Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Folha de S. Paulo – 2



CRISE DAS CHARGES
Jeff Jacoby

Agora somos todos dinamarqueses

"DO ‘BOSTON GLOBE’ – Comer carne bovina é sacrilégio para os hindus. Então quando, no outono passado, um supermercado dinamarquês fez uma promoção de carne bovina e vitela, hindus em todo o mundo reagiram enfurecidos. A Índia retirou seu embaixador de Copenhague, e bandeiras da Dinamarca foram queimadas em Calcutá, Mumbai (ex-Bombaim) e Nova Déli. No Sri Lanka, uma multidão de hindus espancou impiedosamente dois funcionários de uma empresa dinamarquesa, e manifestantes no Nepal gritaram: ‘Guerra à Dinamarca!’. Outros em grandes cidades depredaram lojas que vendem artigos de louça dinamarquesa ou brinquedos Lego. Duas embaixadas da Dinamarca foram atacadas com coquetéis molotov.

Nada disso aconteceu, é claro. Os hindus podem achar odioso ter carne de vaca como alimento, mas eles não recorrem a boicotes, ameaças ou violência quando não-hindus comem bifes ou hambúrgueres. Eles não exigem que todos obedeçam às restrições impostas pelo hinduísmo.

O mesmo se aplica aos cristãos, judeus, budistas ou mórmons: eles não reagem com violência quando seus sentimentos religiosos são ofendidos. Não esperam que suas crenças sejam imunes a críticas, oposição ou zombaria.

Mas os muçulmanos radicais não pensam desse jeito.

A comoção atual em torno das charges do profeta Muhammad, publicadas por um jornal dinamarquês, mais uma vez ressalta a intolerância fascista que está no cerne do islã radical.

O ‘Jyllands-Posten’, maior jornal diário da Dinamarca, encomendou as charges para passar uma mensagem relativa à liberdade de expressão. O jornal quis protestar contra o clima de intimidação pelo qual um escritor dinamarquês não conseguiu encontrar um único ilustrador para o livro infantil que escrevera sobre o profeta Muhammad.

Nenhum artista concordara em ilustrar o livro, porque todos tinham medo de se tornar alvos de extremistas muçulmanos. Estarrecido com essa autocensura, o ‘Jyllands-Posten’ convidou artistas dinamarqueses para fazer desenhos de Muhammad, e publicou os 12 desenhos que recebeu.

A maioria dos desenhos é branda a ponto de ser maçante, especialmente quando comparada às charges mordazes que corriqueiramente aparecem em jornais americanos e europeus.

Algumas dessas charges vinculam Muhammad ao terrorismo islâmico -uma delas o retrata com uma bomba no turbante, e uma segunda o mostra no paraíso, dizendo aos terroristas recém-chegados: ‘Parem! Parem! O estoque de virgens acabou!’.

Outras das charges focalizam a ameaça à liberdade de expressão. Em uma delas, um artista está sentado diante de sua prancheta, nervoso e suado, desenhando Muhammad, e ao mesmo tempo olha sobre o ombro para se assegurar de não estar sendo vigiado.

A idéia de que algo tão brando assim pudesse desencadear uma reação tão desvairada -tumultos, ameaças de morte, seqüestros, queima de bandeiras- revela muitíssimo sobre o abismo que separa os valores do mundo civilizado dos que vigoram em grande parte do mundo islâmico.

Liberdade de imprensa, o mercado de idéias, o direito de espicaçar vacas sagradas: o islã militante não conhece nada disso. E, se os jihadistas conseguirem seu intento, tudo isso será eliminado em toda parte pela censura e a intolerância da sharia.

Algumas vozes muçulmanas corajosas e dispersas têm se manifestado contra os queimadores de livros. O jornal jordaniano ‘Shihan’ publicou três das charges. ‘Muçulmanos do mundo, sejam razoáveis’, suplicou o editor Jihad al Momani, em editorial publicado no jornal. ‘O que causa mais prejuízos ao islã? Essas caricaturas, ou fotos de um seqüestrador degolando sua vítima diante da câmera?’

Em questão de horas, porém, Momani estava desempregado -demitido depois que o governo jordaniano ameaçou tomar medidas legais.

Momani não é o único editor a ter sido demitido nos últimos dias. Em Paris, Jacques Lefranc, do diário ‘France Soir’, também perdeu seu emprego depois de publicar as charges de Muhammad. O proprietário do jornal, um copta egípcio chamado Raymond Lakah, divulgou um comunicado orwelliano, em tom abjeto, oferecendo a cabeça do editor como gesto de ‘respeito pelas crenças e convicções íntimas de cada indivíduo’.

