Ao vencedor, nunca será perguntado se disse a verdade – Adolf Hitler (1889-1945)
Repetir o óbvio, por vezes, é necessário para reavivar memórias e despertar consciências. Ressalto, desde logo, que o Judiciário não é a única forma de se fazer Justiça. Por exemplo, este Observatório da Imprensa foi o primeiro a promover o debate público sobre a conduta da mídia na cobertura da enigmática tragédia com o gás liquefeito de petróleo – GLP da Companhia Ultragaz S/A, ocorrida a 11 de junho de 1996 no Osasco Plaza Shopping, sem deslembrar que a promovida discussão pública foi desenvolvida com respeito a todas as garantias do direito de defesa e do contraditório.
É o que se depreende das assertivas contidas nos textos dos artigos: ‘Tragédia e mídia‘, ‘Telhado de vidro (ou o caso Osasco Plaza)‘, ‘Telhado de vidro‘, ‘Osasco Plaza‘, ‘Lei da selva‘ e ‘Osasco Plaza – Procedimento condenatório‘, publicados por este Observatório, de autoria dos debatedores, respectivamente: crítica de teatro Ilka Marinho de Andrade Zanotto – mãe do diretor do Osasco Plaza, Marcelo Zanotto –, jornalista Paula Pereira, jornalista Luis Nassif, professor Paolo Marinho de Andrade Zanotto – irmão de Marcelo Zanotto – e diretora e coordenador-editorial do IEDC – Instituto de Estudos ‘Direito e Cidadania’, respectivamente, Ana Lúcia Amaral e Carlos Alberto de Salles.
Nova qualidade de medo
De d. Ilka Marinho de Andrade Zanotto, que atuou em defesa da liberdade de imprensa, de profissionais e veículos de comunicação – na época do regime militar e da Operação Bandeirantes –, ao criticar a mídia em sua missiva publicada neste Observatório da Imprensa sob o título ‘Tragédia e mídia’, em data de 5 de março de 1997:
‘É incomensurável a responsabilidade da mídia ao veicular os bastidores das tragédias; é inadmissível dar crédito às declarações de indivíduos ávidos de fama e aos boatos mais estapafúrdios, transformando versões em fatos, sem antes ouvir todos os envolvidos, e, no caso, vilipendiados. Arma-se um circo em torno dos bodes expiatórios que remete de imediato à Fogueira das Vaidades, de Tom Wolfe, no qual o protagonista inocente é condenado a partir de um conluio macabro entre interesses opostos, tendo como argamassa a busca de promoção (no sentido lato e estrito) e tendo a mídia como peça chave da orquestração.
Alberto Dines, estaria estarrecida se não houvesse tábuas de salvação como a consciência dos juízes corajosos ou como este Observatório. Desde o ‘Jornal dos Jornais’ inexistia uma janela eficaz e isenta pela qual a imprensa pudesse se auto-esquadrinhar. Como Guimarães Rosa, ‘a cada dia da vida a gente aprende uma nova qualidade de medo’. Nunca pensei em ter medo da imprensa, cuja liberdade sempre defendi nos 20 anos em que exerci a crítica teatral no Estado, na TV Cultura, nas revistas Visão e IstoÉ: venci-o ao divulgar os dossiês, fortalecida pela confiança na verdadeira imprensa, aquela que se pauta pela ética, inerente à profissão. Confio nela, como confio na justiça dos homens e de Deus.’
Restabelecimento de princípios
Aparte meu: é importante ser salientado aos esclarecidos leitores que este breve texto se resume em trazer a lume apenas algumas das dezenas de robustas e cabeludas falcatruas, sem-vergonhices e mecanismos materializados nos autos dos processos criminal e cíveis do caso concreto, sempre lembrando que os administradores do Osasco Plaza Shopping antes mesmo de prestarem depoimentos à autoridade policial já haviam recebido de parte da mídia e do Ministério Público um título condenatório em um pré-julgamento para satisfação de parte da opinião pública e da imprensa mais sensacionalista.
Portanto, há de se repisar e atentar para a circunstância de que desde o primeiro momento da tragédia, uma espécie de cortina silenciava os fatos de um odioso linchamento nazista até serem publicados neste Observatório. A desordem – que foi planejada em prol da criminalidade econômica com a cristalina intenção de privilegiar a Ultragaz após a tragédia com o seu gás no Osasco Plaza Shopping – chega ao ponto de afrontar e depredar as garantias das liberdades fundamentais em que se baseia o Estado Democrático de Direito.
De se lembrar que, corroborando com tudo o que foi dito e afirmado por d. Ilka Marinho de Andrade Zanotto em seu ‘dossiê’ denominado ‘O outro lado da tragédia do Osasco Plaza Shopping – porque somos vítimas e não culpados’, os julgadores do v. acórdão do Processo nº 302.777.3/8-00 proferido pela Colenda Sexta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), em data de 3 de fevereiro de 2005, no mais cristalino restabelecimento dos princípios da verdade, da lei e da justiça, absolveram os administradores do Osasco Plaza Shopping e os engenheiros da construtora Wysling Gomes, que haviam sido condenados na sentença proferida pelo MM. Juiz da 2ª Vara Criminal da Comarca de Osasco-SP, em data de 23 de agosto de 1999.
‘Uma obra de ficção’
No julgamento retro, restou decidido que a ‘Administração do Shopping’ chamou a Ultragaz por duas vezes e esta, após duas vistorias técnicas nas instalações de gás do Osasco Plaza, não informou, alertou e advertiu os administradores do shopping que com tais irregularidades e falta de segurança nas tubulações das redes de alimentação e de distribuição interna do conjunto técnico de gás o risco de acidente era patente, como bem anotado pelo desembargador Ericson Maranho (relator), que é egresso do Ministério Público, em seu voto vencedor:
‘É sabido que, diante da possibilidade de vazamento, a primeira providência que a fornecedora deve adotar é interromper o fornecimento de gás e condenar a rede de distribuição. Se nada disso fez, ao contrário, entregou mais combustível, ou não havia dúvida quanto à inexistência de vazamento, ou foram desidiosos. E a denúncia não cuidou de incluí-los no pólo passivo da ação?’
No julgamento vertente, o desembargador Debatin Cardoso (revisor), em seu voto vencido, não contestou nenhum dos vícios dos autos do processo crime que foram apontados no explosivo voto vencedor do relator da apelação criminal nº 302.777.3/8-00; que, aliás, são de deixar um frade de pedra com rubor no rosto – o que pode explicar por que o inatacável voto vencedor e os vícios crassos dos autos do processo crime mereceram de parte da grande imprensa o silêncio dos cemitérios.
