Na quinta-feira (30/4), o Supremo revogou a Lei de Imprensa. Os ministros deixaram clara a importância da liberdade de expressão para a manutenção da democracia. É indiscutível que a base para qualquer democracia é possuir uma imprensa livre e esta é mais importante que os governos, como afirmou o ministro Carlos Alberto Menezes Direito na sua argumentação: ‘Os regimes totalitários podem conviver com o voto, jamais com a liberdade de expressão.’ Mas liberdade de expressão é muito mais que apenas ter mantido esse direto de opinião. Como afirmou o ministro Joaquim Barbosa, deve ser plena a ponto de impedir a sua concentração em poucos veículos de comunicação.
Se essa sua argumentação foi embasada no poder dos grandes veículos de comunicação nacionais, não imagina as consequências que a situação atual ocasiona nas regiões menos desenvolvidas. A qualidade dos nossos representantes no legislativo, tanto nas esferas federal quanto estadual, é um reflexo dessa situação.
Uma imprensa é realmente livre quando os seus órgãos de comunicação e os jornalistas profissionais da área recebam salários que permitam exercer o papel que a sociedade lhe confere, isto é, a busca da informação e a divulgação dela a todos.
Alternativa para romper feudos políticos
Isso só é possível onde há um grande número de consumidores do produto que ela oferece, ou anunciantes que permitam arcar com os seus custos. Sem isso, essa liberdade torna-se ilusória e desvirtua-se, passando a sofrer uma espécie de censura, a censura comercial.
Embora existam os que vejam com olhos pouco simpáticos o uso de incentivos fiscais por parte do governo, creio que para esse setor, e baseado no que significou a Lei Rouanet para a cultura nacional, devem ser concedidos aos que investirem, de forma a que auxiliem a imprensa na sua tarefa de consolidar a nossa ainda imatura democracia.
Como na maioria dos municípios brasileiros não temos consumidores ou anunciantes suficientes para manter a imprensa local, a censura comercial se dá de forma clara e inequívoca, mantendo a imprensa refém de ‘padrinhos’, um prato cheio para que se torne subserviente ao dinheiro do poder público, passando a depender desse dinheiro para ter lucro e pagar os salários dos funcionários e fornecedores.
Como impedir ou reverter isso, ainda mais em um momento em que a internet surge como uma alternativa – ou ameaça? – que poderá comprometer ainda mais as finanças dos órgãos de imprensa, a ponto do setor, em todo o mundo, ter dúvidas sobre o que o futuro lhe reserva?
Creio que uma Lei nos mesmos moldes da Rouanet, de incentivo à liberdade plena da imprensa, ou contra a censura comercial da imprensa, seja a alternativa para romper esses feudos políticos nas imprensas regionais.
Fiscalização mais eficaz e independente
A Lei Rouanet foi criada em 1991 para incentivar o apoio à cultura nacional e instituiu, entre outros mecanismos, o incentivo fiscal que viabilizou o patrocínio de empresas e pessoas físicas a projetos culturais, permitindo o abatimento de até 100% do valor no Imposto de Renda investido nesses projetos.
Incentivos em investimentos culturais e, recentemente, redução de IPI dos veículos, foram alternativas implementadas pelo governo para preservar os empregos nessas áreas. Se o governo agiu assim para evitar o colapso nesses setores, por que não se antecipa às dificuldades que certamente a imprensa terá e permite a dedução de impostos dos empresários para que valorizem os seus produtos anunciando-os na imprensa?
Do ponto de vista dos empresários, esse apoio significará a valorização da sua marca com agregação de valor à sua imagem, permitindo o aumento do consumo dos seus produtos, o aumento do seu lucro, a geração de mais empregos e, consequentemente, para o governo, o que em um primeiro momento pode parecer perda, no longo prazo significará aumento da arrecadação de mais impostos. Teríamos então um ciclo virtuoso que seria benéfico aos empresários, ao governo, aos trabalhadores, à imprensa e à sociedade, que teria uma imprensa menos fragilizada.
Caso se instituísse esse incentivo à imprensa, haveria a possibilidade de poder conter, ou dificultar o controle de ‘padrinhos’ sobre a imprensa em regiões mais distantes do país, permitindo uma fiscalização mais eficaz e independente, dificultando a ‘liberdade’ com que hoje se cometem desvios dos recursos públicos.
Esta é uma proposta que, claro, não está acabada. Nos próximos textos publicarei algumas sugestões para controle fiscal e social do incentivo.
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Economista, professora universitária, especialista em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas/Ebape, Rio de Janeiro, RJ