Mas a equipe do ‘France Soir’ defendeu a decisão dele de publicar as charges, num editorial corajoso. ‘A melhor maneira de lutar contra a censura é impedir que a censura aconteça’, disseram os jornalistas. ‘Um princípio fundamental que garante a democracia e a sociedade secular se encontra ameaçado. Não dizer nada equivale a bater em retirada.’

Em todo o continente, quase duas dúzias de outros jornais já se uniram na defesa desse princípio. Enquanto clérigos islâmicos proclamam um ‘dia internacional da ira’ ou declaram que ‘a guerra começou’, importantes publicações de Noruega, França, Itália, Espanha, Holanda, Alemanha, Suíça, Hungria e República Tcheca reproduziram as charges dinamarquesas.

No entanto não houve demonstração comparável de coragem nos EUA.

Não devemos nos deixar enganar: esse assunto não vai desaparecer, como tampouco vai desaparecer a ameaça islamo-fascista. A liberdade de expressão que temos como algo garantido e certo está sofrendo forte ameaça e, se não for bravamente defendida, pode desaparecer.

Hoje os censores podem estar combatendo algumas charges pouco engraçadas de Muhammad, mas amanhã serão nossas palavras e idéias que eles tentarão por todos os meios silenciar. Gostemos disso ou não, agora somos todos dinamarqueses.

Tradução de Clara Allain"

GUERRA & INFORMAÇÃO
David Morgan

Casa Branca ‘selecionou’ dados sobre Iraque

"DA REUTERS, EM WASHINGTON – Um ex-funcionário da CIA que coordenou a inteligência dos EUA relativa ao Oriente Médio durante a invasão do Iraque acusou a Casa Branca de ter feito mau uso das informações obtidas antes da guerra para justificar seus argumentos em favor do ataque.

Paul Pillar, que foi o responsável nacional de inteligência para o Oriente Médio e o sul da Ásia de 2000 a 2005, também disse que o Comitê de Inteligência do Senado e uma comissão presidencial fizeram vista grossa para evidências de que o governo Bush politizou o processo de inteligência de modo a dar apoio aos setores da Casa Branca responsáveis pela formulação da política americana.

‘As informações oficiais sobre os programas de armas iraquianas tiveram falhas, mas, mesmo com falhas, não foram elas que conduziram à guerra’, escreveu Pillar em artigo escrito para a ‘Foreign Affairs’. ‘Se todo o conjunto da análise feita das informações oficiais sobre o Iraque conduzia a uma conclusão política, essa conclusão era que se devia evitar a guerra -ou, se a guerra fosse travada, que nos preparássemos para um pós-guerra problemático.’

Não foi possível contatar Pillar para que ele comentasse o artigo. Um porta-voz da CIA disse que Pillar expressou seu ponto de vista pessoal, e não a visão oficial da agência de espionagem.

A CIA e outras agências que compõem a comunidade de inteligência dos EUA têm sido criticadas por sua coleta de informações sobre o Iraque no pré-guerra, incluindo a alegação de que Saddam Hussein possuía armas de destruição em massa, que foi o principal argumento usado para justificar a guerra. Essas armas não foram achadas no Iraque.

Mas Pillar, analista de inteligência altamente respeitado que passou 28 anos na CIA, disse que, desde a invasão de 2003, já ficou claro que a Casa Branca não empregou as análises oficiais de inteligência para tomar até as mais importantes decisões na área de segurança nacional.

Em vez disso, ela usou uma abordagem de ‘selecionar dados a dedo’, escolhendo informações brutas que pareciam mais favoráveis a suas afirmações sobre as armas de destruição em massa e o argumento de que existia vínculo entre o Iraque e a Al Qaeda.

A Casa Branca desprezou relatórios dos serviços de inteligência que diziam que o Iraque não seria um terreno fértil para a democracia e que falavam de um período pós-invasão longo e difícil, que exigiria um esforço do tipo de um Plano Marshall para reconstruir a economia do país, apesar de suas abundantes reservas petrolíferas.

Os relatórios também previam que a força de ocupação se tornaria alvo de ressentimento e de ataques, inclusive de guerrilheiros.