É importante referir que, além de nenhum profissional da chamada grande mídia estar presente no julgamento – de interesse público –, o desembargador Ericson Maranho fez severas críticas à denunciação caluniosa (acusar alguém de crime mesmo sabendo da inocência) e à sentença de primeira instância, que condenou pessoas sabidamente inocentes. Inclusive, durante a leitura de seu voto, ao ler trecho da denúncia oferecida pelo Ministério Público, desabafou: ‘Esta denúncia é fantasiosa! É uma obra de ficção!’ Já o desembargador Pedro Gagliardi comentou o fato da responsabilidade dos funcionários da Ultragaz não estarem presente nas 40 pastas que compõe o processo.
Não conhecimento do agravo
E como os veículos da grande mídia deixaram de informar a sociedade sobre o desenrolar do processo-crime, cumpre salientar resumidamente que, a Procuradoria Geral de Justiça ingressou com recurso especial somente em face da absolvição dos administradores do Osasco Plaza junto ao Tribunal de Justiça de São Paulo, subscrito pelo procurador-geral de Justiça Rodrigo Cesar Rebello Pinho e pelo promotor de Justiça designado Jorge Assaf Maluly, em data de 5 de maio de 2005.
Contudo, a decisão proferida pelo 2º vice-presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, desembargador Jarbas João Coimbra Mazzoni, em data de 9 de agosto de 2005, não admitiu o recurso especial, conforme conclusão: ‘Ante o exposto, não preenchendo a recorrente os requisitos exigidos, NÃO ADMITO o recurso especial interposto’ (grifos do original).
Deveras, no mais franco inconformismo com a r. decisão, que negou seguimento ao recurso especial interposto contra o v. acórdão da Colenda Sexta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, o Ministério Público nos autos do recurso especial nº 302.777.3, Comarca de Osasco, veio, em data de 15 de agosto de 2005, interpor agravo de instrumento (nº 720.299-SP) para o Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Mutatis mutandis, a decisão do Ministério Público Federal exarada no parecer nº 39761-PP, acostado às fls. 753/754 dos autos nº 720.299, subscrito pelo subprocurador-geral da República Antônio Carlos Pessoa Lins, em data de 29 de novembro de 2005, foi no sentido de que: ‘O r. despacho não merece reforma tendo em vista os enunciados da Súmulas 282 2 356 do STF e 07 do STJ, respectivamente, in verbis:’… Com conclusão: ‘Ante o exposto, o Ministério Público Federal opina pelo não conhecimento do agravo.’
Decisões constritivas
Em conclusão, portanto, decorridos 10 anos, 6 meses e 1 dia da Ultragaz ter ceifado a vida de 42 pessoas e ocasionado lesões corporais em outras centenas com o seu gás no Osasco Plaza Shopping, no dia 12 de dezembro de 2006, ‘a 5ª Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso. Os ministros Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima e Felix Fischer votaram com o ministro relator Gilson Dipp’.’ (REsp 880283 SP).
Acta est fabula, com o resultado da decisão do STJ por quatro votos a zero – o que foi uma clamorosa derrota imposta ao Ministério Público –, chegava ao fim certamente uma das mais tristes histórias de atentado às garantias das liberdades fundamentais em que se baseiam o Estado Democrático de Direito, e de violações às Declarações Universais dos Direitos Humanos (ONU/1948) e dos Direitos da Vítima (ONU/1985).
E aí, com reiteração, ficou positivado que o Poder Judiciário não se deixa levar por julgamento açodado pelo clamor público, nem se sujeita a críticas levianas e à coação, hoje confessada e exercida por alguns membros do Ministério Público com o auxílio de parte da mídia, destinada a obter decisões constritivas com base não em indícios consistentes nem em provas, mas no ‘clamor público’ que já levou Jesus Cristo à cruz, e Adolf Hitler ao poder.
Pretexto de moralização
Prosseguindo: é o óbvio ululante que os fatos explicitados nas históricas e moralizadoras decisões do TJSP e do STJ não são de conhecimento público porque não foram divulgados na imprensa falada nem na imprensa escrita, exclusive este Observatório (edições 425 e 437), a revista Consultor Jurídico (edições de 3/2/2005, 13/12/2006 e 12/3/2007), a revista CartaCapital (edição 427) e o jornal Diário de S. Paulo (edição de 4/3/07), como bem anotou o jornalista Sergio Lirio em seu artigo intitulado: ‘O castigo e o crime’, publicado na revista CartaCapital em data de 17 de janeiro de 2007:
‘A decisão do STJ, em dezembro passado, ao contrário da cobertura da tragédia e do desenrolar das investigações, mereceu da imprensa registros burocráticos ou o total desprezo, salvo raras exceções, principalmente na internet. Foi um silêncio, tanto quanto a explosão do dia 11 de junho de 1996, ensurdecedor.’
Não obstante, de um lado, a Ultragaz dispõe de eficientes mecanismos de controle sobre notícias danosas e de desinformação acerca de suas responsabilidades com a Lei quando mata e fere pessoas; de outro, as matérias amplamente divulgadas pela chamada grande imprensa no caso em tela, principalmente até um dia após os funcionários da Ultragaz prestarem depoimentos à autoridade policial (5/8/1996), retratam uma situação que se repete com alarmante constância, na qual, sob o pretexto de moralização do país, comissões ou órgãos oficiais atuam em absoluto desrespeito às garantias previstas no Código do Processo Penal.
Títulos de mau-gosto
Há um clima de verdadeira caça às bruxas, no qual os investigadores atuam com pressa e estardalhaço, mais preocupados com as luzes das câmeras de televisão e com os aplausos antecipados do que com os fatos, as garantias e os direitos individuais, que de há muito se acham reconhecidos internacionalmente e incorporados ao patrimônio dos cidadãos que fazem parte das sociedades civilizadas e democráticas.
De fato, d. Ilka Zanotto confirmando essa realidade tendenciosa de como as coisas foram conduzidas pela mídia desde as primeiras horas após a ocorrência da tragédia, anotou em seu dossiê de uma centena de páginas intitulado ‘O outro lado da tragédia do Osasco Plaza Shopping – por que somos vítimas e não culpados’, que também foi publicado quase que integralmente neste Observatório, que:
‘Os programas especiais da TV, como o Globo Repórter, editaram suas matérias omitindo qualquer depoimento a favor do Shopping (e os houve, a Globo sabe disso, Caco Barcellos que o diga, deve tê-los ainda gravados).’
