Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Transmídia

A comunicação é muito mais eficiente que a marreta para derrubar barreiras. E elas não param de cair. Desde que Jeff Bezos comprou o Washington Post, no início deste mês, por US$ 250 milhões, as especulações sobre suas motivações e intenções se multiplicam como opiniões na blogosfera. O casamento de um ícone e marca venerada do jornalismo como o Post com o gênio das vendas eletrônicas da Amazon, a mais disruptiva força do varejo das últimas décadas, oferece alimento ao pensamento. São tantas as possibilidades nessa união, e são tantas barreiras a quebrar. Não na marreta, mas no clique.

O trio parada dura de céticos, cínicos e realistas acha que Bezos comprou fundamentalmente poder na capital americana ao adquirir o jornal mais importante de Washington. Sim, mas as coisas hoje em dia têm muitas dimensões, especialmente nas áreas de comunicação, mídia e conteúdo. Bezos sabe o que um veículo e uma marca como o Post podem fazer neste mundo faminto de informação e consumidor de notícias. Um consumo voraz, mas fugaz.

Vamos ver o que vai acontecer. Só sabemos, mesmo, é que estamos ainda na infância do futuro. Um futuro digital e global, como escreveu sir Martin Sorrell, fundador e presidente-executivo da WPP, até o mês passado o maior grupo de publicidade do mundo, em sua coluna de estreia neste mês no LinkedIn, a rede social focada em relações profissionais, com 240 milhões de usuários pelo mundo, mais de 11 milhões só no Brasil. E que há dez anos nem sequer existia.

Uma nova língua

Como os smartphones, que só agora estão se tornando de fato produtos de massa. Segundo dados da Anatel, o Brasil tem hoje um contingente de quase 80 milhões de usuários de internet no celular. É a população inteira da Alemanha, crescendo a taxas chinesas. Isso pode mudar um país e certamente afeta o seu negócio e a sua vida. Basta olhar uma roda de adolescentes para entender a centralidade das telinhas dos gadgets na vida das pessoas hoje e no futuro. É um mundo onde menos é mais. Pequeno é grande. Nano é giga. Menos palavras, mais comunicação. Das mais variadas formas.

Outro dia, por exemplo, conheci um aplicativo fantástico que promove a mais efêmera e intensa comunicação: você manda um vídeo de poucos segundos que pode ser visualizado apenas uma vez pelo receptor antes de se autodestruir, como aquelas mensagens de Missão Impossível. E, para os que acham que essa condensação instantânea de mensagens é uma condenação instantânea a bobagens, pensem de novo e pensem novo.

Com todo apreço e respeito aos grandes romances (e Machado é o maior dos mestres para qualquer redator brasileiro), torpedos, posts, tuítes e e-mails ressuscitaram o poder da escrita num mundo oral e audiovisual. Nunca na história humana tantas pessoas escreveram tantos textos para se expressar e se comunicar com tanta gente. Esses bilhões de novos escritores estão criando uma nova língua ao misturar idiomas, subtrair letras, inventar palavras, uma nova literatura para novos tempos e novas mídias.

“Um grande dia na história da imprensa”

Vivemos agora em estado de conexão permanente com indivíduos e grupos, o que cria caminhos e oportunidades em vários níveis da comunicação – na forma como ela é produzida, consumida, estruturada, difundida, transacionada.

Empresas que nasceram plataformas digitais estão se transformando em mídia e provedores de conteúdo. Facebook e Google são o quê? São híbridos, em expansão. A Amazon, de Bezos, o novo dono do Washington Post, por exemplo, além de ser a maior vendedora de livros, tornou-se também mídia. Ela produz conteúdo e vende espaço publicitário na esfera dos bilhões.

Bezos é antes de tudo um homem de negócios inovador, testado no campo de batalha digital. Ele tem recursos financeiros e estruturais para fazer uma revolução dentro da revolução. Sua entrada no ramo da notícia pelo Washington Post é a melhor notícia desse ramo no ano. Foi, como escreveu Elio Gaspari nesta Folha, “um grande dia na história da imprensa”.

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Nizan Guanaes, publicitário e presidente do Grupo ABC, é colunista da Folha de S.Paulo