Pillar disse que o governo Bush politizou a inteligência sobre o Iraque ao pedir repetidas vezes mais material que contribuísse para seus argumentos em favor da guerra, tática que, segundo ele, levou os recursos de inteligência a serem empregados de maneira parcial em tópicos que favoreciam a posição da Casa Branca.

O Comitê Seleto do Senado para a Inteligência e a Comissão sobre Armas de Destruição em Massa concluíram que não existem evidências de que a Casa Branca tenha exercido pressão política.

‘Mas o método de investigação usado pelos comitês -em essência, perguntar aos analistas se eles haviam sido pressionados- teria detectado apenas as tentativas mais grosseiras de politização’, escreveu Pillar."

Neil Lewis

Libby diz que teve ordem para vazar informações

"DO ‘NEW YORK TIMES’, EM WASHINGTON – O ex-chefe-de-gabinete do vice-presidente Dick Cheney, Lewis Libby Jr., disse a um júri de instrução que foi autorizado por ‘seus superiores’ a revelar a jornalistas informações sigilosas sobre a capacidade iraquiana de armas em 2003, segundo documento registrado por um promotor federal.

O relatório mostra que Libby participou do esforço de relações públicas da administração de George W. Bush para rebater as queixas de que havia poucos fundamentos para dizer que Saddam Hussein tinha ou buscava armas de destruição em massa, alegação que justificou a invasão do Iraque.

O documento é parte dos argumentos contra Libby, acusado de mentir sobre seu papel no vazamento a jornalistas da identidade de uma agente da CIA (Agência Central de Inteligência).

O promotor Patrick Fitzgerald, em carta enviada aos advogados de Libby no mês passado, disse que este depôs diante do júri de instrução dizendo que ‘não manteve contatos com jornalistas nos quais revelou o teor da Estimativa de Inteligência Nacional (EIN)’ relativa à capacidade nuclear iraquiana. ‘Também observamos que Libby declarou em seu depoimento que foi autorizado por seus superiores a revelar à imprensa informações sobre a EIN.’

Em outubro passado, Libby foi indiciado por cinco acusações de falso testemunho e obstrução da Justiça, envolvendo o que Fitzgerald afirma ter sido uma tentativa de enganar investigadores sobre seu papel no vazamento da identidade de Valerie Wilson como agente da CIA.

Valerie é mulher de Joseph Wilson, ex-embaixador que acusara a administração de distorcer informações sobre as tentativas do Iraque de comprar urânio do governo do Níger.

A identidade de Valerie Wilson foi revelada primeiramente numa coluna assinada por Robert Novak em julho de 2003, logo depois de Joseph Wilson escrever um artigo no ‘New York Times’ dizendo que investigara a alegação sobre o Níger e encontrara poucas evidências que a respaldassem.

A nota de 23 de janeiro do promotor parece constituir uma tentativa de provar que Libby usava informações secretas para promover os argumentos da administração, ao mesmo tempo em que a identidade de Valerie Wilson era vazada aos jornalistas.

A EIN, redigida em outubro de 2002, dizia que ‘o Iraque provavelmente terá uma arma nuclear ainda nesta década’, mas incluía pareceres divergentes. O relatório foi classificado como sigiloso.

Em 18 de julho, quando se espalharam dúvidas quanto aos argumentos em favor da invasão do Iraque, algumas das quais atribuíveis ao artigo de Joseph Wilson, o governo retirou o documento da categoria de sigiloso.

Em sua carta, o promotor Fitzgerald disse que Libby comentou o teor do relatório sigiloso numa reunião em 8 de julho com Judith Miller, na época repórter do ‘New York Times’. Miller disse ao júri de instrução que Libby lhe falou sobre Valerie Wilson nesse dia.

Os advogados de Libby já deram a entender que não vão contestar a alegação de que ele teria dado declarações enganosas sobre como soube da identidade de Valerie Wilson e se compartilhou essa informação com jornalistas. Eles já disseram que quaisquer declarações inverídicas de Libby aos investigadores foram fruto de sua preocupação com questões graves de segurança nacional. Tradução de Clara Allain"



FOTOJORNALISMO
Toni Pires

World Press Photo premia registros dolorosos

"A 49ª edição do prêmio máximo do fotojornalismo mundial, o World Press Photo, consagrou ontem o canadense Finbarr O’Reilly, da agência de notícias Reuters, e sua instigante fotografia de uma mãe e sua filha na fila de espera de um centro de alimentação na Nigéria.