A propósito, colacionam-se trechos de análise crítica adrede exarada pelo ombudsman da Folha de S. Paulo, Marcelo Leite, em data de 16 de junho de 1996, intitulada: ‘Os extremos da tragédia’, que versa sobre os deslizes da Folha na cobertura do caso Osasco Plaza Shopping:
‘Quando todos os leitores aguardavam drama e detalhes, a Folha lhes serviu ironia. Uma ironia canhestra, fora de hora, que pôs em evidência não a agonia, a destruição ou o salvamento, mas uma placa: ‘Prezado Cliente: o objetivo de nossa tarifa de segurança é dar mais conforto e tranqüilidade aos nossos usuários’. Melhor dizendo, a edição dessa imagem evidencia a própria intenção de registrá-la e publicá-la, não o que aparece na sua superfície e a legenda pseudo-ingenuamente relata (‘Soldado do Exército passa por placa…’). É o fotógrafo e é o editor que se vê na foto, não o soldado, mero pretexto para a ‘sacada’ do jornalista. Sem este, como todos deveriam saber, não há notícias…
Para quem duvida de que se trata de um padrão que pipoca aqui e ali na Folha, continuamente, cito dois títulos da mesma cobertura que se destacaram mais pelo próprio mau-gosto do que pela notícia que deveriam sintetizar, ambos de quinta-feira: ‘Curioso aumenta ‘quórum’ em cemitério’; ‘Noite teve pizza e desespero’. Não dá para engolir esse ‘quórum’, muito menos a pizza com desespero. Ficaria mais fácil se a Folha tivesse apresentado paralelamente um bom desempenho informativo. Não foi o caso.’
Faltando com a verdade
No mesmo sentido, o leitor da revista Veja Ricardo de Souza Toledo, em data de 18 de junho de 1996, enviou uma carta ao diretor de redação de Veja, Mario Sérgio Conti, desmentindo a autora do artigo intitulado: ‘Câmara de Gás’, jornalista Angélica Santa Cruz, publicado na revista Veja – Edição 1449 – Ano 29 – nº 25, de 19 de junho 1996, com reportagem de capa, intitulada ‘Explosão no shopping – Histórias de horror’ (capa e páginas 33/51), entre outras, que o administrador de empresa Marcelo Zanotto:
‘No dia 11 de junho, às 12h10, encontrava-se trabalhando no Shopping. Contrariamente ao que disse o texto de Veja, não saiu pelo outro extremo do edifício: ficou ainda muito tempo no Shopping, apesar de encontrar-se em estado de choque como várias outras pessoas que, como ele, estavam no local no instante fatídico da explosão.’
Mas, até aqui, o pecado é venial! Pecado mortal, além de Veja não ter publicado a carta de seu leitor por razões óbvias e de ter publicado a solidária ‘Nota de Esclarecimento’ da Administração Osasco Plaza Shopping após 11 páginas da sua ultra matéria de opinião retro, foi a resposta enviada via online pela jornalista Angélica Santa Cruz ao missivista Ricardo de Souza Toledo, em data de 27 de junho de 1996.
A diretora de redação ‘substituta’, Angélica Santa Cruz, faltou com a verdade em seu artigo ‘Câmara de Gás’ (páginas 42/43) e em sua resposta em tela atacou em público e desculpou-se em particular, pois, Marcelo Zanotto não ‘saiu pelo outro extremo do edifício. Depois preferiu ficar no anonimato’.
Negar o óbvio
Também não é verdade que Marcelo Zanotto é ‘o dono do Osasco Plaza Shopping’. Máxime que a jornalista Angélica Santa Cruz, na página 43 de seu artigo, afirmou com todas as letras: ‘Marcelo Zanotto decidiu levantar ali um shopping. A família entrou com 80% das ações e os 20% restantes foram para o Grupo Pelicano.’ Ademais, a referida diretora ‘substituta’, citou em sua referida resposta ‘B7 Empreendimento’ omitindo o ‘S/A’ da B. Sete Participações S/A – na época, uma S/A com 15 sócios.
É curioso que a mencionada jornalista, além de querer ‘checar as informações’ só com um diretor, primeiro alegou: ‘Não contei com a cooperação da empresa’, e depois confessou: ‘O superintendente do Osasco Plaza, Davi Rocha, escalado para responder pelo shopping na semana da tragédia.’ Ora, tanto é verdade que o superintendente do Osasco Plaza foi por Zanotto ‘escalado para responder pelo shopping’ que a própria jornalista o entrevistou: ‘Alguma empresa fez esse encanamento e, portanto, é responsável por ele. Estamos esperando o laudo para responsabilizar o autor dessa besteira, dizia, por sua vez, o superintendente do shopping David Rocha’ (página 43).
E a curiosidade ganha vulto no tópico da referida resposta em que se diz: ‘Telefonei várias vezes para a casa do Sr. Zanotto. Deixei vários recados.’ Entretanto, quando a jornalista conseguiu falar com a suposta ‘esposa de Zanotto’ (talvez uma empregada desatenta, sabe-se lá!), não perguntou por Marcelo Zanotto! É risível a justificativa dada pela diretora de redação ‘substituta’ de Veja ao missivista Ricardo de Souza Toledo, na mais franca terceirização de seus erros por culpa e por dolo: ‘Como você vê, o próprio dono do shopping optou pelo anonimato, preferiu não contribuir para o esclarecimento dos fatos e nos induziu ao erro’ – o que me faz lembrar Galileu Galilei, obrigado a se negar o óbvio, ‘… mas que ela se move, se move!’
Informação correta e fofoca
A propósito, Blackstone já assegurava: ‘A liberdade de imprensa é na verdade essencial à natureza de um Estado livre: mas ela consiste em não impor restrições prévias às publicações, não na isenção de censura por fatos criminosos depois de feita a publicação. Todo homem livre tem um indiscutível direito a expor o que sente ante o público: proibi-lo equivaleria a suprimir a liberdade de imprensa; mas se alguém pública o que é inapropriado, maligno ou ilegal, deve sofrer as conseqüências de sua própria temeridade.’ (Blackstone, Livro IV, Cap.11, in Arthur E. Sutherland, De la Carta Magna a la Constituición norteamericana. Ideas fundamentales sobre constitucionalismo, Buenos Aires: TEA, 1972, pág. 158).
