde para 1995, quando este índice chegou a 64 – 22 na Argélia. No ano passado, também foram mortos cinco assistentes de equipes jornalísticas, como motoristas, técnicos e seguranças.
Pelo terceiro ano consecutivo, o Iraque foi o país mais perigoso para o exercício da profissão, com 24 jornalistas e os cinco assistentes citados acima assassinados enquanto cumpriam seu trabalho. Desde o começo da guerra, em março de 2003, 76 profissionais de imprensa foram assassinados no país. Bombardeios terroristas e ataques de insurgentes são a principal causa da violência, mas pelo menos três jornalistas foram mortos por soldados americanos.
As Filipinas também representaram um país perigoso para jornalistas que tentam informar o público. Os inimigos da imprensa local deixaram de ser membros de grupos armados para se tornar políticos, empresários e traficantes, todos prontos a silenciar repórteres e editores que tentam denunciar seus crimes. A situação não é mais tranqüila para profissionais do oriente, como Nepal, Paquistão, Afeganistão, Sri Lanka e Bangladesh.
Ataques físicos sofridos por políticos e jornalistas abalaram a liberdade de expressão no Líbano durante o ano. Dois importantes jornalistas do país – Samir Kassir e Gebran Tueni – foram mortos em junho e dezembro, respectivamente. A apresentadora de televisão May Chidiac sofreu um ataque a bomba em seu carro em setembro. Ela sobreviveu, mas ficou gravemente ferida e perdeu uma mão e uma perna.
A violência também aumentou na África. Países como Congo, Serra Leoa e Somália contabilizaram mortes de jornalistas, mas seus assassinos – alguns identificados – continuam impunes.
No continente americano, dois jornalistas foram assassinados no México por investigarem o tráfico de drogas e a corrupção no setor petrolífero.
Rússia e Belarus tiveram casos de profissionais mortos em circunstâncias obscuras. As investigações conduzidas pelo governo dificilmente produzem – ou produzirão – soluções para estes crimes.
Agressões diárias
A RSF registrou mais de 1.300 ataques físicos e ameaças a jornalistas durante o ano. Em Bangladesh e no Nepal, eles ocorreram quase que diariamente, e vieram de todos os lados – polícia, governo, ativistas de oposição e membros de grupos armados. Os agressores raramente são punidos e continuam a ter jornalistas como alvo de seus ataques.
Períodos de campanhas eleitorais também se revelaram momentos de violência exacerbada contra profissionais de imprensa, como pôde ser observado no Egito e no Azerbaijão. Os dois países tiveram dezenas de agressões a jornalistas que tentavam cobrir manifestações populares e a votação em si.
Cerca de 50 jornalistas foram espancados no Peru e na Nigéria, acusados de se meterem onde não são chamados. Os agressores? Policiais, soldados e capangas de políticos locais. Em abril, uma repórter de rádio chegou a ser agredida pelo embaixador peruano na Espanha, durante uma visita dele a Lima. Bettina Mendoza, da estação de rádio CPN, tentava entrevistar o embaixador e teve seu braço direito ferido. O diplomata se desculpou posteriormente.
Publicou, foi preso
Em 1/1/06, 126 jornalistas e três assistentes de mídia estavam detidos em 23 países. O número de jornalistas presos em 2005 foi menor do que o do ano anterior – 807, comparado a 907 em 2004. A situação, entretanto, não é otimista, já que, segundo a organização, uma média de dois jornalistas são presos diariamente por tentarem fazer seu trabalho.
China e Cuba continuam a ser as maiores prisões do mundo para profissionais de imprensa. Em Cuba, 20 dos 27 jornalistas presos na onda de repressão na primavera de 2003 continuam a cumprir sentenças de 14 a 27 anos. Na China, o jornalista e crítico de arte Yu Dongyue cumpre pena de 18 anos desde sua prisão durante o massacre da Praça da Paz Celestial, em 1989. Ele é acusado de ‘propaganda contra-revolucionária’ e perdeu a sanidade mental devido a anos de tortura.
A Líbia mantém o recorde de prisão mais longa de um jornalista. Abdullah Ali al-Sanussi al-Darrat está preso desde 1973. As autoridades não fornecem informações sobre ele, e não se sabe ao menos se ele ainda está vivo.
Na Eritréia, a imprensa privada foi banida em 2001. Os ex-publishers e editores continuam presos até hoje. Seu local de prisão não é conhecido e suas famílias não podem visitá-los.
Boca fechada
Pelo menos 1.006 casos de censura foram registrados em 2005 – no ano anterior, este número foi de 622. A pior situação foi a do Nepal, que contabilizou mais da metade dos casos. Foram 567 ao todo, desde o início do estado de emergência imposto pelo rei Gyanendra em fevereiro.
As medidas tomadas contra a imprensa incluem a proibição da transmissão de notícias em estações de rádio, o bloqueio de sítios de internet, a apreensão de equipamento de equipes de mídia e a ampla difusão de propaganda governamental.
A censura também é grande em Belarus, no Cazaquistão e em grande parte dos países da Ásia central, onde jornais são fechados simplesmente por criticarem o governo.
Rede controlada
A rede mundial de computadores continuou a ser controlada por governos repressivos e, em 2005, a RSF divulgou uma lista com os ’15 inimigos da internet’. São eles Belarus, Burma, China, Cuba, Líbia, Irã, Nepal, Maldivas, Coréia do Norte, Arábia Saudita, Síria, Tunísia, Turcomenistão, Uzbequistão e Vietnã.
A internet nestes países é amplamente controlada, com sítios de notícias bloqueados e, muitas vezes, interceptação do tráfego online com o objetivo de silenciar vozes dissidentes e ameaçar internautas e blogueiros que desviem da linha de opinião guiada pelo governo.
No Irã, o Ministério da Informação bloqueia acesso a milhares de sítios. É proibido qualquer tipo de conteúdo sexual. Sítios independentes de notícias também sofrem com a censura.
Na Tunísia, a família do presidente Zine el-Abidine Ben Ali controla o acesso nacional à internet e construiu um eficiente modelo de censura, com os sítios de todas as publicações de oposição e grande maioria dos sítios de notícias bloqueados. Nem o sítio da Repórteres Sem Fronteiras escapou, e não pode ser acessado de território tunisino.
Para saber mais
O balanço completo de 2005 está no sítio da RSF (em espanhol)
Informe de 2004 — Uma mobilização imperativa (em espanhol)
Lista negra dos inimigos da liberdade de imprensa, segundo a RSF (em espanhol)
Classificação mundial da liberdade de imprensa de 2005 (em espanhol)