A caminhada que vem sendo desenvolvida pelas Jornadas Literárias de Passo Fundo (RS) há 32 anos comprova a importância de uma ideia que se transformou numa movimentação cultural ininterrupta, permanente, forte, desafiadora, com ações heterogêneas e amplas de leitura. Propusemos, em 1981, a realização de um evento literário diferenciado: estimular a leitura das obras dos autores convidados antecipadamente, promovendo discussões sobre seus conteúdos e preparando o grande diálogo que poderia ser realizado quando do encontro presencial com os escritores. Realizamos, assim, a primeira pré-jornada com 250 professores de distintas áreas do conhecimento, dispostos a ler textos literários lançando múltiplos olhares sobre uma mesma obra, expressando seus sentimentos num concerto polifônico. O primeiro encontro passo-fundense com escritores do Rio Grande do Sul foi profícuo e a metodologia de leitura antecipada aprovada e ampliada, envolvendo também alunos e leitores de todas as idades. Esse é o grande diferencial da Jornada, quando cotejadas iniciativas na área do livro. Expandimos nossa trajetória, transformando-nos num evento nacional. A continuidade das ações, sua permanência, seus desdobramentos ampliaram nosso compromisso com a leitura e renderam a Passo Fundo o título de Capital Nacional da Literatura.
O grande objetivo que buscamos é a formação de leitores multimidiais a partir da sintonia entre educação, cultura, tecnologia. Estamos empenhados em formar leitores capazes de construir suas cidadanias pelo uso competente da leitura nas suas práticas sociais, tornando-se autônomos; capazes de apreciar textos literários em diferentes suportes, envolvendo-se com uma linguagem criativa, muito distinta da empregada na comunicação informal; estimulados a se envolver com manifestações culturais e artísticas, entendendo-as, apreciando-as e valorizando-as.
Num país de pouquíssimos leitores, estamos preocupados, também, com a necessidade de formar públicos capazes de apreciar pintura, escultura, teatro, música, dança, arquitetura, fotografia, qualificando o gosto, distinguindo expressões populares de outras produzidas esteticamente, desenvolvendo sensibilidades. Em outubro de 2012, após um ano de discussões, a comissão organizadora interinstitucional, responsável pela realização da 15ª Jornada Nacional de Literatura, decidiu que o tema desta edição seria Leituras Jovens do Mundo. Estávamos preocupados em conhecer mais detalhadamente interesses, necessidades, linguagens dos jovens para dialogarmos melhor com eles a partir de suas manifestações. Já tínhamos consciência da liderança que os jovens assumem nas famílias, na escola pelo domínio das tecnologias. São chamados a resolver os problemas desta ou daquela natureza. Não imaginávamos, naquele momento, que seria deles, menos de um ano depois, a liderança da movimentação de protestos nas ruas brasileiras por um país melhor e mais responsável, pela garantia de direitos e deveres de seu povo. Não pensávamos que a tão desejada leitura de mundo fosse tão bem feita na prática transformadora.
Leitores em formação
Nossas ações foram e continuam sendo programadas no contexto de uma universidade, comunitária – a Universidade de Passo Fundo –, junto com representantes das secretarias municipais de Educação e de Cultura, observando a realidade das escolas públicas municipais especialmente e as condições apresentadas pelas escolas públicas estaduais e pelas escolas privadas. Temos desenvolvido ações concretas, demonstradoras do compromisso de tornar indissociáveis atividades de ensino, pesquisa, extensão. Professores e alunos universitários unem-se pela defesa de projetos transformadores da escola brasileira.
A proximidade permanente e não apenas eventual com as escolas, com os professores e com os alunos se faz necessária. Nosso país tem uma extensão territorial muito grande, o que, aparentemente, dificulta o desenvolvimento de um trabalho de formação de mediadores de leitura presencial, mas que não se inviabiliza se houver decisão política governamental. Leitores em formação, sejam eles professores, bibliotecários, agentes culturais ou alunos precisam ser apresentados a diferentes materiais de leitura, observando-se a especificidade de cada um.
As Jornadas Literárias se consolidaram e se ampliaram. Paralelamente, outras importantes iniciativas foram desenvolvidas no país, como as Bienais Internacionais do Livro em São Paulo e no Rio de Janeiro. Festas literárias proliferaram pelo Brasil. Todas essas ações merecem nosso respeito, nossa admiração. Ações que precisam comprovar seu valor, sua importância a cada ano, quando precisamos dos benefícios das Leis de Incentivo à Cultura federal e as existentes nos estados brasileiros. As empresas estatais e privadas vêm espantosamente se esquivando do seu uso. O que está acontecendo em nosso país, tão carente de estímulos a ações educacionais e culturais sintonizadas? O que precisamos avaliar é o que fica de permanente após a realização de cada evento, após a presença ou mesmo da ausência de uma mídia nacional que valorize ações de leitura dessa envergadura. Nada será duradouro, certamente, se não forem envolvidos leitores em formação no planejamento prévio dessas ações. E a pergunta final que todos devemos nos fazer: afinal, todo esse esforço não vale a pena?
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Tania Rösing é coordenadora das Jornadas Literárias de Passo Fundo (RS). A 15ª edição do evento ocorre entre os dias 27 e 31 de agosto