No mesmo sentido, destaca-se a lição de Luis Nassif, jornalista autor do artigo que versa sobre a conduta da mídia na cobertura da tragédia com o gás da Ultragaz no Osasco Plaza Shopping e sobre o périplo penoso de D. Ilka Zanotto: ‘A luta de uma mãe’, publicada no jornal Folha de S. Paulo, em data de 15 de julho de 1998, a saber:
‘Há uma praga jornalística antiga, fruto do maniqueísmo primário, que consiste no seguinte: quando o sujeito se transforma no Judas da vez, pode atribuir a ele todos os crimes, porque de algum ele será culpado mesmo.É um procedimento que depõe contra o jornalismo, contra o rigor que deveria caracterizar a cobertura.
A partir do momento em que não há discernimento, para separar o certo do errado, a notícia correta da fantasia, toda a cobertura perde credibilidade. Se tal informação é falsa como posso acreditar na outra – que pode ser correta? O que separa o jornalismo de outras formas de disseminação de informação – salão de cabeleireira, por exemplo – é a capacidade de separar a informação correta da mera fofoca.’ (Blog do Luis Nassif, ‘Brigando com a notícia’, 14/11/2007).
Versões antecederam investigações
É o caso da revista Veja, que na sua matéria de opinião retro mencionada, sem mencionar uma única prova documental ou técnica-científica sequer, responsabilizou pessoas inocentes pelo cometimento e não desfazimento das causas da explosão do Osasco Plaza Shopping. – o que me faz lembrar Joseph Goebbels que dizia, ‘nós decidimos quem é judeu’.
Ademais, com a publicação da matéria de opinião de Veja supracitada, só se estava a tentar salvar as aparências, escondendo o que havia de efetivamente relevante para ser investigado no evento lutuoso: a Verdade.
Verdade esta ainda a divulgar em momento oportuno e já divulgada nos artigos publicados neste Observatório intitulados: ‘Caso Osasco Plaza – Falta alguém no banco dos réus‘, em data de 20 de março de 2007 (Reproduzido do Consultor Jurídico, 12/3/2007; título original ‘Por que o MP não acusou a Ultragaz pelo acidente?’) e ‘Osasco Plaza, 11 anos – Elogio à impunidade‘, em data de 12 de junho de 2007.
Máxime que, a jornalista Angélica Santa Cruz, em seu artigo intitulado: ‘Câmara de Gás’, antes mesmo de iniciada qualquer investigação, produziu as versões do ‘vazamento lento e gradual’, do ‘cheiro de gás’ e do ‘período de tempo para a execução do teste de estanqueidade’ – tripé que apoiou outra versão, a da ‘ganância dos administradores do Shopping’.
Rápido, abrupto e pontual
Tanto assim é que, até hoje, as ‘versões’ de Veja são defendidas ferrenhamente nos autos dos processos em que a Cia. Ultragaz S/A figura como ré e divulgadas à exaustão na imprensa falada e na imprensa escrita pelos advogados da referida companhia Rodrigo Arantes Barcellos e Rachel Ferreira Araújo Tucunduva.
É de se questionar: por que a referida jornalista entrevistou o funcionário da Copagaz, mas não teve interesse de entrevistar qualquer funcionário, diretor ou advogado da Ultragaz e da BRR Gerenciamento e Planejamento S/C? A quem interessa esta matéria dissimulada e de desinformação de Veja, publicada num momento triste de uma indizível tragédia e antes das pessoas vitimadas e seus familiares, lojistas, funcionários e consumidores do Plaza Shopping prestaram depoimentos à autoridade policial sobre vazamento de gás e sobre percepção olfativa de odores?
É relevante trazer a lume o fato de que a jornalista Angélica Santa Cruz, em seu artigo, para dar mais credibilidade as suas ‘versões’, distorceu e resumiu a longa entrevista dada pelo químico (PhD) da USP para duas linhas: ‘‘Em nenhuma hipótese pode haver esse cheiro, é preciso fechar o gás até se esclarecer o motivo. Isso é básico’, diz o professor do instituto de Química da universidade de São Paulo José Atílio Vanin.’
Sob esse aspecto, o saudoso professor em Química e Livre-Docente em ciências na área de Físico-química da Universidade de São Paulo/USP José Atílio Vanin, em seu depoimento (ou aula), prestado ao Juízo da MM. 2ª Vara Criminal da Comarca de Osasco-SP, em data de 20 de março de 1998 (citado nos artigos já referidos), versando sobre as questões relativas aos eventos ‘químicos’ que esclarecem cientificamente as causas de acidente decorrente de explosão por combustão de gás combustível, confirmou que ocorreu um vazamento rápido, abrupto e pontual e que aquele cheiro de gás noticiado pelas pessoas (nas diversas versões dos que o sentiram) era proveniente das caixas de esgoto que estavam sob o local.
Assessoradas pelo mesmo mentor
No mesmo sentido, o que a Veja distorceu nas mencionadas duas linhas foi divulgado no artigo do jornalista Mauricio Khalil intitulado: ‘REVIRAVOLTA NO CASO OSASCO PLAZA’, publicado no jornal O Grande Osasco, em data de 6 de junho de 1998, no qual o entrevistado professor José Atílio Vanin, afirmou: ‘A maior parte da tubulação estava enterrada e outra completamente inacessível. A fornecedora de gás não podia fazer a ligação. Foi uma imprudência.’
Cumpre salientar que, no mesmo ano em que este Observatório publicou o artigo de d. Ilka Zanotto, este articulista obteve um ‘relatório’ do Instituto de Química da Universidade de São Paulo – USP, elaborado pelo professor José Atílio Vanin, datado de 21 de julho de 1997, para embasar uma representação que foi protocolada pelo procurador de Justiça/Coordenador do CENACON e das ações civil e criminal do caso Osasco Plaza Shopping, José Geraldo Brito Filomeno, em data de 5 de dezembro de 1997, visando à apuração adequada da responsabilidade de todos os partícipes no projeto e na execução do conjunto técnico de gás e no evento danoso.
Pensava este ingênuo articulista que o procurador de Justiça/Coordenador José Geraldo Brito Filomeno – com larga experiência na Curadoria de Defesa do Consumidor, atuando, inclusive, como um dos coordenadores da comissão especial de elaboração do anteprojeto do Código do Consumidor – fosse encontrar inspiração para responsabilizar a Ultragaz e seus responsáveis técnicos pelo grave crime que cometeram contra o ex-deputado federal Geraldo Alckmin, que foi um dos principais responsáveis pela existência do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Os esclarecidos leitores precisam saber que, ao que tudo indica, a jornalista Angélica Santa Cruz e a promotora de Justiça criminal Marilú de Fátima Scarati de Castro Abreu foram assessoradas pelo mesmo cérebro mentor, pois, no caso Osasco Plaza Shopping, a matéria de opinião de Veja é análoga à denúncia oferecida pelo Ministério Público, por vezes ambas análogas às teses da mentora Ultragaz.
