Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Os cobradores de silêncios alheios

Uma das bases do discurso jornalístico é o estabelecimento da crença de que ele se coloca entre os fatos e o leitor de forma a retratar fielmente a realidade. É uma questão central, pois envolve seu principal capital simbólico: a credibilidade.

Se tivermos claro que qualquer tipo de ação discursiva envolve múltiplas estratégias, não poderemos deixar passar em branco uma pequena nota publicada sexta-feira (6/6) na coluna ‘Outro Canal’, do jornal Folha de S.Paulo.

Assinada pelo jornalista Daniel Castro, denuncia o silêncio da TV Record sobre as mais recentes acusações contra a ministra Dilma Rousseff. Deixa claro que a emissora, ao contrário do restante da grande imprensa, optou por uma escolha temática que fere a relação de confiança que deve existir entre um veículo e o leitor/telespectador.

Acusa a Record de ignorar a pauta hegemônica no campo jornalístico. É interessante observar como um simples registro é uma forma de interpelação ideológica, um convite à homogeneização de postura. Vejamos como é construído o curto relato, um expediente narrativo que, operando por axiomas, denuncia o paradigma a ser evitado. O desvio está em silenciar sobre o que estava ‘até na TV Brasil’. O caráter não-público desta última parece prescindir de demonstrações. Faz o jogo do governo e ponto final.

‘O Jornal da Record não falou uma única palavra, na edição de quarta, sobre denúncia de ex-dirigentes da Anac de que a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) teria pressionado a agência a beneficiar compradores da Varig, clientes do advogado Roberto Teixeira, amigo e compadre do presidente Lula. A notícia estava até na TV Brasil, a emissora pública federal. A Record informou que noticiaria a história na edição de ontem, de forma `completa, com todos os lados ouvidos´.’

Com a palavra, os especialistas

Que fique claro que não estamos defendendo uma imprensa chapa-branca. Não é bom para a democracia que o jornalismo se torne subcampo de qualquer bloco de poder. Como destacam diversos analistas, as notícias são representações da autoridade e, como tal, através delas os produtores do conteúdo noticiosos definem quem tem acesso ao espaço público.

Assim, cobrar que a imprensa cumpra o seu papel é salutar. Mas, observando a blindagem recorrente do jornal paulista aos desmandos das administrações tucanas, cumpre indagar ao zeloso jornalista: o que dizer dos sucessivos silêncios da Folha de S.Paulo? A resposta deve ser fácil, posto que o profissional da imprensa obedece à formação discursiva de quem lhe paga os salários.

Com a palavra, pela ordem de inscrição, os nobres especialistas em jornalismo brasileiro.

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Professor titular de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), Rio de Janeiro, RJ