‘Esse retrato assombrou-me desde que o vi, há duas semanas, e permaneceu em minha cabeça após ter visto milhares de outros’, comentou o presidente do júri, James Colton. ‘Essa imagem tem tudo: beleza, horror, desespero. É simples, elegante e comovente.’

Neste ano, 4.448 fotógrafos de 122 países participaram, num total de mais de 83 mil imagens. Mas a profusão nem sempre se traduz em qualidade de informação. Na concorrência desenfreada das ‘imagens da notícia’, somos confrontados por um discurso visual prioritariamente testemunhal, geralmente burocrático.

As imagens premiadas mostram a importância de alinhar olho, coração e mente na construção de uma fotografia. Esse é o caso da imagem feita pelo grego Yannis Kontos em Serra Leoa, onde um menino ajuda o pai, de mãos amputadas, a abotoar a camisa. Ou da comovente cena do velório de uma menina de cinco anos na República Democrática do Congo.

Lugares-comuns na imprensa, as tragédias ainda dão o tom nesses concursos. Convergem ao buscar a dor do outro, que parece, em primeira instância, a base do fotojornalismo. Mas são imagens que nos levam a confrontar a realidade de lugares onde nem sabemos por que um homem leva uma câmera ou como ele consegue a serenidade para compor retratos e flagrantes capazes de nos emocionar no café da manhã."



TELEVISÃO
Daniel Castro

Novela infla audiência do ‘Jornal da Record’

"É artificial o sucesso do ‘novo’ ‘Jornal da Record’, que copia o ‘Jornal Nacional’. Até anteontem, o telejornal marcava média de 11 pontos desde sua ‘estréia’, dia 30. Uma excelente audiência para os padrões da Record.

Mas o ‘Jornal da Record’ só está conseguindo marcar dois dígitos graças à novela ‘Prova de Amor’, que o antecede, e à estratégia da Record de torná-lo mais curto e com menos intervalos comerciais (que ficaram menores).

A análise dos dados minuto a minuto do Ibope mostra que o ‘JR’ não tem ‘musculatura’ para sustentar audiência alta. Na quarta-feira, por exemplo, o ‘JR’ entrou no ar com 23 pontos, herdados de ‘Prova de Amor’. No minuto seguinte, já marcava 16. No quarto minuto, já tinha perdido metade (11 pontos). Ao final, quando saiu do ar, o ‘JR’, estava com apenas seis pontos.

Como durante alguns minutos o telejornal marca audiência alta isso infla sua média final.

A Record argumenta que o ‘JR’ ganhou audiência porque em dezembro já era precedido por ‘Prova de Amor’, mas marcava apenas sete pontos.

Ocorre que em dezembro o ‘JR’ tinha de dez a 15 minutos a mais do que atualmente. E eram até quatro intervalos comerciais de mais de três minutos cada. Agora, são apenas um ou dois ‘breaks’, de dois minutos. Quanto mais cedo sai do ar, maior é a média final do ‘JR’.

OUTRO CANAL

Trama 1 Gilberto Braga confirma: a Globo quer adiar a novela que ele prepara com Ricardo Linhares para substituir ‘Páginas da Vida’, de Manoel Carlos, no início de 2007. ‘A emissora está bastante satisfeita com a temática, mas, com efeito, cogita de troca de ordem [de autores das próximas novelas]’, afirma Braga.

Trama 2 Mas não seria Aguinaldo Silva (convocado para preparar uma sinopse) o substituto de Braga, e, sim, Benedito Ruy Barbosa. É uma questão estratégica: tanto Manoel Carlos quanto Braga tratam da zona sul do Rio, e a Globo teme que isso canse a audiência.

Perigo Fãs de ‘Desperate Housewives’ ficaram preocupados com a notícia de que a Rede TV! irá co-produzir com a Disney, na Argentina, uma versão brasileira da série. Temem que o resultado seja um desastre pior do que ‘Avassaladoras’ (Record e Fox).

Retorno Hoje mais conhecida como ‘a mãe de Luciana Gimenez’, Vera Gimenez está confirmada em ‘Cristal’ (SBT).

Velório Durou pouco a festa do SBT. Anteontem, a Record voltou a superá-la no Ibope no horário nobre.

Outro lado Gugu Liberato diz que a decisão de cancelar a apresentação do grupo mexicano RBD, no último ‘Domingo Legal’, foi dele, e não de Silvio Santos."



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Folha de S. Paulo – 1

Folha de S. Paulo – 2

O Estado de S. Paulo – 1

O Estado de S. Paulo – 2

O Globo

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