Veja e Ministério Público
Como já asseverado por este articulista nos autos do Processo nº 0.00.000.000035/2005-61 instaurado pelo Egrégio Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), na ânsia de responsabilizarem o Osasco Plaza Shopping e seus administradores, as ‘versões’ materializadas na matéria de Veja embasaram a denúncia oferecida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MPE). Por exemplo, sobressaem bem a propósito, estes trechos colhidos no artigo ‘Câmara de Gás’ e na denúncia retro:
‘Depois da mortandade, as investigações demonstram aquilo que todo mundo que ia ao Shopping já sabia: estava vazando gás.’ (‘Câmara de gás’)
‘Conforme se apurou, dois meses antes da explosão, funcionários, lojistas e consumidores passaram a sentir odor desagradável no interior do Shopping, identificando-o como gás de cozinha (Gás Liquefeito de Petróleo).’ (MPE)
‘As 50.000 pessoas que freqüentavam o shopping diariamente tinham razão em suas queixas. Elas pisavam sobre uma câmara de gás, num ambiente de pouco caso diante do risco.’ (‘Câmara de gás’)
‘No período compreendido entre os meses de abril e de julho de 1996, no estabelecimento comercial denominado ‘Osasco Plaza Shopping’, os denunciados Marcelo, David e Antônio em comum acordo e com identidade de propósitos expuseram a perigo a vida, a integridade física e o patrimônio de lojistas, funcionários e consumidores do referido estabelecimento comercial, mediante explosão de substância de efeitos análogos a dinamite.’ (MPE)
‘Falando claro: diante de um cheiro de gás cuja origem ninguém é capaz de identificar, o mais prudente seria a administração do shopping tomar uma atitude drástica – determinar o fechamento das tubulações, até que se esclarecesse o problema. Não seria fácil, está claro. Mas era o mais acertado, ficou mais claro ainda.’ (‘Câmara de gás’)
‘Salienta-se que já em data anterior ao Dia das Mães até a data do evento, véspera do Dia dos Namorados, havia a necessidade da interdição do estabelecimento o que não ocorreu face a opção dos denunciados em privilegiar o lucro em detrimento da segurança dos freqüentadores e funcionários do estabelecimento.’ (MPE)
‘Um dos mistérios do shopping de Osasco é que as tubulações eram no subsolo, e, pior ainda, não se construiu um túnel para permitir vistorias.’ (‘Câmara de gás’)
‘Assim, sabedores da existência de vazamento de GLP, em data de 17 de abril do decorrente ano, os mencionados denunciados solicitaram uma visita técnica da Companhia Ultragaz S/A, empresa responsável pela distribuição de GLP para o empreendimento para avaliar alguma irregularidade nas instalações de gás, providência esta renovada em data de 05 de junho (de 1996).’ (MPE)
‘Quando a tubulação é subterrânea, os técnicos fecham uma ponta do tubo e inserem ar comprimido nele. Na outra extremidade, colocam um manômetro (aparelho que mede a pressão) de 48 a 72 horas.’ (‘Câmara de gás’)
‘Assim, conforme o descrito acima os denunciados, em comum acordo, sabedores da ocorrência de vazamento de GLP e do risco a ela inerente, omitiram-se não adotando as medidas indicadas e eficazes para evitar o resultado quando podiam fazê-lo, assumindo o risco de expor a perigo a vida, a saúde e o patrimônio de terceiros, mediante explosão, posto que medidas eficazes acarretariam a interdição do local, com interrupção de vendas.’ (MPE)
‘O técnico da Ultragaz que esteve no shopping uma semana antes da tragédia passou uma hora no local. Verificou a pressão dos cilindros que armazenavam 45 quilos de GLP cada um, e constatou que estava normal’… ‘Pela quantidade de queixas de clientes e funcionários, tem-se como o certo que o gás ficou vazando por semanas no subsolo. Para localizar o ponto de onde escapava, seria preciso quebrar o cimento e cavoucar a terra – numa linha de 150 metros de extensão. Mesmo assim é capaz de que nada se descobrisse.’ (‘Câmara de gás’)
‘Conforme se apurou, desde a primeira visita, a Companhia Ultragaz não constatou a existência de qualquer vazamento nas instalações centralizadas (bateria de botijões) por ela executada quando da inauguração do Shopping (doc. nº 08), tendo sido recomendada a realização de um ‘teste por compressor’ que poderia ser feito pela própria companhia distribuidora, mediante contratação dos interessados, a fim de se constatar o local onde estaria ocorrendo o vazamento.’ (MPE)
Delírio da denúncia
Este é o retrato de corpo inteiro da peça processual metamorfoseada oferecida pelos seus autores para, alterando a verdade dos fatos, levarem jornalistas, vítimas, peritos, delegados, advogados, promotores, procuradores, juízes etc., a acreditarem no conto da Ultragaz e de seus responsáveis técnicos, que grande parte da imprensa divulgou seguindo a tese-precursora do marketing político de Joseph Goebbels, segundo a qual a divulgação continuada e massificada de uma mentira a transforma em verdade, e seguindo a lei do mercado, que diz ‘onde há ultra demanda se ganha muito’, seja para divulgar notícias imparciais e de desinformação à exaustão a favor do contratante, seja para não divulgar notícias danosas contra o contratante.
Deveras, o Ministério Público, na sua denúncia caluniosa, fantasiosa, uma obra de ficção, caminhou pelos já traçados rumos de Veja, pois, seguindo fielmente a ordem do roteiro da matéria de opinião de Veja, se valeu do Direito Penal do Inimigo e colocou o ‘interesse privado’ da criminalidade econômica acima da dignidade humana das três centenas de pessoas vitimadas na indizível tragédia para forrar a Ultragaz e seus responsáveis técnicos da cabal responsabilidade pelo grave crime que cometeram.
Vejamos, pois, agora, o que vale trazer a lume e que havia de efetivamente relevante para ser investigado no caso Osasco Plaza – que a Veja escondeu e que a mídia, por longos anos, se esquivou de palmilhar para não revelar as brutais falhas na conduta do Ministério Público, que, aliás, foram cometidas desde as primeiras semanas após o evento danoso para eximir os funcionários e preponentes das empresas Projeção, Tetraeng, BRR Gerenciamento e Ultragaz de qualquer responsabilidade pelo evento danoso e utilizá-los como testemunhas de acusação para sustentar a pretensão civil e criminal que deduziu alhures, o que pode explicar por que a denúncia acabou por delirar para a imputação ad terrorem de uma conduta ‘dolosa’ dos administradores do Plaza Shopping.
Ata ‘secreta’
Saliente-se que, o privilégio da Ultragaz após a tragédia com o seu gás no Osasco Plaza Shopping foi tão grande, mas tão grande, que a mídia não divulgou o nome de um único funcionário da Ultragaz sequer no período entre 11 de junho de 1996 a 23 de Agosto de 2001, apesar de eles terem participado no empreendimento Osasco Plaza, no trágico episódio e de terem prestado depoimentos à autoridade policial e ao Juízo da MM. 2ª Vara Criminal da Comarca de Osasco-SP.
Impossível negar que, para privilegiar a Ultragaz, a promotora de Justiça criminal Marilú de Fátima Scarati de Castro Abreu – esposa do secretário de Segurança Pública do governo Geraldo Alckmin, professor de Direito Penal há 18 anos e promotor de Justiça criminal especial, Saulo de Castro Abreu Filho –, em abono de sua denúncia caluniosa, fez uma investigação ‘secreta’ não oficial do Ministério Público junto às empresas partícipes no empreendimento e no episódio que resultou na obtenção de mais de uma dezena de documentos que foram escamoteados do presidente do Inquérito Policial nº 26/96. São eles:
‘Ata de Reunião nº 2302/95 de 23/02/95, Proposta de Fornecimento nº 152/AT da Ultragaz/Tetraeng de14/03/95, Pedido nº 21.136/95 da Tetraeng/Ultragaz de 17/03/96, Proposta Comercial da Ultragaz/Osasco Plaza de 6/3/96, Ofício S/N enviado pelo Ministério Público ao Departamento Jurídico da Ultragaz em data de 14 de junho de 1996, Oficio S/N enviado pelo Departamento Jurídico da Ultragaz ao Ministério Público em data de 24 de junho de 1996, Portaria DNC nº 16/91, Ofício IPT DEC/DIR-165/96, Fac-Símile DNC nº 356/96, Portaria MINFRA nº 0843/90, Portaria MME nº 0060/95, Portaria DNC nº 14/92, Parecer Técnico elaborado pelo Professor Gil Anderi da Silva, Relatório do Acidente enviado ao Ministério Público pela Subdelegacia do Trabalho de Osasco etc.’
Armazenagem de GLP
Na arquitetura das oitivas dos funcionários da Ultragaz, num universo de 230 indagações formuladas a Celso Barchi Júnior e a Antônio Carlos de Souza, nenhuma indagação sequer foi formulada pelo Juiz de Direito Cláudio Antônio Marques da Silva da MM. 2ª Vara Criminal da Comarca de Osasco-SP e pela promotora de Justiça criminal Marilú de Fátima Scarati de Castro Abreu, sobre os documentos retro mencionados, normas técnicas oficiais e legislações vigentes; bem como, de um lado, deixaram de solicitar das empresas e dos profissionais envolvidos no empreendimento e no episódio os documentos exigidos pela legislação do Sistema CONFEA/CREAs pertinente ao ‘Projeto Executivo’ do conjunto técnico de gás do Osasco Plaza, de outro, as empresas e os profissionais esquivaram-se de fornecê-los para não se auto-incriminarem. São eles:
‘ART – Anotação de Responsabilidade Técnica do projetista do projeto do conjunto técnico de gás; ART do(s) executor(es) do conjunto técnico de gás; memoriais de cálculo, qualificativo e quantitativo, as built, isométrico; carta e relatório técnico dos testes de obstrução e de estanqueidade, com ART do responsável técnico pelas suas execuções, da distribuidora de gás; ART do responsável técnico pelo conjunto técnico de gás, abastecimento e assistência técnica, durante 24 horas por dia, da distribuidora de gás; Atestado do responsável técnico pelo conjunto técnico de gás, visando a concessão do Atestado de Vistoria do Corpo de Bombeiros, da distribuidora de gás; e demais documentos, relativos aos diplomas legais de caráter federal, estadual e municipal.’
Considerando o exposto, também não se esclareceu à sociedade que o vendedor de instalações industriais da Ultragaz Alexandre Toledo participou da ata de reunião nº 2302/95 – o DNA da responsabilidade da Ultragaz e de seus responsáveis técnicos pelo grave crime que cometeram –, em data de 23 de fevereiro de 1995, na fase de obra da execução das tubulações do conjunto técnico de gás do Osasco Plaza, na qual fez determinações opostas a procedimentos normatizados de segurança de obrigatoriedade de uso, liberou o primeiro trecho das tubulações de gás imprestáveis da rede de distribuição já executadas pela construtora Wysling Gomes e autorizou à construtora Tetraeng executar o segundo trecho das tubulações inacessíveis ‘por intermédio da Ultragaz’, que forneceu completa assessoria técnica e executou todas as tubulações da instalação para armazenagem de GLP (central de gás) ou rede de alimentação.
Redimensionando o projeto
Ademais, reza da reunião de ata nº 2302/95, por exemplo, que: ‘O técnico da Ultragaz (Senhor Alexandre Toledo) informa que com o < (menor) Ø (diâmetro) de projeto na ponta que é 1,5 não terá problema de consumo no final de linha a uma pressão de aproximadamente 2 Kg para os lojistas.'
Veja-se, também, que, o chefe do setor de assistência técnica da Ultragaz André Luiz Pedro Pregion, mesmo sendo sabedor do risco que representa um eventual vazamento de gás em tubulações inacessíveis e sem nenhuma segurança, fez a ligação das tubulações de gás da rede de alimentação executadas pela Ultragaz às tubulações de gás imprestáveis da rede de distribuição e introduziu o explosivo produto da marca Ultragaz para fluir pelas perigosíssimas tubulações gás até os pontos de consumo das 17 lojas de fast food da praça de alimentação do Plaza Shopping, em data de 19 de abril de 1995, sem terem sido submetidas à aprovação do Corpo de Bombeiros e da Prefeitura do Município de Osasco-SP – o que pode explicar porque o Ministério Público escondeu Alexandre Toledo e André Luiz Pedro Pregion por longos anos.
É certo que o gerente comercial da Ultragaz Celso Barchi Júnior, responsável técnico pelo conjunto técnico de gás do Osasco Plaza, alterou o projeto da empresa Projeção que havia definido em seu Memorial Descritivo que a ‘Potência Computada’ do conjunto técnico de gás do Osasco Plaza seria de 1800 Kg de GLP, ou seja, pré-dimensionou o ‘projeto’ da Projeção para 900 kg de GLP. Isto é, o novo projeto elaborado pela Ultragaz contou com a anuência dos partícipes da ata de reunião nº 2302/95. Não obstante, após 12 (doze) dias da inauguração do Osasco Plaza Shopping, a Ultragaz com anuência dos engenheiros e projetistas das empresas BRR Gerenciamento, Projeção e Tetraeng, redimensionou o seu ‘próprio’ projeto da ‘Potência Computada’ de 900 Kg de GLP para 1.485 Kg de GLP.
Apostar no ‘risco’ e na ‘sorte’
É de se ficar estarrecido! De um lado, na inauguração do Osasco Plaza, as empresas Ultragaz, BRR Gerenciamento, Projeção e Tetraeng colocaram em funcionamento o conjunto técnico de gás com todas as irregularidades sem ter sido submetido à aprovação pelo poder público nem solicitado sua regularização pelos responsáveis técnicos da Ultragaz. De outro, apesar do risco ali embutido nas tubulações de gás ser de pleno conhecimento das empresas supracitadas, a partir do dia 2 de maio de 1995 foram fornecidos semanalmente de forma ininterrupta 1.485 Kg de GLP, sem ter sido tomada qualquer medida efetiva determinada por procedimentos operacionais, normativos, técnicos e de segurança, preventivos e corretivos, por parte da Ultragaz para evitar a ocorrência de um eventual vazamento de gás previsível para os responsáveis técnicos da referida distribuidora de gás desde a reunião de ata nº 2302/95.
Apenas para arrematar, o funcionário da Ultragaz Antônio Carlos de Souza, em seu depoimento prestado à autoridade policial, além de ter confirmado que por duas ou três vezes prestou serviços de assistência técnica ao Osasco Plaza e que os administradores do Shopping não assumiram o risco do resultado, confessou: ‘Que, por sua experiência, e pelas noticiadas reclamações sobre vazamento, o depoente percebeu que ali poderia haver risco de algum acidente; Que, a este respeito, o depoente não efetuou nenhuma comunicação por escrito ao Shopping ou à própria Ultragaz.’ Além disso, o mesmo Antônio Carlos de Souza em depoimento prestado ás fls. 4188/4189 dos autos do Processo-Civil nº 2143/96 da MM. 6ª Vara Cível da Comarca de Osasco=SP, também confessou: ‘Quando ocorre vazamento em uma tubulação embutida, é melhor condená-la e construir outra tubulação externa’… ‘Informou seu chefe, André, do risco.’
Como se vê, esse experiente funcionário da Ultragaz não desconhecia o dever de alertar a ‘Administração do Shopping’ a respeito do risco detectado por ele no dia 5 de junho de 1996, bem como da possibilidade de ocorrer um vazamento de gás e, a fortiori, explosão no Osasco Plaza Shopping com todas as suas seqüelas detrimentais, tal como ocorreu… ‘Informou seu chefe, André, do risco’, mas omitiu-se a respeito de informar os administradores do Shopping. Some-se a isso, a omissão de seu chefe André Luiz Pedro Pregion, do vendedor industrial Alexandre Toledo e do gerente comercial Celso Barchi Júnior e o quadro de negligência quanto ao dever de alertar sobre o risco e de evitar a tragédia está completo. Ambos informados ‘do risco’ pelo subalterno Antônio Carlos de Souza, nada fizeram durante seis dias e seis noites. Apostaram no ‘risco’ e jogaram com a ‘sorte’ que os acompanhava, havia quatorze meses – perderam, matando dezenas de pessoas e ocasionando lesões corporais em outras centenas.
Interesses políticos e econômicos
Ponto para o Grupo Ultra dos poderosos e importantes empresários Ernesto Igel (morto em1996 na queda do Fokker 100 da TAM), Pery Igel (morto em 1998) e Paulo Guilherme Aguiar Cunha, e para os amigos e amigos dos amigos do presidente da Ultragaz Henning Albert Boilesen (morto em 1971) e do ministro do Supremo Tribunal Federal José Geraldo Rodrigues de Alckmin (morto em 1978) – o que pode explicar por que os principais e verdadeiros responsáveis pelo evento danoso foram utilizados como testemunhas de acusação do Ministério Público durante o Inquérito Policial nº 026/96 e durante o Processo-Criminal nº 886/96; sempre lembrando que apesar de fontes fidedignas foram assistidos juridicamente pelos advogados Luis Francisco da Silva Carvalho Filho e José Carlos Dias que foi ministro da Justiça do governo Fernando Henrique Cardoso e já havia atuado com o mesmo ex-chefe do Ministério Público, Luiz Antônio Guimarães Marrey, quando promotor, no caso do crime da Rua Cuba.
A companhia. Ultragaz S/A certamente esta acima da Lei – tanto é que pode não pagar um bandaid às suas três centenas de vítimas sobreviventes da tragédia com o seu gás no Osasco Plaza Shopping, apesar de sua ‘Apólice de Seguro nº 002.002.531’, de 1º de janeiro de 1996, junto à Bradesco Seguros S.A. ser hoje aproximadamente de R$ 300 milhões –, mas não do tempo e da verdade!
Anote-se que, ação civil pública nº 2.967/03 da MM. 5ª Vara Cível da Comarca de Osasco-SP, com requerimento de medida liminar, ajuizada pela Associação Nacional de Proteção às Vítimas de Desabamentos e Explosões – ANPVDE, em face da Companhia Ultragaz S/A e da BRR Gerenciamento e Planejamento S/A, patrocinada pelo Escritório Yarshell, Mateucci e Camargo Advogados, aguarda julgamento no TJSP desde 2006. O desembargador Sílvio Marques Neto da Oitava Câmara de Direito Privado do TJSP é o relator do ‘recurso de apelação nº 487.429.4/5-00’.
Anote-se, também, que, a propalada ação civil pública nº 1.959/96 ajuizada pelo Ministério Público tão-somente em face do consumidor de gás (B. Sete Participações e de Administradora Osasco Plaza Shopping) para atender os interesses políticos e econômicos da Ultragaz, aguarda julgamento no STF desde 2004. O ministro Joaquim Barbosa é o relator do ‘agravo de instrumento nº 496.854’.
Forjar a ‘verdade’ e caluniar
Ora, ora! Em nome dos interesses políticos e econômicos da Ultragaz e de argumentos falaciosos de discutível moralidade, se altera a ordem jurídica, com a mais franca permissividade de déspotas. Pior que as cínicas manifestações de déspotas e de seus áulicos, quando, com arrogância e verdadeiro escárnio, procuram enfiar-nos goela abaixo a imoralidade de suas ações – e professores de comunicação, estudantes universitários e pesquisadores na área da comunicação colocarem a educação do jornalismo a serviço da criminalidade econômica.
Exemplificando, é o caso do livro-reportagem Osasco Plaza – Histórias de uma Tragédia, uma cópia xerográfica aperfeiçoada da referida matéria de opinião de Veja – repete-se, intitulada: ‘EXPLOSÃO NO SHOPPING – HISTÓRIAS DE HORROR’–, que foi utilizada como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) por educandos de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero. Inclusive, um dos estudantes na época do ‘TCC’ retro era estagiário no mesmo jornal que tinha como funcionária a jornalista Angélica Santa Cruz, conforme já relatado à exaustão por este articulista nos autos do Processo nº 0.00.000.000035/2005-61 instaurado pelo Egrégio Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).
A respeito, o livro-reportagem Osasco Plaza – Histórias de uma Tragédia é outro conto mentiroso. Ou seja, é uma obra dissimulada de contra-informação desenvolvida com métodos de torturadores com o propósito único de duas coisas: uma, de forjarem, embaralharem e distorcerem, ao máximo, a verdade incontestável dos fatos que vieram à tona; outra, de caluniarem, injuriarem, difamarem e macularem a honra das vítimas e seus familiares, dos defensores dos absolvidos no processo-crime e das vítimas associadas da ANPVDE, dos diretores do Osasco Plaza Shopping e de quem tem a coragem de esclarecer e divulgar os fatos que causam espécie para que outra tragédia com o gás liquefeito de petróleo – GLP não sobrevenha e para que os mecanismos utilizados nos autos dos processos criminal e cíveis do caso concreto jamais se repitam. Jamais.
Abuso de poder
Que tipo de jornalista a Faculdade Cásper Líbero está formando? Do tipo que, em troca de uma nota 10, é capaz de tudo e não está nem aí para as conseqüências de seus atos e com a ética na profissão jornalística? Do tipo que, no seu ‘TCC’, transcreve diálogos de entrevistas entre ‘aspas’, que os supostos entrevistados negam peremptoriamente terem dado? Do tipo réu confesso que divulga em sua página no Orkut: ‘Atividades: 100% jornalista (pro bem e pro mal)‘? Do tipo brincalhão que coloca foto sua com dois amigos em seu álbum no Orkut com legenda: ‘Organizatsiya, Yakuza e Cosa Nostra (a máfia internacional)’?
Importa esclarecer também aos atentos leitores que essas barbáries contidas nos textos do referido livro-reportagem, normalmente não chegam ao conhecimento dos leitores e, portanto, impende transcrever as palavras do professor Paolo Marinho de Andrade Zanotto pertinente ao seu e-mail enviado ao Coordenador Geral dos Projetos Especiais da Faculdade Cásper Líbero Carlos Costa – ex-funcionário da Editora Abril desde1999, a exemplo da jornalista Angélica Santa Cruz –, e ao presidente da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (INTERCOM) José Marques de Melo, em data 15 de dezembro de 2006, especificamente, a saber:
‘Digníssimos Senhores Professores,
Com justa indignação venho tecer gravíssimas considerações e denúncia acerca da pesquisa antiética, desenvolvida durante o projeto de graduação em Jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero, sob a orientação da Profa. Rosangela Petta, conduzida pelos graduandos Alexandre Volcian, André Kameda, Eugênio Augusto Brito e Klinger Portella. Hoje a Profa. Petta está sob a coordenação do Sr. Carlos Costa.
Infelizmente, esta pesquisa, publicada sob o título de ‘Osasco Plaza – Histórias de uma Tragédia’, foi premiada pela INTERCOM na USP, hoje sob a coordenação do Prof. José Marques de Melo.
Dado que é patente que os alunos e a Profa. Petta foram sobejamente informados e providos de fartas informações documentais que contradiziam cabalmente a versão por eles preferida, o viés dada a presença do contraditório torna o trabalho tendencioso e atesta desrespeito às normas éticas de atuação em pesquisa e a conduta profissional deplorável de todos os envolvidos, responsáveis etc.
De face do que (vide abaixo) o STJ do Brasil de fato julgou acerca do caso Osasco e dados os fatos reais e evidências existentes que foram produzidas aos redatores, o livro é cinicamente tendencioso. Ademais, é lastimável que, esta publicação, que coloca o jornalismo a serviço da criminalidade econômica (que neste caso é perpetrada pelos organizadores e mentores da Operação Bandeirantes – Oban durante os anos de ditadura), tenha sido premiada pela INTERCOM, USP, o que denigre profundamente o nome de nossa Instituição. E isto comanda minha amarga indignação enquanto membro coordenador de Comissão de Ética em Pesquisa (CEPSH-ICB) na USP.
Portanto, solicito ao Prof. Melo que avalie e conteste sem demora ou hesitação esta peça sob a luz da evidência plena e, inexoravelmente anule esta absurda premiação que veste de falsa dignidade o exemplo claro de falta de ética em pesquisa e, em última análise, serve para impedir o Estado de Direito em nosso país. Isto é inaceitável nesta Universidade e solicito a imediata tomada de providências com toda seriedade por parte dos ilustres Srs. Professores supracitados no sentido de sanar esta situação de maior gravidade.’ (grifos do original).
Concluindo, conforme inicialmente citado foi no laboratório deste Observatório que foi desenvolvida a essência da verdadeira Justiça galvanizada nas decisões do TJSP e do STJ retro mencionadas. Num jogo rápido de palavras modernas, a Justiça nos autos do processo-crime do caso Osasco Plaza Shopping começou quando este Observatório, ‘Fórum da Imprensa e da Cidadania’, no longínquo dia 5 de março de 1997, ventilou a informação de uma injustiça produzida por um abuso do poder em Osasco, o que significa reconhecer a importância e a utilidade social da imprensa responsável, que pode, só ela, denunciar um atentado contra os pilares das instituições republicanas, e, portanto, o Judiciário não é a única forma de se fazer Justiça.
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Tecnogasista e autor de representações junto ao MP-SP no caso do acidente no Osasco Plaza Shopping